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Título do Artigo: Comportamento De Compras De Jovens De Baixa Renda No Varejo De Vestuário. Autora: Tania Limeira

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Academic year: 2021

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1 Título do Artigo: Comportamento De Compras De Jovens De Baixa Renda No Varejo De Vestuário

Autora: Tania Limeira

Patrocínio Realização

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2 Comportamento de Compra de Jovens de Baixa Renda no Varejo de Vestuário

RESUMO

Este artigo apresenta os resultados de pesquisa qualitativa sobre o comportamento de compra de vestuário de jovens de baixa renda, residentes nas proximidades de três polos comerciais na cidade de São Paulo. A metodologia baseou-se em entrevistas com 30 jovens mulheres, de 18 a 24 anos e das classes econômicas C1 e C2. Foram realizadas simulações de compra, com a pesquisadora acompanhando a visita a uma loja escolhida pelas jovens. A perspectiva de análise foi a da teoria da cultura de consumo, que busca identificar os significados culturais subjacentes às escolhas das marcas, dos produtos e das lojas. Os resultados indicam que o consumo de vestuário adquire uma diversidade de significados simbólicos, como a construção identitária, a distinção pessoal e a integração social. As jovens preferem as marcas de moda surfe, porque se identificam com este estilo de vida, bastante difundido na mídia. Quanto ao comportamento de compra, as jovens realizam boa parte das compras nas lojas do bairro onde residem, mas também compram nas lojas de departamentos em shopping centers, ou nas lojas de polos comerciais populares, como na região do Brás.

Palavras-Chave:

Varejo: localização, sortimento de produtos, atendimento, preço, polos comerciais Moda: vestuário, calçados, estilos, marcas, lojas

Comportamento de consumo: decisão de compra, significados culturais

ABSTRACT

The objective of this article is to discuss consumer research results showing the purchase behavior of low income young women toward fashion clothing. The methodology was based on interviews with 30 young women aged 18-24, with 3-7 minimum wages of family income, living in three peripheral areas of the city of São Paulo. A buying simulation was also conducted in order to observe their in-store purchase behavior. The analysis was based on the interpretive perspective and the consumer culture theory, which emphasizes the meanings attached to consumer choices and actions. The results indicated that the low income young girls prefer branded fashion clothes, mainly the most famous surfwear brands. The young women also choose the clothing retail stores based on location, product assortment, price and selling practices.

Key Words

Retailing: strategies, product assortment, price, branding, location, selling practices Fashion: clothing, shoes, styles, brands, stores

Consumer behavior: purchase decision, consumer culture, cultural meanings

INTRODUÇÃO

As recentes estatísticas de demanda agregada no Brasil têm revelado o significativo

crescimento do consumo da população de baixa renda, isto é, das famílias que obtêm renda familiar mensal abaixo de 10 salários mínimos (IPSOS, 2008). Os economistas demonstram que essa demanda é provocada pelo aumento da renda, que por sua vez reflete o crescimento real do salário mínimo e do nível de emprego, em conseqüência das políticas sociais e econômicas adotadas pelo governo Lula (FGV/IBRE, 2008). Com base neste cenário, as empresas industriais e varejistas têm direcionado investimentos para atender esta população, que representa 74% dos domicílios brasileiros (IBGE , 2003).

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3 Simultaneamente a este movimento, os dados do setor varejista indicam o crescimento dos polos comerciais de rua, situados nas áreas centrais e periféricas das grandes cidades (Parente et al , 2007). Na cidade de São Paulo, os polos comerciais como os da rua 25 de março e da região do Brás, localizados na região central, têm apresentado crescimento de vendas, e também os localizados em áreas fora do centro, como no Largo Treze, na zona Sul da cidade. Além disso, dados de pesquisa revelam que o segmento jovem dessa população, entre 18 e 24 anos de idade, tem aumentado o seu consumo de vestuário e calçados, possibilitando o crescimento dos polos comerciais nas áreas populares. (Datafolha, 2008)

Dentro deste contexto, foi realizada pesquisa com o objetivo de investigar o comportamento de compra de jovens de baixa renda no varejo de vestuário, identificando os fatores que influenciam a escolha de estilos e marcas de roupa e calçados e de lojas de vestuário por parte de jovens residentes em ruas próximas a três polos comerciais populares da cidade de São Paulo. Desse modo, pretende-se contribuir para o conhecimento sobre os consumidores de baixa renda e as estratégias varejistas, levantando aspectos teóricos e empíricos de um tema emergente, ligado ao varejo para consumidores de baixa renda.

METODOLOGIA E POLOS COMERCIAIS ESTUDADOS

A pesquisa foi realizada com trinta jovens mulheres, de idade entre 18 e 24 anos, das classes econômicas C1 e C2, segundo o Critério Brasil (ABEP, 2008). Cada grupo de dez jovens reside em um de três bairros periféricos da cidade de São Paulo, a saber: Capão Redondo, Vila Nova Cachoeirinha e São Miguel Paulista. Estes bairros foram selecionados porque suas populações são predominantemente de baixa renda e também porque são regiões com forte e diversificado comércio local. A amostra foi não probabilística e por quotas, selecionada com base em perfil previamente definido, seguindo os objetivos da pesquisa. Os dados foram coletados por meio de entrevistas individuais, com base em um roteiro de 25 perguntas abertas, sendo gravadas e posteriormente transcritas. As entrevistas foram marcadas antecipadamente e realizadas entre outubro e novembro de 2008, em lanchonetes situadas na avenida principal de cada polo comercial. Logo após as entrevistas, as jovens foram acompanhadas até uma loja de vestuário de sua escolha, onde simularam ou realizaram a compra de vestuário ou calçado. Para realizar a compra, cada entrevistada recebeu R$ 50,00. Este processo durou cerca de cinquenta minutos, durante o qual se pode observar o comportamento das jovens dentro das lojas e na interação com os vendedores. A análise dos relatos seguiu o paradigma interpretativo (Denzin e Lincoln, 2006), na perspectiva analítica da teoria da cultura de consumo (Arnould e Thompson, 2005), que procura revelar os significados culturais subjacentes às práticas de consumo, as quais permeiam e facilitam as interações sociais.

