filosofia clássica indiana
2011-2012 1ºSemestre
1. No começo, não havia nem a não-existência nem a existência
2. No começo, não havia nem morte nem não-morte. (...) O uno
respirava, sem agitação e sustinha-se a si próprio.
3. Tudo isto era uma onda indistinta. (...) O que estava envolto no
vazio surgiu finalmente através do poder do calor.
4. No começo, o desejo surgiu; foi a primeira semente nascida da
mente.
5. [Sábios/poetas] estenderam a sua corda através do vazio e
souberam o que estava em cima e o que estava em baixo.
6. Mas, afinal, quem sabe? Quem pode assegurar donde é que tudo
veio?
7. Aquele que a contempla do mais elevado céu só ele sabe ou
talvez ele próprio não saiba.
“No começo, este mundo era apenas [existente] ser
(sat) sem dualidade
[segundo]. Ora, sobre este ponto, alguns dizem: ‘No começo -
afirmam - este mundo era não-Ser (asat) [não-existente] sem
dualidade [segundo] e que o Ser [existente] saiu do não-Ser
[não-existente].
Mas, filho, como é que isso seria possível? Ele continuou. Como é que
o existente poderia brotar do não-existente? Pelo contrário, no
começo, este mundo deve ter sido existente puro - apenas um, sem
dualidade [segundo].
E esse um pensou para si mesmo: ‘Que eu seja muitos. Que eu me
multiplique.’ Emitiu calor. O que é quente, contudo, provoca
transpiração; e assim do calor água é produzida. E a água pensou para
si mesma: ‘Que eu seja muita. Que eu me multiplique.’ E emitiu
alimento, pois quando chove, o alimento torna-se abundante.”
Shakespeare
King Lear
“
Nothing will come of nothing”
1.1.92Bṛhad
ā
ra
ṇ
yaka
(“Grande texto
da floresta”)
Ch
ā
ndogya (“de
quem canta as
estrofes”)
Taittir
ī
ya
Aitareya
Kau
ṣī
taki
Kena (“por quem?”)
Śvet
ā
śvatara (“homem
com uma mula branca”)
Ka
ṭh
a (“«parábola»”)
Īś
ā
(“Deus”)
Mu
ṇḍ
aka (“barbeado”)
Praśna (“questão”)
Ṛg
S
ā
ma
Yajur/1
Yajur/2 Atharva
Kau
ṣī
taki
Ch
ā
ndogya
Taittir
ī
ya
BṛhadāraṇyakaMu
ṇḍ
aka
Aitareya
Kena
Śvet
āśvatara
Īśa
Praśna
Ka
ṭh
a
M
ā
ṇḍ
ukya
upani
ṣ
ad
“Quem impele e impulsiona a mente?
Quem promove a primeira respiração?
Quem nos impele a proferir estas palavras?
Quem é o divino que une a visão ao ouvir?
Quem é o ouvir no acto de ouvir?
Quem é o pensar no acto de pensar?
Quem é a fala no acto de falar?
Quem é o ver no acto de ver?
Livres, os que são sábios, tornam-se imortais ao abandonarem este
mundo.
A visão não chega aí, nem o conhecimento e as palavras;
não sabemos, não conhecemos como aqui se pode ensinar. (...)
O que não pode ser expresso pelas palavras
mas através das quais as palavras são expressas,
aprende que apenas é brahman
e não o que se venera.”
1.1-5
"(Para Hume) quando reflectimos sobre o conteúdo da nossa própria mente, descobrimos recordações individuais, pensamentos, paixões, experiências, mas nenhum Self. Hume pensava que, se não encontrássemos (e não pudéssemos encontrar) qualquer coisa na experiência, então não tínhamos o direito de falar disso. A nossa mente não podia abarcar ou mesmo “tocar” tal coisa. Assim, de forma consistente, defendeu que o Self não é mais do que um agregado das suas “percepções” ou experiências, juntamente com quaisquer ligações que existam entre elas. Há conteúdo, mas nada para o conter. A isto chama se por vezes uma teoria da “não propriedade” do Self ou teoria do Self como feixe. […] O problema desta ideia é exigir que tornemos compreensível a ideia de uma experiência sem proprietário. Mas objecta se que isto é incoerente. Esta ideia trata as experiências como “objectos” ou coisas autónomas: o tipo de coisas que poderiam flutuar por aí, sem dono, à espera de serem unidas num feixe com outras, como ramos caídos numa floresta. Mas, prossegue a objecção, isto é um erro, porque as experiências são parasitárias ou adjectivas das pessoas que as têm. O que quer isto dizer?
Pensemos numa amolgadela de um carro. Podemos falar de amolgadelas: esta é pior do que aquela ou a sua reparação será mais cara do que a da amolgadela que sofremos o ano passado. Mas é logicamente impossível que pudesse existir uma amolgadela “sem proprietário”, uma amolgadela sem uma superfície que é amolgada. As amolgadelas correspondem, por assim dizer, aos adjectivos. (…) Analogamente, um sorriso resulta de um rosto que sorri, que é a piada por detrás do gato de Cheshire de Lewis Carroll, que desapareceu deixando apenas o seu sorriso."
“O leitor está a olhar para esta página, a ler este texto e a elaborar o
significado das minhas palavras à medida que vai avançando na leitura.
Porém, o que se passa na sua mente não se limita de forma alguma ao que
diz respeito ao texto e ao seu significado. Paralelamente à representação das
palavras impressas e à evocação de conceitos necessária para compreender
aquilo que escrevi, a sua mente revela também uma outra coisa, algo que é
suficiente para indicar, a cada instante, que é o leitor e não outra pessoa
quem está a ler e a compreender o texto. As imagens que correspondem às
suas percepções externas e às percepções daquilo que recorda ocupam
quase toda a extensão da sua mente, mas não ocupam a sua totalidade. Para
além destas imagens, existe igualmente uma outra presença que o significa a
si (…) Se esta presença não existisse, como poderia saber que os seus
pensamentos lhe pertencem? Quem poderia afirmá-lo? Esta presença é
calma e subtil e por vezes é pouco mais do que uma alusão meio aludida e
um dom meio compreendido”
António Damásio, The Feeling of What Happens (London:Vintage, 2000, 10). Primeira edição de 1999 (ed.port., 29).
“Traz-me o fruto de uma figueira.”
“Aqui está.”
“Corta-o.”
“Cortei-o.”
“O que vês no seu interior?”
“Estas pequenas sementes.”
“Agora pega numa delas e corta-a.”
“O que é que tu vês?”
“Nada.”
Então o pai disse-lhe: “Esta essência subtil que tu nem consegues ver
- vê como desta essência surge esta enorme figueira que aqui está.
Acredita-me.
Esta essência subtil é o
ātman de tudo isto.
Esta é a verdade; isto é o
ātman. E isso és tu.
tat satyam | sa ātmā | tat tvam asi