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SER-NO-MUNDO NA CONTEMPORANEIDADE

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Academic year: 2021

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SER-NO-MUNDO NA CONTEMPORANEIDADE

ÁLVARO ANTÔNIO NICOLAU

BELO HORIZONTE Dezembro/2007

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SER-NO-MUNDO NA CONTEMPORANEIDADE

Monografia apresentada ao Curso de Psicologia, da Faculdade de Ciências Humanas e Letras do Centro Universitário Newton Paiva, na Disciplina Orientação de Monografia como trabalho de conclusão de Curso como requisito parcial para obtenção do título de Psicólogo, sob a orientação do Prof. Éser Pacheco.

BELO HORIZONTE 2007

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Dedico este trabalho a todas as pessoas que, de uma forma ou de outra, me auxiliaram e se empenharam no sentido de que eu chegasse ao final; de bom gosto

àqueles que me ajudaram em sua

concretização, especialmente aos meus

clientes, bem como aos que me

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Aos meus pais, que me estimularam a dar os meus primeiros passos, inclusive no mundo acadêmico, sempre com ética, compromisso e responsabilidade, e com quem aprendi, na simplicidade do existir, a autenticidade de ser. Obrigado pelo amor e incentivo, especialmente minha mãe.

À professora Raquel, que sempre demonstrou acreditar em mim, me estimulando em momentos difíceis nos trabalhos na clínica, compreensiva e na constante disposição em transmitir novos conteúdos.

Ao meu orientador, professor Éser Pacheco, por acreditar na capacidade inerente do ser de crescer com todos os riscos que tal crescimento implica.

A todos os meus professores que contribuíram para o meu crescimento e desenvolvimento pessoal e profissional. Em especial, ao professor Geraldo, que me colocou em paz com o conhecimento.

Aos professores Hélcio Gomes e Rosana Figueiredo, por tudo que compartilhamos nos últimos momentos de estágio no Hospital Geral e Asilo, bem como pelo “acolhimento” preservado na essência de seu ser.

A todos os meus amigos, mormente da equipe da Fundação Guimarães Rosa, e grupo de estágio, pelo compartilhamento das angústias, certezas e incertezas, frustrações, decepções, realizações e sucesso nos últimos anos, onde sempre estiveram dispostos a me incentivar e ouvir.

A minha esposa Rosemeire pela atenção, presença e incentivo em toda a minha vida. Uma dádiva em minhas escolhas.

E, principalmente, aos meus clientes, que me enriqueceram com suas presenças, facilitando o crescimento e amadurecimento, tanto meu, quanto deles. E a oportunidade que eles me deram de ser o que realmente sou.

A todos os aqui citados, divido este trabalho, pois sem suas ternas presenças, ele não seria possível.

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“Ser original não é ser diferente. Mas é reconhecer a sua origem. E como é simples esse caminho.

Porque espontâneo e livre, único de possível, plenitude e realização. Descobrir-se e caminhar

na identidade interior. Como um rio em seu leito

guarda sempre a certeza que seu destino é o mar.”

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O trabalho de conclusão de curso apresentado refere-se a uma pesquisa bibliográfica cuja abordagem foca o sentido de ser-no-mundo na contemporaneidade. É desenvolvido com base nos desdobramentos do Vazio Existencial que sugere uma sociedade egocêntrica, em que as pessoas estão voltadas para si mesmas, que prevalece a angústia, a solidão, num distanciamento do outro. Há uma busca de si mesmo, porquanto tal vazio não significa um vazio da pessoa, mas um vazio de sentido. A relação terapêutica aparece como condição necessária, geradora de mudanças no indivíduo, no sentido do auto-crescimento e autonomia. Nesta perspectiva, a partir do momento em que a autenticidade do terapeuta encontra-se com a autenticidade do cliente, configura-se uma relação com o outro, onde paradoxalmente o cliente muda, a fim de ser ele mesmo. Assim vive-se um momento de crivive-se e conflitos, onde grupos e culturas encontram-vive-se ameaçados. O crime, a criminalidade, e a violência consubstanciam esse momento da contemporaneidade. Os Valores, padrões e princípios que nortearam e possibilitaram o desenvolvimento de nossa cultura falharam e se esgotaram. É preciso revê-los e arriscar-se no desconhecido. O ser-no-mundo, nesta multiplicidade de realidades, precisa encontrar-se no sentido de definir seu estilo pessoal de lidar com as mudanças. Transformar talvez seja o caminho na ressignificação do aqui e agora. O mundo contemporâneo no qual estamos inseridos exige constantes e rápidas mudanças. Em função disso, muitas vezes, buscamos e incorporamos máscaras para nos sentirmos integrados a essa realidade que nos envolve. Nossa singularidade e individualidade diluem-se na coletividade anônima. Nesse contexto, a busca para sermos quem realmente somos parece configurar-se como uma busca conflituosa, mas necessária.

Palavras-chaves: Vazio Existencial, Contemporaneidade, Ser-no-mundo, Psicologia Existencial.

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which focuses on the sense of being-in-the contemporary world. It is developed based on unfold about Empty Being that suggests a selfish society, where people are focused on themselves, which prevails the anguish, loneliness, promotes distance of the other. There are a search about your self, that it doesn't mean an empty person, but a void of meaning. The therapy relation appears as a necessary condition, to promote individual changes, in the autonomy and self-growth sense. Therefore, from the moment at the therapist authenticity finds itself on the authenticity, they setting a relationship with the other, where customer paradoxically switches to be himself. Thus, living is a crisis moment and conflict, where groups and cultures, are threatened. The crime and violence reflect the contemporary moment. The values, standards and principles that guided and enabled our culture development went failed. We must review them and risk in the unknown. The being-in-the world in this multiplicity of realities, needs to find itself in order to define their personal style of dealing with the changes. To transforme, perhaps, is the way to mean again the here and now. The contemporary world in which we inserted requires constant and fast change. Because of this, many times, seek and incorporate masks to feel part of reality that involves us. Our uniqueness and individuality spread in the community anonymously. In this context, the search for who we really are seems set itself as a search conflict, but necessary.

Keywords: Empty Existencial, Contemporaneidade, Being - in-the-world, Psychology Existencial

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1 INTRODUÇÃO...8

2 EXISTENCIALISMO, A PSICOLOGIA E A PSICOTERAPIA EXISTENCIAL ...12

2.1 - O Existencialismo e a Psicologia Existencial ...12

2.2 - A Psicoterapia Existencial...15

3 O SER-NO-MUNDO E O VAZIO EXISTENCIAL ...27

3.1 Ser-no-mundo ...27

3.2 - O Vazio Existencial ...33

4 A FALTA DE SENTIDO NA CONTEMPORANEIDADE ...47

5 CONSIDERAÇOES FINAIS ...60

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1 INTRODUÇÃO

No final do século XX e início do século XXI, era comum ouvirmos e lermos previsões para a chegada da nova era, a era da espiritualidade, do equilíbrio, da paz, da harmonia. Todavia, no Brasil, a violência, sobretudo a urbana, está na agenda do dia-a-dia, e ocupa as manchetes dos jornais. Tal violência e criminalidade é assunto de especiais para a televisão e, mais que tudo, assombra as consciências, de tal forma é ameaçadora, recorrente e geradora de um profundo sentimento de insegurança. Essa evolução é sintoma de uma desintegração social, de um mal-estar coletivo e de um desregramento das instituições públicas. Há um debate contemporâneo sobre a violência, mesmo porque hoje, mais que antes, ela é fato visto e sentido.

Apesar dos inúmeros estudos sobre o assunto, alguns equívocos ainda estão presentes na interpretação do cotidiano social. Em geral, estes equívocos surgem a partir de uma atitude reducionista frente à questão da violência e criminalidade. Um dos exemplos que limitam a compreensão se refere ao fato de muitos situarem-na apenas no campo do crime.

Os crimes, enquanto delitos cometidos contra a lei, concretamente revelam a existência da violência, uma vez que podem comprometer a vida de pessoas e de grupos, mas, por trás dos crimes, estão presentes outros tipos de violência que necessariamente não se articulam diretamente com eles e que nem sempre são percebidos enquanto tais.