Quanto aos polos comerciais, foram escolhidos três entre aqueles com maior concentração de pessoas de baixa renda e um setor comercial em expansão, a saber: Capão Redondo, na zona sul da cidade de São Paulo; Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte; e São Miguel Paulista, no extremo leste da cidade. No distrito de Vila Nova Cachoeirinha, a população é de 156.049 pessoas e os segmentos CDE representam 73% da população, segundo pesquisa do Datafolha (2008). O distrito de Capão Redondo tem uma população de 261.486 pessoas, das quais 49% têm até o ensino fundamental e cerca de 57% ganham até 3 salários mínimos. O distrito de São Miguel Paulista tem 94.890 habitantes, dos quais 67% pertencem às classes CDE.

O polo comercial da Nova Cachoeirinha localiza-se entre as Avenidas Deputado Emílio Carlos, Parada Pinto, Itaberaba, Inajar de Souza e Imirim, que são as artérias principais em torno do ponto central do distrito, que é a Praça Manuel da Costa Negreiros (antigo Largo do Japonês). Na Avenida Parada Pinto, estão localizados os pequenos comércios, os bancos e as principais lojas, como bancos Itaú, Bradesco e Santander; Casas Bahia; e Magazine Luíza.

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4 Naquela avenida também estão localizadas várias pequenas lojas de vestuário e calçados, como: Calçados Antunes; Esperança Calçados; Jane Modas; Alfredo Calçados; Monica Calçados; Krokodilu´s Surf; Dream Beach Surf; Versão Brasil; e Pressão Total.

O polo comercial do Capão Redondo localiza-se entre a Estrada de Itapecerica - onde estão o Shopping Campo Limpo e a estação do metrô Capão - , as Avenidas Ellis Maas e Comendador Sant´anna, e a Estrada de M´Boi Mirim. Na Avenida Comendador Sant´anna estão os pequenos comércios locais (padarias, farmácias, lanchonetes, perfumarias, açougues, entre outros), bem como as redes populares: Casas Bahia; Marabrás; Ponto Frio; Pernambucanas; e Supermercado Dia. As lojas de vestuário e calçados estão nesta avenida, a saber: Calçados Antunes, Calçados Macedo´s , Loja Besni, Loja Fancy e Loja Juçara.

O polo comercial de São Miguel, nos arredores da Praça do Forró, tem quatro avenidas principais: Marechal Tito, Nordestina, São Miguel e Pires do Rio. A estação de trem da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos também está nessa área. O Mercado Municipal Américo Sugai, inaugurado em julho de 1967, está localizado na avenida Marechal Tito. As lojas de vestuário e calçados concentram-se entre a Avenida Mal. Tito e as ruas Salvador de Medeiros, Serra Dourada, Arlindo Colaço e José Otoni. Nesta área, encontram-se as lojas: Besni, Eskala, Sindy, Hot Spice, Tent Surf, Pernambucanas, Zunken e Nossa Loja.

REVISÃO TEÓRICA

A pesquisa foi desenvolvida com base no modelo genérico do comportamento do consumidor e da decisão de compra, bem como na teoria dos fatores situacionais. A análise das escolhas de estilos e marcas de vestuário foi baseada na perspectiva teórica da cultura de consumo (Arnould e Thompson, 2005).

Comportamento do Consumidor e Decisão de Compra

O comportamento do consumidor, de modo genérico, é um processo que engloba três fases, a saber: os antecedentes da decisão, a decisão de compra e a pós-decisão. Os antecedentes da decisão incluem um conjunto de influências, como os estímulos de marketing e os fatores do ambiente sociocultural e econômico. A decisão de compra se refere à maneira como os consumidores tomam suas decisões, a partir dos estímulos da fase anterior. A decisão, na perspectiva da racionalidade econômica, pode ser dividida em quatro etapas. A primeira é o reconhecimento da necessidade, que pode vir de estímulos internos, como fome ou cansaço, ou externos, como a propaganda. Em seguida, os consumidores buscam informações sobre as alternativas de como satisfazer sua necessidade. O consumidor pode procurar informações em fontes internas, isto é, as informações retidas na memória, ou externas, como a consulta a amigos ou familiares. Na terceira etapa, os consumidores fazem a avaliação das alternativas, comparando as diversas maneiras de satisfazer suas necessidades e analisando benefícios, custos e riscos prováveis. A quarta etapa é a decisão de compra, entendida como a escolha de uma opção de produto, serviço, marca ou loja. Os fatores psicológicos, como motivação, percepção, personalidade e atitudes, bem como as experiências anteriores, afetam todo este processo. A decisão refere-se a dois tipos de comportamento: a compra e a avaliação pós-compra. A compra implica a escolha de onde (local), quanto (quantidade) e quando (tempo) comprar. Os consumidores decidem também como pagar pela aquisição, dentre as opções oferecidas. Depois de comprar o produto, eles consideram se estão satisfeitos com a experiência de compra e com o uso do produto ou serviço. Com base em seu grau de satisfação ou insatisfação, decide se abandona o produto ou repete a compra. (Schiffman; Kanuk, 2000).

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5 Influência dos Fatores Situacionais

Diversos autores pesquisaram a influência dos fatores situacionais, ou seja, do conjunto de acontecimentos que interferem na decisão do consumidor no momento da compra. Segundo Belk (1974), entre tais fatores estão aqueles referentes a: local da compra (ambiente da loja; comunicação e promoção; facilidade de acesso); interação com os outros clientes da loja e os vendedores (simpatia, persuasão e insistência); e situação do cliente (urgência da compra; escassez ou excesso de tempo; quantidade de dinheiro na carteira, etc.).

