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Repositório Institucional UFC: As fronteiras do homem-político que tem para vida o projeto de ser, serenamente, inclusive humano

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Academic year: 2018

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Revist~ntrevis a

EDCBA

E n t r e v i s t a c o m L ú c i o G o n ç a l o d e A l c â n t a r a , d i a 1 º d e d e z e m b r o d e 2 0 1 1 .

J o ã o V i c t o r -hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAE m u m liv ro d e d e p o im e n -to s à c o le ç ã o G e n te , o s e n h o r d is s e : "E u

a c a b e i re p ro d u z in d o , s e m q u e p a ra is s o te -n h a fe ito u m e s fo rç o e s p e c ífic o , a c a rre ira d o m e u p a i n a M e d ic in a e n a p o lític a . Q u a s e to d o s o s c a rg o s q u e e u o c u p e i, e le ta m b é m o c u p o u ". E e u q u e ro p e rg u n ta r q u a l a im p o r-tâ n c ia d a fig u ra e d a p e rs o n a lid a d e d o d o u to r W a ld e m a r A lc â n ta ra n a s u a tra je tó ria .

L ú c i o - O lh a , a im p o rtâ n c ia é m u ito g ra n -d e . E m u m a -d e s s a s e n tre v is ta s , -d is s e u m a c o is a : q u e e le , p a ra m im , fo i m a is im p o rta n te p e lo e x e m p lo , p e la s a ç õ e s , d o q u e p e la p a -la v ra . E ra u m a p e s s o a u m ta n to re s e rv a d a ... E m n e n h u m m o m e n to in s is tiu n e m p ra e u s e r m é d ic o n e m p ra s e r p o lític o . C la ro q u e o a m b ie n te e m c a s a a u to m a tic a m e n te te v e a l-g u m a in flu ê n c ia n is s o . M a s n ã o h a v ia ... "A h , e u s o u m é d ic o , q u e ro te r u m filh o m é d ic o !" A g e n te v ê m u ito is s o , n é ? O u e n tã o "E u q u e ro q u e v o c ê s e ja m e u s u c e s s o r n a p o lític a ". Is s o fo i s e d a n d o n a tu ra lm e n te . T e m u m a fo to a í,

q u e e s tá lá n o m e u g a b in e te d o In s titu to

WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( d o C â n c e r d o C e a r á , d o q u a l L ú c io

é

p r e s id e n

-t e ) , q u e in c lu s iv e m o s tra a fo to d e le , d e p o is ( a ) m in h a n o s m e s m o s m o m e n to s . Q u a n d o

e le fo i s e n a d o r, ( e q u a n d o ) e u fu i s e n a d o r. E le

fo i v ic e -g o v e rn a d o r, e u fu i v ic e -g o v e rn a d o r. E le fo i g o v e rn a d o r, e u fu i g o v e rn a d o r. E le e ra m é d ic o , e u fu i m é d ic o . E u fu i p re fe ito , e le n ã o fo i, m a s e le fo i d e p u ta d o e s ta d u a l, e u n ã o fu i. M a s h á u m a tra je tó ria m u ito s e m e lh a n te . Is s o s e d e u , v a m o s d iz e r a s s im , d e u m a m a n e ira in s tin tiv a . C la ro , q u a n d o e le e ra p o lític o , e u , c ria n ç a , a in d a ( o ) a c o m p a n h a v a e m v ia g e n s ,

a s s is tia re u n iõ e s . O q u e e u q u e ro d iz e r é q u e n ã o h o u v e u m a im p o s iç ã o d e d iz e r: "N ã o , e u v o u lh e p re p a ra r". Is s o fo i s e d a n d o n a tu ra l-m e n te . É n e s s e s e n tid o q u e e u s e m p re fa lo s o b re e s s a s e m e lh a n ç a d e tra je tó ria . E a in flu ê n c ia q u e fo i ... E le , p a ra m im , é u m a re fe -rê n c ia m u ito im p o rta n te n a m in h a v id a , p e la s u a c o n d u ta , p e la s u a tra je tó ria d e v id a e tu d o is s o .

R a í s s a - O p a i c o s tu m a s e r u m g ra n d e h e -ró i p a ra o s filh o s , u m g ra n d e e x e m p lo . C o m o é q u e fo i p a ra o s e n h o r o c u p a r o s c a rg o s q u e o p a i o c u p o u , d e c e rta fo rm a ? O q u e s ig n ifi-c o u p a ra o s e n h o r s e r u m p o u ifi-c o o ( s e u ) p a i

ta m b é m ?

