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Comunidade aprendente: a escola como locus de formação e desenvolvimento do professor Learner community: the school as a locus of teacher

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Academic year: 2021

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Comunidade aprendente: a

escola como

locus

de formação e

desenvolvimento do professor

L

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Ana Maria Vellenich

Mestre em Desenvolvimento Humano. Psicóloga da Prefeitura de Lorena, SP - Brasil. anavellenich@hotmail.com

Adriano Marcius Ferreira

Psicólogo. Mestre em Desenvolvimento Humano. Professor do Programa de Especialização em Desen-volvimento do Potencial Humano nas Organizações da Pontifícia Universidade Católica de Campinas,

SP - Brasil. Consultor da Mentor Tecnologia de São José dos Campos, SP - Brasil. adriano.marcius705@gmail.com

Nilsen Aparecida Vieira Marcondes

Mestre em Desenvolvimento Humano. Assistente Social da Prefeitura de São José dos Campos, SP - Brasil. nilsenmarcondes@gmail.com

Maria Aparecida Campos Diniz de Castro

Pedagoga. Pós-Doutora em Psicologia da Educação. Docente do Programa Acadêmico e Interdisciplinar em Desenvolvimento Humano: Formação, Políticas e Práticas Sociais da Universidade de Taubaté, SP - Brasil. nenacdiniz@gmail.com

Resumo: São pacíficas as opiniões a respeito do importante papel que a educação e a escola têm na formação de uma nação. No entanto, no Brasil, há muitos anos, a educação escolar vem enfrentando diferentes problemas afetos diretamente a sua qualidade. Nessa direção, esta revisão crítica de literatura propõe refletir sobre a instituição escolar como sistema de relações, com evidentes características interativas. Os conceitos e ideias de alguns autores estudados nesta reflexão teórica evidenciam a possibilidade de formação docente por meio de ações presentes na própria escola. Conclui-se que a prática reflexiva e as estratégias de ação compartilhadas, se bem conduzidas, transformam a escola numa comunidade aprendente, o que poderá contribuir para a autonomia e o aperfeiçoamento profissional dos agentes envolvidos, bem como possibilitar transformações em nível institucional.

Palavras-chave: Autonomia. Comunidade aprendente. Contexto escolar. Formação. Qualidade.

Abstract: There are peaceful opinions regarding the important role that education and training in school have a nation. However, in Brazil, for many years, school education has been facing different problems directly affects its quality. In this direction, this critical review of the literature proposes a reflection on the educational institution as

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a system of relations, with obvious interactive features. The concepts and ideas of some authors studied this theoretical evidence the possibility of teacher training through shares present at the school. We conclude that reflective practice and strategies for action, if carried out properly, turn the school into a learning community, which may contribute to the professional development and autonomy of the agents involved, as well as possible changes at the institutional level.

Key words: Autonomy. Community Learner. School Context. Training. Quality.

Introdução

Esta revisão crítica de literatura propõe refletir sobre a instituição escolar como sistema de relações, com evidentes características interativas, o que favorece simultaneamente os processos de aprendizagem do aluno, bem como constitui a escola como espaço de formação de professores, por meio de iniciativas que vão além das que caracterizam os centros tradicio-nais de formação. Os conceitos e ideias de alguns autores estudados nesta reflexão teórica evidenciam a possibilidade de formação docente por meio de ações presentes na própria escola.

Verifica-se que as pesquisas sobre a qualidade da educação no Brasil têm demonstrado resultados bastante preocupantes. O termo “qualidade” é usado neste artigo de acordo com Marchelli (2010), considerando não apenas o desenvolvimento intelectual do aluno, mas a apreensão de valo-res, crenças, habilidades e atitudes que o tornem capaz de contribuir para com a qualidade de sua vida e de toda a sociedade.

A vida na escola, tal como ela se configura hoje, supõe saber enfren-tar e resolver situações cada vez mais complexas, para as quais as respostas convencionais se apresentam quase sempre obsoletas ou inaplicáveis. Isso pede a ação eficaz de profissionais, afinados com a realidade e mais bem preparados para superar a crítica vazia, a queixa contundente, a culpa e o amadorismo diante da complexidade das situações vividas no contexto escolar. Entende-se que assumir um modelo de prática coletiva, reflexiva e questionadora poderia contribuir para novos direcionamentos, e isso pode vir a acontecer no próprio local de trabalho.