Quanto aos fatores do local de compra, os pesquisadores têm dedicado atenção aos impactos que o ambiente da loja exerce sobre os consumidores. Isto porque o comportamento do consumidor em uma loja é uma resposta de natureza cognitiva e emocional a estímulos desse ambiente. Estes estímulos são de três dimensões: atmosfera, design e fatores sociais (Baker, 1986). A atmosfera da loja designa as condições que afetam os cinco sentidos humanos e que podem interferir na experiência do consumidor dentro da loja, despertando emoções negativas ou positivas. Essas condições tendem a ser percebidas quando se apresentam em condições extremas (muito barulho, iluminação fraca, temperatura da loja muito alta), quando a pessoa permanece no ambiente por muito tempo ou quando há incongruência entre elas e o restante da atmosfera. O design da loja abrange os elementos visuais, sejam funcionais ou estéticos. Entre os elementos funcionais estão o arranjo dos móveis, os equipamentos da loja e o conforto oferecido, enquanto os elementos estéticos incluem a arquitetura do local, as cores, o estilo e a decoração (Baker, Levy e Grewal, 1992).

Os fatores sociais da loja referem-se às características dos funcionários, como o número de profissionais na loja, a maneira como estão vestidos, sua educação e cortesia. Pesquisas indicam que o relacionamento com os vendedores da loja é um fator relevante, já que estes representam a empresa na percepção dos compradores e podem agregar valor ao produto/serviço. (Ward, Bitner e Barnes, 1992).

Formato da Loja e Localização

Uma importante decisão estratégica das empresas varejistas refere-se ao formato da loja. Segundo Barki e Silva (2008), no varejo não-alimentício os três principais formatos são: as lojas especializadas, as lojas de departamento e os magazines. As lojas especializadas concentram suas vendas em uma linha de produtos, tais como brinquedos, vestuário, calçados, livros ou móveis. Em geral, apresentam amplo sortimento em algumas linhas de produtos e estão direcionadas para certo segmento de consumidores. São exemplo desse tipo as lojas de vestuário de estilo surfe, localizadas nos polos comerciais pesquisados. As lojas de departamento, por sua vez, são de grande porte e estruturadas em bases departamentais, com área de venda superior a 4.000 m2 e grande variedade de produtos, oferecendo ampla gama de serviços aos consumidores. As redes C&A e Renner são exemplos desse formato de loja. O terceiro modelo são os magazines, um formato intermediário entre as lojas de departamento e as lojas especializadas. Estes são modelos compactos de lojas de departamento, com linha de produtos limitada e predomínio de seções de linha “dura” (eletrodomésticos, televisores, etc.). O exemplo deste formato no segmento de baixa renda é a Casas Bahia.

Quanto à localização das unidades varejistas, uma decisão estratégica consiste na seleção do tipo de localização. Na cidade de São Paulo, por exemplo, há 96 distritos, sendo que 52 são predominantemente regiões de baixa renda. A população desses 52 distritos representa quase 70% dos 11 milhões de habitantes da cidade, e consiste em um promissor e crescente mercado consumidor. Além disso, os distritos de baixa renda acusam crescimento extremamente acelerado em termos de população residente, enquanto os mais ricos mostram pequeno declínio demográfico, de acordo com Parente e Kato (2008).

Segundo estes autores, os tipos de localização varejista são três: polo comercial de rua, shopping center e lojas isoladas. Nos mercados de baixa renda, os polos comerciais de rua são

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6 uma localização adequada para lojistas de não-alimentos, que vendem produtos de consumo durável (como eletrodomésticos) e de compra comparada (como vestuário), e também para os supermercados de porte médio. Devido ao baixo índice de posse de carro por parte dessa população, os polos de rua têm se desenvolvido ao longo de corredores de transporte coletivo, ou em torno dos terminais de ônibus. Os polos de rua são conglomerados varejistas que tiveram uma evolução espontânea, em geral desenvolvidos em locais de concentração demográfica e em torno das interseções da malha viária urbana ou de terminais de transporte.

Cultura de Consumo e Significados das Roupas

A perspectiva teórica da cultura de consumo considera que os produtos são símbolos transmissores de significados culturais. E as pesquisas realizadas visam investigar como os consumidores transformam os significados simbólicos codificados nas propagandas, marcas, produtos e lojas varejistas para expressar suas circunstâncias pessoais e sociais, suas identidades e estilos de vida (Arnould e Thompson, 2005).

Para entender a forma de transferência de significados para os bens de consumo e destes para os indivíduos, McCracken (1986) explica que na sociedade de consumo os produtos têm um valor que vai além do seu caráter utilitário ou comercial, estando relacionado a significados culturais que lhe foram socialmente atribuídos. Para o autor, os significados culturais dividem-se em dois tipos: categorias culturais e princípios culturais. As categorias culturais representam as distinções básicas que a cultura usa para dividir os fenômenos do mundo, como tempo, espaço, gênero, status, idade, ocupação, lazer, trabalho, sagrado, profano, etc. E os princípios culturais são as idéias e os valores que determinam como os fenômenos culturais serão organizados, avaliados e construídos. Os significados culturais, inicialmente, movem-se do mundo cultural para os produtos de consumo e, depois, movem-se destes para os consumidores que os utilizam. Diversos instrumentos são responsáveis pela movimentação dos significados culturais, a saber: a propaganda, o sistema da moda e os rituais de consumo. A propaganda engloba os anúncios publicitários, por meio dos quais os produtos de consumo são associados a certas categorias e princípios culturais. Os sistemas de moda, por sua vez, são os profissionais e organizações que atuam na área de jornalismo, cinema, televisão, moda, arquitetura, design industrial, etc. Através de suas criações e produções, estas organizações transferem categorias e princípios culturais para os produtos de consumo. Finalmente, a transferência dos significados do produto até o consumidor ocorre por meio de diversos rituais de consumo, como: rituais de posse (comparação, avaliação e demonstração de bens pessoais); de troca (o ato de presentear em ocasiões como aniversários, cerimônias e festividades); de preparação para o uso (cuidados dedicados aos pertences pessoais e à própria pessoa usuária); e descarte (aquisição de produtos que eram de outra pessoa ou descarte de um produto de uso próprio) (McCracken,1986) .

