Lições do desastre da
Samarco: Vulnerabilidades,
Complexidade e Incertezas
Carlos Machado de Freitas
Carlos Machado de Freitas
CARACTERÍSTICAS DOS
DESASTRES
Desastre
Causas Efeitos
CENÁRIO DE RISCO
ATUAL CENÁRIO DE DESASTRE NOVO CENÁRIO DE RISCO Provável ocorrência de um evento físico Ocorre um evento físico Condições físicas, sociais e sanitárias
Adaptação de Naváez e col., 2009
Transformação do cenário de risco atual em novo cenário após um desastre
Fonte: Adaptação de EIRD, 2009 FORÇAS MOTRIZES GLOBAIS Modelo de desenvolvimento econômico e urbano Mudanças climáticas Governança frágil e baixa capacidade endógena para Redução Risco de Desastres FORÇAS MOTRIZES SUBJACENTES Governança local frágil Precário planejamento urbano Degradação ambiental Comunidades vulneráveis Precárias políticas de Redução Risco de Desastres e proteção social
RISCOS INTENSIVOS - Agudos
Maior concentração de populações vulneráveis e bens econômicos
expostos à ameaças extremas
RISCOS EXTENSIVOS - Crônicos
Dispersos geograficamente e exposição da população e bens econômicos à ameaças de baixa ou
moderada intensividade RISCOS COTIDIANOS
Comunidades e moradias expostas à insegurança alimentar, doenças, criminalidade, acidentes, poluição e
ausência de saneamento e água adequada
POBREZA
Pobreza de recursos econômicos e políticos, exclusão e discriminação com precário acesso a educação e
oportunidades de acesso a bens
IMPACTOS DOS DESASTRES Mortes, doenças, danos ambientais e perdas econômicas Danos as habitações, infraestrutura local e produção e acesso aos bens e serviços RESULTADOS DA POBREZA Impactos de curto e longo prazos sobre os rendimentos, consumo, bem-estar e equidade
PRESSUPOSTOS
Os desastres como fraturas expostas dos sistemas tecnológicos, permitindo vislumbrar um universo opaco e inacessível em “situações normais”, em que as falhas e anormalidades, acidentes e desastres de menor impacto são tornados invisíveis e transformadas em “normalidades” (Brian Wynne)
Desastre da Samarco não constitui
excepcionalidade, mas sim parte dos custos humanos, sociais e ambientais que este tipo de atividade vem provocando no mundo.
Carlos Machado de Freitas
O DESASTRE COMO UM EVENTO COMPLEXO
Resultam da confluência de múltiplos processos (produção, tecnologias, organização social, economia, meio físico-biológico, etc) e em diferentes níveis, do local ao global.
Resultam de múltiplas interações não-lineares, mas que apresentam interdendência, que para simplificar denominamos de sociotécnicas e
O SISTEMA SOCIOTÉCNICO DO
DESASTRE
Carlos Machado de Freitas
ENVOLVE DESDE PROCESSOS GLOBAIS E
LOCAIS ...
Mercado global de minérios (
commodities
), pressões para aumento da produção e redução de custos (acionistas, lucros, dívidas, etc), processos de licenciamento ambiental (flexibilização), precarização do controle público em favor do auto-controle privado, desorganização dos trabalhadores nos locais de trabalho, redução de pessoal e precarização das condições de trabalho ...... ATÉ SUA MATERIALIZAÇÃO NOS
PROCESSOS DE PRODUÇÃO DE RISCOS NOS
LOCAIS DE TRABALHO
... manutenção deficiente das estruturas de drenagem, ausência de monitoramento contínuo e controle durante construção e operação, crescimento das barragens sem adequados procedimentos de segurança, sobrecargas a partir de rejeitos de mineração, falta de regulamentação sobre os critérios de projetos específicos
Centro de Estudos e Pesquisas de Emergências e Desastres em Saúde (CEPEDES) / FIOCRUZ / MS
EVENTO INICIAL
5 novembro de 2015 a Barragem de Rejeitos de Fundão, da mineradora Samarco (Vale e BHP) rompeu liberando ± 34 milhões de m3 de lama, contendo rejeitos de mineração
• intensa destruição que se estenderam por
650 km
• maior desastre mundial em barragens de
mineração no século XX (incertezas, danos humanos e ambientais de longo prazo, difícil gestão...)
Carlos Machado de Freitas
ANTECEDENTES SAMARCO
2008 - primeira Licença de Operação (LO)
2012 - mudanças na estrutura da barragem do Fundão
2013 - início do plano de expansão da empresa e mais modificações no projeto não previstas na estrutura da barragem
2014 - alerta sobre um princípio de ruptura que apareceu após a modificação da estrutura.
ANTECEDENTES SAMARCO
- 2015 - junho Samarco recebeu as Licenças Prévia e de Instalação (LP e LI, respectivamente) para ampliação da barragem de Fundão, que passaria da cota de 920m de altitude para 940m e posterior unificação com a barragem de Germano, que também estava sendo alteada. A LP e a LI foram aprovadas pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado de Minas Gerais
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HIPÓTESES DE CAUSAS
- entupimento do sistema de drenagem de líquido da barragem que impede infiltrações e erosões de dentro para fora da estrutura
- existência de uma falha “princípio de ruptura”, devido ao aparecimento de uma trinca
- aumento no ritmo da deposição de rejeitos. Entre 2013 e 2014, o ritmo de despejos de rejeitos cresceu 83%
- tremor de terra (2.6 de magnitude) que ocorreu a 5 km da barragem do Fundão
RELATÓRIO POLÍCIA FEDERAL
- monitoramento falho e falta de funcionários - lacunas na manutenção da estrutura
- aumento da pressão interna não controlado
- improvisações (falta de inspeções e avaliações periódicas de segurança)
Carlos Machado de Freitas
O SISTEMA SOCIOAMBIENTAL
DO DESASTRE
PROBLEMAS EXTENSIVOS
Ampliam a complexidade e incertezas, pois os sistemas socioambientais não sendo artefatos tecnológicos, não podem ser projetados, manipulados e reduzidos dentro dos limites do conhecimento analítico existente.