Com relação à legislação educacional, no artigo 206 da Constituição Federal de 1988, verifica-se um estímulo à descentralização e à

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ção da autonomia pela escola quando estabelece como princípios básicos o “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas” e a “gestão democráti-ca do ensino público.” (BRASIL, 1988) Acredita-se que é o exercício diário da reflexão como uma prática metódica e de rotina, fruto do pluralismo de ideias e de uma gestão democrática próprias da comunidade aprendente, o único capaz de promover e desenvolver a autonomia da unidade escolar, isso porque a autonomia é uma conquista e ocorre na medida em que os educadores da instituição escolar se percebem em condições de adminis-trar todas as questões advindas do dia a dia escolar, passando pelas peda-gógicas, afetivas, econômicas, sociais, culturais etc.

A qualidade da Educação no Brasil

A escola emerge como uma das instituições fundamentais para de-sencadear processos de desenvolvimento das pessoas, atuando como pro-pulsora ou inibidora do seu crescimento físico, intelectual, emocional e social (DESSEN; POLONIA, 2007). Contudo, o que se tem visto é que a educação escolar não tem redundado, de maneira geral, como propulsora do desenvolvimento humano, ao contrário, o que se verifica é a emergência de um cenário desfavorável a este desenvolvimento no país. Patto (2008) pontua que sucessivos levantamentos mostram uma persistência desse esta-do de coisas que parecem imunes às várias e diversas tentativas de reversão. As teorias explicativas para tais estatísticas referem-se, quase sem-pre, a fatores de ordem interna, vinculados ao sistema educacional, nos quais se incluem baixos salários e má formação de professores, excesso de alunos em sala de aula, inadequação curricular, entre outros; e fatores de ordem externa ligados à pauperização da população escolar ou demais con-dições adversas relativas ao processo de ensino-aprendizagem, incluindo-se a inexistência de um ambiente familiar favorável à educação do aluno.

Patto (2008) considera que o fracasso da escola pública é resultado de um sistema educacional que tem dificuldades em buscar a realização de seus próprios objetivos, para os quais cria até mesmo certas dificulda-des. Logo, a estrutura e a organização escolar poderiam se constituir num óbice a uma prática favorável à superação das desigualdades culturais, pre-dispondo ao insucesso escolar e a suas consequências. Perrenoud (1996)

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também considera o fracasso e as desigualdades que permeiam as práti-cas pedagógipráti-cas como realidades construídas pelo próprio sistema escolar, especialmente representado pelos mecanismos inadequados de superação adotados pela escola e seus agentes.

Apesar da existência de diferentes pesquisas e teorias explicativas, não se contesta o fato de que tal situação tem trazido consequências ex-tremamente danosas a todos os envolvidos e à sociedade brasileira como um todo, na medida em que interfere diretamente no desenvolvimento dos alunos, desencadeando legítimas barreiras ao processo de apropriação dos conteúdos pedagógicos e das competências básicas necessárias para a inserção social e o exercício da cidadania.

A formação do professor

Gatti (2009, p. 90) destaca o quanto o professor é importante no processo de mediação para o desenvolvimento da educação escolar:

A educação escolar pressupõe uma atuação de um conjunto ge-racional com outro mais jovem, ou, com menor domínio de conhecimentos ou práticas, na direção de uma formação social, moral, cognitiva, afetiva, num determinado contexto histórico. Presencialmente ou não, há pessoas participando e dando sen-tido a esse processo. Quando se trata de educação escolar são os professores que propiciam essa intermediação.

Assim, o docente tem um papel fundamental na melhoria da quali-dade da educação escolar. Nesse sentido, há muito se discute o processo de formação do professor. Freitas (2007) apresenta um panorama das políticas de formação de docentes mais recentes no Brasil e descreve as lutas por ide-ais sociide-ais que, apesar de terem se intensificado nos últimos 30 anos, ainda se constituem como utópicos. Em seu estudo, ele comenta sobre a falta de prioridade de investimentos nos centros de formação e destaca, ainda, a baixa qualidade dos cursos de Pedagogia e licenciaturas, principalmente a partir da abertura de inúmeros cursos, em geral realizados na modalidade a distância.