O Consumidor de Baixa Renda

A população de baixa renda, na literatura de marketing, engloba as chamadas “classes CDE”, com renda familiar mensal abaixo de dez salários mínimos (Limeira, apud Parente et al., 2008). Para esta população, o trabalho é a principal fonte de renda, sendo que muitos trabalham na informalidade, como autônomos, trabalhadores em pequenas empresas ou pequenos empresários. Cerca de 61% são analfabetos ou têm nível educacional até o curso primário, sendo que 77% não possuem habilidades matemáticas básicas, tais como capacidade de ler gráficos e tabelas (IBGE , 2003). Sobre as características socioculturais desta população, as pesquisas revelam as especificidades de seus valores, projetos e aspirações de vida. Segundo Aguiar et al. (2008), a família é vista como um porto seguro para a população de baixa renda, que se utiliza de um conjunto de relações familiares já estruturadas para

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7 articular um sistema de ajuda mútua. Esta prática assegura um modo de sobrevivência próprio, onde a reciprocidade é o princípio estruturante da vida social.

Quanto ao comportamento de compra, Barros (2005) informa que, embora a escolha do consumidor de baixa renda seja, muitas vezes, orientada por preço, ele discrimina claramente as marcas de qualidade daquelas que têm como única vantagem o preço. Estas últimas são escolhas circunstanciais, dependendo da disponibilidade financeira do momento. Em algumas categorias de produtos, esse consumidor prefere as marcas mais caras, consideradas de qualidade. O líder da lista de produtos com marcas preferidas é o sabão em pó, seguido de geladeira, televisor e tênis. E os critérios de definição de qualidade das marcas se baseiam em resultados concretos, como durabilidade e eficiência, ou benefícios emocionais, como o sentimento de inclusão. A esse respeito, Mizrahi (2007) explica que marcas de produtos, cujos símbolos estão reproduzidos nas vestimentas e nos adornos corporais dos jovens, são traços constitutivos de sua sociabilidade e o elemento estruturante de sua cosmologia.

ANÁLISE DOS RESULTADOS

A análise dos resultados englobará três temas: as condições socioculturais e os projetos de vida das jovens, que, ao contextualizarem seus comportamentos e escolhas, permitem melhor entendê-los; os significados das roupas e das marcas preferidas, que revelam o papel das roupas como meio de construção identitária e interação social; e, por fim, o comportamento de compra e escolha das lojas, destacando a ausência de fidelidade às lojas e a importância dos estilos de roupas e marcas para a decisão de compra.

Condições socioculturais e projetos de vida

As jovens entrevistadas têm entre 18 e 24 anos e vivem em famílias de classe econômica C1 e C2, segundo o Critério Brasil (ABEP, 2008). São solteiras ou casadas, com ou sem filhos. Residem em bairros considerados periféricos à cidade de São Paulo, onde há moradias

precárias e menor estrutura de serviços públicos. Algumas vivem em casa própria e próxima a de seus pais, outras residem na casa destes. A maioria nasceu no bairro onde mora atualmente e gosta de onde mora, visto que nesse local construíram suas redes de sociabilidade, formadas por colegas da escola, vizinhas ou parentes próximos, como primas e tias. Seus pais e maridos trabalham como autônomos ou em firmas, com atividades de baixa qualificação, como

porteiro, motorista, segurança, metalúrgico, operador de máquina, bancário, tapeceiro, borracheiro, pedreiro ou auxiliar administrativo.

A maioria das jovens entrevistadas terminou o segundo grau, sendo que três delas estão fazendo faculdade (cursos de Educação Física e Administração de Empresas) e pagam as mensalidades com o que ganham de salário. Algumas fizeram curso no Senac, para adquirir uma especialização, como esteticista, por exemplo. Quanto à religião, a maioria é católica, mas há evangélicas e espíritas kardecistas ou, ainda, aquelas que se dizem sem religião. Algumas trabalham em firmas, com carteira assinada, e são operadoras de telemarketing, cobradoras, digitadoras, ajudantes ou auxiliares administrativas. Outras não trabalham ou têm ocupações de horário parcial, como manicure, esteticista, bordadeira, babá, auxiliar de creche ou promotora de empreendimentos imobiliários. Muitas das que estão desempregadas, ou trabalham esporadicamente fazendo “bicos”, buscam trabalho “de carteira assinada” e enviam curriculum para empresas, como supermercados e empresas de telemarketing. Elas reconhecem que enfrentam dificuldades para achar emprego.

Quanto aos projetos de vida, o casamento e a maternidade são o primeiro sonho das jovens. Porém, o modo e o momento de realizar esse sonho varia segundo os interesses, as experiências e as circunstâncias. Uma jovem entrevistada vai casar grávida. Outras querem aproveitar a liberdade da vida sem marido e filhos, adiando o casamento ou a gravidez. Depois do casamento e dos filhos, as jovens querem trabalhar. Uma das principais motivações

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8 é o desejo de independência, que não deve ser entendida apenas no plano material, relativo à sobrevivência. Não depender de outra pessoa significa também ter autonomia, ser dona de suas próprias idéias e do “seu próprio nariz”.

Estes dados reforçam os resultados de outras pesquisas, como as apresentadas no referencial teórico, que indicam que o modo de vida desta população baseia-se na centralidade da família, em relações de gênero tradicionais, assim como em solidariedade e ajuda mútua.

Significados das Roupas e Marcas Preferidas

A partir dos relatos das jovens entrevistadas, verifica-se que a compra de vestuário é uma atividade bastante prazerosa, além de ser habitual e frequente, ocorrendo pelo menos uma vez por mês. Olhar vitrines e entrar em lojas, mesmo sem a intenção de comprar, é um hábito cotidiano de todas as jovens. A maioria revela que a compra de vestuário é uma atividade de alto envolvimento. Além disso, como o vestuário é um item de consumo permanente, as jovens demonstraram bastante experiência e conhecimento em relação às marcas, às lojas e aos tipos de roupas e calçados que “valem à pena comprar”. A entrevistada abaixo relata esta questão:

“Sou muito exigente quanto a roupa. Vou comprar todo mês. Visito várias lojas e

pesquiso bastante pra comprar uma blusinha que eu quero, do meu gosto.” ( Entrevistada I ; Capão Redondo)

Entre os hábitos de uso de vestuário está o de emprestar ou pedir emprestado roupas, o que revela a sociabilidade e solidariedade entre as jovens. Nessas trocas, também está presente uma certa astúcia, para evitar perdas das roupas emprestadas.

