Valter Aparecido Silva Junior
Soluções do Problema de Liouville-Gelfand via
Grupos de Lie
CAMPINAS 2015
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica Ana Regina Machado - CRB 8/5467
Silva Junior, Valter Aparecido,
Si38s SilSoluções do problema de Liouville-Gelfand via grupos de Lie / Valter Aparecido Silva Junior. – Campinas, SP : [s.n.], 2015.
SilOrientador: Yuri Dimitrov Bozhkov.
SilDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica.
Sil1. Lie, Simetrias de. 2. Simetrias variacionais. 3. Liouville-Gelfand, Problema de. I. Bozhkov, Yuri Dimitrov,1962-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica. III. Título.
Informações para Biblioteca Digital
Título em outro idioma: Solutions of Liouville-Gelfand problem via Lie groups Palavras-chave em inglês:
Lie symmetries
Variational symmetries Liouville-Gelfand problem
Área de concentração: Matemática Aplicada Titulação: Mestre em Matemática Aplicada Banca examinadora:
Yuri Dimitrov Bozhkov [Orientador] Stylianos Dimas
Rodney Carlos Bassanezi
Data de defesa: 12-03-2015
Programa de Pós-Graduação: Matemática Aplicada
Abstract
In this dissertation, we shall obtain the exact solutions of the Liouville-Gelfand Problem (in one and in two dimensions) via Lie groups of symmetries.
Keywords: Lie point symmetries, variational symmetries, Liouville-Gelfand Problem.
Resumo
Nesta dissertação, obteremos as soluções exatas do Problema de Liouville-Gelfand (em uma e em duas dimensões) via grupos de Lie de simetrias.
Sumário
1 Preliminares 1
1.1 Primeiras Definições . . . 1
1.2 Gerador de Simetrias . . . 3
1.3 Coordenadas Canônicas . . . 5
1.4 Condição de Simetria Linearizada . . . 7
1.5 Equações Determinantes . . . 9 1.6 Redução de Ordem . . . 12 1.6.1 Redução Simples . . . 12 1.6.2 Redução Dupla . . . 16 2 Grupo-Análise 22 2.1 O Problema de Liouville-Gelfand . . . 22 2.2 Simetrias de Lie . . . 25 2.3 Simetrias Variacionais . . . 28
3 Soluções Exatas do Problema 1D 30 3.1 Primeira Resolução . . . 30
3.2 Segunda Resolução . . . 33
3.3 Terceira Resolução . . . 34
4 Soluções Exatas do Problema 2D 35 4.1 Primeira Resolução . . . 35
4.2 Segunda Resolução . . . 37
4.3 Terceira Resolução . . . 38
Referências 39 A ℒ 41 A.1 O Espaço Vetorial ℒ . . . 41
A.2 A Álgebra de Lie ℒ . . . 43
B Equação de Euler-Lagrange 49
D Equação de Liouville 53
D.1 Introdução . . . 53 D.2 Algumas Generalizações . . . 55 D.3 Soluções Invariantes . . . 57
Dissertação financiada pela Capes, Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Su-perior, através do Programa de Demanda Social (DS).1
Capítulo 1
Preliminares
Existem várias técnicas engenhosas para obter soluções exatas de uma EDO. Surpreendente-mente, elas são, em sua maioria, casos especiais de métodos mais gerais baseados na invariância da equação sob grupos de simetrias. Nesta dissertação, utilizaremos alguns desses métodos para resolver o Problema de Liouville-Gelfand.
Determinar as simetrias de uma EDO pode ser uma tarefa bastante complicada. Porém, na segunda metade do século XIX, Sophus Lie (1842-1899), um brilhante matemático norueguês, percebeu que simetrias particulares, identificadas por seus geradores infinitesimais, podiam ser calculadas sistematicamente a partir de um algoritmo. Este capítulo, longe de exaustivo, trará a teoria estritamente necessária para o desenvolvimento dos capítulos seguintes.1
1.1
Primeiras Definições
Consideremos, por simplicidade, EDO’s do tipo
𝑦(𝑛) = 𝜔(𝑥, 𝑦, 𝑦′, . . . , 𝑦(𝑛−1)) (1.1.1)
e assumamos 𝜔 uma função suave2.
Definição 1.1.1. Uma transformação inversível3 Γ : (𝑥, 𝑦) → (^𝑥(𝑥, 𝑦), ^𝑦(𝑥, 𝑦)) é uma simetria de
(1.1.1) se deixar a EDO invariante,
[︁
^
𝑦(𝑛)= 𝜔(^𝑥, ^𝑦, ^𝑦′, . . . , ^𝑦(𝑛−1))]︁⃒⃒
⃒(1.1.1). (1.1.2)
Cada derivada ^𝑦(𝑘) acima é calculada recursivamente,
1Para uma tratamento mais aprofundado do tema, sugerimos [BK89], [Hyd00], [Olv86] e [Ste89].
2Uma função é suave sempre que suas derivadas parciais de qualquer ordem existirem e forem contínuas. 3Dadas ^𝑥 e ^𝑦 duas funções suaves, uma transformação (^𝑥, ^𝑦) = (^𝑥(𝑥, 𝑦), ^𝑦(𝑥, 𝑦)) é inversível no plano se seu
^ 𝑦(𝑘)= 𝑑^𝑦 (𝑘−1) 𝑑^𝑥 = 𝐷𝑥𝑦^(𝑘−1) 𝐷𝑥𝑥^ , com ^𝑦(0) ≡ ^𝑦, (1.1.3)
onde 𝐷𝑥, o operador derivada total em 𝑥, é dado por 𝐷𝑥 = 𝜕𝑥+ 𝑦′𝜕𝑦+ 𝑦′′𝜕𝑦′ + · · ·.
Exemplo 1.1.2. Para EDO’s de primeira ordem, a condição de simetria (1.1.2) é
^ 𝑦𝑥+ 𝜔(𝑥, 𝑦)^𝑦𝑦 ^ 𝑥𝑥+ 𝜔(𝑥, 𝑦)^𝑥𝑦 = 𝜔(^𝑥, ^𝑦). (1.1.4) Claramente, a reflexão (^𝑥, ^𝑦) = (𝑥, −𝑦) (1.1.5) é uma simetria de 𝑦′ = 0. (1.1.6)
Qualquer simetria deve necessariamente levar solução em solução. Mais formalmente, a condi-ção de simetria (1.1.2) exige que o conjunto das curvas-soluções de uma EDO no plano (𝑥, 𝑦) seja idêntico ao seu conjunto-imagem no plano (^𝑥, ^𝑦).
Figura 1.1: Algumas soluções de 𝑦′ = 0.
No exemplo anterior, a solução geral de (1.1.6) é 𝑦 = 𝑐, que são retas horizontais preenchendo o plano (𝑥, 𝑦). Além da reflexão (1.1.5), várias outras simetrias são admitidas por (1.1.6), algumas bastante óbvias a partir da Figura 1.1. Dentre elas, as translações
Definição 1.1.3. Seja 𝐺 um conjunto de simetrias Γ𝜖 : (𝑥, 𝑦) → (^𝑥(𝑥, 𝑦; 𝜖), ^𝑦(𝑥, 𝑦; 𝜖)) dependentes
de 𝜖, um parâmetro real. Denotemos por ∘ a operação de composição. Se existir uma vizinhança 𝑉0 de zero tal que, para todo 𝜖 ∈ 𝑉0,
(𝐿1) Γ0 é a simetria trivial, isto é, (^𝑥, ^𝑦)|𝜖=0= (𝑥, 𝑦),
(𝐿2) Γ𝜖 é uma simetria,
(𝐿3) Γ𝜖∘ Γ𝛿 = Γ𝜖+𝛿, ∀𝛿 ∈ 𝑉0,
(𝐿4) Γ𝜖 é analítica, ou seja, valem as expansões
^ 𝑥 = 𝑥 + 𝜖𝜉 + 𝑂(𝜖2), (1.1.8) ^ 𝑦 = 𝑦 + 𝜖𝜂 + 𝑂(𝜖2), (1.1.9) onde 𝜉 = 𝜉(𝑥, 𝑦) = 𝑑^𝑥 𝑑𝜖 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0, 𝜂 = 𝜂(𝑥, 𝑦) = 𝑑^𝑦 𝑑𝜖 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0, (1.1.10)
dizemos, então, que (𝐺, ∘) é um grupo de Lie e, aos elementos de 𝐺, damos o nome de simetrias de Lie.
Na definição anterior, os axiomas de grupo são satisfeitos para todo 𝜖 suficientemente próximo de zero. Em particular, da condição (𝐿3), obtemos Γ−1𝜖 = Γ−𝜖.
Exemplo 1.1.4. As translações (1.1.7) são simetrias de Lie de (1.1.6). Também, as rotações
(^𝑥, ^𝑦) = (𝑥 cos 𝜖 − 𝑦 sin 𝜖, 𝑥 sin 𝜖 + 𝑦 cos 𝜖), com 𝜖 ∈ (−𝜋, 𝜋], (1.1.11)
assim como as dilatações
(^𝑥, ^𝑦) = (𝑒𝛼𝜖𝑥, 𝑒𝜖𝑦), com 𝜖 ∈ R, (1.1.12)
onde 𝛼 é um número real fixado, são simetrias de Lie de 𝑦′ = 𝑦/𝑥.