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Diante disso, questiona-se: se a qualidade da formação dos docentes (inicial e continuada) está intrinsecamente relacionada à qualidade do en-sino que se oferece nas escolas, quando se terá uma educação de qualidade? Pelos estudos citados neste artigo, a melhoria na qualidade da formação docente no país depende tanto de fatores sociais, políticos, culturais, técni-cos quanto de tantas outras variáveis, que parece estar muito longe de um consenso e, portanto, de sua “executabilidade”. Assim sendo, considerando o conceito de qualidade apresentado, o que pensar sobre a qualidade da educação no Brasil? Estará sujeita a continuar com os resultados que tem apresentado?

Ao se refletir sobre os aspectos históricos das políticas de forma-ção, identifica-se que, para cada época, há uma tendência pedagógica que suporta as orientações políticas. Cada período da história enfatizou um aspecto da educação, qual seja: o método, o ensino, a relação entre sujeito e objeto etc. Atualmente, um movimento bastante forte é o de conceber a educação para além da transmissão do conhecimento, incluindo também a própria produção desse conhecimento, ou seja, enfatiza a atuação do docente como pesquisador diante do trabalho prático.

Em relação a essa ideia, André (1994) destaca os trabalhos de Zeichner (1993), que valoriza a colaboração da universidade com os pro-fissionais da escola para desenvolver investigações sobre as práticas. Há também um destaque de André (1994) referente aos estudos de Stenhouse (1984) e Elliot (1986) que, no contexto das reformas curriculares, con-sideram os professores como investigadores de sua prática, propondo a investigação-ação aliada à reflexão para melhorar as condições da prática.

Várias concepções estão sendo discutidas a respeito da relação ensi-no-pesquisa e, embora ainda não se tenha um consenso, destaca-se a pro-posta que coloca o docente como investigador de sua própria prática peda-gógica, denominada prática reflexiva: “Esta prática tem suas bases teóricas fundamentadas em Dewey que propõe o ensino reflexivo.” (MACIEL; SHIGUNOV NETO, 2009, p. 156)

Em consonância com essa ideia, o que se aponta neste estudo é que a própria escola inicie um movimento proativo, de “dentro para fora”, propondo-se a investigar a si mesma, tornando-se um centro de formação. Como bem mostram estudos recentes, é urgente a necessidade de movi-mentação interna, de revisão da própria função e das formas concebidas

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de gestão escolar. A prática reflexiva pode ser uma alavanca para a trans-formação em favor de pedagogias diferenciadas, atribuindo aos professores um papel ativo no próprio processo de desenvolvimento profissional, o que poderá acontecer no âmbito dos espaços coletivos da escola.

A escola como centro de formação e desenvolvimento

profissional

Zabalza (2009) ressalta a escola como um importante instrumen-to de mobilidade social que, no entaninstrumen-to, só se instrumen-torna eficaz quando há qualidade nas oportunidades de aprendizagem que são oferecidas aos alunos. O autor afirma ainda que essa qualidade está relacionada a um grande número de variáveis, que vão além, inclusive, da própria escola, incluindo nesse processo as políticas públicas, a família, a comunidade, a cultura e toda a sociedade. Todavia, não se pode esquecer que, apesar dessas variáveis externas, a própria escola possui características intrínse-cas que influenciam de maneira extremamente substancial a qualidade educacional. A organização que a escola adota, a cultura que molda seu funcionamento, as decisões que se toma e seu “clima social” constituem, de fato, uma influência educacional sobre todos os envolvidos. (COLL et al., 2004)

É justamente por esses fatores de influência, ou seja, as “idiossincra-sias” das escolas, que se entende que ela é o centro de formação de educa-dores por excelência. Os cursos ministrados fora do ambiente escolar são desprovidos de toda a riqueza que a realidade escolar apresenta. O que há de comum entre professores de uma mesma disciplina, mas de diferentes escolas, que são reunidos em grandes grupos para serem aperfeiçoados em suas práticas pedagógicas? O simples fato de que lecionam a mesma disci-plina não significa que tenham as mesmas dificuldades e que enfrentem os mesmos problemas. (AZANHA, 1998)

Na verdade, os esforços de aperfeiçoamento do magistério usual-mente repetem e eventualusual-mente agravam os equívocos já presentes na for-mação acadêmica, ignorando que a entidade que deve ser visada é a escola e não o professor isolado. O aperfeiçoamento do professor deveria ocorrer no espaço institucional no qual atua, já que, na maioria das vezes, as

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di-A r t i g o s

ficuldades de seu trabalho de ensino eventualmente serão metodológicas ou didáticas. Não fosse assim, não se compreenderia que o bom professor em uma escola seja mau numa outra ou vice-versa. No entanto, isso é fre-quente. (op.cit.)