“Tenho uma amiga que pediu emprestado uma blusa de frio minha. Ela ainda não devolveu. E eu tenho uma blusa dela comigo. Eu nunca empresto sem pegar nada, porque se acontecer qualquer coisa, eu fico com o que é dela.” (Entrevistada CD; Vila Nova Cachoeirinha)

Com base na teoria da cultura de consumo, verifica-se que a compra de vestuário e calçados adquire uma diversidade de significados, como, por exemplo, ser um meio de distinção pessoal e de integração social. Ou seja, ao mesmo tempo em que as jovens desejam “andar na moda”, também não querem parecer “igual a todo mundo”. Elas querem expressar sua identidade e seu estilo de vida próprios por meio dos objetos que compõem a sua maneira de se vestir. Dentro desta perspectiva, verifica-se que a maioria das jovens entrevistadas compra nas lojas onde acha roupas de que gosta, onde “se identifica com as roupas”.

“Não gosto de ficar me vestindo igual aos outros. Fica chato. Vou numa festa e tem uma menina vestindo a mesma blusinha que a minha. Acho sem graça isso, não gosto”. (Entrevistada V; Vila Nova Cachoeirinha)

“Vejo vitrine e vejo nas pessoas. Se vejo e gosto, compro. Gosto sempre de ser uma das primeiras a usar. Depois tá todo mundo usando.” (Entrevistada S; S. Miguel Paulista) No caso das jovens solteiras, o vestuário é também visto como um meio de sedução, para atrair os rapazes e iniciar uma “paquera”, como no relato abaixo.

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9 “No final de semana , vou a balada. Gosto de ir de minisaia, shortinho, sandália plataforma. Os rapazes também gostam. Chama a atenção.” (Entrevistada G; Capão Redondo)

Todas as jovens, quando questionadas se preferem roupas “de marca”, responderam negativamente, dizendo que o importante é o estilo da roupa e o seu efeito na aparência final, isto é, se “fica bem no corpo”. No entanto, todas compram e usam, com maior ou menor freqüência, roupas e calçados de marca. Elas justificam racionalmente essa escolha pelo benefício funcional, ou seja, pelo fato de serem roupas que “duram bastante”, não encolhem, não desbotam nem perdem a aparência de novas. Outro benefício funcional é o “conforto”, especialmente as sandálias, que não “machucam” nem “fazem bolha no pé”.

“Compro sandália de salto, tipo anabela. Gosto muito da Dakota e da Ramarim. A Ramarim é mais gostosa pra andar, ela não cansa tanto o pé. A Dakota eu compro pelo modelo. Tem uns modelos bem bonitos.” (Entrevistada N, São Miguel Paulista)

Elas reconhecem o valor simbólico das roupas de marca. Uma das jovens expressou: “ a marca diz aonde você comprou e daonde você veio”. Outra expressou o objetivo de distinção social, quando suas amigas passeiam no shopping com as sacolas das lojas de marca. Assim, elas consideram que vale à pena pagar mais caro por roupa de marca. Porém, devido ao alto preço, compram poucas peças e com menor freqüência. Algumas usam as roupas de marca em ocasiões especiais, enquanto no dia a dia usam as roupas mais baratas, sem marca ou de marcas menos conhecidas.

“Gosto de blusinha com marca. As pessoas até preferem que venha logotipo na frente e atrás da roupa. Chama mais atenção ou de repente te dá o nome daonde você se veste. Tem pessoas que preferem só detalhes, mas mesmo assim aquele detalhe diz aonde você comprou.” (Entrevistada GH, Vila Nova Cachoeirinha)

A preferência por marcas é mais ou menos intensa de acordo com o tipo de roupa. A maior preferência ocorre nos calçados, nas sandálias de salto e botas, nos tênis e chinelos. Existe uma tendência de fidelidade em relação às marcas de calçados. Das sandálias de salto plataforma, a marca mais citada é a Lui Lui, seguida da Goofy, as quais são compradas nas lojas de surfe, preferencialmente, ou nas lojas especializadas em calçados. Das sandálias e sapatos sociais, foram citadas as seguintes marcas, em ordem decrescente de citação: Dakota, Ramarim, Dijean, Piccadilly, Azaleia, Mississipi, Via Marte, San Marino e Via Uno. Das botas, as mais citadas foram a Lui Lui e a Kolosh.

Quanto aos preços que costumam pagar pelas sandálias e botas de marca, estes variam entre 80 e 200 reais. As sandálias sem marca conhecida têm preço entre 35 e 70 reais. As marcas de tênis mais citadas foram: Olympikus, Nike, Adidas, Fila, Allstar, Kolosh e Rainha. Os preços de tênis de marca, que as jovens costumam pagar, variam de 100 a 200 reais. Os mais baratos são considerados de baixa qualidade, ou seja, são “ralequinhos” e rasgam em pouco tempo.

Quanto às jaquetas de moleton, estas são escolhidas em função da marca (Onbongo, Billabong, Rip Curl, Tent Girls), especialmente as vendidas nas lojas de surfe (Tent Beach, Krokodilu´s, Central Surf) e as marcas esportivas (Adidas, Puma). Quanto às blusinhas e baby-looks, a preferência por marca é menos freqüente, porém algumas jovens preferem as marcas de surfe internacionais (Billabong, Rip Curl) ou nacionais (Onbongo, Nicoboco, Recruta) ou, ainda, as marcas das lojas de surfe (Versão, Pressão, Zuken, Krokodilu´s, Fatal). As marcas de lojas de departamentos ou lojas especializadas mencionadas foram C&A, Besni,

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10 Renner, Marisa, Pernambucanas, Conexão e Hering. Os preços das blusinhas de marca vão de 50 a 90 reais. As blusinhas sem marca custam entre 10 e 35 reais.