L ú c i o - O lh a , e u a c h e i is s o im p o rta n te n o s e n tid o d e q u e e u h o n re i o n o m e d e le o u a tra je tó ria d e le , q u e r d iz e r, c o rre s p o n d i a u m a

e x p e c ta tiv a q u e e le tin h a . A m in h a m ã e ( M a -r ia D o lo r e s A lc â n t a r a e S ilv a ) e ra m a is e x

-p líc ita n is s o . M a s e u v ia d e s s a fo rm a , c o m o u m a re a liz a ç ã o p e s s o a l e q u e a te n d ia , v a m o s d iz e r a s s im , a u m a e x p e c ta tiv a d e le .

I g o r - D o u to r L ú c io , o s e n h o r fa la m u ito d o s e u p a i e c ito u a s u a m ã e . T a m b é m n o liv ro d a c o le ç ã o G e n te , o s e n h o r a firm o u q u e a s u a m ã e e s ta v a c o n s ta n te m e n te te n ta n d o re s o lv e r o s p ro b le m a s d e o u tra s p e s s o a s . N a p ré -e n tre v is ta , a A u x ilia d o ra ( A u x ilia d o r a B e -n e v id e s , s e c r e t á r ia q u e t r a b a lh a c o m L ú c io h á m a is d e 3 0 a n o s ) in c lu s iv e fa lo u q u e o s e

-n h o r te m u m p o u c o d is s o , q u e u m a g ra -n d e c a ra c te rís tic a s u a é a d is p o s iç ã o d e s e rv ir o s o u tro s . Q u e e x e m p lo s a d o n a D o lo re s d e ix o u p a ra o s e n h o r, q u e o s e n h o r c a rre g a ta n to n a p ro fis s ã o c o m o n a v id a p e s s o a l?

L ú c i o - O lh a , a m in h a m ã e é u m a p e s s o a q u e n ã o tin h a c u rs o s u p e rio r n e m n a d a , m a s e ra u m a m u lh e r m u ito a tiv a , m u ito lig a d a n a s c o is a s , m u ito c o m u n ic a tiv a . G o s ta v a rn u to d e p o lític a , n ã o p ra s e c a n d id a ta r, m a s d o s b a s tid o re s d a p o lític a , d o s c o n ta to s c o m a s p e s s o a s . E e la tin h a e s s a c a ra c te rís tic a re a l-m e n te . S e v o c ê le v a s s e u l-m a s s u n to p a ra e la , p e d in d o p a ra e la a ju d a r, e la to m a v a a q u ilo , n ã o d e s c a n s a v a e n q u a n to n ã o e s g o ta s s e to -d a s a s p o s s ib ili-d a -d e s d e a te n d e r. E u ta m b é m te n h o u m a n o rm a c o m o p o lític o e c o m o p e s -s o a , q u e e u d ig o -s e m p re a -s -s im : "Q u e m q u e r fa la r c o m ig o , fa la ". P o d e d e m o ra r u m p o u c o m a is , à s v e z e s , ( p o r ) p ro b le m a d e a g e n d a ...

( E u ) g o s to d e a te n d e r a q u e m p ro c u ra fa

-la r c o m ig o . E is s o , à s v e z e s , te m u m c u s to e m o c io n a l, p o rq u e v o c ê to m a c o n h e c im e n to d e m u ito s p ro b le m a s d ia n te d o s q u a is v o c ê p o u c o o u n a d a p o d e fa z e r. M a s e u a c h o q u e , c o m o p o lític o , e u c o n s id e ro is s o u m a o b ri-g a ç ã o . V o c ê te m d e e s ta r d is p o n ív e l, te m d e p ro c u ra r re c e b e r a s p e s s o a s , o u v ir e , s e fo r p o s s ív e l, a ju d a r. S e fo r in c lu s iv e u m a c o is a ju s ta , e v o c ê p o s s a d a r s u a c o n trib u iç ã o . E u a c h o q u e is s o e u h e rd e i u m p o u c o d e la .

R a n n i e r y - N a s u a in fâ n c ia , o s e n h o r já c o n v iv ia c o m m u ito s p o lític o s im p o rta n te s d a q u i d o E s ta d o d o C e a rá . O s e n h o r le m b ra c o m o é q u e v ia , ( q u a l) a im a g e m q u e fa z ia

d e s s e s p o lític o s ?

L ú c i o - E u g o s ta v a m u ito ... O m e u p a i fo i p re s id e n te d o P S D ( P a r t id o S o c ia l D e m o c r a -t a , f u n d a d o e m 1 9 4 5 e e x t in t o n a d it a d u r a m ilit a r ) , q u e e ra o p a rtid o a q u i, a té s e r e x tin

-L Ú C IO A -L C Â N T A R A I9 9

A in d ic a ç ã o d o n o m e d e L ú c io A lc â n ta ra p a ra a re v is ta E n tre v is ta fo i d e J o ã o V ic to r. E le o b s e rv o u q u e o e x -g o v e rn a d o r e ra o ú n ic o , d o s p rin c ip a is p o lític o s v iv o s d o C e a rá , q u e a in d a n ã o fo ra e n tre -v is ta d o .

