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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS

Agravo de Instrumento n° 1.0090.19.000182-7/001

O MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS, por intermédio da Promotora de Justiça que esta subscreve, no escopo de que seja mantida a respeitável decisão interlocutória prolatada na tutela cautelar em caráter antecedente nº 00018276920198130090 que tramita na 1ª Vara Cível, Criminal e da Infância e Juventude da Comarca de Brumadinho, com supedâneo no artigo 1.019, inciso II do Código de Processo Civil, vem, à presença de Vossa Excelência, expor

CONTRAMINUTA DE AGRAVO DE INSTRUMENTO,

na qual se pretende demonstrar que não merece reforma o r. decisum prolatado pelo douto Juízo a quo, requerendo, para tanto, o recebimento e regular processamento da presente para fins de direito.

Brumadinho, 21 de março de 2019. Ana Tereza Ribeiro Salles Giacomini

Promotora de Justiça Em exercício na

1ª Promotoria de Justiça de Brumadinho

Claudia Spranger e Silva Luiz Motta

Promotora de Justiça

Coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos e Apoio Comunitário (CAO-DH)

Membro da Força-Tarefa instituída em decorrência do rompimento das barragens em Brumadinho

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Agravo de Instrumento n° 1.0090.19.000182-7/001 Agravante: Vale S.A.

Agravado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais Autos de origem: 0001827-69.2019.8.13.0090

Egrégio Tribunal, Colenda Câmara, Eminente Relator,

I RELATÓRIO

O Ministério Público propôs tutela cautelar antecedente com pedido liminar em face da Vale S.A., buscando, em linhas gerais, assegurar às pessoas atingidas pelo rompimento das barragens da Mina Córrego do Feijão em Brumadinho, a reparação dos danos sofridos.

Deferidos os pedidos formulados em sede liminar, a Vale interpôs agravo de instrumento contra a decisão primeva alegando, em síntese, que o bloqueio on line nas contas da empresa, no importe de R$ 5.000.000.000,00 (cinco bilhões), constitui ameaça à própria continuidade das medidas emergenciais que estão sendo realizadas pela VALE para a mitigação e reparação dos danos decorrentes do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão.

Compara a tragédia de Brumadinho com a de Mariana, chamando atenção para o fato de que, em Mariana, os danos ambientais e matérias tiveram extensões muito maiores do que em Brumadinho, de modo que o Ministério

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Público do Estado de Minas Gerais e o Ministério Público Federal concordaram ser suficiente a garantia de R$ 2.200.000.000,00 (dois bilhões e duzentos milhões de reais).

Aduz ainda que a ordem do bloqueio, além de descabida, é absolutamente desnecessária, não sendo razoável que se presuma a impossibilidade da agravante arcar com eventual reparação dos impactos do rompimento.

Indeferido o efeito suspensivo vindicado para determinar a imediata liberação dos valores bloqueados, vieram os autos para manifestação.

É brevíssimo o relatório.

II DA TEMPESTIVIDADE DA CONTRAMINUTA

O Código de Processo Civil unificou o prazo de interposição de recursos (exceto embargos de declaração) e contrarrazões de recurso em 15 (quinze dias), contados a partir da data em que ocorrer a intimação. No caso do Ministério Público, gozará de prazo em dobro para manifestar-se nos autos, que terá início a partir de sua intimação pessoal. É o que dispõe o artigo 180 do CPC.

É de se verificar ainda que, de acordo com o artigo 219 do CPC,

na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis. Considerando que o Ministério Público recebeu a carta de ordem

5000008-12.2019.8.13.0090 no dia 06/02/2019, o termo a quo fixou-se em 07/02/2019 (quarta-feira) e o dies ad quem em 25/03/2019 (segunda-(quarta-feira). Logo, protocolada a presente Contraminuta nesta data, comprovada está sua tempestividade.

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III DOS FUNDAMENTOS

Embora sejam sólidas e procedentes as asserções fáticas e jurídicas expendidas pelo Ministério Público na peça vestibular, cabe enfatizá-las a fim de demonstrar que os fundamentos adotados pela agravante não merecem prosperar.

III. 1 DA LIMINAR PROFERIDA POR JUIZO COMPETENTE

A agravante, ao apresentar suas razões de recurso, alegou que a competência para processar e julgar as causas decorrentes do rompimento da barragem de Feijão seria da 2ª Vara da Fazenda pública estadual de Belo Horizonte, sob os seguintes argumentos:

(...) o ESTADO DE MINAS GERAIS pleiteia a recuperação de os danos decorrentes do rompimento da barragem 1 da Mina do Feijão. Os impactos socioambientais – ponto exclusivo da ação de origem deste recurso – estão, pois, claramente abrangidos pelos pedidos ali formulados. A prévia distribuição daquela demanda pelo ESTADO DE MINAS GERAIS tornou prevento o juízo de Belo Horizonte para o julgamento das pretensões que envolvem as medidas de mitigação e reparação dos impactos socioambientais e socioeconômicos decorrentes do rompimento da barragem da Mina do Feijão, que, por força do art. 58, deverão ser reunidos e julgados em conjunto, primando pela solução global e sistêmica dos impactos.

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Como é cediço, o instituto processual da prevenção se dá na hipótese de existirem duas ou mais ações conexas, ocorrendo, neste caso, a reunião das mesmas perante um único juízo. Nessa esteira, de acordo com o artigo 55, caput, do CPC, reputam-se conexas duas ou mais ações quando lhes forem comuns o pedido ou a causa de pedir. Seguindo nessa linha de raciocínio, mister perscrutar se há identidade na causa de pedir ou no pedido das tutelas cautelares propostas pelo Ministério Público de MG em Brumadinho e naquela aviada pelo Estado de Minas Gerais em trâmite neste respeitável Juízo.

Pois bem.

A tutela cautelar antecedente proposta pelo Ministério Público durante o plantão judiciário do dia 26/01/2019, autos nº 0001827-69.20198.13.0090, na Comarca de Brumadinho, tem como causa de pedir a reparação dos danos

socioeconômicos em prol dos atingidos, ou seja, a proteção dos direitos dos munícipes de Brumadinho e outros que se encontravam naquele município, com fins à reparação de danos socioeconômicos ocorridos a partir do rompimento das barragens da Mina Córrego do Feijão, considerando os danos conhecidos no momento do ajuizamento da exordial. Ademais, também requeridas providências para salvaguardar indenizações que abarcam danos por perdas materiais, emocionais, urbanísticas e sociais de todos aqueles atingidos que se encontravam,

no dia do crime ambiental, nos limites territoriais do município de Brumadinho

(como, por exemplo, os hóspedes da Pousada Nova Instância soterrada pela lama).