Quanto às calças e bermudas de jeans, a marca preferida é a Sawary, que tem fábrica na cidade de São Paulo e realiza investimentos em marketing. A propaganda da marca é estrelada pela modelo Daniela Ciccarelli. Das outras marcas nacionais, são mencionadas as seguintes: K2B, R119, Recruta, Biotipo, Mix, Zuken e Colcci. Porém, várias jovens não conseguem se lembrar do nome da marca dos jeans que usam. Os preços das calças de jeans com marca famosa variam de 70 a 200 reais, e as de marcas desconhecidas vão de 35 a 60 reais.

Por meio dos relatos das jovens, verifica-se que as práticas de consumo de vestuário estão associadas a distinção pessoal e a integração social, e baseiam-se na crença destas consumidoras de que as imagens das marcas são transferidas para elas próprias, processo explicado por McCracken (1986). Neste caso, as jovens preferem as marcas que são veiculadas na mídia e que adotam estratégias de posicionamento voltadas para o segmento jovem, como as marcas de surfe. Portanto, o que diferencia essas jovens de baixa renda das jovens de alta renda não são os preços das roupas e calçados comprados. O que existe é uma significativa diferença nos significados atribuídos a esses produtos, bem como nos estilos e nas marcas. As escolhidas são aquelas que conseguem “falar” a linguagem dessa população.

Comportamento de Compra e Escolha das Lojas

A maioria das jovens realiza suas compras em diversas lojas, visando a busca de novidade e variedade de estilos. Muitas delas desconhecem o nome das lojas onde compram, principalmente quando são lojas pequenas de bairro ou de shoppings, ou localizadas no Brás, ou, ainda, na rua 25 de março. Assim, as jovens não demonstram fidelidade às lojas.

Na escolha das lojas, a localização é um dos primeiros fatores considerados. As jovens realizam uma boa parte de suas compras nas lojas do bairro, devido à localização próxima de suas residências, o que lhes possibilita economizar tempo e dinheiro de transporte. Como os bairros em que residem são polos comerciais, com boa variedade de lojas, as jovens acabam satisfazendo suas principais necessidades localmente. Além disso, muitas das compras ocorrem por impulso, quando as jovens passam em frente às lojas, durante seus trajetos para o trabalho, a escola ou creche dos filhos. Os relatos abaixo revelam esta questão:

“Não vou nessas lojas Marisa, C&A. Vou mais nas lojas do bairro. Estou sem tempo, e prefiro comprar aqui perto”. (Entrevistada AB, Vila Nova Cachoeirinha)

“Aqui tem tudo que a gente quer. Tem muita loja. Compro jeans na Eskala, que tem preço bom, modelos que eu gosto, novidades e boa qualidade. Compro também na Kamelo e na Besni.” ( Entrevistada K, São Miguel Paulista)

Quanto às lojas de bairro preferidas, há diferenças devido à localização das lojas. No Capão Redondo, as lojas preferidas são: Juçara´s, Fancy, Vermelha e Macedo´s. As lojas de calçados são Macedo´s e Antunes. Em Vila Nova Cachoeirinha, as mais citadas são as lojas de surfe, como Krokodilu´s, Surf Beach, Pressão Total e Versão Brasil. De calçados, são as lojas Esperança e Taka Taka. Em São Miguel Paulista, são as lojas de surfe as preferidas: Tent Beach, Hot Spice, Zuken e M Brasil. Outras lojas locais são bastante citadas (Nossa Loja, Sindy, Unimodas e Eskala), havendo compras esporádicas nas lojas de rede (Besni e Pernambucanas). De calçados, as preferidas são a Mundial e a Antunes.

Quando as jovens desejam maior variedade de produtos ou, por outro lado, querem otimizar o orçamento, vão fazer compras em outros polos comerciais, em shopping centers, na rua 25 de março ou na região do Brás. Para compensar o tempo e o custo de deslocamento até essas áreas, procuram realizar um volume maior de compras, incluindo as necessidades de

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11 toda a família. Em geral, as idas ao Brás ou à 25 de março ocorrem uma vez ou duas vezes por ano, principalmente no final do ano, quando elas dispõem do décimo terceiro salário. Uma entrevistada assim explicou:

“Quando junto dinheiro, uns 300 reais, vou no Brás e compro bastante roupa mesmo. Da última vez, comprei calça por 23 reais. Lá, é mais em conta. E tem que ir com bastante dinheiro, porque gastar condução pra comprar uma calça não dá. O preço da condução dá pra comprar outra calça.” (Entrevistada O, São Miguel Paulista)

Ir aos shopping centers é um programa menos freqüente. Nos shoppings, as jovens vão para passear e, esporadicamente, para fazer compras, visto que elas reconhecem que lá os preços são mais caros. Algumas jovens, porém, compram algumas peças de roupa, especialmente nas lojas de rede, como C&A, Besni, Renner, Marisa e Pernambucanas, devido à facilidade dos cartões de loja e à variedade de produtos. Ou, ainda, compram nas lojas de surfe e butiques dos shoppings, quando acham promoções, ofertas ou produtos diferenciados a preços “acessíveis”. Os shoppings mais freqüentados são aqueles com localização mais próxima, como: Interlagos, SP Market e Boa Vista, para as residentes em Capão Redondo; West Plaza e Santana para as residentes em Vila Nova Cachoeirinha; e Itaquera e Tatuapé para as residentes em São Miguel Paulista.