A escola, particularmente a escola pública, é uma instituição so-cial muito específica, com uma tarefa de ensino eminentemente soso-cial e complexa e que, por isso mesmo, exige um esforço coletivo para enfrentar com êxito as suas dificuldades. Isso porque essas dificuldades são, antes de tudo, institucionais e não individuais, de cada professor. Mas, de fato, o que se tem é um conjunto de professores preparados, bem ou mal, para um desempenho individualizado e que, por isso, resistem à ideia de que os próprios objetivos escolares são socioculturais e que até mesmo o êxito no ensino de uma disciplina isolada deve ser aferido em termos da função social da escola. (op.cit.)

A complexidade dos problemas que a realidade nos impõe tem exi-gido das escolas posicionamentos para os quais ela normalmente não se en-contra pronta. Tem exigido que a mesma apresente soluções cada vez mais rápidas e assertivas para os problemas complexos que surgem no dia a dia. Esse processo exige cooperação, olhares multidimensionais e uma atitude de investigação na ação e pela ação. Todas essas questões levam a apontar a escola como o único local capaz de atender a todas as necessidades forma-tivas dos docentes, sendo elas pedagógicas, afeforma-tivas, institucionais, sociais, políticas, culturais etc.

A escola pode se tornar um centro prático de formação continuada, com características diferenciadas dos centros tradicionais e que vai além de uma formação repetidora. “Somente por meio de contextos sociais de aprendizagem intimamente conectados a uma prática é que a dimensão tácita do conhecimento pode ser incorporada.” (SOUZA-SILVA; DAVEL, 2007, p. 54) O que se deve buscar com a formação continuada é a modifi-cação da própria prática docente, questão que, como visto anteriormente, não vem sendo alcançada pelos centros tradicionais de formação, como os Institutos de Ensino Superior.

Assim como é função da escola realizar bem a sua tarefa de tornar significativo o aprendizado de seus alunos, torna-se relevante assumir o seu papel enquanto unidade social, na qual os agrupamentos humanos são constituídos de pessoas com diferentes histórias de vida, que mantêm

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certo nível de interações e intencionalidade nos seus atos. Nesse sentido, concorda-se com Alarcão (2001, p. 11) sobre o fato de que:

A escola é por excelência um centro de formação: é organis-mo vivo, dinâmico, onde se cria contextos de aprendizagem, ambientes que favorecem o cultivo de atitudes saudáveis, onde podem desabrochar capacidades e competências que facilitam o convívio em sociedade, onde o exercício da prática é pleno, favorecendo que professores se tornem responsáveis em sua au-tonomia, críticos em seu pensamento, exigentes em sua profis-sionalidade coletivamente assumida.

Cada escola deve conceber-se como local, tempo e contexto educa-tivo. As pessoas são as peças centrais da escola e os professores estão em primeiro plano. Entende-se que, na práxis, sujeito e realidade dialogam. Há muitas e mútuas relações entre sujeitos e situações no contexto escolar. Tais sujeitos, membros ativos da cultura escolar, adquirem a capacidade de articular o aparato teórico-prático, a capacidade de mobilizá-lo diante da situação presente a favor de mudanças, implicando até mesmo a capa-cidade de organização de novos saberes, cedendo espaço para a articulação dialética do novo e do necessário.

Gadotti (1995, p. 7) sustenta que a instituição escolar não deve ape-nas reproduzir a cultura ou se limitar a executar planos elaborados fora dela; deve, sim, construir e elaborar a cultura, pois a escola deve ser um “[…] local privilegiado de inovação e experimentação político-pedagógi-ca.” Consultando Libâneo (2009, p. 10), ele assim complementa:

A modalidade mais rica e eficaz de formação docente conti-nuada ocorre pela atividade conjunta dos professores na dis-cussão e elaboração das atividades orientadoras de ensino. É assim porque a formação continuada passa a ser entendida como um modo habitual de funcionamento do cotidiano da escola, um modo de ser e de existir da escola. Para realiza-ção das atividades pedagógicas os professores realizam ações compartilhadas que exigem troca de significados, possibili-tando ampliar o conhecimento da realidade. Assim o grupo de formação constitui-se ao desenvolver a ação pedagógica.