1.2
Gerador de Simetrias
Consideremos o operador diferencial
𝑋 = 𝜉𝜕𝑥+ 𝜂𝜕𝑦, (1.2.1)
onde 𝜉 e 𝜂 são os mesmos coeficientes definidos em (1.1.10). Dada uma função suave arbitrária
𝑋𝑘𝐹 (𝑥, 𝑦) = 𝑑 𝑘𝐹 (^𝑥, ^𝑦) 𝑑𝜖𝑘 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 . (1.2.2) De fato, 𝑋𝐹 (𝑥, 𝑦) = 𝜉𝐹𝑥(𝑥, 𝑦) + 𝜂𝐹𝑦(𝑥, 𝑦) = [︃ 𝐹𝑥^(^𝑥, ^𝑦) 𝑑^𝑥 𝑑𝜖 + 𝐹𝑦^(^𝑥, ^𝑦) 𝑑^𝑦 𝑑𝜖 ]︃⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 = 𝑑𝐹 (^𝑥, ^𝑦) 𝑑𝜖 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 . (1.2.3)
Assumindo, então, que
𝑋𝑘−1𝐹 (𝑥, 𝑦) = 𝑑 𝑘−1𝐹 (^𝑥, ^𝑦) 𝑑𝜖𝑘−1 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 ≡ 𝐺(𝑥, 𝑦), (1.2.4) obtemos 𝑋𝑘𝐹 (𝑥, 𝑦) = 𝑋𝐺(𝑥, 𝑦) = 𝜉𝐺𝑥(𝑥, 𝑦) + 𝜂𝐺𝑦(𝑥, 𝑦) (1.2.5) = [︃ 𝐺𝑥^(^𝑥, ^𝑦) 𝑑^𝑥 𝑑𝜖 + 𝐺𝑦^(^𝑥, ^𝑦) 𝑑^𝑦 𝑑𝜖 ]︃⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 (1.2.6) = [︃ 𝑑𝐺(^𝑥, ^𝑦) 𝑑𝜖 ]︃⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 (1.2.7) = 𝑑 𝑘𝐹 (^𝑥, ^𝑦) 𝑑𝜖𝑘 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 , (1.2.8)
o que demonstra a afirmação (1.2.2). Segue, da expansão de 𝐹 , que
𝐹 (^𝑥, ^𝑦) = ∞ ∑︁ 𝑘=0 𝜖𝑘 𝑘! [︃ 𝑑𝑘𝐹 (^𝑥, ^𝑦) 𝑑𝜖𝑘 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 ]︃ = ∞ ∑︁ 𝑘=0 𝜖𝑘 𝑘!𝑋 𝑘𝐹 (𝑥, 𝑦) = 𝑒𝜖𝑋𝐹 (𝑥, 𝑦). (1.2.9)
Em particular, dado 𝑋, as correspondentes simetrias de Lie de uma EDO podem ser reconstruídas da seguinte maneira
(^𝑥, ^𝑦) = (𝑒𝜖𝑋𝑥, 𝑒𝜖𝑋𝑦), (1.2.10) algo que motiva a próxima definição.
Definição 1.2.1. A operadores como em (1.2.1), damos o nome de gerador infinitesimal de
Exemplo 1.2.2. Para as translações (1.1.7), temos que 𝑑^𝑥 𝑑𝜖 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 = 0, 𝑑^𝑦 𝑑𝜖 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 = 1. (1.2.11)
Portanto, tais simetrias são geradas por 𝑋 = 𝜕𝑦.
Exemplo 1.2.3. Da mesma maneira,
𝑋 = −𝑦𝜕𝑥+ 𝑥𝜕𝑦 (1.2.12)
gera as rotações (1.1.11), enquanto que
𝑋 = 𝛼𝑥𝜕𝑥+ 𝑦𝜕𝑦 (1.2.13)
gera as dilatações (1.1.12).
1.3
Coordenadas Canônicas
Em (1.2.1), há uma referência explícita às coordenadas 𝑥 e 𝑦 nas quais uma EDO é original-mente escrita. Investigamos aqui como as componentes 𝜉 e 𝜂 de um gerador de simetrias 𝑋 são modificadas quando substituímos 𝑥 e 𝑦 por novas coordenadas 𝑡(𝑥, 𝑦) e 𝑢(𝑥, 𝑦).
Dada novamente uma função suave arbitrária 𝐹 : R2 → R, pela regra da cadeia,
𝑋𝐹 (𝑡, 𝑢) = 𝜉𝐹𝑥(𝑡, 𝑢) + 𝜂𝐹𝑦(𝑡, 𝑢) (1.3.1)
= 𝜉[𝑡𝑥𝐹𝑡(𝑡, 𝑢) + 𝑢𝑥𝐹𝑢(𝑡, 𝑢)] + 𝜂[𝑡𝑦𝐹𝑡(𝑢, 𝑣) + 𝑢𝑦𝐹𝑢(𝑡, 𝑢)] (1.3.2)
= (𝜉𝑡𝑥+ 𝜂𝑡𝑦)𝐹𝑡(𝑡, 𝑢) + (𝜉𝑢𝑥+ 𝜂𝑢𝑦)𝐹𝑢(𝑡, 𝑢) (1.3.3)
= (𝑋𝑡)𝐹𝑡(𝑡, 𝑢) + (𝑋𝑢)𝐹𝑢(𝑡, 𝑢) (1.3.4)
= [(𝑋𝑡)𝜕𝑡+ (𝑋𝑢)𝜕𝑢]𝐹 (𝑡, 𝑢). (1.3.5)
E justamente porque 𝐹 é uma função arbirária, temos
𝑋 = (𝑋𝑡)𝜕𝑡+ (𝑋𝑢)𝜕𝑢. (1.3.6)
Exemplo 1.3.1. Nas coordenadas polares 𝑟 =√𝑥2+ 𝑦2 e 𝜑 = arctan(𝑦/𝑥), o gerador de simetrias
(1.2.12) é dado por 𝑋 = 𝜕𝜑, pois, 𝑋𝑟 = 0 e 𝑋𝜑 = 1. Ou seja, as rotações (1.1.11), nas novas
Obviamente, coordenadas polares são as mais adequadas para descrever rotações. Dessa cons-tatação simples, surge a pergunta: para todo 𝑋 = 𝜉𝜕𝑥 + 𝜂𝜕𝑦 ̸= 0, sempre existem coordenadas
não-degeneradas4 𝑟(𝑥, 𝑦) e 𝑠(𝑥, 𝑦) , ditas canônicas, tais que 𝑋 = 𝜕
𝑠? A resposta é sim.5 Para
tanto, basta que tenhamos
𝑋𝑟 = 0, 𝑋𝑠 = 1. (1.3.7) Coordenadas canônicas podem ser obtidas a partir de (1.3.7) pelo método das características.
i) Como 𝑋𝑟 = 0, temos que 𝜉𝑟𝑥+ 𝜂𝑟𝑦 = 0.
i-a) Se 𝜉 = 0, então, 𝑟𝑦 = 0. Tomando, portanto, 𝑟 tal que 𝑟 = 𝑟(𝑥), obtemos 𝑋𝑟 = 0.
i-b) Se 𝜉 ̸= 0, então,
𝑟𝑥+
𝜂
𝜉𝑟𝑦 = 0, (1.3.8)
ou ainda, 𝐷𝑥𝑟 = 0, quando 𝑦′ = 𝜂/𝜉. Tomando, portanto, 𝑟 tal que 𝑟(𝑥, 𝑦) = 𝑐 é solução geral de
𝑦′ = 𝜂(𝑥, 𝑦)
𝜉(𝑥, 𝑦), (1.3.9)
obtemos 𝑋𝑟 = 0.
Em ambos os casos, (i-a) e (i-b), dizemos simplesmente que 𝑟 é uma primeira integral de
𝑑𝑥 𝜉 =
𝑑𝑦
𝜂 . (1.3.10)
ii) Como 𝑋𝑠 = 1, temos que 𝜉𝑠𝑥+ 𝜂𝑠𝑦 = 1, e, portanto,
𝑑𝑥 𝜉 =
𝑑𝑦
𝜂 = 𝑑𝑠. (1.3.11)
Calculado 𝑟, o cálculo de 𝑠 se reduz a uma quadratura. De fato,
ii-a) se 𝜉 ̸= 0, então, 𝑠 = ∫︁ 𝑟(𝑥,𝑦) 𝑑𝑥 𝜉 (𝑥, 𝑦(𝑥, 𝑟)); (1.3.12) 4Condição de não-degenerescência: 𝑟 𝑥𝑠𝑦− 𝑟𝑦𝑠𝑥̸= 0.
ii-b) se 𝜂 ̸= 0, então,
𝑠 =
∫︁ 𝑟(𝑥,𝑦) 𝑑𝑦
𝜂 (𝑥(𝑟, 𝑦), 𝑦). (1.3.13)
Em ambos os casos, (ii-a) e (ii-b), 𝑟 é tratado como uma constante.
Exemplo 1.3.2. O gerador de simetrias (1.2.13) é tal que 𝜉 = 𝛼𝑥 e 𝜂 = 𝑦. Se 𝛼 = 0, uma
possibilidade é tomarmos 𝑟 = 𝑥. Do contrário, se 𝛼 ̸= 0, sabendo que
𝑦 = 𝑐𝑥1/𝛼 (1.3.14)
é solução geral de
𝑦′ = 𝑦
𝛼𝑥, (1.3.15)
uma possibilidade é tomarmos 𝑟 = 𝑥𝑦−𝛼.
Como 𝜂 é independente de 𝑥, por simplicidade, tomemos
𝑠 =
∫︁ 𝑑𝑦
𝑦 = ln|𝑦|+𝑐. (1.3.16)
Façamos, em particular, 𝑐 = 0. Portanto,
(𝑟, 𝑠) = (𝑥𝑦−𝛼, ln|𝑦|), ∀𝛼, (1.3.17)
são coordenadas canônicas do gerador de simetrias (1.2.13).
1.4
Condição de Simetria Linearizada
Para muitas EDO’s, a condição de simetria (1.1.2) é não-linear. Simetrias de Lie podem, no entanto, ser determinadas de uma condição mais simples.
Das expansões (1.1.8) e (1.1.9), segue que
^
𝑦(𝑘)= 𝑦(𝑘)+ 𝜖𝜂(𝑘)+ 𝑂(𝜖2), (1.4.1)
onde
De fato, ^ 𝑦(1) = 𝐷𝑥𝑦^ 𝐷𝑥𝑥^ = 𝑦 ′+ 𝜖𝐷 𝑥𝜂 + 𝑂(𝜖2) 1 + 𝜖𝐷𝑥𝜉 + 𝑂(𝜖2) (1.4.3) = [︁𝑦′+ 𝜖𝐷𝑥𝜂 + 𝑂(𝜖2) ]︁[︁ 1 − 𝜖𝐷𝑥𝜉 + 𝑂(𝜖2) ]︁ (1.4.4) = 𝑦′+ 𝜖 (𝐷𝑥𝜂 − 𝑦′𝐷𝑥𝜉) ⏟ ⏞ 𝜂(1) +𝑂(𝜖2). (1.4.5)
Assumindo, então, que
^ 𝑦(𝑘−1) = 𝑦(𝑘−1)+ 𝜖𝜂(𝑘−1)+ 𝑂(𝜖2), (1.4.6) obtemos ^ 𝑦(𝑘)= 𝑦 (𝑘)+ 𝜖𝐷 𝑥𝜂(𝑘−1)+ 𝑂(𝜖2) 1 + 𝜖𝐷𝑥𝜉 + 𝑂(𝜖2) = 𝑦(𝑘)+ 𝜖 [𝐷𝑥𝜂(𝑘−1)− 𝑦(𝑘)𝐷𝑥𝜉] ⏟ ⏞ 𝜂(𝑘) +𝑂(𝜖2), (1.4.7)
o que demonstra a afirmação (1.4.1).