“Vou no shopping West Plaza geralmente pra passear, tomar sorvete. Não vou freqüente lá. Gosto da loja Centauro pra tênis. E lá tem lojas de surfe com ofertas. Comprei tênis na loja de surfe, é da Rip Curl. Não lembro o nome da loja. Paguei 109 reais, não é caro, dura bastante.” (Entrevistada BC, Vila Nova Cachoeirinha)

Das lojas de rede localizadas em shoppings, a preferida pela maioria das jovens é a C&A. Em segundo lugar, a Besni é a mais citada. E em terceiro lugar a Marisa, a Renner e a Pernambucanas. Quanto à C&A, os principais motivos declarados são: variedade de estilos de roupa de moda, principalmente para mulheres e crianças; facilidade de pagamento com cartão e crediário; e percepção de “qualidade” e durabilidade das roupas. O ponto negativo da C&A são os preços, considerados altos, bem como a localização em shoppings, o que dificulta o acesso. As entrevistadas demonstraram uma imagem bastante positiva da C&A, que reflete os investimentos feitos na marca, especialmente a propaganda com a modelo Gisele Bundchen.

“Compro blusinha na Besni, C&A e lojinhas pequenas, que não lembro o nome. Gosto muito da C&A pela facilidade de pagar com cartão e parcelado.” (Entrevistada BC, Vila Nova Cachoeirinha)

Quanto à atmosfera e o design das lojas, as jovens não verbalizaram nenhuma reação positiva nem negativa. O que mais chama a atenção delas é a vitrine das lojas, onde param para examinar detalhadamente as roupas e os preços expostos. A vitrine torna-se o principal chamariz para a entrada na loja. Além da vitrine, as roupas expostas em cabides e manequins são detalahadamente observadas e manuseadas. No entanto, se conscientemente as jovens não reconhecem a presença dos elementos físicos e decorativos no interior da loja, cabe ressaltar a sua importância para chamar a atenção e motivar a compra. As lojas de surfe, por exemplo, têm uma atmosfera que remete à praia, ondas do mar e vegetação, bem como um design com elementos identificados com o mundo jovem. Sobre isso, uma das jovens comentou:

“Comprei na loja que fica no mini shopping, na Av Parada Pinto, mas foi a primeira vez. Já conhecia, mas nunca tinha comprado lá. Acho que a cara dela não chama muita

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12 atenção. Se fizesse reforma, com essas luzes que chamam atenção, acho que chamaria a atenção do público. Por isso que nunca tinha me interessado de entrar lá. Desta vez vi que tinha umas roupas, resolvi entrar e acabei achando os vestidos.” (Entrevistada GH, Vila Nova Cachoeirinha)

O atendimento feito pelos vendedores também é bastante valorizado pelas jovens e, se avaliado como inadequado, é um fator que motiva algumas a não entrarem mais na loja. Principalmente quando o comportamento do vendedor humilha a compradora, o que já ocorreu com algumas jovens em lojas de moda surfe.

“Tem lugares que a vendedora te olha de cima abaixo antes de te atender. Onde eu sei que tem esse tipo de vendedora eu nem entro. Na Krokodilu´s, entrei, fui tratada assim, e depois não entrei mais. A pessoa me mediu, virou as coisas e não veio atender. Percebi que elas vêem atender se a pessoa tá vestindo marca, ou tá bem vestida. Pessoas que elas pensam que têm dinheiro, que vão comprar.” (Entrevistada BC, Vila Nova Cachoeirinha)

Nas lojas de surfe, em geral, o atendimento é considerado ruim, pelo fato de que os vendedores exercem pressão sobre a compradora, além de serem pouco atenciosos e desorganizados. Se esse fato não impede a compra por parte de algumas jovens, para outras tal atendimento é bastante inibidor, afastando-as das lojas. O sentimento de discriminação, que ocorre em conseqüência do comportamento de certos vendedores, é um fator de forte rejeição à loja:

“Tem vendedores que não olham na sua cara, dizem que não tenho dinheiro pra comprar. (...) Fui na Sun Rocha, loja de surfe. A vendedora começou a desfazer da gente. (...) Quando eu vejo que ele não me atende bem, eu já saio logo e não compro. Mas tem outras lojas que o vendedor fala “vamos entrar, vamos dar uma olhadinha, chegou variedades, tá em liquidação”, e vai conversando com o cliente.” (Entrevistada J, Capão Redondo)

Outros aspectos valorizados são a organização da loja, a rapidez do atendimento e a ausência de filas no caixa.

“Comprei uma vez na Zunken e não gostei. Vi o preço de uma roupa e quando fui pagar o preço era outro. Achei que eles tavam enganando a gente, não gostei. Também não gosto porque as roupas lá não têm etiqueta de preço. Tem sempre de ficar perguntando, e eu não gosto. A Besni não, é uma loja mais organizada e tem o preço.” (Entrevistada M, São Miguel Paulista)

As promoções e descontos de preço exercem forte atração e motivam a compra por impulso.

“Eu não tinha intenção de comprar a blusinha. Mas quando olhei, falei “eu vou comprar”. Achei tão bonitinha. Eu bati o olho e comprei. Ela tava custando 45 reais, mas na promoção tava 20 reais. A calça tava 75 reais, na promoção paguei 40 reais.” (Entrevistada M ; São Miguel Paulista)

As compras de vestuário são feitas à vista com dinheiro, ou parceladas no cartão. Mas há consciência, por parte da maioria das jovens entrevistadas, de que o cartão possibilita a perda

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13 de controle e o aumento dos gastos, apesar de facilitar as compras. Além do cartão de crédito (Visa ou Mastercard), muitas possuem cartões de loja, sendo o mais mencionado o cartão da C&A. Outros cartões mencionados foram: Pernambucanas, Marisa e Sorocred. Os cartões de loja geram, em alguns casos, a fidelização das consumidoras, devido às facilidades oferecidas.

“Eu também compro com cartão, mas prefiro com dinheiro. As vezes eu compro no cartão e depois chega a conta e digo “meu deus do céu, gastei demais e agora?” . Então eu manero bastante no cartão e prefiro comprar mais a vista. (....) Tenho cartão da C&A, da Marisa, Pernambucanas, Sorocred e cartão de crédito. Em geral uso mais o cartão de crédito do que o das lojas.” (Entrevistada N; São Miguel Paulista)

Quanto aos meios utilizados pelas jovens para se informarem sobre moda, os mais citados foram as novelas e as propagandas na televisão, bem como os catálogos e as vitrines das lojas. As novelas influenciam a difusão e a aceitação dos novos estilos de vestuário, a partir do trabalho das figurinistas, que escolhem as roupas dos principais personagens. Mas, às vezes, a adoção do novo estilo requer tempo para se acostumarem com a idéia e se certificarem da nova moda que estará nas vitrines. Verifica-se, assim, a influência da mídia e de todo o sistema de moda, que orientam as escolhas das jovens, segundo explicou McCracken (1986).