Carlos Machado de Freitas
PROBLEMAS EXTENSIVOS
Envolvem:
• grande número e diversidade de espécies de
seres vivos (além da variabilidade genética dentro das espécies), diferenças entre as composições químicas de solos, águas e atmosferas em ambientes específicos.
• processos sociais, econômicos, psicológicos e
culturais e sociais de um modo que pode contribuir para agravar ou atenuar seus impactos.
• escalas locais, regionais e globais
simultaneamente
• para além dos riscos e danos de curto prazo
possuem potencial de longo prazo
• acabam por se sobrepor aos riscos e danos que já
existiam, transformando-os
• exigem decisões sob condições de urgência sem
Administrações municipais e populações dos municípios de Mariana, Barra Longa, Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado (77 km e mais de 10 mil afetados) + 31 municípios em MG e 3 no ES (570 km e mais de 1 milhão de pessoas)
Indios Krenak, pequenos agricultores, pescadores – idosos, mulheres, crianças
Danos intensos ao solo e cobertura vegetal, potencializando intensificação de processos de erosão e assoreamento
Rios Gualaxo do Norte, Carmo e Doce
• Fitoplâncton, perifíton, e macrófitas aquáticas
submersas
• Comunidade planctônica, invertebrados aquáticos,
peixes, anfíbios, répteis e mamíferos que dependem direta e indiretamente das águas dos rios
• Fauna e flora bentônicos
• Óxido de Ferro e Sílica (nos rejeitos), Alumínio,
Arsênio, Cádmio, Cobre, Cromo, Manganês, Níquel, Chumbo e Mercúrio (estes dois últimos com níveis superiores ao limite da legislação de 165 e 1465 vezes)
Carlos Machado de Freitas
Danos diretos à saúde
19 óbitos, concentrados em Mariana, sendo dois terços de trabalhadores terceirizados. Os outros óbitos envolveram crianças entre 5 e 7 anos e idosos entre 60 e 73 anos.
Lesionados e feridos em Mariana (n=231) e Barra Longa (n=305)
Impactos na saúde mental e psicosociais
Aumento expressivo dos casos de doenças respiratórias, doenças de pele e diarreias
Danos indiretos à saúde
Comprometimento dos serviços de provisão de alimentos e água potável; de regulação do clima (destruição de mais de mil hectares de cobertura vegetal) e dos ciclos das águas (contribuindo para enchentes nos períodos chuvosos), contribuindo para alteração ciclos de vetores e hospedeiros de doenças (Dengue, Chikungunya e Zika)
Potencial de aumento de doenças crônicas no futuro
Carlos Machado de Freitas
RECONHECER A
COMPLEXIDADE E
INCERTEZAS
A construção de médias, padronizações e agregações tem sido o modo dominante de se reduzir incertezas e o modo de se gerar conhecimentos.
A constituição de modos hegemônicos de formação de especialistas, construção de conhecimentos e gestão dos riscos que oculta e sufoca as contradições e conflitos tem sido o modo dominante de se produzir e reproduzir as estruturas de poder político, econômico e social vigentes (quem e o que se proteger em detrimento do que e de quem)
Carlos Machado de Freitas
Não podemos separar "o que se deseja conhecer acerca de um determinado problema“ do que se deseja fazer acerca desse mesmo - o que é proposto e realizado no desenvolvimento das políticas e estratégias de redução de riscos. O modo de se perceber a realidade e de se organizar os fatos a ela pertinentes tem implicações, embora nem sempre visíveis, tanto nas avaliações de riscos, como nos aspectos das políticas públicas e de justiça social: quem se deve proteger de determinados riscos, a que custo e deixando de lado que alternativas
OS RISCOS DE DESASTRES EM
BARRAGENS NÃO SE LIMITAM
Carlos Machado de Freitas
RISCOS DE BARRAGENS NO BRASIL
662 barragens e cavas exauridas com barramento distribuídas pelo país - 80% classificadas como sendo de baixo risco de desastres (mesma classificação da barragem de Fundão) e apenas 5% como de alto risco
Carlos Machado de Freitas
Estratégia de solução de Problemas Ambientais
Ciência Pós-Normal Consultoria Profissional Ciência Aplicada Interesses em Jogo nos Processos Decisórios Sistemas de Incertezas Alto Alto Baixo
Gestão de riscos de desastres Identificação de vulnerabilidades e riscos Redução de riscos de desastres Respostas aos desastres Reconstrução
Centro de Estudos e Pesquisas de Emergências e Desastres em Saúde (CEPEDES) / FIOCRUZ / MS
AÇÕES PARA REDUÇÃO DO RISCOS DE DESASTRES
SITE NA INTERNET (dezembro de 2012) http://www.ensp.fiocruz.br/desastres/
PÁGINA NO FACEBOOK (agosto de 2013)
https://www.facebook.com/saudepublica.desastres
Carlos Machado de Freitas
Centro de Estudos e Pesquisas em Emergências e Desastres em Saúde - FIOCRUZ mail: carlosmf@ensp.fiocruz.br site: www.ensp.fiocruz.br/desastres facebook: https://www.facebook.com/saudepublica.desastres