Nos últimos anos, a violência, por causa de sua tendência ascendente, vem sendo apontada por diversos setores representativos da sociedade como sério e importante problema que aflige muitos paises, e o Brasil em especial.

Nesta contemporaneidade, é lastimável o imperativo da insensatez. Mata-se na cotidianidade por quase nada: mata-se por um par de chinelos ou por alguns poucos trocados. O crime a criminalidade e a violência imperam vitoriosas nos contextos sociais.

Vivemos muitas enfermidades, sejam físicas, sejam psicológicas e, muitas vezes, uma decorrente da outra. Por isso mesmo, na pós-modernidade, é comum o ser humano fazer uma avaliação de si e do mundo.

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Nesse sentido, percebe-se que as pessoas buscam um sentido para a vida, mesmo porque a falta desse sentido está inserida num contexto de um sintoma contemporâneo, presentes os diversos cenários contidos na relação entre desenvolvimento tecnológico capitalista contemporâneo e o desenvolvimento humano, pois estão longe de andar lado a lado.

Tal discrepância fomentou o desenvolvimento desta pesquisa no sentido de entender a relação entre a sociedade hoje, na contemporaneidade, que é usada no mesmo sentido de pós-modernidade, suas implicações para com a falta de sentido enquanto uma patologia psicológica. Para tanto, buscou-se na filosofia existencial, bem como na psicologia advinda desta filosofia, algumas considerações para que este trabalho pudesse ser realizado.

Assim, dentro de uma seqüência, contou-se ainda para o fortalecimento das idéias a contextualização do existir das pessoas e o seu sentido de ser-no-mundo na contemporaneidade, do ponto de vista da Psicologia Existencial, bem como Identificar o Vazio Existencial e a falta do sentido de ser no mundo permeado pela natureza da existência humana.

No primeiro Capitulo, tratou-se o Existencialismo, a Psicologia e a Psicoterapia Existencial através dos conhecimentos de Sarte (2005), Kierkegaard (1987), Heidegeer (1982), May (1987), Erthal (1999), Arendt (1989), Augras (2004), dentre outros. O objetivo principal, neste primeiro momento, consistiu em contextualizar o Existencialismo apoiado na idéia de ser este uma doutrina filosófica, em que há uma centralização na pessoa existente, enfatiza estar o homem em constante evolução, e ainda mostra que a existência corresponde o envolvimento de pessoas reais, as quais procuram superar-se através de seu sentido de ser-no-mundo.

Na seqüência, tem-se a abordagem sobre a Psicoterapia Existencial, numa demonstração no sentido de que vários são os modelos terapêuticos com a influência da fenomenologia e do existencialismo, que objetiva conduzir a pessoa no sentido do autoconhecimento e da autonomia, numa compreensão da existência humana. O desenvolvimento do trabalho obedece ao sentido dado pela contemporaneidade à Psicologia e à Psicoterapia Fenomenológico-Existenciais, por perspectiva da Filosófica da Vida.

Assim, nesse capítulo, é apresentado um breve histórico do Existencialismo, a partir da contextualização da condição e da existência humana, além da

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apresentação da abordagem sobre a psicoterapia existencial e o sentido de ser-no-mundo de uma pessoa na contemporaneidade.

No segundo capítulo, a abordagem sobre “O ser-no-mundo e o Vazio Existencial” foi desenvolvida através dos conceitos apresentados por Feijoo (2000), Calmon (2002), Heidegger (1989) e Forghieri (2003) com o fim de buscar o entendimento do sentido de ser-no-mundo no cotidiano uma vez que a existência do homem se refere ao processo de existir no mundo. Teve o propósito de compreender o sentido da vivência no dia-a-dia.

Por intermédio de Erthal (1999), Cohn (1997), Van Deurzen-Smith (1996), Yalom (1983) e Lipovetsky (1989), procurou-se compreender a questão do Vazio Existencial, que pode ser caracterizado pelo sentido de vida num processo de isolamento, de negação, de resistência, de ajustamento a um padrão, porquanto nesse processo não há vida, mas sim uma sensação de frustração.

Logo, o ser-no-mundo e o Vazio Existencial na contemporaneidade, nesse sentido, estão implícitos no vir-a-ser num contexto de falta de sentido no pós-moderno e como é pensado e trabalhado o dia seguinte na vida das pessoas, em consideração ao tempo vivido e um novo projeto de vida.

No terceiro capítulo, a pesquisa foi feita a partir de estudos das obras dos seguintes autores: em Bauman (1998), Kierkegaard (1987), Foucault (1994), Olivenstein (1989), May (2000), Arendt (1989), Fromm (2000), Rojas (1996) e Lipovetsky (1983), o sentido de ser na contemporaneidade.

Nesse capítulo, procurou-se estabelecer a relação entre o sentido de ser-no-mundo e a contemporaneidade no sentido de existir, e o que os psicólogos podem apresentar para o acolhimento das pessoas, pela compreensibilidade desse ser, através da psicoterapia existencial fenomenológica.

Ser-aqui-e-agora certamente está embutido na questão do modo de ser-no-mundo ou no modo de ser para o ser-no-mundo, pois, dessa forma, o significado delineará o sentido que a pessoa tem do vivido, por meio de uma análise compreensiva.

Feijoo (2000), em sua obra, relata a situação das pessoas como ser-no-mundo; demonstra a necessidade de se qualificar os relacionamentos, e não simplesmente quantificar uma situação, mesmo porque uma situação dessas pode levar ao adoecimento psicológico do ser.

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Há que se relevar a situação específica dos atos apresentados pelas pessoas, pelos seus símbolos e mitos do discurso, significados e reflexos de tudo que ela faz e pensa, além do que, a vida é um processo de existir.

Por isso mesmo, para construir o humano, deve-se pensar no mundo e seguir a construção pelo que está presente em cada momento da existência.

Só a pessoa pode viver sua própria vida, não há duble. Os projetos de vida podem ser conduzidos, em vista da identificação de como se pode estabelecer as escolhas diante do que a vida oferta.

Certamente que vários são os procedimentos que passam pela natureza das pessoas no sentido do humano. Todavia, o sentido de se fazer presente, de existir e de sentir-se na contemporaneidade, o indivíduo como “Ser de possibilidades, é responsável pelas suas próprias decisões”, bem como na identificação de seu horizonte existencial, constrói e reconstrói seu projeto de vida.

As considerações finais são desenvolvidas com base no que ocorre na contemporaneidade, que é marcada por uma sociedade arbitrária, que exclui a importância das relações interpessoais e coloca como insignificantes os desejos individuais, bem como as experiências passadas, além da falta de projeção futura. Nesse ambiente, vislumbra-se o papel do psicólogo em vista acolher o ser humano acometido do Vazio Existencial, na sua angústia, no seu isolamento e na sua solidão; a acolher a pessoa enquanto ser-no-mundo e propenso ao adoecimento psicológico. Há destaque para esse trabalho psicoterapêutico; no que tange ao acolhimento das pessoas, as quais buscam melhor qualidade de vida no encontro consigo e na relação com o outro.

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2 O EXISTENCIALISMO, A PSICOLOGIA E A PSICOTERAPIA EXISTENCIAL

2.1 O Existencialismo e a Psicologia Existencial

O existencialismo é um movimento filosófico que dá supremacia à existência, e considera o homem como centro de valores e em contínuo crescimento. Nestes termos, é compreendido como uma doutrina filosófica em que há uma centralização na pessoa existente e enfatiza estar o homem em constante evolução.

Para Sartre (2005), a existência precede a essência. Nesse sentido, há uma presença apenas biológica da criatura humana no mundo. Só depois, pela convivência, é que se adquire uma essência humana. É uma posição ateísta e, no final, o homem é o nada. Mas o homem está em estado de constante superação de si, mesmo porque o fundamento da existência é a liberdade de escolha.

A existência humana envolve pessoas reais, em situações concretas. Por isso, a psicologia existencial é a psicologia da existência humana com toda a sua complexidade e paradoxos. (WONG, 2004)

A psicologia existencial procura entender o que caracteriza a existência individual, e nesse diapasão o que é estar-no-mundo, e como se caracteriza o confronto do indivíduo com os dados da existência. Essa psicologia tem, pelos seus propósitos, a finalidade de introduzir fundamentos da psicologia existencial em que assentam diferentes propostas de psicoterapia existencial, além de fazer uma revisão sumária sobre o que caracteriza a existência individual na possibilidade do existir. Aborda o sentido de que o homem tem total responsabilidade por sua existência e é o criador de seu próprio destino, em contraposição a qualquer forma de determinismo.