“Vejo pela televisão, as artistas, e vejo nas lojas. Não sou de aceitar a moda de cara, mas com o tempo. Comprei três calças de boca justa, depois de um ano. Demorou um ano para comprar. (...) Não comprei a moda da oncinha. Todo mundo tinha.” (Entrevistada AB, Vila Nova Cachoeirinha)

Em síntese, verifica-se que além das marcas e dos estilos de roupa preferidos, as jovens escolhem as lojas principalmente pela localização, variedade de roupas e calçados da moda, promoções, facilidade de pagamento e atendimento. As lojas especializadas em moda surfe são as preferidas da maioria das jovens entrevistadas, principalmente das solteiras, as quais reconhecem o poder das marcas famosas no jogo de sedução e de conquista dos namorados. Das lojas de departamento, as preferidas são a C&A e a Besni, pela facilidade de pagamento com os cartões das lojas e os estilos de roupa de moda.

Os relatos das jovens reafirmam a importância da dimensão simbólica dos bens de consumo, sendo o vestuário de moda uma categoria de produto cuja decisão de compra é baseada nos diversos significados culturais e sociais dos produtos e marcas para elas. Estes significados distinguem-se em função do contexto de vida e dos objetivos pessoais de cada jovem. Entender estes significados é uma condição importante para a formulação das estratégias de posicionamento das marcas de vestuário e das lojas.

Quanto à escolha das lojas, como foi visto no referencial teórico, há uma combinação de fatores, com maior relevância da localização e do tipo de produto oferecido (estilos, variedade e marca).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa visou compreender o comportamento de compra de vestuário, destacando as motivações e os significados simbólicos, os critérios de escolha, as formas de pagamento, as marcas de roupas e calçados, as lojas preferidas e os meios de informação utilizados pelas jovens de baixa renda, residentes nos três polos comerciais selecionados.

A análise dos resultados revelou que as práticas de consumo de vestuário estão associadas aos processos de construção identitária, distinção pessoal e integração social, e

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14 baseiam-se na crença das jovens de que as imagens das marcas são transferidas para elas próprias, processo explicado por McCracken (1986). Neste caso, as jovens preferem as marcas que são veiculadas na mídia e que adotam estratégias de posicionamento voltadas para o segmento jovem, como as marcas de surfe. Portanto, o que diferencia essas jovens de baixa renda das jovens de alta renda não são os preços das roupas e calçados comprados. O que existe é uma expressiva diferença nos significados atribuídos a esses produtos, bem como nos estilos e nas marcas. As escolhidas são aquelas que conseguem “falar” a linguagem dessa população.

Quanto ao comportamento de compra, as jovens realizam boa parte de suas compras nas lojas do bairro onde residem, devido à localização próxima de suas residências, o que lhes possibilita economizar tempo e dinheiro de transporte. Como os polos comerciais analisados apresentam uma boa variedade de lojas, as jovens acabam satisfazendo suas principais necessidades localmente. Quando desejam maior variedade de produtos ou, por outro lado, querem otimizar o orçamento, vão fazer compras em outros polos comerciais, em shopping centers, na rua 25 de março ou na região do Brás. Assim, verificou-se um comportamento de baixa fidelidade em relação às lojas, devido à busca de variedade e novidade, já que o vestuário é um meio importante de construção da identidade pessoal e de distinção social.

A maioria das jovens afirma que compra nas lojas onde acha roupas de que gosta, onde “se identifica com as roupas”. Em geral, as lojas especializadas em moda surfe são as preferidas da maioria das jovens, principalmente as solteiras, as quais reconhecem o poder destas marcas no jogo de sedução e de conquista dos namorados. Quanto à atmosfera e o design das lojas, o que mais chama a atenção das jovens é a vitrine da loja, onde elas param para examinar detalhadamente as roupas e os preços expostos. O atendimento dos vendedores da loja também é bastante valorizado e, se for avaliado como inadequado, é um fator que motiva algumas a não entrarem mais na loja. Principalmente quando o comportamento do vendedor humilha a compradora. Outros aspectos valorizados são a rapidez do atendimento e a ausência de filas no caixa.

Os resultados tendem a corroborar as proposições da teoria da cultura de consumo, em que o comportamento do consumidor é baseado na dimensão simbólica dos bens, cujos significados culturais são estabelecidos na interação social, onde os grupos de referência, o sistema de moda, a mídia e a propaganda têm papel de destaque. Assim, verificou-se uma diversidade de significados simbólicos atribuídos pelas jovens ao vestuário de moda, como a construção identitária, a distinção pessoal e a integração social.

Quanto aos limites dessa pesquisa, por ser de caráter exploratório, não é possível fazer generalizações para a população pesquisada. A metodologia utilizada, mesmo que adequada aos objetivos da pesquisa, pode ser enriquecida com outras técnicas, como discussão em grupo e técnicas projetivas, que permitam identificar outros significados culturais não verbalizados. E também as técnicas de cunho etnográfico, com imersões na realidade em estudo, que permitam um maior desvendamento das questões investigadas. Esta pesquisa, no entanto, pode contribuir para levantar outras questões e algumas hipóteses, que poderão orientar outras pesquisas, de natureza tanto exploratória quanto conclusiva, na área do comportamento do consumidor de baixa renda.

Para os gestores das empresas varejistas, os resultados da pesquisa podem ser utilizados para apoiar decisões estratégicas quanto a localização de loja, sortimento de produtos, formas de pagamento, promoções, ambiente de loja e atendimento. Tais estratégias, desenvolvidas com foco neste segmento da população, podem contribuir para explorar novas oportunidades neste mercado, que apresenta significativo potencial de expansão nos próximos anos.

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