Isso posto, da diferenciação, em 𝜖, de (1.1.2), obtemos
[︃ 𝑑^𝑦(𝑛) 𝑑𝜖 = 𝜔𝑥^ 𝑑^𝑥 𝑑𝜖 + 𝜔𝑦^ 𝑑^𝑦 𝑑𝜖 + 𝜔𝑦^′ 𝑑^𝑦′ 𝑑𝜖 + · · · + 𝜔𝑦^(𝑛−1) 𝑑^𝑦(𝑛−1) 𝑑𝜖 ]︃⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒(1.1.1) , (1.4.8) ou ainda, [︁ 𝜂(𝑛)+ 𝑂(𝜖) = 𝜉𝜔𝑥^+ 𝜂𝜔𝑦^+ 𝜂(1)𝜔𝑦^′+ · · · + 𝜂(𝑛−1)𝜔𝑦^(𝑛−1)+ 𝑂(𝜖) ]︁⃒ ⃒ ⃒(1.1.1), (1.4.9)
uma equação que deve ser necessariamente satisfeita em 𝜖 = 0. Logo,
[︁ 𝜂(𝑛)= 𝜉𝜔𝑥+ 𝜂𝜔𝑦+ 𝜂(1)𝜔𝑦′+ · · · + 𝜂(𝑛−1)𝜔𝑦(𝑛−1) ]︁⃒ ⃒ ⃒ (1.1.1). (1.4.10)
É conveniente introduzir aqui o gerador de simetrias prolongado,
𝑋(𝑛) = 𝜉𝜕𝑥+ 𝜂𝜕𝑦 + 𝜂(1)𝜕𝑦′ + · · · + 𝜂(𝑛)𝜕𝑦(𝑛). (1.4.11)
Assim, (1.1.1) admite simetrias de Lie geradas por 𝑋 se (e, somente se,6)
𝑋(𝑛)Δ⃒⃒
⃒Δ=0= 0, (1.4.12)
a versão linearizada de (1.1.2), onde Δ = 𝑦(𝑛)− 𝜔(𝑥, 𝑦, 𝑦′, . . . , 𝑦(𝑛)).
Doravante, dedicaremos especial atenção a EDO’s de segunda ordem.
1.5
Equações Determinantes
Calculados os coeficientes 𝜂(1) e 𝜂(2) a partir de (1.4.2),
𝜂(1) = 𝜂𝑥+ (𝜂𝑦− 𝜉𝑥)𝑦′− 𝜉𝑦𝑦′2, (1.5.1)
𝜂(2) = 𝜂𝑥𝑥+ (2𝜂𝑥𝑦− 𝜉𝑥𝑥)𝑦′+ (𝜂𝑦𝑦 − 2𝜉𝑥𝑦)𝑦′2− 𝜉𝑦𝑦𝑦′3+ (𝜂𝑦 − 2𝜉𝑥− 3𝜉𝑦𝑦′)𝑦′′, (1.5.2)
para EDO’s de segunda ordem, a condição de simetria (1.4.12) é
𝜂𝑥𝑥 + (2𝜂𝑥𝑦− 𝜉𝑥𝑥)𝑦′+ (𝜂𝑦𝑦 − 2𝜉𝑥𝑦)𝑦′2− 𝜉𝑦𝑦𝑦′3+ (1.5.3)
+ (𝜂𝑦− 2𝜉𝑥− 3𝜉𝑦𝑦′)𝜔 = 𝜉𝜔𝑥+ 𝜂𝜔𝑦 + [𝜂𝑥+ (𝜂𝑦− 𝜉𝑥)𝑦′− 𝜉𝑦𝑦′2]𝜔𝑦′.
Embora pareça complicada, a equação acima pode ser decomposta, via de regra, em um sistema sobredeterminado de EDP’s lineares relativamente simples, as chamadas equações determinantes das simetrias de Lie.
Exemplo 1.5.1. A condição de simetria (1.5.3) para
𝑦′′= 0 (1.5.4)
é
𝜂𝑥𝑥+ (2𝜂𝑥𝑦− 𝜉𝑥𝑥)𝑦′+ (𝜂𝑦𝑦− 2𝜉𝑥𝑦)𝑦′2− 𝜉𝑦𝑦𝑦′3= 0. (1.5.5)
Sabemos que 𝜉 e 𝜂 são independentes de 𝑦′. Como {1, 𝑦′, 𝑦′2, 𝑦′3} é um conjunto LI,
𝜂𝑥𝑥 = 0, (1.5.6) 2𝜂𝑥𝑦− 𝜉𝑥𝑥 = 0, (1.5.7) 𝜂𝑦𝑦− 2𝜉𝑥𝑦 = 0 𝜉𝑦𝑦 = 0 }︃ ⇒ {︃ 𝜉 = 𝐴(𝑥)𝑦 + 𝐵(𝑥) 𝜂 = 𝐴′(𝑥)𝑦2+ 𝐶(𝑥)𝑦 + 𝐷(𝑥), (1.5.8)
com 𝐴, 𝐵, 𝐶 e 𝐷 funções arbitrárias. Substituindo (1.5.8) em (1.5.7) e (1.5.6), obtemos, respecti-vamente,
3𝐴′′(𝑥)𝑦 + [2𝐶′(𝑥) − 𝐵′′(𝑥)] = 0, (1.5.9)
𝐴′′′(𝑥)𝑦2+ 𝐶′′(𝑥)𝑦 + 𝐷′′(𝑥) = 0, (1.5.10)
𝐴′′(𝑥) = 0 2𝐶′(𝑥) − 𝐵′′(𝑥) = 0 𝐶′′(𝑥) = 0 𝐷′′(𝑥) = 0 ⎫ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎬ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎭ ⇒ ⎧ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎨ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎩ 𝐴(𝑥) = 𝑐1𝑥 + 𝑐2 𝐵(𝑥) = 𝑐3𝑥2+ 𝑐5𝑥 + 𝑐6 𝐶(𝑥) = 𝑐3𝑥 + 𝑐4 𝐷(𝑥) = 𝑐7𝑥 + 𝑐8 , (1.5.11)
pois, {1, 𝑦, 𝑦2} também é um conjunto LI. Assim,
𝜉 = (𝑐1𝑥 + 𝑐2)𝑦 + 𝑐3𝑥2+ 𝑐5𝑥 + 𝑐6, (1.5.12)
𝜂 = 𝑐1𝑦2+ (𝑐3𝑥 + 𝑐4)𝑦 + 𝑐7𝑥 + 𝑐8, (1.5.13)
o que nos leva a concluir que qualquer gerador de simetrias de (1.5.4) é da forma
𝑋 = 8 ∑︁ 𝑖=1 𝑐𝑖𝑋𝑖, (1.5.14) onde 𝑋1 = 𝑦(𝑥𝜕𝑥+ 𝑦𝜕𝑦), 𝑋2 = 𝑦𝜕𝑥, 𝑋3 = 𝑥(𝑥𝜕𝑥+ 𝑦𝜕𝑦), (1.5.15) 𝑋4 = 𝑦𝜕𝑦, 𝑋5 = 𝑥𝜕𝑥, 𝑋6 = 𝜕𝑥, 𝑋7 = 𝑥𝜕𝑦, 𝑋8 = 𝜕𝑦. (1.5.16)
Denotando por ℒ o conjunto de todos os geradores de simetrias de uma EDO, é possível mostrar que ℒ é, em verdade, uma álgebra de Lie.7 No exemplo anterior,
ℒ = 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋1, 𝑋2, 𝑋3, 𝑋4, 𝑋5, 𝑋6, 𝑋7, 𝑋8). (1.5.17)
A ordem da EDO impõe algumas restrições sobre a dimensão de ℒ. Para EDO’s de segunda ordem, em particular,
𝑑𝑖𝑚ℒ ∈ {0, 1, 2, 3, 8}. (1.5.18)
Exemplo 1.5.2. A condição de simetria (1.5.3) para
𝑦′′= 𝐹 (𝑦
′)
𝑦𝛼 (1.5.19)
é
𝜂𝑥𝑥 + (2𝜂𝑥𝑦− 𝜉𝑥𝑥)𝑦′+ (𝜂𝑦𝑦 − 2𝜉𝑥𝑦)𝑦′2− 𝜉𝑦𝑦𝑦′3+ (1.5.20) + [︃(︃ 𝜂𝑦− 2𝜉𝑥+ 𝛼 𝑦𝜂 )︃ − 3𝜉𝑦𝑦′ ]︃ 𝐹 (𝑦′) 𝑦𝛼 − [𝜂𝑥+ (𝜂𝑦 − 𝜉𝑥)𝑦 ′− 𝜉 𝑦𝑦′2] 𝐹′(𝑦′) 𝑦𝛼 = 0.