Quanto aos pedidos em sede de liminar foram propostos:

1. A concessão de liminar inaudita altera pars, por estarem presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, decretando-se a

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indisponibilidade dos bens da requerida VALE S/A, no valor de R$5.000.000.000,00 (cinco bilhões de reais), efetivando-se, inicialmente, o bloqueio de valores depositados em instituições financeiras através do BACENJUD e, caso não exista numerário suficiente, a indisponibilidade de automóveis através do RENAJUD e de bens móveis mediante expedição de ofícios aos cartórios de imóveis de Belo Horizonte/MG, Brumadinho/MG, Itabirito/MG, Itabira/MG e Ouro Preto/MG;

2. Caso não sejam encontrados bens e valores suficientes na forma do item acima, seja determinado o bloqueio de ações listadas em Bolsa de Valores da requerida, na quantidade necessária a composição do valor;

3. A indicação expressa na decisão de que esse valor bloqueado seja usado exclusivamente na reparação dos danos causados às pessoas atingidas pelo rompimento das barragens da Mina do Córrego do Feijão nos limites territoriais do município de

Brumadinho;

4. Que a requerida se responsabilize pelo acolhimento, abrigamento em hotéis, pousadas, imóveis locados, arcando com os custos relativos ao traslado, transporte de bens móveis, pessoas e animais, além de total custeio da alimentação, fornecimento de água potável, observando-se a dignidade e adequação dos locais às características de cada família, sempre em condições equivalentes ao status quo anterior ao desastre, para TODAS as pessoas que tiveram comprometidas suas condições de moradias em decorrência do rompimento das barragens, pelo tempo que se fizer necessário;

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5. Para o atendimento ao item anterior, que sejam ouvidas as pessoas atingidas acerca da opção quanto ao local e forma de abrigamento (hotel, pousada, imóvel locado);

6. Que a requerida seja compelida, imediatamente, a assegurar à coletividade dos moradores atingidos integral assistência, devendo, para tanto, disponibilizar equipe multidisciplinar composta por, no mínimo, assistente social, psicólogo, médico, arquiteto, e em quantidade suficiente, para o atendimento das demandas apresentadas pelas pessoas atingidas;

7. Que a empresa requerida disponibilize, de imediato, estrutura adequada para acolhimento dos familiares de vítimas que se encontram desaparecidas e daquelas já com confirmação de óbito, fornecendo informações atualizadas a cada família envolvida, alimentação, apoio da equipe multidisciplinar acima mencionada, transporte, gastos com sepultamento e todo o apoio logístico e financeiro solicitado pelas famílias;

8. Que sejam divulgados boletins informativos acerca das pessoas desaparecidas, atualizados a cada seis horas;

9. Que, semanalmente, a empresa forneça ao Juízo a relação das famílias retiradas de suas moradias, locais em que se encontram abrigadas, além de relatório circunstanciado de todas as ações de apoio às pessoas atingidas.

À luz do caso concreto, os requerimentos ministeriais acima elencados tangenciam a reparação de danos locais, o que atrai a competência da Comarca de Brumadinho, como juiz natural do feito, em respeito aos princípios da

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fatos, efetividade e legitimidade da instrução probatória na coordenação das provas técnicas e periciais.

De forma concreta, a inteligência do inciso II, do art. 93, do Código de Defesa do Consumidor, deve ser compatível com a regra fundamental prevista no inciso I do mesmo artigo e no art. 2° da Lei da Ação Civil Pública, havendo de ser assim sintetizada: a competência será da capital do Estado ou do

Distrito Federal, em danos regionais ou nacionais, quando a capital for atingida pelo dano; por consequência, ainda que o dano seja regional ou nacional, mas a capital do Estado ou do Distrito Federal não for atingida, o foro competente será aquele(s) da(s) comarca(s) atingida(s) pelo dano.1

A ratio que sustenta essa solução legal é exatamente a necessidade de aproximação do juízo competente do material fático subjacente à demanda, com especial relevo para as questões probatórias, v. g., produção de provas testemunhais, realização de perícias, bem como eventuais inspeções judiciais.

Essa também foi a conclusão do Superior Tribunal de Justiça quando tratou da definição da competência para o julgamento das demandas relativas à multiplicidade de danos causados em decorrência do rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana/MG, no CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 144.922 – MG:

“EXCEÇÕES À REGRA GERAL

Há que se ressalvar, no entanto, das considerações realizadas acima, os aspectos estritamente humanos e econômicos da

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tragédia (tais como o ressarcimento patrimonial de vítimas e familiares, combate a abuso de preços etc.), ou mesmo abastecimento de água potável que exija soluções peculiares ou locais, os quais poderão ser objeto de ações individuais ou coletivas, intentadas cada qual no foro de residência dos autores ou do dano. Nesses casos, devem ser levadas em conta as circunstâncias particulares e individualizadas, decorrentes do acidente ambiental, sempre com base na garantia de acesso facilitado ao Poder Judiciário e da tutela mais ampla e irrestrita possível” (CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 144.922 - MG (2015/0327858-8, Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça).

Neste diapasão, a própria decisão que julgou como competente, por definitivo, o Juízo da Vara Federal em causa semelhante à presente, acerca do rompimento da barragem em Mariana-MG, aplicando, dentre outros, o instituto da conexão, entendeu que, seria exceção à regra, situações onde o foco é a questão humanitária, “decorrentes do acidente ambiental, sempre com base na garantia de

acesso facilitado ao Poder Judiciário e da tutela mais ampla e irrestrita possível”, devendo

prevalecer o foro do local do fato, pois, o contrário, “significaria óbice à facilitação do

acesso à justiça, marco fundante do microssistema da ação civil pública”.

É o caso dos presentes autos onde se busca o atendimento de questões voltadas para o local do dano, tais como, moradias (temporárias e futuras), liberação e recuperação de acessos urbanísticos à sede da cidade, assistência social e médico-psicológica relacionadas com o grave impacto causado pela tragédia, questões registrais, direitos/reparações definitivas relacionadas às especificidades dos danos no território de Brumadinho, reassentamento de

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comunidades inteiras afetadas, auxílio a familiares dos mortos e desaparecidos, danos morais e sociais específicos e individuais, etc..

Não se pode perder de vista que o prejuízo gravíssimo à economia de Brumadinho é patente e notório.2 Em suma, as incertezas são inúmeras para os munícipes daquela cidade, enxergando a ação que visa reparar os danos socioeconômicos, possivelmente, como uma última esperança. Retirar tal ação do local do fato, nestes termos, é suprimir a possibilidade de acompanhamento e recuperação, inclusive psicossocial, de toda uma população atingida no território de Brumadinho, onde cada uma das vidas retrata os “bastidores” de uma história particular deixada para trás.

Re melius perpensa, verifica-se que, no caso da tutela cautelar

pleiteada no bojo dos autos nº 0001827-69.20198.13.0090, admitir a competência da Vara da Fazenda Pública e Autarquias constituir-se-ia em afastar o órgão julgador do local do dano, o que acarretaria não somente violação ao princípio do juiz natural, mas, principalmente, dificuldade do acesso à justiça por parte dos atingidos pelo rompimento da Mina do Córrego do Feijão.

Em se tratando da tutela cautelar ajuizada pelo Estado de Minas Gerais, autos nº 5010709-36.2019.8.13.0024, a causa de pedir é a reparação quanto ao dano socioambiental emergencial, tendo como foco salvaguardar pessoas, bens, animais, municípios e o meio ambiente em toda a extensão do Estado de Minas Gerais atingido pelo rompimento das barragens da Mina Córrego do Feijão (direitos emergenciais que se aplicam a toda a bacia, tais como, contratação de assessoria técnica gerenciadora das demais que serão contratadas, solução de dívidas estatais e

2

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ressarcimento de importantes investimentos e receitas ao Estado de Minas Gerais em razão da tragédia, etc.).