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É essa constituição do grupo que possibilita o movimento de formação do professor.

Para Gatti (2009), o desenvolvimento profissional do docente en-volve, além das competências operativas e técnicas, a aquisição de experi-ências oriundas da própria prática docente. Um saber que mobiliza o agir e o pensar, que orienta as intenções e os valores, que permite um olhar mais apurado sobre o outro, que compreende as diferenças, que engloba as dimensões cognitivas sociais e afetivas da prática docente. Experiências como essas geralmente são deixadas de lado na formação justamente por-que ocorrem em outros ambientes por-que não a escola.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96) prescreve que a escola deve ter como objetivo o exercício de sua autonomia, cabendo a ela buscar condições para qualificar seus profissionais. Dessa forma, a prescrição legal abriu caminhos para que a organização da escola promova a formação continuada de seus professores em situação de trabalho. Essa modalidade de qualificação, que não retira o professor de seu locus profis-sional, permite que a escola esteja em permanente avaliação e formação. (BRASIL, 1996)

Essa é a escola que Alarcão (2003) denomina reflexiva e qualifican-te, na qual professores ensinam e aprendem. Existem diferentes denomi-nações apontadas pela literatura científica para essa escola: comunidade de prática, comunidade de aprendizagem, comunidade aprendente, organiza-ções aprendentes, aprendizagem colaborativa e comunidade socioprática.

Independentemente de centros, a formação que pode e deve aconte-cer na escola possibilita, de forma privilegiada, a reflexão da sua realidade e, assim, a conquista de resultados de melhor qualidade, mais pertinentes e condizentes com essa realidade. “Em um processo de reciprocidade, o professor se junto com os outros professores e a escola qualifica-se, reconceitualiza-se e reorganiza-se.” (ALARCÃO, 2001, p. 78) Portanto, a escola emerge como o locus privilegiado de formação continuada dos educadores.

Nóvoa (1992) observa que após o foco para a inovação educacional ter oscilado entre o sistema educativo (nível macro) e a sala de aula (nível micro), atualmente as inovações podem implantar-se e desenvolver-se no contexto da organização escolar. Em última instância, são as pessoas que aprendem,

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que se apropriam, que constroem e (re)constroem saberes que orientam as práticas. No entanto, este processo pressupõe uma dimensão coletiva e orga-nizada, podendo vir a constituir as comunidades aprendentes.

As comunidades aprendentes se caracterizam e se diferenciam das ações tradicionais de formação por alguns aspectos específicos: são forma-das voluntariamente a partir do engajamento de um grupo de pessoas que tem necessidades parecidas; são informais e desenvolvem a aprendizagem do grupo por meio da prática contextualizada dos problemas cotidianos. Ocorrem por meio de um processo reflexivo, descrito por Souza-Silva e Davel (2007), pelo qual se dá o confronto de uma situação atual com uma situação já vivida e que ajuda os indivíduos a desvendarem os problemas atuais, encontrando soluções para as necessidades que se apresentam.

Como proposto por Grigorowitschs (2008), são pessoas que refletem sobre sua realidade, suas reais funções, sobre a organização, seu funcio-namento, sobre as relações mantidas com outras instituições, a estrutura social, questionam as relações e as comunicações interpessoais estabeleci-das no meio escolar. Elas ressignificam e reconfiguram sua subjetividade e, assim, a produção de novos sentidos sobre a vivência de ser educador, desencadeando possíveis mudanças na prática escolar - são verdadeiras co-munidades sociopráticas.

O termo socioprático tem a ver com um ambiente em que há mais de uma pessoa e que elas estão ligadas entre si por uma prática. Souza-Silva e Davel (2007, p. 61) destacam que as pessoas participantes de contextos sociopráticos, quando se propõem a dialogar e a negociar significados, di-namizam seus processos individuais de reflexão e contribuem com a refle-xão dos outros, o que amplifica “[…] a reflexividade e, consequentemente, a aprendizagem e a competência social do grupo.”