(5)

o

hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

p rim e iro c o n ta to c o m o e n tre v is ta d o fo i

fe ito p o r te le fo n e . R a ia n a lig o u p a ra a c a s a d e L ú c io , e e le m e s m o a te n d e u , já s e p ro n tific a n d o e m c e d e r a e n tre v is ta . A p a rtir d e e n tã o , o c o n ta to p a s s o u a s e r fe ito c o m a s e c re tá ria A u x ilia d o ra .

A m a io r d ific u ld a d e n a p re p a ra ç ã o d a p a u ta fo i a q u a n tid a d e d e m a te ria l s o b re L ú c io . A p ro d u ç ã o te v e d e le r in ú m e ro s li-v ro s , s ite s e jo rn a is p a ra c o lh e r o m á x im o d e in fo r-m a ç õ e s , filtra n d o a q u ilo q u e s e ria im p o rta n te p a ra a e n tre v is ta .

to , e d e p o is fo i p re s id e n te d a A re n a

WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( A lia n ç a R e n o v a d o r a N a c io n a l, p a r t id o d o s m ilit a r e s

n o G o lp e d e 1 9 6 4 ). E n tã o tin h a m u ita re u n iã o

lá n a n o s s a c a s a , m u ita s re u n iõ e s d e p o líti-c o s . E e u , q u a n d o e s ta v a , a s s is tia s e m p re , fi-c a v a a li, o lh a n d o , o u v in d o , v ia a s d is fi-c u s s õ e s q u e e ra m tra v a d a s , a s d ific u ld a d e s , a s a rti-c u la ç õ e s p o lítirti-c a s e is s o , d e a lg u m a fo rm a , fo i a ju d a n d o a m o ld a r a m in h a fo rm a ç ã o e ta m b é m o m e u in te re s s e p e la p o lític a . A lé m d o q u e , e u p a rtic ip a v a m u ito d a p o lític a lo c a l a q u i n o m u n ic íp io d e S ã o G o n ç a lo d o A m a -ra n te ( m u n ic í p io lo c a liz a d o n a R e g iã o M e t r o -p o lit a n a d e F o r t a le z a ) , o n d e n a s c e u m e u p a i,

n a s c e u m in h a m ã e , ( n a s c e r a m m e u s ) a v ó s

p a te rn o s e m a te rn o s , e o n d e e u c o s tu m a v a p a s s a r fé ria s c o m m u ita fre q u ê n c ia . T a m b é m p a rtic ip a v a d a q u e la p o lític a lo c a l c o m m e u s tio s , E u c o m e c e i m u ito c e d o a te r e s s e re la -c io n a m e n to .EDCBA

J u l i a n a - M a s , d o u to r L ú c io , o s e n h o r d is -s e q u e c o n v iv ia c o m e -s -s a -s p e -s -s o a -s , c o m a -s fig u ra s p o lític a s im p o rta n te s . M a s , a o m e s -m o te -m p o , a s u a ir-m ã L u íz a( L u í z a A lc â n t a r a , b ib lio t e c á r ia d a F u n d a ç ã o W a ld e m a r A lc â n -t a r a ) d is s e q u e n ã o te m a m e n o r v o n ta d e d e

p a rtic ip a r d e p o lític a . E la a firm o u m e s m o q u e o s e n h o r c o m u n ic o u a e la q u e e la n ã o tin h a m e s m o c o m o e n tra r p o rq u e e la é m u ito m a is "s a n g u e ", e la é m u ito m a is "e m o ç ã o ". E la ta m b é m c o n v iv e u n e s s e m e io . A q u e o s e n h o r a trib u i ( o f a t o d e ) te r d e s p e rta d o p a ra

is s o ? O q u e o a tra ía n e s s a c o n v iv ê n c ia ?

L ú c i o - E u a c h o q u e ...É u m a p e rg u n ta d ifí-c il d e e u re s p o n d e r ( r is o s ) . N ã o h o u v e a q u e le

e s ta lo : "A h , e u v o u s e r p o lític o !" A o lo n g o d a

m in h a c a rre ira , e u já re c e b i m u ita s p e s s o a s q u e s ã o m é d ic o s , s ã o jo rn a lis ta s , s ã o a d v o g a d o s e , u m b e lo d ia , c h e g a m a q u i p a ra fa -la r c o m ig o q u e d e c id ira m e n tra r n a p o lític a e ta l, c o m o s e a q u ilo fo s s e , d e re p e n te , u m e s ta lo . E e u s in c e ra m e n te n ã o s e i id e n tific a r s e h o u v e a lg u m m o m e n to ( d e c is iv o ) . N ã o

h o u v e ( ê n f a s e ) . F o i u m a c o is a q u e fo i s e d a n

-d o n a tu ra lm e n te . M e u p ro je to d e v id a , a in d a h o je m in h a m u lh e r ( M a r ia B e a t r iz R o s á r io d e A lc â n t a r a , e s c r it o r a ) m e c o b ra is s o , p o rq u e