Quanto aos pedidos formulados pelo Estado, requereu-se:

1. a ABERTURA DE CONTA JUDICIAL ESPECÍFICA E

AUTORIZAÇÃO JUDICIAL Para que o Estado de Minas Gerais

possa utilizar imediatamente todos os recursos indisponibilizados na forma dos itens subsequentes, necessários para atendimento das demandas urgentes das vítimas, pessoas, animais, municípios e ao meio ambiente atingidos pelo desastre, seja a que título for, prestando contas a este Juízo das medidas adotadas e valores utilizados, proibido o custeio de quaisquer outras finalidades desvinculadas do objeto da presente ação;

2. a DECRETAÇÃO DE INIDISPONBILIDADE de ativos

financeiros, via BACENJUD, observado o limite equivalente a R$

1.000.000.000,00 (um bilhão de reais), localizados em quaisquer contas bancárias da matriz da VALE S.A., bem como da lista de filiais constante no Anexo 1, para atendimento ao item “a” desta petição;

3. a DECRETAÇÃO DE INDISPONIBILIDADE de todas ações de

propriedade da ré (e não de terceiros) negociadas nas Bolsas de Valores do Rio de Janeiro, na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), na Bolsa de Valores de Madri (Latibex), na bolsa de New York Stock Exchange (NYSE) e na NYSE Euronext Paris ,

observados o limite equivalente a R$ 20.000.000.000,00 (vinte bilhões de reais) da matriz da VALE S.A. , bem como da lista de filiais constante no Anexo, expedindo-se as competentes intimações, inclusive através do Ministério das Relações

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Exteriores: Palácio Itamaraty, Esplanada dos Ministérios - Bloco H, Brasília/DF –Brasil, CEP 70.170-900, para atendimento ao item “a” desta petição.

4. a DECRETAÇÃO DE INDISPONIBILIDADE em bens imóveis

ou em direitos reais em nome dos requeridos , por meio da

Central Nacional de Indisponibilidade de Bens - CNIB, conforme autorizado pela regra do Art. 184 do CTN e Art. 4º, § 3º, da Lei 8.397/1992 c/c Art. 1.024-K, §8º, do Provimento n. 260/13 da CGJ/TJMG e do Provimento 39/2014 do CNJ, com ressalvas às impenhorabilidades em lei, observando-se o limite equivalente a R$ 20.000.000.000 (vinte bilhões de reais), da matriz da VALE

S.A., bem como da lista de filiais constante no Anexo, para

atendimento ao item “a” desta petição;

5. seja lançada ordem de bloqueio, via RENAJUD, determinando a

indisponibilidade eventuais registros de propriedade de automóveis em nome dos requeridos, equivalente a R$

20.000.000.000,00 (20 bilhões de reais), da matriz da VALE S.A. , bem como da lista de filiais constante no Anexo 1, para atendimento ao item “a” desta petição;

6. penhora das marcas VALE S. A. e VALE MANGANÊS junto ao INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial, oficiando-se aquela autarquia federal acerca da indisponibilidade da marca, até ulterior determinação deste d. juízo, para atendimento ao item “a” desta petição;

7. ARRESTO DE 10% (dez por cento) DO FATURAMENTO LÍQUIDO, entendendo-se como o faturamento bruto menos os impostos estaduais, da matriz da VALE S.A., bem como da lista de filiais constante no Anexo 1, mês a mês, na forma do art. 324, §1º, II e III do CPC, até o atingir o montante da efetiva reparação

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de todos os danos emergenciais causados pelo desastre, para atendimento ao item “a” desta petição;

8. CONSTITUIÇÃO do referido Instituto DICTUM (CNPJ 16.454.617/0001-17), para exercer o múnus de administrador-depositário, às expensas dos requeridos , nos termos do art. 677 e art. 655-A, §3º do CPC, a qual deve ser NOTIFICADA, por meio de correspondência a ser endereçada à Rua Raimundo Correia, 52, São Pedro, Belo Horizonte/MG, CEP: 30.330-090 (tel. 031 3284-6480) , a fim de que informe a esse d. Juízo se aceita o encargo e, para que, no prazo legal, apresente a proposta de honorários e detalhamento de plano de administração;

9. DETERMINAÇÃO ao administrador judicial, para realizar o depósito da importância constrita, mensalmente, em conta judicial remunerada, à disposição deste d. juízo, no 5º dia útil de cada mês (ou em outra data, sugerida pelo administrador-depositário, mensalmente), prestando conta nos presentes autos, até se chegar ao montante de vinte bilhões de reais.

Como se pode observar, límpido que ao serem comparados os pedidos formulados e a causa de pedir nas tutelas cautelares propostas pelo Ministério Público e o Estado de Minas Gerais, percebe-se a inexistência de identidade entre as mesmas.

Posta assim a questão é de se dizer que, mesmo quando se reconhece a conexão entre duas ações, o que não é o caso aqui, o Superior Tribunal de Justiça em diversos julgados tem atribuído ao juiz uma maior liberdade no caso concreto para analisar a conveniência de reunir ou não processos, admitindo-se o julgamento em apartado. Vejamos:

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RECURSO ESPECIAL. MEDIDA CAUTELAR DE SEQUESTRO VINCULADA A AÇÃO DECLARATÓRIA DE EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO FLORESTAL. EFEITO TRANSLATIVO.

INSTÂNCIA ESPECIAL. INAPLICABILIDADE.

PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA Nº 282/STF.

CONEXÃO RECONHECIDA. INEXISTÊNCIA DE

OBRIGATORIEDADE DE JULGAMENTO CONJUNTO. [...] 5. Segundo a jurisprudência desta Corte, a reunião dos processos por conexão configura faculdade atribuída ao julgador, sendo que o art. 105 do Código de Processo Civil

concede ao magistrado certa margem de discricionariedade para avaliar a intensidade da conexão e o grau de risco da ocorrência de decisões contraditórias. 6. Justamente por

traduzir faculdade do julgador, a decisão que reconhece a conexão não impõe ao magistrado a obrigatoriedade de julgamento conjunto. 7. A avaliação da conveniência do julgamento simultâneo será feita caso a caso, à luz da matéria controvertida nas ações conexas, sempre em atenção aos

objetivos almejados pela norma de regência (evitar decisões conflitantes e privilegiar a economia processual). 8. Assim,

ainda que visualizada, em um primeiro momento, hipótese de conexão entre as ações com a reunião dos feitos para decisão conjunta, sua posterior apreciação em separado não induz, automaticamente, à ocorrência de nulidade da decisão. [...]”

(STJ, REsp 1366921, 3ª T., Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julg. 24.2.2015)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL E AÇÃO DE

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CONTRATO. CONEXÃO RECONHECIDA. INEXISTÊNCIA

DE OBRIGATORIEDADE DE JULGAMENTO CONJUNTO.

AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. SÚMULA Nº 284/STF. VALOR ARBITRADO A

TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

RAZOABILIDADE. 1. Considera-se deficiente de

fundamentação o recurso especial que não indica os dispositivos legais supostamente violados pelo acórdão recorrido, circunstância que atrai a incidência, por analogia, do enunciado nº 284 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. 2.