O existencialismo tem sua origem em Kierkegaard (1813-1855), um filósofo dinamarquês que contestava o caráter determinista e intelectual de Hegel; afirma o interesse pelo simples e pela vontade; é considerado o pai do existencialismo moderno.

Para Kierkegaard, a existência é o que determina o homem, e isto gera grande ansiedade porquanto passa pela luta do ser vivo contra o não ser. Aqui temos a crise da vida contra a morte.

Outro personagem importante para o Existencialismo foi Heidegger (1976), filósofo alemão, que se preocupou com a problemática existencial do ser humano.

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Ele dizia que, pelo fato de a vida ser limitada, é continuamente ameaçada. A existência humana está posta diante da morte a todo o momento. O ser do homem é um ser para além de si, para fora de si. Assim, o homem tem uma maneira peculiar de existir: “ele é, não sendo a si mesmo”.

O existencialismo é um modo de compreender o ser humano; este é visto como referência para que a sua natureza seja colocada na inter-relação com o outro. A teoria que embasa, ou seja, a metodologia especifica, é a fenomenologia. O mundo interno exprime-se na simbolização pelas categorias cognitivas que representam a experiência na sua ausência, na imaginação, pela recombinação de categorias mentais que se assemelham à experiência, mas sem interação com o meio e juízo, que é a avaliação em relação à experiência, associadas à intimidade, ao amor, à espontaneidade e à criatividade.

O processo de individuação opõe-se ao conformismo com as normas e papéis sociais, o que conduz a um funcionamento estereotipado e inibidor da simbolização e da imaginação. O indivíduo está comprometido com a tarefa, sempre inacabada, de dar sentido à sua própria existência.

A existência individual caracteriza-se por palavras-chave, as quais sejam: cuidado; construção e responsabilidade. Na medida em que o indivíduo cuida da sua existência na procura de conhecer-se e compreender-se; descobre-se na relação com o outro, constrói o seu mundo. Assim, traça sentido à sua existência; a partir da possibilidade de escolha, opta por viver de acordo com os seus valores. Isto lhe confere um caráter único e singular, pois, responsabiliza-se por si próprio na realização do seu projeto de vida. Portanto, a existência individual é uma totalidade única, singular e concreta.

É um processo que se estabelece com o individuo, pela sua forma de estar-no-mundo. Ocorre que a existência, enquanto estar-no-mundo, envolve a unidade entre o indivíduo e o meio em dimensões, que são as dimensões da existência (VAN DEURZEN-SMITH, 1996).

São três as dimensões da existência, para Biswanger (1971). Temos a dimensão física, que significa o mundo natural, Umwelt, o da relação do indivíduo com os aspectos biológicos do existir e com o ambiente, que envolve as suas atitudes em relação ao corpo, aos objetos, à saúde e à doença e no qual se exprime em permanência uma procura de domínio sobre o meio natural, que se opõe à submissão e aceitação das limitações impostas, nomeadamente pela idade e pelo

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ambiente. O sentimento de segurança é aqui dado pela saúde e bem-estar, este é o lado social.

Verifica-se ainda o mundo da relação com os outros, Mitwelt, do estar-com e da inter-subjetividade, onde se revela e descobre o que se é. Mundo em que envolve as atitudes e os sentimentos em relação aos outros, tais como amor/ódio, cooperação/competição, aceitação/rejeição e partilha/isolamento. Inclui os significados que os outros têm para nós; querem sejam dos familiares, dos amigos ou dos colegas de trabalho, significados que dependem das modalidades da nossa relação com eles.

Na dimensão relacional tem se o mundo psicológico. Trata-se de uma premissa fundamental do modelo existencial, segundo Spinelli (2003). É o mundo da relação consigo próprio, Eigenwelt, da existência subjetiva e fenomenológica de si - mesmo, da construção do mundo pessoal, com a auto-percepção de si, da sua experiência passada e das suas possibilidades, recursos, fragilidade e contradições, profundamente marcado pela procura da identidade própria, assente na auto-afirmação e numa polaridade de atividade e passividade.

Cada indivíduo centra-se na construção de significados, e é com base neles que luta contra o vazio e a falta de sentido, sendo responsável, existencialmente, pela sua auto-afirmação e desenvolvimento; consciente do que sentiu e pensou, do que sente e pensa além de poder antecipar o que poderá vir a ser no futuro.

As pessoas necessitam e desejam estar com os outros, já que juntos destes, podem estabelecer uma empatia e aprender. Assim, ele se descobre e constrói projetos com base nas relações significativas.

A importância do estar - com, da abertura aos outros, tem sido tratada de modo distinto por diferentes autores. Todavia podemos destacar dentre os temas existencialistas: Crise existencial, angústia, solidão, morte, liberdade, sentido, escolha, risco, compromisso, encontro, responsabilidade, autenticidade, diferenças individuais e projetos de vida, temporalidade, espacialidade e a responsabilidade pela sua existência é do próprio homem, mesmo porque ele é consciente.

A partir daí, para ser humano, é necessário lidar com todas essas condições de ser um ser-no-mundo.

O existencialismo é, então, uma doutrina filosófica pela qual a Psicologia existencial se constitui. Considera o homem lançado no mundo, entregue a si mesmo; e que o Ser constrói-se a cada ação. Pela existência, o homem se lança e

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se arrisca no mundo, sem qualquer garantia. Por isso, pode parecer impossível uma ação preventiva para o ato de existir, porquanto não se pode prever ou antecipar os acontecimentos.

2.2 - A Psicoterapia Existencial

São Vários os modelos terapêuticos que podem ser designados genericamente como psicoterapia existencial. Foram desenvolvidos, em decorrência e com as influências da fenomenologia e do existencialismo. Tais modelos terapêuticos tiveram o objetivo de serem facilitadores e conduzirem a pessoa ao encontro do auto-conhecimento e de uma autonomia psicológica suficiente para que pudessem assumir livremente sua existência. (VILLEGAS, 1988)

Refere-se a uma intervenção que tem a finalidade de ajudar o crescimento do indivíduo com a autenticidade da sua existência, de forma a assumi-la e a projetá-la mais livremente no mundo. A preocupação central é o Ser enquanto pessoa no mundo e não a perturbação mental. A perturbação mental, se presente, é vista como resultado de dificuldades do indivíduo em fazer escolhas mais autênticas e significativas, pelo que as intervenções terapêuticas privilegiam a autoconsciência, a auto-compreensão e a auto-determinação.

No livro Existência, Rollo May (1987), ensina que no inicio do século XX a Psicoterapia Existencial surgiu espontânea e simultaneamente, em diversos países da Europa: Alemanha, França, Suíça e Holanda. Havia certa insatisfação com a psicanálise, tanto com os seus resultados clínicos quanto com a sua formulação teórica. Foi uma tentativa de superar essa insatisfação, e também procurar preencher algumas lacunas sobre a compreensão humana deixadas por ela. Todavia não deve ser considerada como uma das correntes derivadas da Psicanálise, pois dela muito se difere, mormente quanto ao método e à técnica. May, em seu trabalho, sistematizou as idéias de Binswanger, Medard Boss e outros.

Na proposta da psicologia existencial, há um enfoque que busca uma maior compreensão da existência humana. Procura refletir e propor soluções às questões da cotidianidade, além de compreender a própria existência sem pré-conceito, e perceber a vivência da pessoa da mesma forma que ela a percebe. É voltar às

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coisas mesmas. É o ser - humano ser compreendido a partir de sua forma de ser-no-mundo.

O homem deve ser capaz de perceber o seu sentido de ser - no - mundo, bem como decidir por uma aceitação mais ampla de vida, conforme dizeres de Rollo May (1987), por uma atitude compreensiva. É pela experiência que a pessoa irá transcender e não por uma explicação. Certamente que, decidir e experimentar a existência precede ao conhecimento, daí a importância do ato de compreender que sua experiência diz respeito à sua existência como um todo. Eis a citação de May, para reforço desta idéia: “A ampla aceitação é o objetivo de toda a terapêutica, para um sentido mais preciso; significa a relação de um indivíduo com seu mundo e com seu eu, a experiência da própria existência” (MAY, 1977, p.66).