o m e u p ro je to e ra e s te : s e r m é d ic o , s e r p ro fe s s o r d a F a c u ld a d e d e M e d ic in a e fa z e r p ro -d u ç ã o c ie n tífic a , tra b a lh o s , e tc . O q u e é q u e a c o n te c e u ? C e d o e u m e fo rm e i ( e m M e d ic i-n a p e la U n iv e r s id a d e F e d e r a l d o C e a r á , a o s 2 3 a n o s ) , e m 1 9 6 6 fu i p a ra S ã o P a u lo , v o lte i

e m 1 9 6 8 . E m 1 9 7 1 , e u fu i s e r s e c re tá rio d e S a ú d e d o E s ta d o . E u a c h o q u e a í é q u e e u c o m e c e i a m e e n v o lv e r c o m a p o lític a . A fin a l d e c o n ta s , o m e u p a i e ra p o lític o , e e u e ra u m jo v e m m é d ic o . H o u v e a té q u e m c e n s u -ra s s e o g o v e rn a d o r C é s a r C a is( C é s a r C a I s d e O liv e ir a F ilh o , c o n h e c id o c o m o u m d o s t r ê s " c o r o n e is " q u e g o v e r n a r a m o C e a r á d u r a n t e o r e g im e m ilit a r ) p o r te r m e e s c o lh id o . E ra

m a is p o rq u e e u e ra e s c o lh id o p o r s e r filh o d e q u e m e ra . A c h o q u e d a í q u e e u c o m e c e i a m e e n v o lv e r c o m a p o lític a , q u e é u m a c o is a q u e a b s o rv e m u ito , n é ? A re la ç ã o c o m a p o lític a é a s s im : a m a o u o d e ia . A g e n te v a i, e v o c ê v a i c ria n d o la ç o s , v ín c u lo s , v a i a s s u m in d o c e rta s re s p o n s a b ilid a d e s e is s o ...

J u l i a n a - M a s o s e n h o r b rin c a v a d e s e r p o lític o q u a n d o e ra c ria n ç a .

L ú c i o - E ra , d e fa z e r d is c u rs o s , d e fa z e r

(6)

campanha.

KJIHGFEDCBA

J u lia n a - O que é que o atraía ali? O se-nhor achava bonito?

L ú c io -

É

que a política sempre apaixona muito, não é? Nós tivemos aquela interrupção dos governos militares, mas a política era mui-to ... Envolvia menino, envolvia mui-todo mundo. Ainda hoje. Quantas vezes eu já tive, como candidato,

aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( d e ) receber mães que queriam que eu falasse porque o filho me adorava, gostava de me ver na televisão. A política cria esse laço. E eu, na casa de político, realmente participava, fazia comícios, inventava uns mi-crofones que eram ( f e it o s ) com uma lata de manteiga, botava um cordão, que era um fio. Mas não era só eu, eram ( t a m b é m ) os nossos vizinhos ali. Era uma coisa assim.

P e d ro - A gente falou bastante da figura do pai do senhor. E, além dele, vários homens da família do senhor fizeram parte, foram fi-guras importantes na vida pública. Eu andei pesquisando um pouco e descobri que o pa-triarca da família do senhor ( J o s é d a R o c h a M o t a ) chegou a ser vereador da vila de Forta-leza em 1749, ou seja, há vários anos atrás. E isso foi passando de geração para geração. O senhor é neto do Doca Praíba( R a im u n d o N o -n a t o d a S ilv a ) , que também foi uma pessoa importante no clã do Cauípe. O Zeca Praíba, o Jaca Praíba( J o s é M a t a S ilv a e J o a q u im d a M a t a S ilv a , r e s p e c t iv a m e n t e , f o r a m p o lí t ic o s in f lu e n t e s n o C e a r á d o c o m e ç o d o s é c u lo X X ) ... Eu pergunto pro senhor qual a impor-tância dessa herança política na formação de um homem, de um ser político?

L ú c io - Eu acho que essa herança é, ao

mesmo tempo, uma coisa honrosa e um far-do. Porque você se sente quase que na obri-gação de dar continuidade, ( d e ) não interrom-per essa corrente. No meu caso, por exemplo, o meu filho, Leonardo ( c o n h e c id o c o m o L e o A lc â n t a r a ) , foi deputado ( f e d e r a l d e 2 0 0 3 a 2 0 1 0 ) , mas eu não movi uma peça para ele

entrar na política. Foi uma decisão dele. Pelo contrário! Eu até coloquei ... Questionei, ( p a r a )

saber se ele realmente queria, o que é que estava levando ele a ir para a política e tal. Como ele queria, e decidiu ser ( p o lí t ic o ) , eu realmente fui ajudar. Mas eu não forcei, não fiz nenhum movimento para que ele entrasse na política. Até porque a mãe ( d e le ) não queria que ele fosse. Porque a política é uma ativida-de muito nobre, muito importante do ponto de vista da sociedade, mas é uma atividade muito desgastante, tem momentos muito di-fíceis. Eu não forcei isso. Mas eu achei bom dar essa continuidade. Mas, como eu digo, é, ao mesmo tempo, uma coisa honrosa porque você vê a sua família envolvida nisso ao lon-go dos anos ... Você ( r e f e r in d o - s e a o P e d r a )

foi recuperar lá no século XVIII, não é? Então isso é importante. E não que eu queira dar nisso um caráter oligárquico, de um grupo,