Segundo a jurisprudência desta Corte, a reunião dos processos por conexão configura faculdade atribuída ao julgador, sendo

que o art. 105 do Código de Processo Civil concede ao magistrado certa margem de discricionariedade para avaliar a intensidade da conexão e o grau de risco da ocorrência de decisões contraditórias. 3. Justamente por traduzir faculdade

do julgador, a decisão que reconhece a conexão não impõe ao magistrado a obrigatoriedade de julgamento conjunto. 4. A avaliação da conveniência do julgamento simultâneo será feita caso a caso, à luz da matéria controvertida nas ações conexas,

sempre em atenção aos objetivos almejados pela norma de regência (evitar decisões conflitantes e privilegiar a economia processual). 5. Assim, ainda que visualizada, em um primeiro

momento, hipótese de conexão entre as ações com a reunião dos feitos para decisão conjunta, sua posterior apreciação em separado não induz, automaticamente, à ocorrência de nulidade da decisão. 6. O sistema das nulidades processuais é informado pela máxima "pas de nullité sans grief", segundo a qual não se decreta nulidade sem prejuízo, aplicável inclusive

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aos casos em que processos conexos são julgados separadamente. 7. O Superior Tribunal de Justiça, afastando a

incidência da Súmula nº 7/STJ, tem reexaminado o montante fixado pelas instâncias ordinárias a título de honorários advocatícios apenas quando irrisório ou abusivo, circunstâncias inexistentes no presente caso. 8. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, desprovido. (REsp 1255498/CE, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 29/08/2012)

PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.

NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.

INOCORRÊNCIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÕES

INDENIZATÓRIAS. CONEXÃO. EXISTÊNCIA.

CONVENIÊNCIA DA MEDIDA. 1. A conexão pressupõe a existência de causas que, embora não sejam iguais, guardam entre si algum vínculo, uma relação de afinidade, o que denota que o alcance da regra de conexão tem sido alargado, de modo a se interpretar 'o vocábulo 'comum', contido no texto legal, como uma indicação do legislador de que, para caracterizar a conexão, seria desnecessária a identidade total dos elementos da ação, bastando tão somente uma identidade parcial. 2. O art. 105 do CPC, em torno do qual existe certa divergência acerca de sua exata interpretação, afirma que, 'havendo conexão ou continência, o juiz, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, pode ordenar a reunião de ações propostas em separado, a fim de que sejam decididas simultaneamente'. 3. Parcela

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significativa da doutrina relativiza a cogência da norma, partilhando do entendimento de que existe margem para uma discricionariedade do magistrado na apreciação da conveniência ou não da reunião dos processos. Precedentes. 4. Esse permissivismo, porém, deve ser tratado com cautela, realizando-se um juízo criterioso, a fim de evitar a reunião desnecessária e desmedida de ações. O critério fundamental a ser sopesado pelo julgador nessa avaliação situa-se em torno da verificação da conveniência da reunião dos processos 5. O

art. 103 do CPC se limita a instituir requisitos mínimos de conexão, cabendo ao Juiz, conforme os elementos presentes em cada caso, aquilatar se a adoção da medida se mostra aconselhável e consentânea com a finalidade do instituto, que, em última análise, se presta a colaborar com a efetividade da justiça e da pacificação social. (...) (REsp 1.226.016/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/03/2011, DJe 25/03/2011)

Sob tal ambulação, consoante entendimento sedimentado no Superior Tribunal de Justiça, uma vez reconhecida a conexão, cabe ao magistrado aquilatar se, a apreciação conjunta das ações, será capaz de atender ao seu fim

último, qual seja, garantir a efetividade da justiça e pacificação social. Logo, a

avaliação da conveniência do julgamento simultâneo de ações conexas deverá ser feita caso a caso, à luz da matéria controvertida.

Completa-se com o entendimento da doutrina pátria, no sentido de que os processos coletivos possuem um viés diferenciado.

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“A tutela jurisdicional coletiva, portanto, nada mais é que um conjunto de normas processuais diferenciadas (espécie de tutela jurisdicional diferenciada), distintas daquelas aplicáveis no âmbito da tutela jurisdicional individual. Institutos processuais, como a competência, a conexão e a continência, legitimidade, coisa julgada, liquidação da sentença etc., recebem na tutela coletiva um tratamento diferenciado, variando o grau de distinção do tratamento dispensado pelos mesmos institutos no Código de Processo Civil.”3

Em artigo intitulado “Da competência no projeto de lei de Nova Ação Civil Pública”4, Athos Gusmão Carneiro pontua:

“O projeto, destarte – art. 4º, caput -, afirma competente, em competência corretamente qualificada como absoluta, o foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer (ameaça de lesão) o dano ou o ilícito , ou seja, o juiz mais próximo dos fatos, com a decorrente facilidade em pessoalmente (princípio da imediação) inquirir testemunhas e coordenar as provas técnicas e periciais, bem como as tentativas para uma conciliação entre as partes (...).

Pareceu mais adequado, pois, como regra geral, o ajuizamento da ação coletiva em uma das comarcas diretamente atingidas pelos danos ambientais e esta foi a solução adotada no projeto ora em exame no Congresso Nacional. Entretanto, se a extensão dos danos abranger igualmente a área da Capital do Estado (...), então sim, haverá motivo suficiente para que se imponha a

3

Manual de Direito Processual Civil, Daniel Amorim Assumpção Neves, p.115, 10 ªedição ampliada.

4

In Em defesa de um novo sistema de processos coletivos: estudos em homenagem à Ada Prelegrini Grinover. São Paulo, Saravaiva, 2010.

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competência, como juiz natural, de juízo (possivelmente juízo especializado) sediado no foro da própria Capital – art. 4º,§1º).”

É oportuno dizer que, na situação sob análise, as tutelas cautelares sequer apresentam identidade de causa de pedir ou pedido, apesar de o fato que deu ensejo às ações ser o mesmo, o que, mesmo se fosse, pelo teor da jurisprudência pátria, não impediria o julgamento em separado.

Ad argumentandum, ainda que restasse presente a conexão, a

ânsia por reunir as ações não pode deixar de levar em consideração o caso concreto.

In casu, é sobremodo importante que o juízo de Brumadinho conduza o processo e

julgamento de ação que visa a reparação dos danos causados às pessoas atingidas pelo rompimento das barragens da Mina do Córrego do Feijão.

Como salientado pela Culta Magistrada Federal, Juíza da 12ª Vara da Seção Judiciária de MG, do TRF da 1ª Região, Rosilene Maria Clemente de Souza Ferreira, em face do rompimento da barragem de Fundão em Mariana, “quando se tratar de ressarcimento patrimonial e moral das vítimas e familiares, como é o caso dos autos, as ações serão processadas e julgadas nos juízos das comarcas da residência dos autores”5.

Outro não foi o escólio do Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode extrair dos excertos do alhures citado acórdão no CC 144.922/MG, Rel. Ministra DIVA MALERBI (DESEMBARGADORA CONVOCADA TRF 3ª REGIÃO), PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 09/08/2016.

5Disponível em < http://minas1.com.br/plus/modulos/noticias/ler.php?cdnoticia=73240> Acesso em

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Com efeito, considerando a complexidade e multiplicidade de direitos violados dos atingidos e de todos aqueles que no território de Brumadinho sofreram danos na seara humanitária, o que era possível vislumbrar na ocasião da tutela cautelar antecedente, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, objetivando garantir o cumprimento da decisão judicial proferida no dia 26/01/2019, no bojo dos autos nº 0001827-69.2019.8.13.0090 pela Juíza daquela comarca que determinou à Vale S.A. assegurar à coletividade dos moradores atingidos integral assistência, devendo, para tanto, disponibilizar equipe multidisciplinar para o atendimento das demandas apresentadas, articulou junto ao Município de

Brumadinho e Vale S.A. o primeiro termo de pactuação de atos iniciais para assegurar assistência à saúde e socioassistencial aos atingidos pelo rompimento das barragens do Córrego do Feijão.