Sendo 𝐹 uma função arbitrária, {1, 𝑦′, 𝑦′2, 𝑦′3, 𝐹 (𝑦′)/𝑦𝛼, 𝐹′(𝑦′)/𝑦𝛼} é um conjunto LI. Logo,
𝜂𝑥𝑥 = 0 2𝜂𝑥𝑦 − 𝜉𝑥𝑥 = 0 𝜂𝑦𝑦− 2𝜉𝑥𝑦 = 0 𝜉𝑦𝑦 = 0 ⎫ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎬ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎭ Exemplo =⇒ 1.5.1 {︃ 𝜉 = (𝑐1𝑥 + 𝑐2)𝑦 + 𝑐3𝑥2+ 𝑐5𝑥 + 𝑐6 𝜂 = 𝑐1𝑦2+ (𝑐3𝑥 + 𝑐4)𝑦 + 𝑐7𝑥 + 𝑐8 , (1.5.21) (︃ 𝜂𝑦− 2𝜉𝑥+ 𝛼 𝑦𝜂 )︃ − 3𝜉𝑦𝑦′ = 0 𝜂𝑥+ (𝜂𝑦 − 𝜉𝑥)𝑦′ − 𝜉𝑦𝑦′2= 0 ⎫ ⎪ ⎪ ⎬ ⎪ ⎪ ⎭ ⇒ ⎧ ⎪ ⎨ ⎪ ⎩ 𝜉𝑦 = 𝜂𝑥 = 0 𝜉𝑥= 𝜂𝑦 = 𝛼 𝑦𝜂 . (1.5.22) Substituindo (1.5.21) em (1.5.22), obtemos 𝑐1𝑥 + 𝑐2 = 𝑐3𝑦 + 𝑐7 = 0, (1.5.23) 𝑐1𝑦 − 𝑐3𝑥 + (𝑐4− 𝑐5) = 0, (1.5.24) (𝛼 − 2)𝑐1𝑦 + (𝛼 − 1)𝑐3𝑥 + (𝛼 − 1)𝑐4+ 𝛼 𝑦(𝑐7𝑥 + 𝑐8) = 0, (1.5.25) e, portanto, 𝑐1 = 𝑐2 = 𝑐3 = 𝑐7 = 0, (1.5.26) 𝑐4− 𝑐5 = 0 (𝛼 − 1)𝑐4 = 0 𝛼𝑐8 = 0 ⎫ ⎪ ⎪ ⎬ ⎪ ⎪ ⎭ ⇒ ⎧ ⎪ ⎪ ⎨ ⎪ ⎪ ⎩ 𝑐4 = 𝑐5 = 0, 𝛼 = 0 𝑐4 = 𝑐5 e 𝑐8 = 0, 𝛼 = 1 𝑐4 = 𝑐5 = 𝑐8 = 0, 𝛼 ̸= 0 e 𝛼 ̸= 1 , (1.5.27)
pois, {1/𝑦, 1, 𝑥, 𝑦} também é um conjunto LI. Assim,
𝜉 = 𝑐6 e 𝜂 = 𝑐8, 𝛼 = 0, (1.5.28)
𝜉 = 𝑐4𝑥 + 𝑐6 e 𝜂 = 𝑐4𝑦, 𝛼 = 1, (1.5.29)
𝜉 = 𝑐6 e 𝜂 = 0, 𝛼 ̸= 0 e 𝛼 ̸= 1, (1.5.30)
o que nos leva a concluir que
ℒ = ⎧ ⎪ ⎪ ⎨ ⎪ ⎪ ⎩ 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝜕𝑥, 𝜕𝑦), 𝛼 = 0 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝜕𝑥, 𝑥𝜕𝑥+ 𝑦𝜕𝑦), 𝛼 = 1 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝜕𝑥), 𝛼 ̸= 0 e 𝛼 ̸= 1 . (1.5.31)
1.6
Redução de Ordem
Agora que estamos em posição de calculá-las sistematicamente, mostraremos alguns métodos que utilizam simetrias de Lie para reduzir a ordem de EDO’s.
1.6.1
Redução Simples
Redução via Coordenadas Canônicas
Dado 𝑋 ̸= 0 um gerador de simetrias de
𝑦′′= 𝜔(𝑥, 𝑦, 𝑦′), (1.6.1)
sejam (𝑟, 𝑠) suas coordenadas canônicas (𝑋(𝑘) = 𝜕
𝑠). Reescrevendo, pois, (1.6.1) em termos das
novas coordenadas, obtemos
¨
𝑠 = Ω(𝑟, 𝑠, ˙𝑠), (1.6.2) para alguma função Ω.8 Como (1.6.2) é invariante sob translações em 𝑠, pela condição de simetria
(1.4.12),
Ω𝑠 = 0. (1.6.3)
Portanto,
¨
𝑠 = Ω(𝑟, ˙𝑠), (1.6.4)
ou ainda, se tomarmos 𝑣 = 𝑣(𝑟, ˙𝑠) qualquer função tal que 𝑣𝑠˙ ̸= 0, a EDO original fica, então,
reduzida a
˙𝑣 = ˜Ω(𝑟, 𝑣), (1.6.5)
uma EDO de primeira ordem em 𝑣.
Exemplo 1.6.1. Sabemos que
𝑦′′ = 𝑦
′2
𝑦 (1.6.6)
8A condição de não-degenerescência das coordenadas canônicas nos garante a existência de Ω. Para detalhes,
admite simetrias de Lie geradas por 𝑋 = 𝜕𝑥.9 Para esse gerador,
(𝑟, 𝑠) = (𝑦, 𝑥) (1.6.7)
são as coordenadas canônicas mais simples. Tomando
𝑣 = 1 ˙𝑠 = 𝑦 ′ , (1.6.8) reduzimos (1.6.6) a ˙𝑣 = 𝑣 𝑟. (1.6.9)
A EDO acima pode ser imediatamente resolvida,
𝑣 = 𝑐1𝑟. (1.6.10)
Como ˙𝑠 = 1/𝑣, de (1.6.10), obtemos
˙𝑠 = 1
𝑐1𝑟
, (1.6.11)
outra EDO cuja resolução é imediata,
𝑠 = 1 𝑐1
ln|𝑟|+𝑐2. (1.6.12)
Logo, substituindo (𝑟, 𝑠) = (𝑦, 𝑥) em (1.6.12), toda solução de (1.6.6) deve satisfazer a
𝑥 = 1 𝑐1
ln|𝑦|+𝑐2, (1.6.13)
o que nos leva a concluir que
𝑦 = 𝑐3𝑒𝑐1𝑥, 𝑐3(= ±𝑒−𝑐1𝑐2) ̸= 0, (1.6.14)
é a solução geral de (1.6.6).
Via de regra, encontrada a solução geral da EDO reduzida, digamos 𝑣 = 𝑓 (𝑟), a solução geral de (1.6.1) pode ser obtida da relação ˙𝑠 = ˙𝑠(𝑟, 𝑣),
𝑠(𝑥, 𝑦) =
∫︁ 𝑟(𝑥,𝑦)
˙𝑠(𝑟, 𝑓 (𝑟))𝑑𝑟. (1.6.15)
Redução via Invariantes Fundamentais
Definição 1.6.2. Uma função não-constante 𝐼(𝑥, 𝑦, . . . , 𝑦(𝑘)) é uma invariante diferencial de
or-dem 𝑘 de 𝑋 ̸= 0, um gerador de simetrias, se 𝑋(𝑘)𝐼 = 0.
Em coordenadas canônicas, 𝑋(𝑘)= 𝜕
𝑠, tal que toda invariante é da forma
𝐼 = 𝐽 (𝑟, ˙𝑠, . . . , 𝑠(𝑘)), (1.6.16)
ou, equivalentemente,
𝐼 = 𝐽 (𝑟, 𝑣, . . . , 𝑣(𝑘−1)), (1.6.17) para alguma função 𝐽 , onde 𝑣 = 𝑣(𝑟, ˙𝑠) é, de novo, qualquer função com 𝑣𝑠˙ ̸= 0. Observemos que
𝑟 é a única invariante diferencial de ordem zero. Invariantes de primeira ordem são funções de 𝑟
e de 𝑣. Em particular, 𝑣 é uma invariante diferencial de primeira ordem. Invariantes de ordem superior são, por sua vez, funções de 𝑟, de 𝑣 e de derivadas de 𝑣 em 𝑟. Por essa razão, 𝑟 e 𝑣 são as chamadas invariantes fundamentais.
Usualmente, podemos determinar 𝑣 sem o conhecimento prévio de 𝑠. De fato, conforme a definição anterior,
𝜉𝑣𝑥+ 𝜂𝑣𝑦+ 𝜂(1)𝑣𝑦′ = 0, (1.6.18)
de maneira que 𝑣 é uma primeira integral de
𝑑𝑥 𝜉 = 𝑑𝑦 𝜂 = 𝑑𝑦′ 𝜂(1), (1.6.19) contanto que 𝑣𝑦′ ̸= 0.
Exemplo 1.6.3. Para o gerador de simetrias (1.2.13), 𝜉 = 𝛼𝑥 e 𝜂 = 𝑦. Dado que 𝜂(1) = (1 − 𝛼)𝑦′,
primeiras integrais de 𝑑𝑥 𝛼𝑥 = 𝑑𝑦 𝑦 = 𝑑𝑦′ (1 − 𝛼)𝑦′ (1.6.20) são da forma 𝐼 = 𝐼(𝑥𝑦−𝛼, 𝑦𝛼−1𝑦′). (1.6.21)
𝑣 = (𝑥𝑦−𝛼)(𝑦𝛼−1𝑦′) = 𝑥𝑦
′
𝑦 . (1.6.22)
É fácil verificar que
𝑣 = 𝑟 ˙𝑠
1 + 𝛼𝑟 ˙𝑠, (1.6.23)
onde (𝑟, 𝑠) = (𝑥𝑦−𝛼, ln|𝑦|).10
Retomando o Exemplo 1.6.1, sabemos que
𝑦′′ = 𝑦
′2
𝑦 (1.6.24)
admite também simetrias de Lie geradas por 𝑋 = 𝑥𝜕𝑥+ 𝑦𝜕𝑦.11 Tomando
(𝑟, 𝑣) = (︃ 𝑥 𝑦, 𝑥𝑦′ 𝑦 )︃ , (1.6.25) reduzimos (1.6.24) a ˙𝑣 = 𝑣 𝑟(1 − 𝑣), (1.6.26)
uma EDO separável cujas soluções são dadas, implicitamente, por
𝑣𝑒−𝑣 = 𝑐1𝑟. (1.6.27)
Como 𝑣 = 𝑟 ˙𝑠/(1 + 𝑟 ˙𝑠), de (1.6.26), obtemos
˙𝑠 = ˙𝑣, (1.6.28)
uma EDO que pode ser imediatamente resolvida,
𝑠 = 𝑣 + 𝑐2, (1.6.29)
10Ver Exemplo 1.3.2. 11Ver Exemplo 1.5.2.
ou ainda,
(𝑠 − 𝑐2)𝑒𝑐2−𝑠= 𝑐1𝑟. (1.6.30)
Logo, substituindo (𝑟, 𝑠) = (𝑥/𝑦, ln|𝑦|) em (1.6.30), toda solução de (1.6.24) deve satisfazer a
(ln|𝑦|−𝑐2)𝑒𝑐2−ln|𝑦| = 𝑐1
𝑥
𝑦, (1.6.31)
o que nos leva a concluir que
𝑦 = 𝑐3𝑒𝑐4𝑥, 𝑐3(= ±𝑒𝑐2) ̸= 0, 𝑐4 = 𝑐1/𝑐3, (1.6.32)
é a solução geral de (1.6.24).
1.6.2
Redução Dupla
Redução via Coordenadas Canônicas/Invariantes Fundamentais
Até aqui, tratamos de reduções simples (a ordem da EDO é diminuída apenas em um). Em verdade, podemos reduzir a uma equação algébrica toda EDO de segunda ordem para a qual ℒ = 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋1, 𝑋2).