( q u e p e n s a ) "nós aqui é que mandamos". Até porque nós não tínhamos esse caráter assim autoritário, oligárquico.

É

a contingência, né? Eu( t a m b é m ) estava na casa de uma família de médicos. Tinha eu, tinha uma irmã ( L ú c ia A lc â n t a r a ) , tinha uma prima minha ( I e / d a A lc â n t a r a ) , cujo pai, irmão do meu pai, morava no Amapá, e ela veio, ter-minou o Ginásio ( h o je E n s in o F u n d a m e n t a l li)

LÚCIO ALCÂNTARA 1101

Em quase todo o tem-po em que a produção es· teve preparando a pauta, Lúcio e toda a família es-tavam viajando por causa de um casamento. Por isso, não foi possível re-alizar uma pré-entrevista com ele e com alguns fa· miliares.

(7)

Por causa da pressa, a equipe de produção fez uma visita quase surpre-sa à Fundação, localizada na antiga casa da família Alcântara, no bairro São João do Tauape. A biblio-tecária Teima foi muito so-lícita e apresentou o local para João Victor e Raiana.

o

que mais impressio-nou a equipe de produção foi a organização de todo o material da Fundação. Teima contou sobre a ma-nia de Lúcio em guardar tudo: "Se ele recebe um bilhete no meio da rua, ele me pede para arquivar".

lá, e veio para cá estudar aqui e morava lá em casa, como uma irmã nossa, era estudante de Medicina e se formou. Eu tinha um con-texto médico muito importante. Isso, de

algu-ma foralgu-ma, foi me levando

aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( p a r a a M e d ic in a ) .

Mas, antes disso, eu quis ser oficial de Mari-nha, imagina isso ( r is o s ) ? Isso é um detalhe importante! Eu estava terminando o Ginásio. Naquela época, era o Ginásio e o Científico

( h o je E n s in o M é d io ) , que são os oito anos de hoje. E eu comecei a ter dificuldade, no ci-nema, de ler as legendas. E o meu pai então

( m e ) mandou para um médico, amigo dele, doutor Hélio Góes ( o f t a lm o lo g is t a c e a r e n s e ) ,

e depois ele verificou que eu era míope. Então ele mandou um bilhetezinho - devia ter guar-dado isso: "Waldemar, o nosso almirante real-mente ..." ( r is o s ) . Eu tinha já o Manual do Colé-gio Naval, já ia começar a me preparar, ainda dava para ser fuzileiro naval. Mas eu achei que não valia

à

pena. Foi a minha primeira opção. Se eu não fosse míope, provavelmente eu, se tivesse passado no exame físico e tudo, teria sido oficial da Marinha.

Nayana -

E a Medicina veio como?

lúcio -

Eu acho que uma coisa que me in-fluenciou foi uma leitura. Qual foi essa leitura? Do Cronin. Eu tenho a coleção, deve estar na biblioteca ( b ib lio t e c a p a r t ic u la r d e L ú c io , n o M e ir e le s , o n d e a c o n t e c e u a e n t r e v is t a ) . Ar-chibald Joseph Cronin ( e s c r it o r n a s c id o n a E s c ó c ia e m 1896). Era um escocês, médico, foi um grande escritor, ( e s c r e v e u ) vários li-vros, "A Cidadela", uma série de livros. São livros, muitos deles, sobre a profissão médica. Médicos de mineiros, no auge da mineração de carvão na Inglaterra, na Escócia, no País de Gales; médicos da elite londrina, e com to-das essas paixões da profissão, etc. Revendo assim para responder essas perguntas ... Eu acho que isso ( a o b r a d e C r o n in ) influenciou

II(Meu pai)

KJIHGFEDCBA

fo i m a is

im p o rta n te

p e lo

e x e m p lo ,

p e la s

a ç õ e s , d o q u e p e la

p a la v ra . (. ..) E m

n e n h u m

m o m e n to

in s is tiu n e m p ra e u

s e r m é d ic o n e m p ra

s e r p o lític o ."

também, e era uma coleção que tinha na S'-blioteca do meu pai. Eu acho que eu li prati-camente todos os livros dele, todos os livros dessa coleção do Cronin.