Em linhas gerais, por meio do sobredito pacto a Vale S.A. comprometeu-se a: repassar ao Município de Brumadinho uma soma em dinheiro em torno de três milhões de reais para o custeio da contratação temporária de servidores, locação de veículos e despesas com combustíveis; a adquirir e entregar ao Município de Brumadinho os equipamentos e insumos, bem como providenciar a locação de imóveis para sediar as novas equipes de saúde e psicossociais.

Assim sendo, em 06/02/2019, foi publicado no Diário Oficial de Brumadinho o Edital nº 001/2019 destinado à contratação de 132 (cento e trinta e dois) profissionais em caráter transitório para a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, a fim de atender às necessidades de calamidade pública provocadas após o rompimento da barragem.

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Nessa esteira, no dia 20/02/2019, a Vale S.A. depositou R$ 2.636.522. 79 (dois milhões, seiscentos e trinta e seis mil, quinhentos e vinte e dois reais, e setenta e nove centavos) em favor do Município de Brumadinho.

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Esse é um dos exemplos que demonstra as várias atuações que serão necessárias na Comarca de Brumadinho, decorrentes do crime ambiental, envolvendo aspectos estritamente humanos e econômicos da tragédia (tais como o ressarcimento patrimonial e moral de vítimas e familiares, combate ao abuso de preços, etc.) ou mesmo abastecimento de água potável que exigirão soluções

peculiares ou locais.

Os danos causados pelo rompimento das barragens do Córrego do Feijão deixaram, além de centenas de mortos e desaparecidos, um rastro de horror incalculável no território de Brumadinho, como vem sendo demonstrado não só no bojo do Inquérito Civil nº009019000012-6 lá em trâmite, que versa sobre os estragos no status quo socioeconômico das vítimas, mas a sua perpetuação, infelizmente, por um longo período de tempo.

Este é o cenário da comarca de Brumadinho: doenças de pele já surgem nas crianças, depressão nos idosos que deixaram suas terras e fugiram com a roupa do corpo, a triste perda de parentes queridos de uma maneira impensável, arrimos de família que se foram e não mais voltarão, comércios destroçados, lares totalmente destruídos e/ou sujos de lama, plantações e sonhos soterrados, saques, pânico, medo e vidas despedaçadas, apenas para resumir. As vidas dos brumadinhenses e de todos que estavam naquele território naquele dia fatídico precisam ser reparadas e lá – na comarca de Brumadinho! O atendimento das exigências e necessidades tanto dos indivíduos quanto da transindividualidade, in

casu, perpassa pela manutenção do trâmite da cautelar socioeconômica naquela

Comarca, sob pena de não se oferecer instrumentos processuais efetivos aos anseios

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Além das violações contra o direito à moradia, direito à subsistência e ao trabalho, direito ao lazer, inclusive da infância, etc., outras violações ainda vêm ocorrendo diuturnamente na Comarca, em face do rompimento das barragens do Feijão, sendo imperioso o trâmite processual da futura ACP e atual cautelar nº 0001827-69.20198.13.0090 no Juízo de Brumadinho, evitando-se a

revitimização. Ao contrário, se ocorrer a remessa para o ínclito Juízo da Fazenda Estadual, estarão impossibilitadas de acompanhar de perto o processo, complicando e atrapalhando, sem sombras de dúvidas, a produção de provas, a implementação do contraditório e ampla defesa, logo, impedindo a plena reparação.

Não resta dúvida que a tutela cautelar antecedente ajuizada pelo Parquet nos autos 0001827-69.2019.8.13.0090, trata de questão pontual e, tramitando em Brumadinho, facilitará o acesso judicial das pessoas atingidas pela tragédia ambiental e humana, corroborando, assim, para o exercício do direito à ampla defesa, razão pela qual pugna o Ministério Público que os autos permaneçam na Comarca de Brumadinho, onde deverão ser julgados os danos ocorridos nos limites territoriais daquele Município em relação à reparação socioeconômica e as

indenizações que abarcam danos por perdas materiais, emocionais, urbanísticas e sociais em prol da população atingida.

III.2 DO BLOQUEIO JUDICIAL – MEDIDA NECESSÁRIA E PRODUCENTE

Alega a agravante que:

é flagrantemente desarrazoada, com o devido respeito, a r. decisão agravada, quando ignora que a Vale é uma das três

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maiores empresas mineradoras do mundo, que certamente não está a se esgueirar, dissipando o seu patrimônio de forma descontrolada. (...) A decisão agravada ignora que o comprometimento da robusta quantia de R$ 5 bilhões impacta, muito negativamente, qualquer empresa, que, privada dessa soma, não poderá utilizá-la no desenvolvimento dos seus negócios, indispensável para mantê-la viva e atuante. (...) Em suma, o que se tem é, de um lado, empresa hígida, que está adotando todos os atos necessários ao amparo das vítimas do acidente (...) e, de outro, um pleito desnecessário e genérico, baseado em premissas que o próprio MPMG, em sua experiência no caso Fundão, já constatou ser equivocada e precipitada.

O bloqueio de R$ 5.000.000.000,00 (cinco bilhões) foi determinado no dia 26/01/2019, pela juíza de plantão da Comarca de Brumadinho, como medida necessária para garantir o integral ressarcimento dos atingidos pelo rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão. Impende salientar que, ao contrário do que afirma a agravante, a quantia retida é assertiva e responsável, considerando que, de acordo com o boletim mais recente divulgado pela defesa civil, até o presente momento já somam 2066 (Duzentos e seis) o número de mortos identificados e 1027 (cento e dois) o número de desaparecidos.

A abrupta alteração da rotina dos atingidos, para dizer o mínimo, gerou impactos negativos à saúde mental, física e emocional dessas pessoas,

6 Disponível

em<http://www.defesacivil.mg.gov.br/index.php/component/gmg/page/590-informacoes1703> Consulta em 21/03/2019.

7 Disponível

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sendo difícil mensurar a extensão dos danos. Além disso, o mar de lama solapou projetos de vidas, estabelecimentos comerciais, propriedades privadas, destruiu o patrimônio social e cultural e, por conseguinte, a memória de um povo, de famílias, de indivíduos.

Contabilizar danos irreparáveis ou de difícil reparação não é tarefa fácil, mesmo assim a agravante insiste que “além de redundante, o valor de cinco bilhões é, em si, exagerado.” Aduz ainda que, no caso de Mariana, quando se rompeu a barragem de Fundão, “muito mais eficaz foi a constituição pela Vale e pelas demais rés daqueles processos, de uma Fundação que já dispensou quantias muito mais expressivas, todas em prol da reparação dos danos ambientais e das comunidades envolvidas.”

É de ser revelado que a fundação constituída pela Vale e outras empresas, trata-se da Fundação Renova, pessoa jurídica de direito privado, criada para reparar os danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana. Não obstante, em várias atas de reunião acostadas nos Procedimentos de Atividade Fim n° MPMG 0024.16.013175-1 e MPMG 0024.17.006566-8, a atuação da Fundação Renova foi questionada, por exemplo, quanto aos seguintes aspectos: atraso no pagamento de aluguéis das pessoas desalojadas de suas casas após o rompimento da barragem de Fundão, ausência de transparência sobre o andamento dos 23 (vinte e três) programas socioeconômicos conduzidos pela fundação Renova, e até mesmo problemas relacionados ao auxílio de políticas de saúde e de assistência Social no Município de Mariana.