De fato, tendo reduzido
𝑦′′ = 𝜔(𝑥, 𝑦, 𝑦′) (1.6.33)
a
˙𝑣1 = Ω(𝑟1, 𝑣1), (1.6.34)
onde (𝑟1, 𝑣1) são invariantes fundamentais de 𝑋1, suponhamos, sem perda de generalidade,12 que
[𝑋1, 𝑋2] = 𝑐𝑋1. (1.6.35)
Por (1.6.35), temos garantida a existência de
(𝑟2, 𝑠2) = (𝑟2(𝑟1, 𝑣1), 𝑠2(𝑟1, 𝑣1)), (1.6.36)
coordenadas canônicas de
𝑋2(1) = (𝑋2(1)𝑟1)𝜕𝑟1 + (𝑋 (1)
2 𝑣1)𝜕𝑣1, (1.6.37)
em termos das quais podemos reescrever (1.6.34), obtendo
˙𝑠2 = ˜Ω(𝑟2), (1.6.38)
para alguma função ˜Ω.13 Se integrarmos (1.6.38), a EDO original fica, então, reduzida a
𝑠2(𝑟1, 𝑣1) =
∫︁ 𝑟2(𝑟1,𝑣1)
˜
Ω(𝑟2)𝑑𝑟2, (1.6.39)
uma equação algébrica.
Exemplo 1.6.4. No Exemplo 1.6.1, reduzimos
𝑦′′= 𝑦
′2
𝑦 , (1.6.40)
uma EDO admitindo ℒ = 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋1, 𝑋2), com 𝑋1 = 𝜕𝑥 e 𝑋2 = 𝑥𝜕𝑥+ 𝑦𝜕𝑦,14 a
˙𝑣1 =
𝑣1
𝑟1
, (1.6.41)
onde (𝑟1, 𝑣1) = (𝑦, 𝑦′). Notemos que
[𝑋1, 𝑋2] = 𝑋1. (1.6.42) Além disso, 𝑋2(1) = 𝑟1𝜕𝑟1, (1.6.43) pois, 𝑋2(1)𝑟1 = 𝑟1 e 𝑋 (1) 2 𝑣1 = 0. Tomando (𝑟2, 𝑠2) = (𝑣1, ln|𝑟1|), (1.6.44)
dado que ˙𝑠2 = 1/𝑟1˙𝑣1, de (1.6.41), obtemos
13Para detalhes, sugerimos [BK89, Seção 3.4.1]. 14Ver Exemplo 1.5.2.
˙𝑠2 =
1
𝑟2
, (1.6.45)
uma EDO cuja integração reduz (1.6.40) a
𝑠2 = ln|𝑟2|+𝑐1. (1.6.46)
Substituindo (𝑟2, 𝑠2) = (𝑣1, ln|𝑟1|) em (1.6.46), toda solução de (1.6.40) deve satisfazer a
𝑣1 = 𝑐2𝑟1, 𝑐1 = ±𝑒−𝑐1, (1.6.47)
uma equação idêntica àquela em (1.6.10).
Como na Subseção 1.6.1, via de regra, explicitado 𝑣1 como função de 𝑟1 a partir da equação
algébrica reduzida, digamos 𝑣1 = 𝑓 (𝑟1), a solução geral de (1.6.33) pode ser obtida da relação
˙𝑠1 = ˙𝑠1(𝑟1, 𝑣1),
𝑠1(𝑥, 𝑦) =
∫︁ 𝑟1(𝑥,𝑦)
˙𝑠1(𝑟1, 𝑓 (𝑟1))𝑑𝑟1, (1.6.48)
onde (𝑟1, 𝑠1) são coordenadas canônicas de 𝑋1.
Redução via Simetrias Variacionais
Para determinadas EDO’s, é possível executar uma redução dupla utilizando um único gerador de simetrias. É o que mostraremos a seguir.
Por ora, estamos especialmente interessados em EDO’s resultantes de um problema variacional. A ação aqui é do tipo
𝐽 [𝑦] =
∫︁ 𝑏
𝑎
𝐿(𝑥, 𝑦, 𝑦′)𝑑𝑥, (1.6.49) onde 𝐿 é a Lagrangeana. Desse problema variacional, obtemos
𝐿𝑦− 𝐷𝑥𝐿𝑦′ = 0, (1.6.50)
a equação de Euler-Lagrange para pontos críticos de 𝐽 [𝑦].15
Definição 1.6.5. Uma transformação inversível Γ : (𝑥, 𝑦) → (^𝑥(𝑥, 𝑦), ^𝑦(𝑥, 𝑦)) é uma simetria variacional de (1.6.49) se deixar a ação invariante, isto é, se 𝐽 [^𝑦] = 𝐽 [𝑦], onde
𝐽 [^𝑦] = ∫︁ ^𝑏 ^ 𝑎 𝐿(^𝑥, ^𝑦, ^𝑦′)𝑑^𝑥. (1.6.51) 15Ver Apêndice B.
Denotando por ^𝐿 = 𝐿(^𝑥, ^𝑦, ^𝑦′), a equação de Euler-Lagrange do problema transformado é
^
𝐿𝑦^− 𝐷^𝑥𝐿^^𝑦′ = 0. (1.6.52)
Observemos, portanto, que toda simetria variacional de (1.6.49) é também simetria de (1.6.50) (e não vice-versa, em geral!).
Calculadas as simetrias de Lie da equação de Euler-Lagrange, é fácil checar quais delas são simetrias variacionais da ação, conforme critério abaixo. De fato, dado
(^𝑥, ^𝑦) = (𝑒𝜖𝑋𝑥, 𝑒𝜖𝑋𝑦), (1.6.53) onde 𝑋 = 𝜉𝜕𝑥+ 𝜂𝜕𝑦, simetrias de Lie de (1.6.50), podemos expandir (1.6.49) em potências de 𝜖,
^ 𝐿 = ^𝐿 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 +𝑑 ^𝐿 𝑑𝜖 ⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 𝜖 + 𝑂(𝜖2) (1.6.54) = 𝐿 + (︃ ^ 𝐿𝑥^ 𝑑^𝑥 𝑑𝜖 + ^𝐿𝑦^ 𝑑^𝑦 𝑑𝜖 + ^𝐿𝑦^′ 𝑑^𝑦′ 𝑑𝜖 )︃⃒ ⃒ ⃒ ⃒ ⃒𝜖=0 𝜖 + 𝑂(𝜖2) (1.6.55) = 𝐿 + (𝜉𝐿𝑥+ 𝜂𝐿𝑦 + 𝜂(1)𝐿𝑦′)𝜖 + 𝑂(𝜖2) (1.6.56) = 𝐿 + 𝜖𝑋(1)𝐿 + 𝑂(𝜖2), (1.6.57) de maneira que 𝐽 [^𝑦] = ∫︁ 𝑏 𝑎 [𝐿(𝑥, 𝑦, 𝑦′) + 𝜖𝑋(1)𝐿(𝑥, 𝑦, 𝑦′) + 𝑂(𝜖2)][1 + 𝜖𝐷𝑥𝜉 + 𝑂(𝜖2)]𝑑𝑥. (1.6.58)
Colecionando, pois, os termos de primeira ordem em 𝜖, 𝐽 [^𝑦] = 𝐽 [𝑦] se (e, somente se,16)
𝑋(1)𝐿 + (𝐷𝑥𝜉)𝐿 = 0. (1.6.59)
Em particular, 𝑋 = 𝜕𝑦 gera simetrias variacionais de (1.6.49) se 𝐿𝑦 = 0. Como consequência,
(1.6.50) se reduz a
𝐷𝑥𝐿𝑦′ = 0, (1.6.60)
ou equivalentemente,
𝐿𝑦′(𝑥, 𝑦′) = 𝑐1, (1.6.61)
uma EDO de primeira ordem. Conforme esperado, 𝑋 = 𝜕𝑦 também gera simetrias de Lie de
(1.6.61), de tal sorte que uma redução mais é possível. Isso é facilmente feito se utilizarmos (1.6.61) para escrever
𝑦′ = 𝑓 (𝑥), (1.6.62)
uma EDO que pode ser imediatamente integrada,
𝑦 =
∫︁
𝑓 (𝑥)𝑑𝑥. (1.6.63)
A técnica acima descrita pode ser estendida a outras simetrias variacionais. Dado 𝑋 ̸= 0 um gerador de simetrias de (1.6.50) satisfazendo ao critério de invariância (1.6.59), sejam (𝑟, 𝑠) suas coordenadas canônicas. Reescrevendo, pois, (1.6.49) em termos das novas coordenadas, obtemos
𝐽 [𝑠] = ∫︁ ˜𝑏 ˜ 𝑎 ˜ 𝐿(𝑟, ˙𝑠)𝑑𝑟, (1.6.64) onde ˜ 𝐿 = 𝐿 𝐷𝑥𝑟 .17 (1.6.65)
Como consequência, (1.6.50) se reduz a
𝐷𝑟𝐿˜𝑠˙= 0, (1.6.66)
a equação de Euler-Lagrange para pontos críticos de 𝐽 [𝑠], ou, equivalentemente,
˜
𝐿𝑠˙(𝑟, ˙𝑠) = 𝑐1. (1.6.67)
A solução é completada se utilizarmos (1.6.67) para escrever
˙𝑠 = 𝑓 (𝑟), (1.6.68)
outra EDO cuja integração é imediata,
𝑠(𝑥, 𝑦) =
∫︁ 𝑟(𝑥,𝑦)
𝑓 (𝑟)𝑑𝑟. (1.6.69)
Exemplo 1.6.6. É fácil ver que
𝑦′′ = 𝑦
′2
𝑦 (1.6.70)
nasce de um problema variacional cuja Lagrangeana é dada por
𝐿(𝑥, 𝑦, 𝑦′) = 𝑦
′2
2𝑦2. (1.6.71)
As simetrias geradas por 𝑋 = 𝜕𝑥 são também variacionais, pois,
𝑋(1)𝐿 + (𝐷𝑥𝜉)𝐿 = 𝐿𝑥 = 0. (1.6.72)
Utilizando novamente as coordenadas canônicas (𝑟, 𝑠) = (𝑦, 𝑥), dado que a Lagrangeana transfor-mada é ˜ 𝐿 = 𝐿 𝐷𝑥𝑟 = 𝑦 ′ 2𝑦2 = 1 2𝑟2˙𝑠, (1.6.73) reduzimos (1.6.70) a − 1 2(𝑟 ˙𝑠)2 = 𝑐1, (1.6.74) ou ainda, ˙𝑠 = 1 𝑐2𝑟 , 𝑐2 = ± √ −2𝑐1, (1.6.75)
Capítulo 2
Grupo-Análise
Neste e nos próximos dois capítulos, faremos a grupo-análise do Problema de Liouville-Gelfand. Na grupo-análise, empregamos a teoria de Lie (em parte desenvolvida no capítulo anterior) para resolver problemas de análise. Neste capítulo, em particular, calcularemos as simetrias de Lie do problema mencionado, identificando suas simetrias variacionais.