João Victor -

Depois de não poder ingres-sar na Marinha, o senhor acabou escolhendo pela Medicina, que, na verdade, era a escolha de grande parte dos seus familiares. Mas o que é que lhe atraía na Medicina, além desse fato de ( e la ) já estar muito presente na ( s u a )

vida familiar?

lúcio-

Teve uma outra coisa que foi impor-tante na minha vida também, que foi o fato de ter estudado no Liceu ( C o lé g io E s t a d u a l L ic e u d o C e a r á ) . Essa também é uma passagem da minha vida importante, e isso pode também ter influído. O que é? Eu estudei o chamado Ginásio e uma parte do chamado curso Pri-mário ( h o je E n s in o F u n d a m e n t a l I ) no Ginásio Farias Brito ( a t u a l C o lé g io F a r ia s 8 r it o , c u jo d e s m e m b r a m e n t o d e u o r ig e m a o C o lé g io A r i d e S á ) , na época. Ali onde ainda hoje é a

( a v e n id a ) Duque de Caxias, esquina da Praça do Carmo ( C e n t r o d e F o r t a le z a ) . Os diretores eram amigos de meus pais, que eram doutor Ari de Sá Cavalcante, doutor João César, e era uma escola particular. Os outros ( a lu n o s )

eram filhos de colegas do meu pai, eram ami-gos, etc. Era uma coisa meio restrita. Quando eu terminei o Ginásio, eu fui para o Liceu. Pri-meiro eu tive que enfrentar uma seleção, por-que o número de vagas era limitado. Eu fui lá e meu pai ( d is s e : )

"Ó,

se quer ir para o Liceu, vai lá, se inscreve". E ele era político, mas não se meteu nisso. Eu já tive de cair, digamos assim, na "vida real", sem aquela proteção natural de um meio conhecido e dos seus pais. Passei na seleção, fui para lá, e o Liceu, que era na época um colégio muito bom, um excelente colégio entre os colégios daqui, tinha gente de diversas classes sociais. A minha família não era rica mas era uma família de classe média. Meu pai era médico, era político, diretor e pro-fessor da Faculdade de Medicina ( d a U n iv e r -s id a d e F e d e r a l d o C e a r á ) . E havia alguns ou-tros também filhos de médico, de militar. Mas havia também pessoas modestas do ponto de vista econômico, do ponto de vista social, gente do interior, que vinha, chegava aqui e ia morar na casa da tia, pegava não sei quantos ônibus para chegar, aquela dificuldade toda. Ainda mais, no último ano do curso Científico, 3º ano, eu fui estudar

à

noite, para ter o dia todo para estudar para me preparar pro ves-tibular. Esse caráter, vamos dizer assim, essa coisa heterogênea do ponto de vista social, mas que era um corte na sociedade, ainda se tornou mais clara ( p a r a m im ) , porque tinha cabo da Aeronáutica, tinha sargento do Exér-cito, empregado de escritório, enfim. Eu era o que se chama "estudante profissional", vivia

(8)

só para estudar. Eu via esse pessoal chegava cansado de noite, cochilava na aula, dormia, tinha dificuldade porforça mesmo da vida que eles tinham. Acho que isso me ajudou muito a formar uma consciência social. Tudo isso eu vou recuperando depois. Na época, essas coisas foram acontecendo naturalmente. Isso eu acho que influenciou muito a minha forma-ção. Ser uma pessoa tolerante, uma pessoa democrática, mais compreensiva com as difi-culdades dos outros, entender que a vida não era aquilo no meio onde eu circulava. A vida era uma coisa muito mais abrangente, mais ampla.

KJIHGFEDCBA

R a ia n a - Doutor Lúcio, outra experiên-cia que o senhor relata como marcante já foi

quando o senhor era médico do INPS

aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( I n s t it u -t o N a c io n a l d e P r e v id ê n c ia S o c ia l, a t u a l I n s t

i-t u i-t o N a c io n a l d e S e g u r id a d e S o c ia l, I N S S ) . O

senhor fala muito neste livro ...

L ú c io - Isso foi uma coisa também ... Aí já como médico, formado, eu voltei ( d e S ã o P a u -lo ) . O meu primeiro emprego foi, na época, era INPS( L ú c io t r a b a lh o u n o I N P S e m 1 9 6 8 ) .

Eu trabalhei um ano. Foi uma coisa também muito útil na minha vida.

R a ia n a - Mas em que sentido essa expe-riência ... Porque o senhor fala que foi uma experiência como cidadão, médico e homem público. Em que sentido, nesse espaço, houve oportunidade para a formação de um homem que está disposto a servir a essa sociedade que o senhor já tinha visto na escola do Li-ceu, que tinha essa diferença de classes, em que havia pessoas necessitadas? Quando o senhor vai trabalhar no INPS, o senhor depara com outro tipo também de vivência. Como é que isso contribuiu para a sua formação hu-mana e, mais tarde, como homem público?