Dessa forma, ampliar o campo perceptível e elevar a sensibilidade para as experiências em suas possibilidades e em sua totalidade é um caminho natural para o ser humano. Isto é possível através do conhecimento de seu “ser”, do modo como se coloca junto com as pessoas e como experiencia as coisas que o cercam. Enfim, o ser assume o seu estado de ser humano em processo, um ser - sendo.

Quando a pessoa se dá conta de como é seu modo-de-ser na psicoterapia, experiencia um estado de ser-para-a-morte, pois neste momento, no presente, tem em si uma possibilidade de transcender para uma visão mais ampla da vida: É sempre um vir-a-ser. Assim: “A morte é o único aspecto da minha vida que não tem valor relativo e sim absoluto; meu reconhecimento consciente desta particularidade comunica a minha existência e o quanto há em minuto a minuto um caráter absoluto” (May, 1977, p.72).

Nesse modo-de-ser, tem-se a consciência. Para Sartre (1986), a consciência é consciência de um objeto. É consciência de algo e ela distingue o seu próprio objeto. Dai advém a concepção dos diversos juízos, que podem ser positivos ou negativos: de valor, sobre as coisas, dentre outros. A considerar a possibilidade de fazer juízos negativos, Sartre (1986) faz uma ligação conceitual entre a consciência e a liberdade, e diz: “A capacidade de conceber a negativa constitui a liberdade de imaginar outras possibilidades, a liberdade de fazer uma suspensão de juízos”. Essa liberdade tem o significado de poder, de negar. Enfim, ser consciente é ser livre. Assim, a responsabilidade sobre a existência é de cada indivíduo, pois ele tem sua liberdade, inclusive de negar a realidade. Isto possibilita fazer novas escolhas. A autenticidade na vida está exatamente em escolher.

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Na análise existencial, a existência é um Vir-a-Ser, uma incerteza. A existência real do ser é atribuir o seu sentido, o seu significado, o seu propósito. O ser do homem deve ser um “Ser-Aí” e “Aí” é o mundo. O nosso Ser-no-Mundo-Com consiste em estar relacionado com alguma coisa, em fazer uso de algo, em renunciar algo, apreender, realizar, determinar e saber algo.

Para Heidegger (1982) “somos lançados no mundo que está diante de nós e permanecerá depois, sem escolha pessoal, sem conhecimento prévio”. Portanto, é assumir ou não a própria vida; mas é uma dúvida, uma incerteza, mesmo porque não se sabe a que fim foi lançado na existência. Já o ser alienado, este não sente o peso da responsabilidade de suas escolhas. Esta forma de existência é o oposto de um Dasein (ser-ai), que tem domínio de si, e daí consiste a distinção entre condição autêntica e uma condição inautêntica do modo de vida humano, de existência do Ser.

Na existência inautêntica, Heidegger (1982) nos dirá que o ser encontra-se constantemente temeroso, preocupado com a opinião de outros homens, de estar dentro dos padrões materiais e psicológicos que lhe são impostos.

A inautenticidade é necessária para que o dasein tome consciência de sua perda do eu, e a partir daí se esforce para retornar à sua autenticidade. Paralelamente, ao abrir o Dasein vazio para a vertigem, possibilita ir além de si mesmo.

O que move o ser a ter desejo e esperança de ter uma existência autêntica é o cuidado e a preocupação voltados para o futuro. O cuidado e o afeto subentendem e requerem “a possibilidade de ser”. Eis um estado primordial do Dasein; adquirir autenticidade.

De acordo com May (1987), a obscuridade frente a nossa existência e às nossas tomadas de decisões é o aspecto mais penoso da angústia. Mas há um lado positivo: assim como a ansiedade destrói a consciência de nós mesmos, esta pode destruir a ansiedade. Isto é, quanto mais forte a consciência de nós mesmos, tanto melhor podemos lutar e vencer a ansiedade. ”Quando muito intensa, a ansiedade é a ameaça mais penosa sentida pelo animal racional” (May, 1987. p. 34).

Não-Ser é conseqüência da irresponsabilidade de quem não assumiu a sua vida como devia. É a negação de si, infidelidade para consigo mesmo, e a frustração das próprias realizações pessoais. É a busca pelo parecer-ser e parecer-ter. É representar papéis na busca de estima, admiração, prestígio e poder, papéis estes

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que não têm nada a ver com uma possível catalogação, uma possível designação no sentido de uma pessoa a ser identificada. Simplesmente ocorre, aparece.

Por outro lado, é necessário considerar que as pessoas precisam estabelecer um modo ativo de existência, até porque é o vivido que afirma o corpo e os sentidos. Identifica-se com o vivido e se potencializa como tal no sentido de ser e atuar na criatividade. Nesta identificação, e na expressividade do vivido, também em suas intensidades, possibilidades e devir, é que constitui e configura a interpretação fenomenológico-existencial como um modo existencial de vida.

É nesse sentido que ocorre o desdobramento ativo das possibilidades de ser da pessoa humana; propicia a configuração, a compreensão, e a interpretação fenomenológico-existencial.

Na contemporaneidade, a Psicologia e a Psicoterapia Fenomenológico-Existenciais têm uma perspectiva da Filosofia da Vida, e é um dos elementos fundamentais de sua concepção e de sua metodologia. A identificação é com o vivido; perpassa pela afirmação e expressividade do vivido como critérios de valor e de método.

Dessa forma, prevalece a idéia de que se constituem como espaços para o cliente ter a afirmação de seu próprio vivido, pelo privilégio da prática intensiva da compreensão e da interpretação fenomenológico-existenciais. Essa é, pois, a idéia de constituírem-se fundamentalmente, para o cliente, como espaços e tempos de compreensão intensiva de seu ser-no-mundo, na presença e atualidade das possibilidades de ser espaço que envolve desdobramento ativo e o vivido das possibilidades de ser desta compreensão. Configura-se, nesse mister, o próprio devir do ser-no-mundo, do cliente na relação inter-humana com o terapeuta.

Certamente que não implica “caminhar” com o cliente no sentido de ele interpretar o seu vivido e utilizar-se necessariamente da forma do artista. Fato é que a conversação inter-humana expressiva entre o terapeuta e o cliente, ao longo da sessão e do trabalho psicoterapêutico e psicológico, impõe-se, e pode configurar-se, como um meio privilegiado de propiciar o desempenho fenomenal sem cometer qualquer tipo de negligência.

São evidentes que, apesar de sua excelência, a fala e a conversação não são as únicas dimensões possíveis da interpretação fenomenológico-existencial, porquanto se abre a possibilidade de inúmeros recursos e possibilidades expressivas, verbais e não verbais. Por isso deve-se potencializar, compreender e

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interpretar, mas efetivamente processar o vivido pelo cliente através da compreensão e interpretação do fenômeno existencial.

É no vivido que o cliente potencializa os desdobramentos "curativos", é onde cria e recria sua saúde com prática sistematizada do seu si mesmo na facticidade e afetividade de sua atualização existencial.

Quanto ao psicoterapeuta, este estuda diversas formas de ver o homem. Considera o inserido no mundo, na história que já foi explicitada. Isto significa que ele escolhe a forma de ver o homem e, conseqüentemente, como irá trabalhar na sua prática de consultório, ou seja, na compreensibilidade. Na psicoterapia, o profissional considera o ser humano como um indivíduo que possui sua singularidade, e em sua vivência e existência, sofre, se angustia, está no mundo da forma que pode no momento, mesmo que insatisfeito, que sente solidão, que não se apropria das suas escolhas na vida, que se mostra sem sentido.

Trabalha-se a fim de que o cliente se revele, em primeiro lugar, para si mesmo na constante descoberta de si mesmo, e a partir daí, ter conhecimento de como, tal cliente se relaciona com o mundo. Há uma busca no sentido de se apropriar do sentido de ser da pessoa, de como tem escolhido ser e estar consigo e com os outros, e ainda, de como se responsabiliza por sua vida. Isto significa olhar para dentro de si, reconhecer-se, assumir para modificar-se, caso considere que é devido. Significa buscar um sentido mais próprio para sua vida por meio de uma investigação que visa auxiliar o cliente a encontrar o próprio caminho, sem perder de vista que se faz necessário a incessante busca para compreendê-lo com seu sofrimento, sua alegria e temores. Levam em conta suas crenças e seus valores, no contato, sem acrescentar, sem julgar e sem criticar.