2.1
O Problema de Liouville-Gelfand
Denotemos por 𝐷 ⊂ R𝑛 a bola aberta, de raio unitário, centrada na origem. Seja 𝜆 um
parâmetro real. O Problema de Liouville-Gelfand, que surge no estudo da dinâmica de gases em combustão,1 originalmente consiste em encontrar soluções positivas de
−Δ𝑢 = 𝜆𝑒𝑢, x ∈ 𝐷,2 (2.1.1)
uma EDP elítica não-linear, satisfazendo à condição de contorno
𝑢 = 0, x ∈ 𝜕𝐷.3 (2.1.2)
Um notável resultado obtido por Gidas, Ni e Nirenberg em [GNN79] nos garante, porém, que tais soluções devem ser radialmente simétricas, o que torna (2.1.1) e (2.1.2) equivalentes ao PVC
⎧ ⎪ ⎨ ⎪ ⎩ 𝑦′′+ (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝑦′+ 𝜆𝑒𝑦 = 0, 𝑥 ∈ (0, 1),4 𝑦′(0) = 0, 𝑦(1) = 0,5 (2.1.3) 1
O Problema de Liouville-Gelfand, reformulado sobre domínios 𝐷 ⊂ R𝑛 arbitrários, aparece nos mais variados contextos, modelando desde processos de combustão até a expansão do universo (Modelo de Chandrasekhar). [Moh14]
2O modelo matemático para processos de combustão é derivado a partir de princípios de conservação básicos
como conservação de massa, momento e energia. Para detalhes, sugerimos [BE89, Capítulo 1].
3Uma das questões de interesse é investigar como um gás em combustão se comporta quando colocado em um
onde 𝑦(𝑥) ≡ 𝑢(|x|); e radialmente decrescentes,
𝑦′(𝑥) < 0, 𝑥 ∈ (0, 1). (2.1.4)
Proposto por Liouville em 1853, ele encontrou uma solução explícita para o caso unidimensi-onal (𝑛 = 1) e também soluções de (2.1.1), em termos de duas funções arbitrárias, para o caso bidimensional (𝑛 = 2). A rigor, Liouville considerou
𝑢𝑥¯¯𝑦 + 𝜆𝑒𝑢 = 0, (2.1.5)
uma EDP hiperbólica não-linear equivalente a
𝑢𝑥𝑥+ 𝑢𝑦𝑦+ 𝜆𝑒𝑢 = 0, (2.1.6)
onde ¯𝑥 = (𝑥 + 𝑖𝑦)/2 e ¯𝑦 = (𝑥 − 𝑖𝑦)/2.6 No Apêndice D, faremos um estudo detalhado de [Lio53].
Aproximadamente sessenta anos mais tarde, Bratu encontrou duas soluções explícitas para o caso 𝑛 = 2, contanto que
0 < 𝜆 < 2. (2.1.7)
Cerca de um século após os trabalhos pioneiros de Liouville, Gelfand determinou, para os casos
𝑛 = 1 (recipientes com paredes planas), 𝑛 = 2 (recipientes com paredes cilíndricas) e o caso
tridimensional (𝑛 = 3, recipientes com paredes esféricas), valores de 𝜆 para os quais (2.1.3) era solúvel e a multiplicidade das soluções.7
É fácil monstrar que o problema não admite solução para 𝜆 ≤ 0. De fato, se 𝑣 for uma solução positiva de (2.1.1) e (2.1.2), dado que
∇·(𝑣∇𝑣) = |∇𝑣|2+𝑣Δ𝑣, (2.1.8)
pelo Teorema da Divergência,
∫︁ 𝐷 𝑣Δ𝑣 𝑑𝑉 = ∫︁ 𝐷 ∇·(𝑣∇𝑣) 𝑑𝑉 − ∫︁ 𝐷 |∇𝑣|2 𝑑𝑉 = ∮︁ 𝜕𝐷 𝑣∇𝑣 · 𝑑 ⃗𝐴 ⏟ ⏞ =0 − ∫︁ 𝐷 |∇𝑣|2 𝑑𝑉, (2.1.9) 4
Para funções radiais em R𝑛, o Laplaciano é dado por Δ = 𝑑2
𝑑𝑥2 +
𝑛−1 𝑥
𝑑
𝑑𝑥.
5As condições 𝑦′(0) = 𝑦(1) = 0 levam em conta a simetria do domínio de definição do problema. Em particular,
𝑦′(0) = 0 nos assegura a regularidade das soluções em 𝑥 = 0.
6[Cro97].
ou seja, ∫︁ 𝐷 𝑣Δ𝑣 𝑑𝑉 = − ∫︁ 𝐷 |∇𝑣|2 𝑑𝑉. (2.1.10) Assim, 𝜆 ∫︁ 𝐷 𝑣𝑒𝑣 𝑑𝑉 ⏟ ⏞ >0 = − ∫︁ 𝐷 𝑣Δ𝑣 𝑑𝑉 = ∫︁ 𝐷 |∇𝑣|2 𝑑𝑉 ⏟ ⏞ >0 , (2.1.11)
o que nos leva a concluir que 𝜆 > 0. E como consequência, toda solução de (2.1.3) é necessariamente positiva em [0, 1).8
Imaginemos que 𝑢 seja a temperatura de um gás em combustão cuja dinâmica é descrita pela equação evolutiva
𝑢𝑡= Δ𝑢 + 𝜆𝑒𝑢, x ∈ 𝐷. (2.1.12)
Uma solução de (2.1.1) corresponde a uma solução estacionária (𝑢𝑡= 0) de (2.1.12). Há
essencial-mente dois termos competindo entre si em (2.1.12): o termo Δ𝑢 que, juntaessencial-mente com a condição
𝑢 = 0 na fronteira, diminui a temperatura do gás; e o termo fonte 𝜆𝑒𝑢 > 0, produzindo o efeito
contrário. Se uma solução estacionária existir, esses termos devem, portanto, ser mutuamente compensados. Intuitivamente, deveríamos esperar que, para valores grandes de 𝜆, o termo fonte dominasse a reação térmica de modo a elevar infinitamente a temperatura do gás, tornando o equilíbrio inviável. De fato, pode ser demonstrado que (2.1.3) é insolúvel se 𝜆 > 𝜆*, uma certa constante positiva. Noutras palavras, 𝜆 assume um valor crítico 𝜆*, que diferencia eventos térmicos explosivos dos não-explosivos: a inexistência de soluções é interpretada como uma explosão.9
Um importante resultado obtido por Joseph e Lundgren em [LJ73] pôde caracterizar comple-tamente o espectro10 do problema, bem como a multiplicidade de suas soluções.
Teorema 2.1.1. Em relação às soluções de (2.1.3), são válidas as seguintes afirmações. (i) 1 ≤ n ≤ 2: Existe 𝜆* > 0 tal que
(a) para cada 𝜆 ∈ (0, 𝜆*), há duas soluções; (b) para 𝜆 = 𝜆*, há uma única solução;
(c) para 𝜆 ≤ 0 ou 𝜆 > 𝜆*, não há solução.
(ii) 3 ≤ n ≤ 9: Seja ˜𝜆 = 2(𝑛 − 2). Então, existe 𝜆* > ˜𝜆 tal que
(a) para cada 𝜆 ∈ (0, 𝜆*) ∖ {˜𝜆}, há um número finito de soluções;
(b) para 𝜆 = ˜𝜆, há uma infinidade de soluções;
(c) para 𝜆 = 𝜆*, há uma única solução;
8[GNN79]. 9[Jac01] e [JS02].
Figura 2.1: Diagramas de bifurcação. [JS02]
(d) para 𝜆 ≤ 0 ou 𝜆 > 𝜆*, não há solução.
(iii) n ≥ 10: Seja 𝜆* = 2(𝑛 − 2). Então,
(a) para cada 𝜆 ∈ (0, 𝜆*), há uma única solução; (b) para 𝜆 ≤ 0 ou 𝜆 ≥ 𝜆*, não há solução.
Soluções analíticas são conhecidas apenas para os casos 𝑛 = 1 e 𝑛 = 2. Em [CFM96], Clément, de Figueiredo e Mitidieri obtiveram as soluções de
⎧ ⎪ ⎪ ⎨ ⎪ ⎪ ⎩ − (𝑥𝛼|𝑦′|𝛽𝑦′)′ = 𝜆𝑥𝛾𝑒𝑦, 𝑥 ∈ (0, 1),11 𝑦′(0) = 𝑦(1) = 0, 𝑦 > 0, 𝑥 ∈ [0, 1), (2.1.13)
uma versão generalizada do problema, onde 𝛼 = 𝛽 + 1, 𝛽 > −1 e 𝛾 > −1.12 Nos Capítulos 3 e 4,
obteremos, pelas técnicas de simetria, as soluções para os casos 𝑛 = 1 e 𝑛 = 2, respectivamente.
2.2
Simetrias de Lie
A condição de simetria (1.5.3) para
𝑦′′+ (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝑦′+ 𝜆𝑒𝑦 = 0 (2.2.1) é
11Fazendo 𝛼 = 𝛾 = 1 e 𝛽 = 0 em (2.1.13), recuperamos (2.1.3) para o caso 𝑛 = 2.