Também se deve trazer à lume que a ineficiência da Fundação Renova, por diversas vezes foi e tem sido denunciada não só pelos veículos de

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comunicação, mas por organismos internacionais de direitos humanos, sendo apontada como entidade violadora de direitos dos atingidos e à serviço das mineradoras. Veja:

Fonte:

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Fonte:

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/04/fundacao-recebe-ultimato-apos-denuncias-sobre-vitimas-de-mariana.shtml

Fonte: https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2018/11/05/interna_gerais,1003230/comitiva-de-atingidos-protesta-contra-fundacao-renova-em-londres.shtml

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Fonte:

https://www.xapuri.info/desastre-ambiental/mariana-fundacao-renova-e-braco-das-mineradoras-diz-representante-de-atingidos-pelo-desastre/

Como se não bastasse, a Fundação Renova que, em tese, deveria agir de forma diligente em prol dos interesses dos atingidos, durante o último recesso forense (dezembro de 2018) pleiteou em juízo que fossem descontados das indenizações devidas aos pescadores do Rio Doce, os valores pagos a título de auxílio financeiro emergencial.

Nota-se que, ao contrário do que sustenta a agravante, a Fundação Renova não tem atendido a contento as necessidades dos atingidos de Mariana e passados três anos após o rompimento da barragem de Fundão, as vítimas ainda aguardam por uma indenização justa.

Dessa forma, percebe-se que é igualmente descabido a agravante tecer comparações entre as tragédias de Brumadinho e Mariana, afirmando

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que neste município os danos ambientais e materiais tiveram extensões muito maiores do que naquele, sendo dispensada uma garantia no valor R$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões e duzentos milhões de reais). Infeliz é essa comparação, pois, é de trivial sabença que a tragédia de Brumadinho já contabiliza um número de vítimas fatais infinitamente maior do que em Mariana.

Ora, data vênia, desde o dia 25/01/2019, o caos generalizado instaurou-se no município de Brumadinho: estradas interditadas, comunidades como Melo Franco e Aranha estão ilhadas, centenas de pessoas desalojadas de suas casas, helicópteros que sobrevoam a região carregando corpos, sistema de transporte prejudicado, arrefecimento ou fechamento de comércios, crianças impossibilitadas de irem à escola, suspensão da captação de água do Rio Paraopeba pela COPASA devido à chance de contaminação do rio, soterramento de pessoas, animais e plantas.

No caso das comunidades dependentes da terra e de recursos naturais, essa situação resulta na perda de acesso aos meios tradicionais de vida, o que inclui a agricultura, a pesca, a pecuária e extração vegetal.

Registre-se ainda que, de acordo com levantamentos preliminares durante reunião da Força-Tarefa composta pelo MPMG, MPT, Polícia Civil, DPE e AGE, segundo documentos oficiais apresentados pela própria Vale, na hora do rompimento da barragem havia mais de (400) quatrocentos empregados na área da empresa em Brumadinho (lista em anexo).

Sob o influxo dessas considerações, resta induvidoso que, no atual momento, é impossível mensurar a real extensão dos danos humanísticos e socioeconômicos causados pelo rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, o que justifica a constrição patrimonial determinada pelo juiz a quo.

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Outrossim, não é despiciendo observar que, diante das diversas omissões e contradições da Vale no rompimento da barragem de Fundão em Mariana, a constrição de bens consubstancia-se como valor preliminar de reparação destinado ao custeio dos danos provocados pelo desastre que vitimou centenas de pessoas em Brumadinho e arrasou com o município em numerosos vieses.

A dimensão dessa tragédia, por si só, é fator de risco e insegurança à garantia dos direitos fundamentais dos atingidos, que diariamente e várias horas ao dia são revitimizados pela falta de moradia adequada, trabalho, lazer, vida comunitária, e pelo rompimento do equilíbrio do ecossistema do Rio Paraopeba, um dos principais afluentes do Rio São Francisco.

Logo, não há que se entender como em demasia o valor bloqueado, já que, por enquanto, os danos materiais, físicos e emocionais da população brumadinhense mostram-se incalculáveis, revelando-se infundadas as alegações da agravante.

Adicione-se, ainda, que, ao contrário do que afirma a Agravante, os valores bloqueados vinculados ao presente feito não colocam em risco, por si só, a saúde financeira da empresa, tampouco comprometem sua atividade ou mesmo a implementação das ações emergenciais. Ora, segundo informações prestadas pela própria Vale S.A aos acionistas, em prestação de contas existente em seu site, a receita líquida no 3º trimestre de 2018 foi de 37,9 bilhões de reais (trinta e sete bilhões e novecentos milhões de reais). O lucro líquido recorrente foi de 8,3 bilhões de reais (oito bilhões e trezentos milhões de reais) só no 3º trimestre de 2018. Portanto, valores bloqueados são inferiores ao lucro do 3º trimestre de 2018, os quais seriam distribuídos aos acionistas, na forma de dividendos.

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Da mesma forma, não há que se falar em violação de direitos fundamentais da Agravante – pessoa jurídica que atua no ramo da mineração, sabidamente atividade degradadora do meio ambiente, conforme reconhecido em sede constitucional (art. 225, §2º) responsável pelo maior desastre ambiental, trabalhista e social do país – ela sim contumaz violadora de direitos fundamentais alheios.

A constrição patrimonial cautelar como instrumento para garantir recursos suficientes à reparação de danos é medida prevista na lei processual pátria, inerente ao poder geral de cautela do Juiz e amplamente utilizada pelos Tribunais Nacionais como forma de assegurar a efetividade de decisões judiciais que reconhecem responsabilidade civil por danos.

Aliás, imperioso salientar que mesmo com as contas bloqueadas, a Agravante, quando instada pelo juízo a quo, efetuou em prazo exíguo (12 horas) depósito judicial de R$5.000.000.000,00 (cinco bilhões de reais), referente à presente demanda, o que demonstra sua capacidade financeira atual.

III.3 DA PRESENÇA DE REQUISITO AUTORIZADOR DA CONSTRIÇÃO PATRIMONIAL

Quanto à existência dos pressupostos básicos que legitimam a tutela cautelar, não há o que tergiversar diante da notoriedade dos fatos publicamente conhecidos em âmbito nacional e internacional, não havendo subterfúgio capaz de ocultá-los, tamanha a repercussão. Nesse sentido, a BBC News, através de imagens, conferiu visibilidade ao fumus boni iuris. Veja.

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As imagens acima falam por si só. Mesmo assim, a agravante insiste que não estão presentes os requisitos consistentes no fumus boni iuris e

periculum in mora para a concessão da tutela que autorizou o a constrição patrimonial.

É de clareza insofismável que tanto a probabilidade do direito (fumus boni juris), quanto o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora) encontram-se presentes e justificam a medida pleiteada, nos termos dos artigos 300 e 301 do Código de Processo Civil.