Portanto, a posição do psicoterapeuta será compreender e explicitar; tem em Heidegger a compreensão do termo, quando ele assim se manifesta: "El ente constituído esencialmente por el ‘ser-en-el-mundo’ es el mismo en cada caso su ahí".

De modo objetivo, deve-se explicar o mundo natural a fim de compreender o mundo vivido, bem como o vivido do mundo, o ser-no-mundo. É por isso que a interpretação adquire sentidos diferentes: como interpretação explicativa, com evidências de atitude naturalista diante de objetos do mundo natural, na busca de suas relações e identificação conceitual do seu sentido; e o seu sentido fenomenológico existencial, como interpretação que se constitui como

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desdobramento das possibilidades de ser da compreensão da facticidade e da afetividade existenciais do ser-no-mundo.

Na análise existencialista há predominância do valor existencial e ontológico da interpretação fenomenológico existencial. Nietzsche consagra a perspectiva de que "tornamo-nos algo que somos" em existência como um estilo de viver; entende a vida como algo efetivamente inocente.

Em sua hermenêutica ontológica, Heidegger precisa o sentido da interpretação fenomenológico-existencial como desdobramento das possibilidades ativas de ser da compreensão:

En cuanto comprender, el ‘ser-ahí’ proyecta su ser sobre possibilidades. Este comprensor ‘ser relativamente a possibilidades’ és él mismo, por obra de la repercussión de las possibilidades enquanto abiertas sobre el ‘ser-ahí’, un ‘poder ser’. El proyectar del comprender tiene la possibilidad peculiar de desarrollarse. Al desarrollo del compreender lo llamamos ‘interpretación’. En ella el comprender se apropia, comprendiendo, lo comprendido. En la interpretación no se vuelve el comprender outra cosa, sino él mismo. La interpretación no és el tomar conocimiento de lo comprendido, sino el desarrollo de las possibilidades proyectadas en el comprender. (HEIDEGGER, 2005)

Há o desdobramento das possibilidades de ser da compreensão, que se constitui originariamente como vivido do ser-no-mundo. Logo, viver é uma arte. A arte humana de viver; a criatividade existencial que permite ao homem a possibilidade de criar a originalidade de sua vida, que lhe permite produzir respostas criativas para suas questões existenciais, que lhe permite ajustar-se criativamente na relação com o mundo que lhe diz respeito, deriva do exercício desta capacidade de poder identificar-se e ser intérprete (fenomenativo-existenciais) de seu próprio ser-no-mundo; no desdobramento de suas possibilidades de ser.

A abordagem privilegia a priorização e acentuação, afirmação efetiva, da perspectiva do vivido do cliente; a priorização de uma efetiva compreensão deste vivido, compreensão não exatamente pelo terapeuta – para quem isto seria impossível, em termos do vivido do cliente – mas pelo próprio cliente. Esta priorização, acentuação e afirmação da perspectiva própria do vivido do cliente implica em uma consonância com a natureza própria do vivido enquanto ser-no-mundo, o seu caráter efetivo como desdobramento de possibilidades de ser nos dizeres de Heidegger, de modo que a priorização, a acentuação e afirmação do

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vivido pressupõem efetivamente a interpretação – fenomenológico-existencial – como desdobramento efetivo das possibilidades de ser deste vivido.

A Psicoterapia Existencial ocupa-se com as mais diversas demandas que uma pessoa possa ter ao chegar ao consultório. Tudo aquilo que é próprio do ser como indivíduo que está no mundo é de interesse do psicoterapeuta existencial. Assim, cabe tanto a busca do auto-conhecimento quanto à queixa de um sofrimento específico daquele cliente, seja adulto, adolescente ou criança.

Esta abordagem privilegia o olhar sobre o cliente como um ser humano que sente e interage com o mundo de uma forma particular, e, que, com o processo psicoterápico, ampliará o leque de possibilidades de ser e estar no mundo, de existir de forma mais plena, a fim de ser uma pessoa mais feliz, e aí tocar o mundo e imprimir sua marca de uma forma melhor.

Nos dias atuais, o Parecer-Ser e o Parecer-Ter já são partes integrantes das relações estabelecidas entre as pessoas no trabalho, educação, família, religião e até mesmo nas relações mais íntimas, enquanto forma de comunicação e relacionamento afetivo.

Para Ser é preciso ocorrer uma construção pessoal como fruto da responsabilidade pessoal na interface com a própria existência, em vista mantê-la e aperfeiçoá-la. É realizar-se de acordo com as condições de seu existir no mundo.

A negação de si no existir no mundo é o Não-Ser, é a infidelidade para consigo, além da ansiedade e frustração com relação às suas realizações. Consubstancia-se na representação de papéis que conduzem à auto-estima, ao poder-ser, ao prestígio e tantos outros predicados da contemporaneidade.

Na psicoterapia existencial enfatizam-se as dimensões históricas e de projeto, além da responsabilidade individual na construção do ser-no-mundo. Visa à mudança e à autonomia pessoal.

Nesse contexto, é oportuno ressaltar a posição de vários autores quanto à finalidade principal da psicoterapia existencial: May, (1987) procura de si mesmo; procura do sentido da existência (FRANKL, 1984); tornar-se mais autêntico na relação consigo próprio e com os outros (BUGENTAL, 1978); facilitar um modo mais autêntico de existir (COHN, 1997); promover o encontro consigo para assumir a sua existência e projetá-la mais livremente no mundo (VILLEGAS, 1989); aumentar a autoconsciência, aceitar a liberdade e ser capaz de usar as suas possibilidades de existir (ERTHAL, 1999).

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É fato que a perspectiva existencial pretende ajudar o cliente a escolher-se e a agir de forma cada vez mais autêntica e responsável. Em qualquer caso resulta de modo claro que o conceito de psicoterapia não é o de uma técnica destinada a “curar” perturbações mentais, mas sim o de uma intervenção psicológica que contribui para o crescimento e para a transformação do cliente como pessoa. Mais especificamente, que promove o encontro da pessoa com a autenticidade da sua existência, para que venha a assumi-la, e assim projetá-la mais livremente no mundo.

Apesar disso, é necessário identificar e registrar a importância do existencial e do valor ontológico da interpretação fenomenológico existencial e as restrições de suas condições de possibilidades, presentes ou não no desenvolvimento da sociedade de cultura ocidental. Hannah Arendt, (1989) aborda essa temática e expressa que a cultura da sociedade contemporânea favorece o comportamento e desprivilegia a ação e, ainda esclarece que:

(...) é o mesmo conformismo, a suposição de que os homens se comportam ao invés de agir, que está na base da moderna ciência econômica (...) que, juntamente com o seu principal instrumento, a estatística, se tornou a ciência social por excelência. (ARENDT, 1989).

Para ela, existem padrões sociais com seus hábitos e expectativas, os quais envolvem os níveis mais vivenciais mais subjetivos, singulares do ser, por onde passa a definição do comportamento das pessoas, de forma original. Desse modo, ganha interesse a observação de que: ”Num mundo de máquinas cada vez mais exatas e perfeitas, ganha sentido cada vez mais valioso a capacidade humana de errar”. (ARENDT,1989).

Coloca-se, então, a questão como algo da consciência. Conforme já foi mencionado: toda consciência é “consciência de alguma coisa”. Assim, a consciência não é uma substância, mas uma atividade constituída por atos (percepção, imaginação, especulação, volição, paixão, dentre outras), com os quais o ser visa algo. Daí nossa possibilidade de errar numa demonstração da natureza humana do Ser.

Segundo Merleau-Ponty (1961), quando o ser humano se depara com algo que se apresenta diante de sua consciência, primeiro o reconhece; e o percebe em total harmonia com sua forma, a partir de sua consciência perceptiva. Após perceber o objeto, esse entra em sua consciência e passa a ser um fenômeno.Trata-se então, para uma compreensão do sentido e concepção do interpretativo e de seu valor no

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âmbito da Psicologia e Psicoterapia Fenomenológico-Existenciais, de mudar o referencial. Ao invés do referencial explicativo de uma interpretação naturalista, a interpretação compreensiva do ser-no-mundo com o desdobramento da compreensão, das possibilidades de ser do ser-no-mundo, é o caminho.