12Em verdade, existe uma classe geral de operadores quasilineares radiais dados por 𝐿𝑦 = (𝑥𝛼|𝑦′|𝛽𝑦′)′𝑥−𝛾,
[︂ 𝜂𝑥𝑥+ (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝜂𝑥+ 𝜆(2𝜉𝑥− 𝜂𝑦 + 𝜂)𝑒𝑦 ]︂ + + [︂ 2𝜂𝑥𝑦 − 𝜉𝑥𝑥+ 3𝜆𝜉𝑦𝑒𝑦 + (︂𝑛 − 1 𝑥2 )︂ (𝑥𝜉𝑥− 𝜉) ]︂ 𝑦′+ + {︂ 𝜂𝑦𝑦− 2 [︂ 𝜉𝑥𝑦 − (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝜉𝑦 ]︂}︂ 𝑦′2− 𝜉𝑦𝑦𝑦′3 = 0. (2.2.2)
Sabemos que 𝜉 e 𝜂 são independentes de 𝑦′. Como {1, 𝑦′, 𝑦′2, 𝑦′3} é um conjunto LI,
𝜂𝑥𝑥+ (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝜂𝑥+ 𝜆(2𝜉𝑥− 𝜂𝑦+ 𝜂)𝑒𝑦 = 0, (2.2.3) 2𝜂𝑥𝑦 − 𝜉𝑥𝑥+ 3𝜆𝜉𝑦𝑒𝑦 + (︂𝑛 − 1 𝑥2 )︂ (𝑥𝜉𝑥− 𝜉) = 0, (2.2.4) 𝜂𝑦𝑦− 2 [︂ 𝜉𝑥𝑦 − (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝜉𝑦 ]︂ = 0 𝜉𝑦𝑦 = 0 ⎫ ⎪ ⎬ ⎪ ⎭ ⇒ {︃ 𝜉 = 𝐴(𝑥)𝑦 + 𝐵(𝑥) 𝜂 = 𝑎(𝑥)𝑦2+ 𝐶(𝑥)𝑦 + 𝐷(𝑥), (2.2.5) onde 𝑎(𝑥) = 𝐴′(𝑥) − (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝐴(𝑥), (2.2.6)
com 𝐴, 𝐵, 𝐶 e 𝐷 funções arbitrárias.
i) Substituindo (2.2.5) em (2.2.4), obtemos [2𝐶(𝑥) − 𝑏(𝑥)]′+ 3𝑎′(𝑥)𝑦 + 3𝜆𝐴(𝑥)𝑒𝑦 = 0, (2.2.7) onde 𝑏(𝑥) = 𝐵′(𝑥) − (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝐵(𝑥). (2.2.8) Portanto, 𝐴(𝑥) = 0 [2𝐶(𝑥) − 𝑏(𝑥)]′ = 0 }︃ ⇒ ⎧ ⎪ ⎪ ⎨ ⎪ ⎪ ⎩ 𝜉 = 𝐵(𝑥) 𝜂 = 1 2[𝑏(𝑥) + 𝑐1] ⏟ ⏞ 𝑦 + 𝐷(𝑥), (2.2.9) 𝐶(𝑥)
ii) Substituindo (2.2.9) em (2.2.3), obtemos 𝑑(𝑥) + 𝑐(𝑥)𝑦 + 𝜆[2𝐵′(𝑥) − 𝐶(𝑥) + 𝐷(𝑥)]𝑒𝑦 + 𝜆𝐶(𝑥)𝑦𝑒𝑦 = 0, (2.2.10) onde 𝑐(𝑥) = 𝐶′′(𝑥) + (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝐶′(𝑥), (2.2.11) 𝑑(𝑥) = 𝐷′′(𝑥) + (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝐷′(𝑥). (2.2.12) Portanto, 𝐶(𝑥) = 1 2[𝑏(𝑥) + 𝑐1] = 0, (2.2.13) 2𝐵′(𝑥) + 𝐷(𝑥) = 0, (2.2.14) 𝑑(𝑥) = 𝐷′′(𝑥) + (︂𝑛 − 1 𝑥 )︂ 𝐷′(𝑥) = 0, (2.2.15)
pois, {1, 𝑦, 𝑒𝑦, 𝑦𝑒𝑦} também é um conjunto LI.
iii.a) A EDO (2.2.15) pode ser imediatamente resolvida,
𝐷(𝑥) =
{︃
𝑐2ln 𝑥 + 𝑐3, 𝑛 = 2
𝑐2𝑥2−𝑛+ 𝑐3, 𝑛 ̸= 2
. (2.2.16)
iii.b) Substituindo (2.2.16) em (2.2.14), obtemos
𝐵′(𝑥) =
{︃
− (𝑐2ln 𝑥 + 𝑐3)/2, 𝑛 = 2
− (𝑐2𝑥2−𝑛+ 𝑐3)/2, 𝑛 ̸= 2
, (2.2.17)
outra EDO cuja resolução é imediata,
𝐵(𝑥) = ⎧ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎨ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎪ ⎩ 𝑥 2[𝑐2(1 − ln 𝑥) − 𝑐3] + 𝑐4, 𝑛 = 2 − 1 2(𝑐2ln 𝑥 + 𝑐3𝑥) + 𝑐4, 𝑛 = 3 𝑥 2 [︂(︂ 𝑐 2 𝑛 − 3 )︂ 𝑥2−𝑛− 𝑐3 ]︂ + 𝑐4, 𝑛 ̸= 2 e 𝑛 ̸= 3 . (2.2.18)
𝑐2 = 0 e 𝑐3 = 2𝑐1, 𝑛 = 1, (2.2.19) 𝑐2 = 2𝑐1 e 𝑐4 = 0, 𝑛 = 2, (2.2.20) 𝑐2 = 𝑐4 = 0 e 𝑐3 = − (︂ 2 𝑛 − 2 )︂ 𝑐1, 𝑛 ̸= 1 e 𝑛 ̸= 2. (2.2.21) Assim, 𝜉 = 𝑐4− 𝑐1𝑥 e 𝜂 = 2𝑐1, 𝑛 = 1, (2.2.22) 𝜉 = 𝑥 2[2𝑐1(1 − ln 𝑥) − 𝑐3] e 𝜂 = 2𝑐1ln 𝑥 + 𝑐3, 𝑛 = 2, (2.2.23) 𝜉 = (︂ 1 𝑛 − 2 )︂ 𝑐1𝑥 e 𝜂 = − (︂ 2 𝑛 − 2 )︂ 𝑐1, 𝑛 ̸= 1 e 𝑛 ̸= 2, (2.2.24)
o que nos leva a concluir que
ℒ = ⎧ ⎪ ⎪ ⎨ ⎪ ⎪ ⎩ 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋1, 𝑋2), 𝑛 = 1 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋2, 𝑋3), 𝑛 = 2 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋2), 𝑛 ̸= 1 e 𝑛 ̸= 2 , (2.2.25) onde 𝑋1 = 𝜕𝑥, 𝑋2 = 𝑥𝜕𝑥− 2𝜕𝑦, 𝑋3 = 𝑥(1 − ln 𝑥)𝜕𝑥+ 2 ln 𝑥𝜕𝑦. (2.2.26)
2.3
Simetrias Variacionais
A EDO (2.2.1) nasce de um problema variacional cuja Lagrangeana é dada por
𝐿𝑛(𝑥, 𝑦, 𝑦′) = 𝑥𝑛−1 (︃ 𝑦′2 2 − 𝜆𝑒 𝑦 )︃ . (2.3.1)
De fato, multiplicando (2.2.1) por 𝑥𝑛−1, obtemos
𝑥𝑛−1𝑦′′+ (𝑛 − 1)𝑥𝑛−2𝑦′ ⏟ ⏞ 𝐷𝑥 (︁ 𝑥𝑛−1𝑦′)︁ ⏟ ⏞ (𝐿𝑛)𝑦′ − (−𝜆𝑥𝑛−1𝑒𝑦 ⏟ ⏞ (𝐿𝑛)𝑦 ) = 0, (2.3.2) ou seja,
𝐷𝑥[(𝐿𝑛)𝑦′] − (𝐿𝑛)𝑦 = 0, (2.3.3)
a equação de Euler-Lagrange para pontos críticos de
∫︁ 𝑏
𝑎
𝐿𝑛(𝑥, 𝑦, 𝑦′)𝑑𝑥. (2.3.4)
Isso posto, observemos que 𝑋1 = 𝜕𝑥 gera simetrias variacionais de (2.3.4), pois,
𝑋1(1)𝐿1 + (𝐷𝑥𝜉1)𝐿1 = (𝐿1)𝑥 = 0. (2.3.5)
Por outro lado, 𝑋3 = 𝑥(1 − ln 𝑥)𝜕𝑥+ 2 ln 𝑥𝜕𝑦 não gera simetrias variacionais de (2.3.4), pois,
𝑋3(1)𝐿2+ (𝐷𝑥𝜉3)𝐿2 = 𝐿2+ 2𝑦′ ̸= 0. (2.3.6)
Por fim, como
𝑋2(1)𝐿𝑛+ (𝐷𝑥𝜉2)𝐿𝑛= (𝑛 − 2)𝐿𝑛, (2.3.7)
Capítulo 3
Soluções Exatas do Problema 1D
Procuramos aqui por soluções do PVC𝑦′′+ 𝜆𝑒𝑦 = 0, 𝑥 ∈ (0, 1), 𝜆 > 0, (3.0.1a)
𝑦′(0) = 0, (3.0.1b)
𝑦(1) = 0, (3.0.1c)
correspondente ao Problema de Liouville-Gelfand unidimensional.
3.1
Primeira Resolução
Sabemos que (3.0.1a) admite simetrias de Lie geradas por 𝑋1 = 𝜕𝑥.1 Tomando, por
conveni-ência, as invariantes fundamentais
(𝑟1, 𝑣1) = (𝑦, 𝑦′), (3.1.1) reduzimos (3.0.1a) a ˙𝑣1 = − 𝜆𝑒𝑟1 𝑣1 , 𝑣1 < 0,2 (3.1.2)
uma EDO separável que pode ser imediatamente resolvida,
𝑣1 = −
√︁
𝑐1− 2𝜆𝑒𝑟1. (3.1.3)
Seja, então, a coordenada canônica 𝑠1 = 𝑥. Como
1Ver Seção 2.2. 2A restrição 𝑣
˙𝑠1 =
1
𝑣1
, (3.1.4)
segue, do Apêndice C, que
𝑒𝑟1 = 2𝑐 2 2𝑐3𝑒𝑐2𝑠1 𝜆(1 + 𝑐3𝑒𝑐2𝑠1)2 , 𝑐2 = − √ 𝑐1. (3.1.5)
Logo, substituindo (𝑟1, 𝑠1) = (𝑦, 𝑥) em (3.1.5), toda solução de (3.0.1a) deve satisfazer a
𝑒𝑦 = 2𝑐
2 2𝑐3𝑒𝑐2𝑥
𝜆(1 + 𝑐3𝑒𝑐2𝑥)2
. (3.1.6)
Da condição de contorno (3.0.1b), obtemos 𝑐3 = 1. Nesse caso,
𝑒𝑦 = 2𝑐
2 2𝑒𝑐2𝑥
𝜆(1 + 𝑒𝑐2𝑥)2, (3.1.7)
ou ainda, após algumas manipulações algébricas,
𝑒𝑦 = 𝑒
𝛼
cosh2(︁√︁𝜆𝑒2𝛼𝑥)︁
, (3.1.8)
onde 𝛼 ≡ 𝑦(0).
Se 𝛽 ≡ cosh−1(√𝑒𝛼), da condição de contorno (3.0.1c), obtemos
𝛽 =
√︃
𝜆
2cosh 𝛽, (3.1.9)
uma equação algébrica transcendental cujo comportamento é estudado graficamente na Figura 3.1. Denotando por
𝜆* = 2csch2𝛽*, (3.1.10)
onde
𝛽*tanh 𝛽* = 1,3 (3.1.11)
as seguintes afirmações são verdadeiras.