Azanha (1998) propõe que, a partir da elaboração do projeto peda-gógico da escola, é possível “experienciar” novas práticas, que podem se constituir em fonte de apoio para que a escola se torne uma comunidade aprendente. Sob essa perspectiva, os professores precisam fazer parte de uma ampla comunidade de aprendizagem. Assim sendo, é possível perce-ber o esforço para integração do grupo escolar em torno de um propósito comum a partir da compatibilização dos valores resultantes da tomada de consciência do universo de práticas discursivas e não discursivas e da

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identificação das práticas e condutas vigentes na escola com os valores de uma educação democrática.

Todavia, o que fazer para que todos na escola se envolvam em torno da construção do projeto pedagógico? Mudanças em sua compre-ensão não ocorrem meramente com a apresentação de uma nova ideia ou por meio de um convite à participação. Com relação a isso, Nóvoa (1992, p. 7) propõe criar “[…] as condições para uma aprendizagem mútua en-tre os atores educativos, através do diálogo e da tomada de consciência individual e coletiva.”

A escola deve ser vista pelos educadores como espaço e oportunidade de compartilhamento de ideias, de práticas socioculturais e institucionais, de valores, de atitudes e modos de agir. Cabe considerar, no entanto, que as mudanças não ocorrem facilmente e que a resistência é particularmente forte entre aqueles que se consideram satisfeitos com as formas como estão acostumados a fazer as coisas.

Para se instalar uma comunidade de prática, especialmente no con-texto escolar, Alarcão (2001, p. 2) afirma que “[…] é preciso refletir sobre a vida que lá se vive em uma atitude de diálogo com os problemas e as frustrações, os sucessos e os fracassos, mas também em diálogo com o pensamento, o pensamento próprio e o dos outros.”

Comunidade aprendente: autonomia e qualidade na

Educação

Descentralização e busca de autonomia por parte da escola é defen-dida pela legislação educacional, conforme já citado neste estudo. Assim, exercitar a reflexão diária de forma rotineira e metódica no ambiente edu-cacional apresenta-se como possibilidade de promoção, desenvolvimento e conquista dessa autonomia. Essa percepção é desenvolvida pelo desejo de se pensar e repensar a prática, bem como todas as questões referentes à escola. Alarcão (2001, p. 78) reforça essa ideia quando afirma que a or-ganização escolar é revelada quando há reflexão sobre seus próprios con-flitos, bem como quando são manifestadas “[…] as relações de poder nela existentes, o que conduz a um redimensionamento.” A autonomia escolar é

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promovida na medida em que os educadores se sentem libertos do trabalho prescrito para

[…] construir suas próprias iniciativas, em função dos alunos, do campo, do meio ambiente, das parcerias e cooperações pos-síveis, dos recursos e das limitações próprias do estabelecimen-to, dos obstáculos encontrados ou previsíveis. (PERRENOUD, 1999, p. 11)

Portanto, uma escola que gera conhecimento sobre si mesma, con-siderando a sua própria realidade e conduzindo-se de maneira reflexiva e aprendente visando sua autonomia, é capaz de desenvolver-se e conquistar maior eficácia nas ações realizadas. Essa é a proposta aqui defendida: de que tal escola é capaz de oferecer uma educação de qualidade, aqui con-siderando os aportes pedagógicos, comportamentais, culturais, políticos e sociais. Na visão de Gadotti (1994, p. 8),

A questão essencial da nossa escola hoje se refere à sua quali-dade e esta está diretamente relacionada com os pequenos pro-jetos das próprias escolas que são muito mais eficazes na con-quista dessa qualidade do que grandes projetos, mas anônimos, distantes do dia-a-dia das escolas. Isso porque: 1º) só as escolas conhecem de perto a comunidade e seus projetos podem dar respostas concretas a problemas concretos de cada uma delas; 2º) assim sendo, podem respeitar as peculiaridades étnicas, raciais e culturais de cada região; 3º) tem menos gastos com burocracia; 4º) a própria comunidade pode avaliar de perto os resultados.

Entende-se que a questão da mudança na qualidade da educação está intrinsecamente relacionada às formas de gestão da escola, à sua organização, às suas características próprias, à sua cultura e aos sistemas de ensino. Também se acredita que utilizar estratégias de integração gera possibilidades de a escola se tornar um centro de formação, desencade-ando o surgimento de uma comunidade aprendente. Parte-se do pres-suposto de que isso é vital para estimular a reflexão e o debate e extrair

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algumas conclusões relativas à mudança em educação, buscando superar os obstáculos políticos e técnicos existentes em prol da melhoria da qua-lidade da educação.