É curioso ressaltar, que, não obstante essa postura de desdobramento da compreensão, o seu desenvolvimento queda-se, em geral, negligenciada e obscurecida pela analogia. Ou seja, o fato de que os seres humanos vivem de interpretar o seu modo de ser-no-mundo, vivem da interpretação fenomenológica existencial de seu vivido, na criação de si e do mundo que lhe diz respeito, e na potencialização de seus devires.

Nesse sentido, os fundamentos da Psicologia Existencial procuram dar o sentido de ser-no-mundo em decorrência de um sentido vital apropriado por um projeto de vida.

É certo que esse sentido mencionado está na percepção do homem, pela sua própria natureza humana, porquanto deve se ter a devida compreensão do que caracteriza a existência individual. O sentido vital está agregado ao “Projeto de Vida” a partir da cotidianidade. Destarte, o que caracteriza a existência individual é o ser que se escolhe a si - mesmo com autenticidade, na constante construção do seu destino, num processo dinâmico de vir-a-ser.

A considerar que o indivíduo é um ser consciente, ele é capaz de fazer escolhas livres e intencionais, ou seja, faz suas escolhas, das quais resulta o sentido da sua existência. Ele faz-se a si próprio escolhendo-se, eis a combinação de realidades, de capacidades, e de possibilidades, além de potencialidades, está “em aberto”, ou melhor, está em projeto.

A maneira citada anteriormente é como o Ser escolhe estar-no-mundo, cuja ocorrência se apresenta através da sua liberdade, porquanto as escolhas podem ser feitas em função do futuro ou em função do passado.

É fato que o individuo ao escolher o futuro, envolve ansiedade, pois está associado ao medo do desconhecido. Se escolher o passado envolve culpabilidade, pois está associada à consciência das possibilidades perdidas, que não voltam mais. Existiu e acabou.

O sentido é o da autenticidade, e esta implica em aceitar a condição humana tal como é vivida e conseguir confrontar-se com a ansiedade e escolher o futuro, na

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redução da culpabilidade existencial, em vista caracterizar a maturidade pessoal e social (CABESTAN, 2005).

Na existência individual, escolher é um processo central e inevitável; e a liberdade de escolher-se envolve responsabilidade pela autoria do seu destino e compromisso com o seu projeto. A liberdade de escolha não só é parte integrante da experiência como também o indivíduo torna-se o resultado de suas escolhas. Ou seja, a identidade e as características do Ser seriam conseqüências das suas próprias escolhas.

Necessário é identificar a continuidade compreensível das vivências; coerência interna do mundo individual, que reflete a escolha originária que o indivíduo fez de si e que aparece em todas as suas realizações significativas. Essa possibilidade aparece através de um projeto existencial porquanto significa a união, o “fio condutor” entre o passado, presente e futuro, quer ao nível dos sentimentos, quer ao nível das realizações pessoais e profissionais, todos estão presentes neste contexto. Os mundos que nos rodeiam, e são diversos, apresentam suas caracterizações próprias e se apropriam da vivência para dar o sentido desejado às coisas e aos fatos.

A expressão caracterizada no e do mundo interno encontra respaldo na simbolização em que as categorias cognitivas representam à experiência na sua falta. O respaldo está também na imaginação, em que não há interação com o meio e se sustenta na recombinação de categorias mentais que se assemelham à experiência e no juízo, que é uma avaliação em relação à experiência. Tudo está associado à intimidade, ao amor, à espontaneidade e à criatividade.

A esse dinamismo se liga um processo de individuação que se opõe ao conformismo com as normas e papéis sociais. Isto possibilita um funcionamento estereotipado, além de inibir a simbolização e a imaginação.

O indivíduo se compromete a dar sentido à sua tarefa, a fim de dar sentido à sua própria existência; enfim, ele precisa dar significação à existência por um sentido vital comprometido com um projeto de vida bem definido e inserido no contexto da pré-sença.

A existência é caracterizada pela individualização da pessoa como ser-no-mundo. Essa personalização, como parte da existência individual, caracteriza-se por três palavras-chave: cuidado, construção e responsabilidade, presentes na vivência do indivíduo. O Ser cuida de sua existência; pois é na procura de conhecer-se e

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compreender-se que brota a descoberta na relação com o outro. A partir desta referência, o sujeito constrói o seu mundo para dar sentido à sua existência.

Dentre os objetivos existenciais da Psicoterapia, é preciso destacar aquele que possibilita ao individuo facilitar uma atitude mais autêntica em relação a si próprio.

Nesses termos, o conceito de autenticidade assume aqui primordial importância. Trata-se de um processo gradual de auto-compreensão com a finalidade de o sujeito vir-a-ser mais verdadeiro e coerente consigo próprio.

No sentido de vir-a-ser, o indivíduo procurará responder às situações com sentimento de domínio e maior percepção de controle pessoal.

Para Cohn (1997), deve ser ofertado ao cliente ajuda para libertar-se das conseqüências perturbadoras da negação e evasão no seu confronto com os dados da existência.

Nesta ação, o sujeito está em busca de uma forma de existir mais autêntica. Portanto, promove uma abertura maior das perspectivas do indivíduo em relação a si mesmo e ao mundo.

Certamente que esta abertura citada acima é desenvolvida por meio de trabalhos que têm como foco a relação do individuo consigo mesmo. Isto pode acontecer pela facilitação da auto-avaliação das suas crenças, valores e aspirações. Com isto terá mais clareza na exploração das suas experiências.

O foco é a autoconsciência, enquanto consciência de si mesmo, em articular a autoconsciência do tempo perdido, que corresponde aquilo que perdeu, que ficou, que desapareceu, que são impossibilidades da necessidade de viver o agora, o momento presente, e não o que já passou ou ainda não chegou.

Proporcionar o máximo de autoconsciência para favorecer um aumento das possibilidades e clarificar como agir no futuro em novas direções passa a ter significado. A abertura de novas possibilidades de vir-a-ser de acordo com o novo projeto de vida é uma questão bem ponderada para o crescimento pessoal.

A pretensão é ajudar o cliente a descobrir o seu poder de auto-criação e a aceitar a liberdade de ser capaz de usar as suas próprias capacidades para existir, conforme nos esclarece. (ERTHAL, 1999)

A autodeterminação passa a ser parte de um poder do indivíduo em vista de decidir o que lhe convém ser e fazer, no exercício da sua liberdade de escolha.

Assim, novas alternativas são construídas, o que facilita o encontro do Ser com o significado da sua existência.

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É promovido o confronto e a re-avaliação da compreensão que o indivíduo tem da vida, dos problemas que tem enfrentado e dos limites impostos ao seu estar-no-mundo.

O foco é a procura de sentido que permite a auto-realização, enquanto tudo o que o indivíduo é capaz de vir-a-ser. É promover o confronto com a superação da ansiedade que emerge dos dados da existência cujo sentido está na inevitabilidade da morte, da liberdade de escolha em situações diversas, da solidão e da falta de sentido para a vida.

Em síntese, trata-se de facilitar ao indivíduo o desenvolvimento de maior autenticidade em relação a si próprio, uma maior abertura das suas perspectivas sobre si e o mundo e, ainda, de ajudar a clarificar como é que poderá agir no futuro de forma mais significativa.

O ponto central é a responsabilidade da liberdade de escolha do indivíduo. A palavra-chave é construção, uma vez que se trata de desafiar o indivíduo a ser o construtor da sua existência.

Pode-se observar em Augras (2004), Feijoo (2002) e outros, que os psicoterapeutas fenomenológico-existenciais perceberam profundamente esta dimensão da realidade existencial; e a importância existencial, regeneradora e propiciadora da criatividade e do crescimento humano; das possibilidades da potencialização da interpretação fenomenológico-existencial, como modalidade natural de interpretação e de potencialização da própria existência. E foram profundamente conseqüentes com relação a esta constatação como perspectiva de filosofia da vida, como princípio de concepção e de método de suas abordagens de psicologia e de psicoterapia.