L ú c io - Olha, isso contribuiu no sentido de eu ter uma ideia mais clara da sociedade, dos problemas que essas pessoas enfrentavam e me sensibilizar para o que eu pudesse fazer ... Nessa época, eu não tinha intenção de entrar na política. Estava mais voltado para a minha carreira como médico, como profissional. En-tão eu fiquei alerta, atento a isso. Não só como médico, mas depois, quando eu ingressei na política, eu tinha essa visão, não é? Uma vi-são social, mais ampla. Na minha própria casa também, porque a nossa casa tinha um bra-são, que está até lá na Fundação ( F u n d a ç ã o W a ld e m a r A lc â n t a r a ) , que ele ( d iz ) : "Tenho, em minha casa, um brasão, dentre todos, o mais nobre: receber, sem distinção, tanto o rico como o pobre", que foi presente de ami-gos do meu pai, que mandaram vir de Portu-gal. Mas essa consciência se fortaleceu nesse trabalho que eu tive, com a formação como estudante e, depois, no início da minha vida profissional.

"Gosto

d e a te n d e r

a q u e m

p ro c u ra

fa la r c o m ig o . E is s o ,

à s v e z e s , te m u m

c u s to e m o c io n a l,

p o rq u e v o c ê to m a

c o n h e c im e n to

d e

m u ito s p ro b le m a s

d ia n te d o s q u a is

v o c ê p o u c o o u n a d a

p o d e fa z e r."

R o b e rta - E como a atuação de médico con-tribuiu para a sua formação como político?

L ú c io - Você, como médico, ainda mais na minha especialidade, que era ( e m ) Doen-ças Infecciosas ... Na época, era uma coisa que só dava mais em pobre. Era difteria, era tétano, era calazar, esquistossomose, as cha-madas doenças infecciosas e doenças tropi-cais. Já pela minha própria opção, eu fui lidar com pessoas, a grande maioria, desvalidas economicamente, socialmente. E eu era mui-to disponível para atender e era bastante res-ponsável no exercício profissional. Isso tudo foi se encaixando, eu nunca forcei nada. As coisas foram acontecendo.

J o ã o V ic to r - O senhor citou agora há pouco que chegou a sofrer preconceito quan-do o senhor assumiu a Secretaria de Estaquan-do porque as pessoas achavam que ...

L ú c io - ( I n t e r r o m p e n d o ) Até algum cole-ga de vocês mais irreverente chegou a botar o apelido de "Baby Doc" ( r is o s ) , numa alusão ao Haiti ( J e a n C la u d e D u v a lie r , o B a b y D o e , f o i u m p r e s id e n t e a u t o r it á r io d o H a it i q u e s u -c e d e u

o

p a i n o p o d e r ) .

J o ã o V ic to r - Mas é bastante comum fi-lhos de políticos construírem suas carreiras sob a imagem dos pais. O que o senhor ...

L ú c io - ( I n t e r r o m p e n d o )

É,

agora isso, veja bem. Isso pode ser um pontapé ini-cial. Eu acho que foi também, porque isso influiu, claro. Ele ( W a ld e m a r A lc â n t a r a ) era presidente do partido, era senador, naquela composição que o César Cais fez, ele ( C a I s )

podia ter optado por outro. O problema não é você receber o primeiro apoio. Todos nós, de alguma forma ou de outra, recebemos. Se

LÚCIO ALCÂNTARA

I

103

Apenas as clipagens de notícias de jornais que se referem aos Alcânta-ras ocupam dois grandes armários na Fundação. Além disso, é incontável a quantidade dos mais diversos documentos e objetos guardados ali.

(9)

Por suqestào de Teima, u a das pré-entrevistas foi realizada com Auxliadora, a secretária que trabalha com Lúcio há 30 anos, e outra, com o doutor Pedro Henrique Saraiva Leão, que é amigo de infãncia e ex-cunhado de Lúcio.

A entrevista com Pe-dro foi realizada na Aca-demia Cearense de Le-tras, onde Lúcio também ocupa uma cadeira. Raia-na não chegou a tempo para a entrevista, mas a produção ficou ainda um bom tempo na ACL con-versando com o jornalista Vicente Alencar.

vocês amanhã forem trabalhar em um jornal, vai ter aquele editor que vai te dar uma opor-tunidade, vai te dar uma "ajudazinha", vai te dar uma dica. Isso é da vida. Agora saber se você vai sustentar isso, é outra coisa. Eu, por

exemplo, me preocupava muito em

aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( n ã o )

desmerecer isso, essa confiança, tanto do governador como o nome do meu pai, que também estava em jogo. Se eu fizesse uma besteira, eu ia comprometer o nome dele, enfim.

KJIHGFEDCBA

R a ia n a - Então o que foi que o senhor fez para se manter? Porque o senhor falou que ...