Figura 3.1: Diagrama de bifurcação.
i) Se 𝜆 ∈ (0, 𝜆*), o PVC (3.0.1) possui duas soluções distintas,
𝑦1,2 = −2 ln [︃ cosh(𝛽1,2𝑥) cosh 𝛽1,2 ]︃ , (3.1.12) com 𝛽1,2 satisfazendo a (3.1.9).
ii) Se 𝜆 = 𝜆*, o PVC (3.0.1) possui uma única solução,
𝑦 = −2 ln [︃ cosh(𝛽*𝑥) cosh 𝛽* ]︃ . (3.1.13)
iii) Se 𝜆 /∈ (0, 𝜆*], o PVC (3.0.1) não possui solução alguma.
3.2
Segunda Resolução
Na seção anterior, reduzimos (3.0.1a), uma EDO para a qual ℒ = 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋1, 𝑋2), com 𝑋1 = 𝜕𝑥
e 𝑋2 = 𝑥𝜕𝑥− 2𝜕𝑦,4 a
˙𝑣1 = −
𝜆𝑒𝑟1
𝑣1
, 𝑣1 < 0, (3.2.1)
onde (𝑟1, 𝑣1) = (𝑦, 𝑦′). Notemos que
[𝑋1, 𝑋2] = 𝑋1. (3.2.2)
Além disso,
𝑋2(1) = −(2𝜕𝑟1 + 𝑣1𝜕𝑣1), (3.2.3)
pois, 𝑋2(1)𝑟1 = −2 e 𝑋 (1)
2 𝑣1 = −𝑣1. Tomando, então, as coordenadas canônicas
(𝑟2, 𝑠2) = (︃ 𝑒𝑟1 𝑣2 1 , −𝑟1 2 )︃ , (3.2.4)
dado que ˙𝑠2 = −𝑣13/2𝑒𝑟1(𝑣1− 2 ˙𝑣1), de (3.2.1), obtemos
˙𝑠2 = −
1 2𝑟2(1 + 2𝜆𝑟2)
, (3.2.5)
uma EDO cuja integração reduz (3.0.1a) a
𝑠2 = − 1 2ln (︂ 𝑟 2 1 + 2𝜆𝑟2 )︂ + 𝑐1, (3.2.6) ou ainda, substituindo (3.2.4) em (3.2.6), 𝑣1 = − √︁ 𝑐2− 2𝜆𝑒𝑟1, 𝑐2 = 𝑒−2𝑐1. (3.2.7)
A equação acima é idêntica àquela em (3.1.3). Todo o resto segue conforme a Seção 3.1.
3.3
Terceira Resolução
Sabemos que (3.0.1a) nasce de um problema variacional cuja Lagrangiana é dada por
𝐿 = 𝑦
′2
2 − 𝜆𝑒
𝑦.5 (3.3.1)
As simetrias geradas por 𝑋1 = 𝜕𝑥 são também variacionais. Utilizando novamente as coordenadas
canônicas (𝑟1, 𝑠1) = (𝑦, 𝑥), dado que a Lagrangiana transformada é
˜ 𝐿 = 𝐿 𝐷𝑥𝑟1 = 𝑦′2 2 − 𝜆𝑒 𝑦 𝑦′ = 1 2 ˙𝑠1 − 𝜆𝑒𝑟1˙𝑠 1, (3.3.2) reduzimos (3.0.1a) a − 1 2 ˙𝑠2 1 − 𝜆𝑒𝑟1 = 𝑐 1,6 (3.3.3) ou, equivalentemente, ˙𝑠1 = − 1 √ 𝑐2− 2𝜆𝑒𝑟1 , 𝑐2 = −2𝑐1, (3.3.4)
uma EDO idêntica àquela em (3.1.4). Todo o resto segue conforme a Seção 3.1.
5Ver Seção 2.3. 6Ver (1.6.67).
Capítulo 4
Soluções Exatas do Problema 2D
Procuramos aqui por soluções do PVC𝑦′′+ 𝑦 ′ 𝑥 + 𝜆𝑒 𝑦 = 0, 𝑥 ∈ (0, 1), 𝜆 > 0, (4.0.1a) 𝑦′(0) = 0, (4.0.1b) 𝑦(1) = 0, (4.0.1c)
correspondente ao Problema de Liouville-Gelfand bidimensional.
4.1
Primeira Resolução
Sabemos que (4.0.1a) admite simetrias de Lie geradas por 𝑋2 = 𝑥𝜕𝑥 − 2𝜕𝑦.1 Tomando, por
conveniência, as invariantes fundamentais
(𝑟2, 𝑣2) = (𝑦 + 2 ln 𝑥, 𝑥𝑦′+ 2), (4.1.1) reduzimos (4.0.1a) a ˙𝑣2 = − 𝜆𝑒𝑟2 𝑣2 , (4.1.2)
uma EDO separável que pode ser imediatamente resolvida,
𝑣2 = ±
√︁
𝑐1− 2𝜆𝑒𝑟2. (4.1.3)
Seja, então, a coordenada canônica 𝑠2 = ln 𝑥. Como
˙𝑠2 =
1
𝑣2
, (4.1.4)
segue, do Apêndice C, que
𝑒𝑟2 = 2𝑐 2 2𝑐3𝑒𝑐2𝑠2 𝜆(1 + 𝑐3𝑒𝑐2𝑠2)2 , 𝑐2 = ± √ 𝑐1. (4.1.5)
Logo, substituindo (𝑟2, 𝑠2) = (𝑦 + 2 ln 𝑥, ln 𝑥) em (4.1.5), toda solução de (4.0.1a) deve satisfazer a
𝑒𝑦 = 2𝑐
2
2𝑐3𝑥𝑐2−2
𝜆(1 + 𝑐3𝑥𝑐2)2
. (4.1.6)
Para que a condição de contorno (4.0.1b) seja satisfeita, façamos 𝑐2 = 2. Nesse caso,
𝑒𝑦 = 8𝑐3
𝜆(1 + 𝑐3𝑥2)2
. (4.1.7)
Se 𝑐4 ≡ 1/𝑐3, da condição de contorno (4.0.1c), obtemos
𝜆𝑐24+ 2(𝜆 − 4)𝑐4+ 𝜆 = 0, (4.1.8)
uma equação algébrica do segundo grau cujo discriminante é
Δ = 32(2 − 𝜆). (4.1.9)
i) Se 𝜆 ∈ (0, 𝜆*), onde 𝜆* = 2, então, Δ > 0. Assim,
𝑐1,24 = 4 − 𝜆 ± 2 √︁ 2(2 − 𝜆) 𝜆 = (√2 ±√2 − 𝜆)2 𝜆 (4.1.10)
e, portanto, o PVC (4.0.1) possui duas soluções distintas,
𝑦1,2 = ln [︃ 8𝑐1,24 𝜆(𝑥2+ 𝑐1,2 4 )2 ]︃ , (4.1.11)
as mesmas encontradas por Bratu.
ii) Se 𝜆 = 𝜆*, então, Δ = 0. Assim,
𝑐4 = 1 (4.1.12)
e, portanto, o PVC (4.0.1) possui uma única solução,
𝑦 = 2 ln
(︂ 2
𝑥2+ 1
)︂
. (4.1.13)
Figura 4.1: Soluções exatas do problema bidimensional.
4.2
Segunda Resolução
Na seção anterior, reduzimos (4.0.1a), uma EDO para a qual ℒ = 𝑆𝑝𝑎𝑛(𝑋2, 𝑋3), com 𝑋2 =
𝑥𝜕𝑥− 2𝜕𝑦 e 𝑋3 = 𝑥(1 − ln 𝑥)𝜕𝑥+ 2 ln 𝑥𝜕𝑦,2 a
˙𝑣2 = −
𝜆𝑒𝑟2
𝑣2
, (4.2.1)
onde (𝑟2, 𝑣2) = (𝑦 + 2 ln 𝑥, 𝑥𝑦′+ 2). Notemos que
[𝑋2, 𝑋3] = −𝑋2. (4.2.2)
Além disso,
𝑋3(1) = 2𝜕𝑟2 + 𝑣2𝜕𝑣2, (4.2.3)
pois, 𝑋3(1)𝑟2 = 2 e 𝑋 (1)
3 𝑣2 = 𝑣2. Tomando, então, as coordenadas canônicas
(𝑟3, 𝑠3) = (︃ 𝑒𝑟2 𝑣2 2 ,𝑟2 2 )︃ , (4.2.4)
dado que ˙𝑠3 = 𝑣23/2𝑒𝑟2(𝑣2− 2 ˙𝑣2), de (4.2.1), obtemos
˙𝑠3 =
1 2𝑟3(1 + 2𝜆𝑟3)
, (4.2.5)
uma EDO cuja integração reduz (4.0.1a) a
𝑠3 = 1 2ln (︂ 𝑟 3 1 + 2𝜆𝑟3 )︂ + 𝑐1, (4.2.6) ou ainda, substituindo (4.2.4) em (4.2.6), 𝑣2 = ± √︁ 𝑐2− 2𝜆𝑒𝑟2, 𝑐2 = 𝑒2𝑐1. (4.2.7)
A equação acima é idêntica àquela em (4.1.3). Todo o resto segue conforme a Seção 4.1.
4.3
Terceira Resolução
Sabemos que (4.0.1a) nasce de um problema variacional cuja Lagrangiana é dada por
𝐿 = 𝑥 (︃ 𝑦′2 2 − 𝜆𝑒 𝑦 )︃ .3 (4.3.1)
As simetrias geradas por 𝑋2 = 𝑥𝜕𝑥 − 2𝜕𝑦 são também variacionais. Utilizando novamente as
coordenadas canônicas (𝑟2, 𝑠2) = (𝑦 + 2 ln 𝑥, ln 𝑥), dado que a Lagrangiana transformada é
˜ 𝐿 = 𝐿 𝐷𝑥𝑟2 = 𝑥 2(︁𝑦′2 2 − 𝜆𝑒 𝑦)︁ 𝑥𝑦′+ 2 = 1 2 ˙𝑠2 − 2 + (2 − 𝜆𝑒𝑟2) ˙𝑠 2, (4.3.2) reduzimos (4.0.1a) a − 1 2 ˙𝑠2 2 + (2 − 𝜆𝑒𝑟2) = 𝑐 1,4 (4.3.3) ou, equivalentemente, ˙𝑠2 = ± 1 √ 𝑐2 − 2𝜆𝑒𝑟2 , 𝑐2 = 2(2 − 𝑐1), (4.3.4)
uma EDO idêntica àquela em (4.1.4). Todo o resto segue conforme a Seção 4.1.
3Ver Seção 2.3. 4Ver (1.6.67).
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