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3 O SER-NO-MUNDO E O VAZIO EXISTENCIAL

3.1. Ser-no-mundo

De acordo com Feijoo (2002), a cotidianidade é o melhor caminho para conhecer a estrutura do existir, e se chega ao ser a partir da facticidade do mundo, da vida e da sua historicidade. Esclarece, ainda, que o com,no sentido de ser-no-mundo, se atrela ao fenômeno do cuidado, se completando com a ocupação e preocupação. Continua dizendo que “a convivência recíproca como ocupação comum, pode se dar na forma de confiança, deficiência, indiferença e de ligação própria” Feijoo (2002, p.49). Diz ainda que, na tentativa de desvendar o ser, são distinguidos três momentos essenciais: o questionado, o perguntado e o interrogado. Ao procurar o ente tal como ele é, o questionado é o ser significando, enquanto ente, no homem, a sua própria humanidade.

Segundo Calmon (2002, p.14-16), a existência do homem se refere à sua relação de ser-no-mundo. Estar-no-mundo constitui um fato por si só determinante e de desespero. O ser-no-mundo significa uma luta constante do homem consigo mesmo, para não perder a dignidade existencial e características individuais. O princípio apresentado pelo mundo, hoje, em que os valores são determinados pelas normas sociais, há que se ter um discernimento significativo, em meio a conflitos diversos; neste caso, a lucidez será uma aliada imprescindível para uma reflexão constante, a fim de não se tornar presa fácil de um sistema social em que a dignidade humana não é questionada.

O homem é o ser que é, ao contrário de diversos seres que apenas existem, o homem é um ser para si. Nesse sentido, o ser-no-mundo converge diretamente para a angústia do aqui e do agora, e apresenta a questão de que o homem é o único ser que constrói seu ambiente de vida.

Para Feijoo (2002, p.74-86), a existência significa o ser do ente-do-homem, ou pré-sença significa o ente cuja essência é o existir que estabelece uma relação consigo mesmo. Num modo impróprio, essa relação do ser com o ente se dá pela convenção do prazer, do interesse, da profissão. O eu não se dá sem o mundo, sem o outro. É um ser-em que é um ser - com os outros. É um mundo compartilhado, um mundo da presença. Esse ser - com, ser-no-mundo, se funda no fenômeno do cuidado: da preocupação e ocupação. O estar-no-mundo ou ser-no-mundo, que é

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determinação de presença, tem três aspectos: o mundo, que facilita a transformação; o ser do existente, que diz respeito às possibilidades; e o ser-em que implica objetivar-se no mundo, de acordo com o caráter de intencionalidade.

Para Heidegger (1989), conhecer a estrutura do ser na existência indica que tudo está no cotidiano, não é naturalmente de fácil identificação. Todavia é de sua historicidade, e, a partir da sua facticidade do mundo que se pode chegar ao ser. Contudo, é necessário elaborar a estrutura formal pela qual vai proceder ao questionamento do ser. É nesse questionamento que está o desenvolvimento explícito do sentido do ser e não a sua origem. Decorre disso a necessidade de que a questão do ser transpareça e surja o seu sentido. Logo, é preciso, nessa tentativa de desvelar o sentido do ser, distinguir os três momentos essenciais, conforme apresentado anteriormente: o questionado, o perguntado e o interrogado.

Fica claro que, ao questionar, busca-se o sentido; para tanto, é necessário retirar daquilo que se procura para sua direção prévia. Ao procurar o ente, tal como ele é o questionado é o ser dos entes que, em si mesmo, apenas é si próprio. O ato de ser de um ente, apropriado daquilo que o determina enquanto ente, no homem, refere-se a sua humanidade.

Reforça, aqui, a importância da humanidade no contexto da abordagem. A questão será um modo de acesso ao ser, sem identificação do próprio ser, sem perder de vista a importância do questionado e do interrogado. O interrogado é o próprio ente: a dimensão ôntica na qual o ente é outro ente interrogado em seu ser. No questionado reside o perguntado, que é o sentido do ser, o que, em linhas gerais, é o que se intenciona e no qual o questionado atinge sua meta. Questiona-se o ser, interroga-se o ente em seu ser, pergunta-lhe sobre o sentido do ser em seu ente.

A importância está exatamente nos diferentes modos do ser no processo de investigação, o que não se daria por um processo dedutivo, mas por uma compreensão prévia do ser. Compreender o ser, eis uma questão que devemos ponderar. (HEIDEGGER, 1989)

Por outro lado, a existência é o ser do ente do homem. Dasein ou pré-sença é o ente cuja essência é o existir. Passa pelo entendimento de que é o ente que, como ele é, se responsabiliza e assume seu próprio ser. A relação do ser com o ente na pré-sença constitui-se na sua possibilidade mais própria. Todavia, há a impropriedade que se relaciona com a possibilidade da pré-sença fundada no fato

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de ser determinada por si própria que, juntamente com a propriedade, caracterizam a constituição do ente, cujo ser está em jogo. Essa pré-sença existe de modo próprio e impróprio, mesmo que disso não se dê conta. Pelo modo próprio de existir, o ser se relaciona com o ente de forma fluida. No impróprio, a relação se dá pelas convenções do prazer, do interesse, da profissão.

Continua Heidegger (1989) a esclarecer que em sua elaboração sobre o ser-no-mundo: ser - com e ser – próprio, a pré-sença, com seu modo de ser, é o mundo com o seu ser, com suas estruturas ontológicas, dentre elas a de se constituir como um existencial. Na verdade, o “eu” não se dá sem o mundo, sem o outro nem sem sua estrutura de ser. Nessa relação, a presença acaba sendo levada pelo mundo, pois nele se constitui, pois o ser-em é ser - com os outros. Na base desse ser-no-mundo determinado pelo com, o ser-no-mundo é sempre o ser-no-mundo compartilhado com os outros. O mundo da presença é o mundo compartilhado.

Tanto o ser - com quanto o ser-no-mundo se fundam no fenômeno do cuidado caracterizado pela ocupação e preocupação com suas particularidades.

O ser-no-mundo é determinado fundamentalmente pela pré-sença e significa o estar-no-mundo com três aspectos importantes: o mundo que significa o conjunto de objetos que se apresentam utilitariamente para a pré-sença, este se serve do mundo para sua transformação; o ser do existente significa um conjunto de possibilidades que ele poderá utilizar; e o ser-em que implica objetivar-se no mundo, de acordo com as suas necessidades, revela o caráter de intencionalidade. O modo existencial do ser-aí consiste na ocupação e pré-ocupação; a primeira se impõe à presença no mundo da praticidade e dos objetos; e a pré-ocupação, que é outro modo essencial do ser-no-mundo, consiste na atenção ao próximo como tal.

Forghieri (1993), num enfoque fenomenológico do existir humano, denominou as várias características do existir humano de personalidade. Dentre essas características, destaca que a estrutura originária do existir humano é o ser-no-mundo, já que, a essência do homem está em seu ser.

Nessa perspectiva, o ser humano não pode ser explicado por teorias, mas compreendido de acordo com um esclarecimento fenomenológico de seu existir-no-mundo, porquanto abrange tanto a sua relação com outras pessoas e as coisas no geral, como na relação consigo mesmo.

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Por isso mesmo há uma busca de se entender como ocorre a presença do homem no mundo e como ele se realiza a partir de suas próprias possibilidades de escolhas. Assim Heidegger nos diz:

(...) mas ser-no-mundo não quer dizer que o homem se acha no meio da natureza, ao lado de árvores, animais e outros homens... É uma estrutura de realização... O homem está sempre superando os limites entre o dentro e o fora. (HEIDEGGER, 1989).

Ao existir no mundo, o ser humano deve compreender as situações que vivencia. Noutras palavras, ele deve atribuir significados às suas experiências e daí, gradativamente, constituir e conhecer o mundo e a si mesmo. A vivência sempre ocorre acompanhada de humor, com sentimentos agradáveis de sintonia e bem-estar, ou sentimentos desagradáveis de preocupações e contrariedades, com níveis variáveis de intensidade. Nesse sentido, podem ser tão intensos que podem arrebatar o sujeito intensamente, ou tão tênues que se tornam imperceptíveis.