Cresce a reivindicação pela autonomia, contra a uniformização; cresce o desejo de afirmação da singularidade de cada região e local, de cada língua, de cada dialeto. Apesar dos meios de comunicação de massa, existe hoje uma forte tendência de afirmação regional e de valorização das culturas locais (op.cit.). A descentralização, as escolas como comunidades aprendentes e a autonomia são recursos indispensáveis para promover a qualidade na educação do Brasil.

É com base nas ideias expostas que os redatores deste artigo se situ-am enquanto participantes de grupos de pesquisa e reconhecem a necessi-dade de mudanças no trabalho escolar. Por um lado, acredita-se na força do professor como principal elemento desencadeador das reformas educa-cionais; por outro, tem-se a certeza de que a escola, enquanto grupo insti-tucional organizado, constitui local privilegiado para a mudança ocorrer.

Para dar conta de missão tão importante e complexa, a escola preci-sa que seus professores e demais colaboradores sejam capazes de reinterpre-tar seus papeis e ampliar sua formação, colocando-se a serviço dos ideais de uma educação democrática.

Tais questões são intrigantes e deram sentido a este estudo. Insiste-se na importância relacional no contexto escolar diante da necessidade de se reconhecer valores sociais nele presentes, trocar dados da própria experiência, refletir sobre limites e possibilidades, e buscar corrigir possí-veis distorções existentes. Dessa forma, acredita-se ser possível assumir um modelo de escola – participativa e reflexiva –, que se interpreta a partir da sua experiência e, com isso, aprende e se desenvolve.

Considerações finais

Não se pode esperar que os centros tradicionais de formação do-cente sejam os únicos responsáveis pelas mudanças necessárias à educação brasileira, tampouco esperar pelo oferecimento de formações de quali-dade. As mudanças aqui sugeridas exigem um esforço muito maior, que envolve cada escola e cada professor, para que cada um se mobilize na

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direção da construção de sua própria profissionalidade, para o desenvolvi-mento de habilidades e competências que correspondam às necessidades da sociedade atual, e isso é possível transformando as escolas em centros de formação docente.

A formação não tem um caráter cumulativo; não se constrói por acu-mulação de conhecimentos, mas sim por meio da reflexão crítica sobre a própria experiência e em interação com diferentes elementos da comunidade escolar e com diversos segmentos da sociedade. Nada melhor do que perce-ber a escola como esse espaço de diálogo, lugar de trocas para sedimentar saberes que emergem dos diferentes momentos da prática profissional.

O espaço coletivo da escola pode, sem dúvida, servir de base para viver-se essa realidade. As memórias e histórias partilhadas pelos membros das comunidades escolares influenciarão a capacidade de aprender dos respectivos grupos humanos que lá convivem. Fica aqui o estímulo para novos estudos na área.

Considera-se, portanto, que a prática reflexiva e as estratégias de ação compartilhadas, se bem conduzidas, transformam a escola numa co-munidade aprendente, o que poderá contribuir para a autonomia e o aper-feiçoamento profissional dos agentes envolvidos, possibilitando transfor-mações em nível institucional, melhorando assim a qualidade da educação e a mobilização de recursos em prol do desenvolvimento humano.

Encerram-se essas observações com as palavras de Gadotti (1994, p. 10), que resume o sentimento a respeito da necessidade de um movimento proativo e reflexivo, iniciado no interior das escolas, como comunidades aprendentes a partir da formação continuada:

Houve uma época na qual eu pensava que as pequenas mu-danças impediam a realização de uma grande mudança. Por isso, no meu entender, elas deveriam ser evitadas e todo o in-vestimento deveria ser feito numa mudança radical e ampla. Hoje, minha certeza é outra: penso que, no dia-a-dia, mudando passo a passo, com pequenas mudanças numa certa direção, podemos operar a grande mudança, a qual poderá acontecer como resultado de um esforço contínuo, solidário e paciente. E o mais importante: isso pode ser feito já. Não é preciso mais esperar para mudar.

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Referências

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Recebido em 1º out. 2016 / Aprovado em 6 dez. 2016

Para referenciar este texto

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Referências

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