Sobre o tema ensina Humberto Theodoro Junior que:

As tutelas provisórias têm em comum a meta de combater os riscos de injustiça ou de dano, derivados da espera, sempre longa, pelo desate final do conflito submetido à solução judicial. Representam provimentos imediatos que, de alguma forma, possam obviar ou minimizar os inconvenientes suportados pela parte que se acha numa situação de vantagem aparentemente tutelada pela ordem jurídica material (fumus boni iuris). Sem embargo de dispor de meios de convencimento para evidenciar, de plano, a superioridade de seu posicionamento em torno do objeto litigioso, o demandante, segundo o procedimento comum, teria de se privar de sua usufruição, ou teria de correr o risco de vê-lo perecer, durante o aguardo da finalização do curso normal do processo (periculum in mora). Correspondem esses provimentos extraordinários, em primeiro lugar, às tradicionais medidas de urgência – cautelares (conservativas) e

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perigo de dano, que possa advir do tempo necessário para cumprimento de todas as etapas do devido processo legal.8

Complementam Cintra, Grinover e Dinamarco:

A atividade cautelar foi preordenada a evitar que o dano oriundo da inobservância do direito fosse agravado pelo inevitável retardamento do remédio jurisdicional (periculum in mora). O provimento cautelar funda-se antecipadamente na hipótese de um futuro provimento jurisdicional favorável ao autor (fumus boni iuris): verificando-se os pressupostos do fumus boni iuris e do periculum in mora, o provimento cautelar opera imediatamente, como instrumento provisório e antecipado do futuro provimento definitivo, para que este não seja frustrado em seus efeitos. Assim, a garantia cautelar surge, como que posta a serviço da ulterior atividade jurisdicional, que deverá restabelecer, definitivamente, a observância do direito: é destinada não tanto a fazer justiça, como a dar tempo a que a justiça seja feita.9

Seguindo esse fio condutor, o dano ambiental, socioeconômico e humano gerado pelo rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, encontra-se exaustivamente estampado em todos os veículos de comunicação do país e do mundo, sendo indiscutível a responsabilidade objetiva da agravante em indenizar e reparar os danos.

8 JUNIOR THEODORO, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito

processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. I, 56. ed. rev., atual. e ampl., Rio de Janeiro: Forense, 2015.

9 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido

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No que concerne ao perigo de dano ou risco de resultado útil do processo, considerando a magnitude da tragédia somada à recente constatação de instabilidade de diversas barragens sob a responsabilidade da agravante espalhadas pelo Estado de Minas Gerais, não se pode descartar a ameaça de prejuízos à futura efetividade do provimento jurisdicional definitivo.

Conforme vem sendo divulgado na mídia, após o rompimento da barragem de Brumadinho, centenas de pessoas foram obrigadas a deixar suas casas e acomodar-se em hotéis ou casa de parentes por causa das barragens B3 e B4 (Mina Mar Azul em Macacos, distrito de Nova Lima); barragens Vargem Grande, do Complexo Vargem Grande em Nova Lima; e Forquilha I, II e III e Grupo, na Mina Fábrica (Ouro Preto), todas sob a responsabilidade da agravante.

Segundo a agravante, a evacuação das pessoas que se encontram nas proximidades das barragens acima mencionadas trata-se de “medida preventiva para garantir a segurança de todos enquanto são realizadas as primeiras atividades de descaracterização das barragens a montante, visando à aceleração dos projetos”10. Contudo, essa justificativa mostra-se dissociada da realidade, qual seja, risco de gatilhos para modos de falhas por liquefação das barragens, o que faz com que um material rígido se comporte como fluido podendo, inclusive, causar o colapso da estrutura de barragens. Foi por esse motivo que, em 20/02/2019, a Agência Nacional de Mineração interditou as barragens Forquilha I, II e III e Grupo. Repare:

10 Disponível

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Cuida-se analisar que, o caso concreto, por si mesmo, confirma ainda mais a presença dos requisitos autorizadores da constrição patrimonial, restando mais do que óbvia a existência da plausibilidade do direito invocado em sede de tutela cautelar antecedente.

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III.4 DA INOBSERVÂNCIA AO ATENDIMENTO EMERGENCIAL

Em suas razões de recurso, afirma a agravante que está cumprindo as obrigações a ela imposta na decisão objurgada. Destaca que não tem poupado esforços no amparo das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem.

De fato, emergencialmente, em observância à determinação

judicial, a agravante deveria ter adotado medidas que assegurassem total apoio aos

atingidos. Não obstante, desde o dia 25/01/2019, inúmeras pessoas, famílias e comunidades aguardam por uma solução emergencial que ainda não sobreveio. Mesmo assim sustenta a agravante que:

(...) especificamente em relação à garantia de que todas as medidas necessárias serão adotadas, vale repetir à exaustão: não é necessária garantia alguma, pois as medidas estão sendo adotadas e continuarão a ser. (...) Nesse sentido, é manifesta a

falta de interesse de agir do MINISTÉRIO PÚBLICO quanto a esse pedido, tendo em vista que a VALE adotará todas as medidas necessárias ao endereçamento dos danos decorrentes do rompimento da barragem da Mina de Feijão.

Ora, não há que se falar aqui em falta de interesse de agir do Ministério Público.

Aliás, até o momento, centenas das pessoas privadas de suas moradias e/ou impossibilitadas de exercer suas atividades econômicas, não receberam qualquer auxílio pecuniário emergencial. A cada dia que passa sem que a agravante adote medidas concretas de reparação, os atingidos são submetidos a violações continuadas a seus direitos fundamentais.

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Com efeito, no intuito de conhecer a necessidades emergências dos atingidos, a Força-Tarefa do MPMG foi a campo: visitou locais afetados pela avalanche de lama, bem como hotéis e pousadas onde estão hospedadas pessoas que foram desalojadas de suas casas, que perderam tudo ou que acompanham as buscas de familiares desaparecidos. Os relatórios e certidões referentes às visitas seguem em anexo.

Entre os problemas levantados pela população visitada nas localidades de Brumadinho, ressaltaram o intenso mal cheiro proveniente das águas do rio Paraopeba, manifestam preocupação com as consequências para a saúde dos que moram nas imediações do leito do rio, a incidência de um grande número de insetos, dificuldade de acesso aos equipamentos de saúde, transporte, prejuízos à economia regional (serviços, comércio, agricultura, pecuária e pesca), falta de informações com relação às medidas reparatórias.

Ocorreu no dia 30/01/2019, a primeira visita às imediações ao Córrego do Feijão, ocasião em que os moradores locais reclamaram que o posto de atendimento da Vale S.A. situado na comunidade não tem prestado um bom acolhimento aos moradores, tratando-os de forma desrespeitosa.

Nos hotéis e pousadas visitadas em Brumadinho, Betim, Belo Horizonte, Casa Branca e Mário Campos, muitos se queixaram de, por vários dias, ter recebido comida azeda, falta de roupas, calçados, materiais de higiene pessoal (sabonete, absorvente, escova de dente, creme dental, antitranspirante, etc.), sabão e amaciante para lavar roupas, dificuldade de transporte para deslocar-se, crianças impossibilitadas de irem para escola, demora na realocação das famílias em casas alugadas, insatisfação quanto a rotatividade de funcionários da Vale (que se

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apresentam como voluntários) que comparecem às pousadas sempre perguntando sobre demandas, mas sem efetivamente resolvê-las.

No dia 05/02/2019, famílias domiciliadas na região do Pires hospedadas na Pousada Jangada dos Tucanos (Casa Branca), relataram que as casas estavam sendo saqueadas após sua saída, e por isso algumas pessoas retornaram sem a devida autorização da Defesa Civil.

Outrossim, muitas foram as pessoas hospedadas em pousadas que se queixaram de dificuldade na comunicação devido à ausência de sinal de telefone, ou perda dos aparelhos, não sendo informadas acerca das assembleias com os atingidos, de modo a se manterem isolados das decisões tomadas.

Em resposta às necessidades emergenciais dos atingidos, por meio de vídeo11 divulgado no dia 08/02/2019, o líder do Grupo de Resposta Imediata e diretor da Vale, Claudio Alves, informou sobre a ampliação da ajuda humanitária emergencial. Segundo Claudio Chaves, a partir de 11/02/2019, as pessoas que moravam na zona de autossalvamento receberiam a título de doação R$50.000,00 (cinquenta mil reais), e aqueles que exerciam atividades produtivas ou comerciais na referida zona receberiam R$15.000,00 (quinze mil reais).