A existência humana é permeada pela sintonia e pela preocupação, que se alternam no decorrer de sua trajetória. Assim, a maneira preocupada de existir caracteriza-se por uma vivência global de desconforto e mal-estar, que varia de um vago sentimento de intranqüilidade a uma profunda sensação de angústia, a qual chega a dominá-lo por completo, e isto está fundamentado no próprio ser-no-mundo, do ser humano. Não há sombras de dúvidas de que a sintonia constitui outra maneira primordial de existir.

É oportuno dizer que tanto a maneira preocupada de existir como a sintonizada, das quais se têm o sentimento e a compreensão pré-reflexivos em sua vida cotidiana imediata, pois, geralmente são submetidas à análise e reflexão para que a partir delas seja possível ter um conhecimento racional. Neste contexto, é percebida a maneira racional de existir; de analisar e refletir a respeito da vivência cotidiana imediata; elaborar sobre ela conceitos, pelos quais seja possível relacioná-los entre si. Assim, chega-se à elaboração de teorias sobre o ser humano e o mundo que o rodeia. Esses conhecimentos aqui traçados e articulados com os adquiridos pelos outros, semelhantes, fornecem substancialmente alguns parâmetros, de certo modo objetivos, que permitem ao ser humano, até certo ponto, entender e explicar as suas vivências passadas e as atuais, bem como planejar suas futuras ações.

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Ocorre que o fluxo do ato de existir está sempre em processo, enriquecido por novas vivências; fornecem elementos para que se ampliem, continuamente, os conhecimentos já existentes. É preciso, constantemente, enriquecer a capacidade de racionalidade com a vivência imediata pré-reflexiva, a fim de que seja possível: “Recobrar o contato com a vida e com o que ela tem de mais espontâneo e originário; voltar à fonte primeira da qual brota não apenas a ciência, mas todas as manifestações da vida“. (MINKOWSKI, 1982, p.9)

Importa que a pessoa, na análise racional da vivência, tenha condições de refletir sobre a vivência. Para isso, é necessário que aceite sua existência, e se considere como parte dela, para que consiga se envolver nela, e se sintonizar com ela. Quando ocorre uma vivência de contrariedade, caso seja intensa, a pessoa tem dificuldades para aceitá-la e sintonizar-se com ela. Sua primeira reação é de estranheza, para, depois, de sua existência se esquivar ou negá-la. Se não conseguir aceitar nem se sintonizar com a vivência, a pessoa não consegue compreendê-la, nem tampouco lhe dar um significado, muito menos integrá-la à sua existência, conseqüentemente, fica confusa e sem saber agir. Sem ver o significado, não vemos coisa alguma.

Segundo Feijoo (2002), os princípios positivistas presentes na ciência clássica mostraram-se insuficientes para abarcar a totalidade da existência humana. Ora, as pessoas, por vezes, sentem-se presas a um contexto clássico da medicina, tratam do corpo, mas preso a um fenômeno ligado ao quadro clínico. Isso preocupa no ponto em que esse quadro, na sua maioria, conduz as pessoas para a doença psicológica, aliada ao distanciamento do saber médico da pessoa. Pois, a postura medicamentosa olha, apenas, o físico.

A filosofia existencial postula a liberdade humana como o ponto de partida para a construção do eu, dá lugar a uma proposta indeterminista e humanista, na qual o homem é visto como totalidade. É essa totalidade que visa encontrar em cada pessoa. Encontrar e encaminhar a pessoa rumo ao encontro consigo mesma, para o encontro do ser-no-mundo com suas possibilidades, na expectativa do desespero das necessidades, é uma conduta persistente na escuta de cada um.

Respeitar as angústias das pessoas e ser seu parceiro na busca da completude da formação de uma liberdade construída nas possibilidades do próprio Ser é outro ponto relevante do encontro com o outro. A escuta das pessoas para a formulação de suas necessidades existenciais é elemento de importância da ação

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destinada à formulação de regras próprias para conduzi-lo ao encontro consigo mesmo.

Por meio dos conceitos de Husserl é possível iniciar um trabalho de observação: o ponto de partida será o fenômeno apresentado pela pessoa. Este caminho mostrará as diversas possibilidades decorrentes, em vista de uma possibilidade de cura, física e mental, mas tal procedimento dependerá tão somente de ele mesmo agarrar-se ao motivo de cura, a fim de gerar uma consciência de vivência presente, em busca do sentido de vida própria, mesmo que apresente um quadro em que seja necessário o tratamento clínico.

Não adoecer psicologicamente é uma questão a considerar. Isso é um recurso apropriado para pesquisar a vivência e seu sentido, o que lhe dá razão, que a origina. Dessa forma, o que se busca é o sentido do fenômeno vivenciado pelo Ser, e não os conceitos e leis que explicam os fatos; procura mostrar, metodologicamente, o caminho das coisas pelas quais ele se mostra.

Aparece o princípio da transparência e não do manifesto nem da aparência. Nesse aspecto, espera-se com a atitude, dar um sentido diferente à vida vivenciada pelas pessoas. Mostrar que há possibilidades de vida para cada uma das pessoas é uma questão relevante para o idealizador desta pesquisa, até porque o foco principal é dar sentido a uma possibilidade de vida futura no aqui-e-agora. Isso depende de cada um, portanto, não lhe cabe ocupar o lugar na vida de alguma pessoa. Elas precisam ter consciência desta máxima, viver a própria vida e buscar a cura pelas suas próprias capacidades de concentrar as energias no poder de cura existente em seu interior.

Viver a própria vida é um ponto importante para alguém articular um encontro consigo mesmo. Não se pensa em generalizações, mas numa busca de sentido e princípios. Para se encontrar consigo mesmo na vivência, e com outras pessoas nas situações novas criadas e estabelecidas pelo conceito de vida do momento, e assim, criar uma nova vivência com um quadro positivado pela vontade de viver para si e para o outro. O padrão passa pela concepção da vida plena de desejo de ser para si mesmo.

A existência deve ser assumida como o “devir”, e a estrutura ontológica da linguagem aparece em três momentos: o referencial dos discursos ou sobre o qual se discorre a comunicação e o anúncio. Isso está bem identificado nas tratativas com os pacientes.

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As formas ontológicas, defendidas por Heidegger (1989), estão também presentes no contexto da verbalização. Busca-se, nessa interação, uma identificação de objetivo focado numa abertura do ser para o mundo. Isso é fundamental para mostrar às pessoas a necessidade de se abrirem para o mundo que as circundam, de sentirem-se parte de um contexto bem-constrito que lhe acena e pode conduzi-lo para a cura do corpo e das emoções. A pré-sença está ligada ao cotidiano como significante para conduzir o ser para a vida, e se caracteriza pela afetividade presente no cotidiano.

3.2 O Vazio Existencial

Faz parte do contexto, em decorrência do próprio sentido de ser-no mundo, da inautenticidade, o Vazio Existencial. A questão está no fato de que a vida, no contexto da vivência e existência, fica vazia do conteúdo da realidade, além de outros existentes, as sensações.

Certamente passa por algo interno às pessoas, que também se liga aos sintomas psicopatológicos. Assim, o que é denominado por sintoma em psicopatologia, poderia ser considerado como possibilidades escolhidas: ao escolher, não se confronta diretamente com a ansiedade associada aos conflitos existenciais, pois, o indivíduo poderia perturbar - se mentalmente.

Dessa forma, os sintomas derivariam de escolhas não autênticas. A não redução da ansiedade associada aos dados da existência apareceria sob a forma de ansiedade neurótica.

Portanto, os sintomas poderiam ser compreendidos como expressões parciais da forma como o indivíduo constrói o seu mundo. Ou, se quiser, o desajustamento é o resultado de uma escolha do próprio indivíduo, que experimenta uma inabilidade para contatar com o mundo e consigo mesmo, desse modo, mantém-se bloqueado num falso projeto de ser; uma forma pouco autêntica de realizar o projeto.

Uma das características do homem contemporâneo, narcísico, é dar mais valor ao presente; é viver o presente, o momento, sem pensar no amanhã. Significa viver para si mesmo. É centrar-se no presente, ignorar o passado sem preocupar-se com o futuro. Investir-se, apenas, no presente. Logo, perde o sentido histórico da continuidade, porquanto se perde de vista valores da tradição e finalidades

Referências

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