Os valores anunciados pela Vale são destinados exclusivamente a propriedades localizadas dentro da zona de autossalvamento, ou seja, região à jusante da barragem, numa extensão de até 10km, definida no plano de ação de emergência das barragens de mineração, de modo a restringir quem são os atingidos e, por conseguinte, direitos.

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Ocorre que, tratando-se de um empreendimento de mineração, o conceito de atingidos é muito mais amplo, conforme destaca Carlos Vainer, Professor da UFRJ:

(...) a noção de atingido não é nem meramente técnica, nem estritamente econômica. Conceito em disputa, a noção de atingido diz respeito, de fato, ao reconhecimento, leia-se legitimação, de direitos e de seus detentores. Em outras palavras, estabelecer que determinado grupo social, família ou indivíduo é, ou foi, atingido por determinado empreendimento significa reconhecer como legítimo – e, em alguns casos, como legal – seu direito a algum tipo de ressarcimento ou indenização, reabilitação ou reparação não pecuniária (...) Assim, ao abordar a discussão acerca do conceito de atingido é necessário compreender que se está discutindo acerca do reconhecimento e legitimação de direitos.12

Dessa forma, a título de exemplificação, são considerados atingidos pelo rompimento da Mina Córrego do Feijão:

1. Proprietário ou posseiro residente nos locais atingidos; 2. Morador, ocupante, inquilino, arrendatário, rendeiro,

herdeiro, autônomo e trabalhador rural – não detentor da posse ou do domínio da terra, que morava ou possuía benfeitorias nos locais atingidos;

12 VAINER, Carlos. Conceito de ‘atingido’: uma revisão de debate e diretrizes. In: Franklin Daniel

Rothman (Org). Vidas Alagadas – conflitos socioambientais, licenciamento e barragens. 1ª Ed. Viçosa, UFV, 2008.

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3. Morador possuidor de qualquer bem material destruído ou danificado pelos rejeitos da barragem, o que inclui veículos, móveis, roupas, eletrodomésticos e outros bens atingidos pelos rejeitos;

4. Visitantes/turistas que perderam seus bens em razão da tragédia;

5. Pessoas economicamente dependentes da terra e dos recursos naturais afetados pela lama;

6. Residentes que tiveram afetadas suas rotinas de vida e/ou sofreram impactos decorrentes do caos instaurado no Município, comerciantes, empreendedores locais, produtores rurais que perderam ou tiveram afetados seus meios de trabalho e/ou subsistência;

7. Comunidades tradicionais (indígenas, quilombolas e outros), residentes nas áreas afetadas;

8. Pessoas que foram deslocadas de suas moradias compulsoriamente,

9. Todos aqueles que tiveram restrição de acesso a recursos e serviços básicos necessários à sobrevivência, como por exemplo: água potável, saúde, educação, moradia e alimentação;

10. Pessoas que perderam animais de estimação, animais criados para a sua subsistência, e animais destinados à atividade comercial;

11. Todos aqueles que sofreram danos à saúde física ou mental; 12. Todos que perderam familiares e/ou amigos.

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As pessoas acima relacionadas, por se encaixarem no conceito de atingidos, fazem jus a toda e qualquer ajuda emergencial humanitária a ser disponibilizada pela agravante, bem como todos os moradores de Brumadinho e outras situações não listadas acima, mas que se encontram abarcadas dentro da ampla compreensão do termo atingidos.

Todavia, a Sra. Sônia Araújo, residente na Rua Filomena, 223, Córrego do Feijão/Brumadinho, onde foram encontrados dez corpos (segmentos de corpos inclusive), ao procurar um dos postos de atendimento da Vale foi informada que não teria direito à doação de cinquenta mil reais, pois, de acordo com mapa abaixo, o seu imóvel não se encontra dentro da zona de autossalvamento.

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Ratificando formalmente o indeferimento da doação, no dia 20/02/2019, a Sra. Sônia recebeu o seguinte e-mail:

Cumpre assinalar que, a Sra. Sônia após visualizar em seu quintal a cabeça de uma das vítimas fatais da tragédia, entrou em colapso e passou a fazer uso de antidepressivos.

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Outro exemplo de flagrante desídia da agravante para com os atingidos é o caso da Sra. Marineide e seu marido Anael José da Silva que requereram a doação de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), mas tiveram o pedido negado. Em resposta, Marineide questionou à Vale o porquê, antes do rompimento da barragem, ao ser realizado mapeamento, a sua residência encontrava-se dentro da zona de autossalvamento, e agora, não mais. A Vale, por sua vez, encaminhou um segundo email retificando a informação anterior. Comunicou que, após nova análise, a empresa identificou que a residência estaria localizada na zona de autossalvamento, segundo os parâmetros próprios da ora agravante, o que fazia de Marineide elegível para a doação de cinquenta mil reais.

Esses, dentre tantos exemplos, demonstram ser incabível admitir que o causador do dano aponte quem deva ou não ser sujeito de direito à reparação. Confira abaixo a troca de e-mails entre a Vale e a atingida Marineide:

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Como se não bastasse, a doação de quinze mil reais destinada a quem exercia atividades produtivas ou comerciais na zona de autossalvamento, permaneceu suspensa por nove dias. Isso porque, após a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais analisar os documentos de registro apresentados pela Vale, verificou que, da forma como estavam redigidos davam margem para que, no futuro, o indigitado valor fosse descontado das indenizações em caráter de compensação, motivo pelo qual aconselhou comerciantes e produtores rurais a não assinarem o referido documento.

Fonte:

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Em meio a tudo isso, as regiões do Córrego do Feijão e Parque das Cachoeiras foram infestadas por insetos, razão pela qual a Prefeitura de Brumadinho, por intermédio da Defesa Civil e Ministério Público Estadual, diante da real possibilidade de proliferação de vetores de doenças endêmicas a exemplo da dengue e febre amarela, demandou à Vale apoio logístico no combate a tais doenças. Em que pese ter havido a contratação de um veículo fumacê que percorreu as ruas do Córrego do Feijão e Parque das Cachoeiras como prevenção ao controle de pragas, já existem relatos de que, após o rompimento da barragem, essas localidades vêm sendo acometidas por dengue, o que só confirma o estudo realizado pela Fundação Owsvaldo Cruz , divulgado no dia 05/02/2019, a seguir:

Estudo realizado pela Fiocruz, que avaliou os impactos imediatos do desastre da mineradora Vale em Brumadinho, alerta para a possibilidade de surtos de doenças infecciosas - dengue, febre amarela e esquistossomose - mudanças no bioma e agravamento de problemas crônicos de saúde, como hipertensão, diabetes e doenças mentais. Mapas construídos pela instituição permitiram identificar residências e unidades de saúde afetadas, comunidades potencialmente isoladas e as áreas soterradas pela lama. Os resultados serão apresentados na próxima terça-feira (5/2). (...) Além disso, destacou o pesquisador, as alterações ecológicas provocadas pelo desastre podem promover a transmissão de esquistossomose, principalmente se levado em consideração que grande parte do município de Brumadinho e municípios ao longo do rio Paraopeba não é coberta por sistemas de coleta e tratamento de esgotos. "A transmissão de esquistossomose é facilitada pelo contato com rios contaminados por esgotos domésticos e com

Referências

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