L ú c io - ( I n t e r r o m p e n d o ) Trabalho, dedi-cação, um roteiro de vida, responsabilidade. Nunca fiquei transigindo com princípios fun-damentais. Eu procurei sempre trilhar esse caminho.

M a ria n a - Como o senhor construiu a sua carreira tentando se diferenciar um pouco, conseguir esse perfil do Lúcio e não ficar só na sombra?

L ú c io -

É,

eu acho que eu consegui muito bem isso, sem romper, sabe?

M a ria n a - Mas como?

L ú c io - Não foi preciso eu brigar com ele. E nem ele também me cobrou. Porque meu pai era uma pessoa talvez mais conservado-ra, mas também tinha coisas ... Em 2012 é o centenário dele,

nós

estamos recuperando umas coisas. Ele, senador pela Arena, defen-deu a legalização da maconha naquela épo-ca, do governo militar e tudo. Hoje, quando o sujeito fala em maconha é um problema, avalie àquela época. Porque ele acreditava nisso! Ele era uma pessoa assim, que tam-bém tinha posições. Ele foi chamado de "se-nador maconheiro" ( r is o s d e t o d o s ) . Eu fui construindo isso naturalmente. Nem ele tam-bém me cobrava, não me tutelou.

Ig o r - Mas como o senhor conseguiu se diferenciar dele?

L ú c io - Não sei também se eu consegui. Foi o tempo também em que ele foi saindo. Ele encerrou o governo em março de 1979 e encerrou a atividade política dele.

M a ria n a - O senhor considera que deu uma continuidade, digamos assim, ao que ele já vinha começando?

L ú c io - Eu acho que sim, mas uma conti-nuidade adequada ao momento que a gente estava vivendo, que era outra coisa. Porque também ele sempre transitou muito bem em todos os grupos. Tinha muitos médicos de esquerda do tempo dele, que eram amigos dele. Porque também ele fez isso, ele tinha a posição dele, mas nunca se valeu disso para perseguir ninguém, para maltratar, para de-nunciar, para ganhar posição por conta dis-so. Foi galgando posições quase que

consen-sualmente. Um pouco também, de alguma forma, ( c o m o f o i) o meu caso. ( E u ) aparecia como uma solução natural ( n o s c o n f lit o s ) , al-guém que conseguia transitar nos diferentes grupos. E se não concordavam totalmente, achavam que eu era capaz de intermediar.

J u lia n a - O senhor provavelmente pode ter cometido algum erro. O senhor considera que cometeu algum erro?

L ú c io - Ah, devo ter cometido muitos! Certamente que eu cometi. Eu não me lem-bro de um "mega-erro", mas devo ter co-metido erro de percepção. Certamente, em algum momento, eu tomei uma decisão que não era a melhor, eu me equivoquei ou fui mal-informado. O que eu digo que eu nunca cometi foi um erro deliberado no sentido de tomar uma atitude prejudicial a alguém, de alguma forma, fazer um mal a alguma pessoa em decorrência da posição em que eu me encontrava naquele momento e tal. Claro, primeiro, ninguém agrada a todo mundo. E ainda mais na política, na administração

ipú-b lic a ) . Mas eu sempre tive uma preocupação muito grande em fazer esta pergunta: "Onde está o interesse público? Onde está o bem comum?

É

fazendo assim ou fazendo 'assa-do'?". Bom, aí é que eu digo. Eu posso ter me equivocado na avaliação. E então eu preferi

(10)

errar, talvez, em algum m om ento por dar o benefício da dúvida a um a pessoa do que ...

O m undo da política é um m undo onde há m uita deslealdade, há m uitos interesses, m uito jogo, m uita coisa. M as eu não tinha

condição de viver eternam ente desconfian-do de todo m undo, sem acreditar. Talvez seja um a visão ingênua da política. M as eu acho que, para eu viver bem , estar tranquilo, eu tenho de estar de acordo com aquilo que eu penso. Claro que, aqui ou acolá, você tem de transigir um a coisa, você não pode ser um intolerante. M as, de um a m aneira geral,

eu procurei sem pre, vam os dizer assim , ter um a certa coerência para m e sentir bem e estar tranquilo. Eu fiz o que eu achava que devia fazer.

LKJIHGFEDCBA

J u lia n a - M as nesse seu prim eiro cargo

de secretário de Saúde, pelo fato de o senhor

ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

ter um a certa influência política devido

à

sua fam ília e

à

convivência que teve ( c o m o u t r o s p o l í t i c o s ) , o senhor acredita que já entrou no cargo com um a visão m ais confor-m ista da política ou acredita que tinha um a visão utópica de ainda querer m udar, de fa-zer diferente?

L ú c io - Não, eu entrei com essa visão, até porque, é um a questão de justiça, prim eiro do César Cais, foi um a confiança em m im , né? Eu m e form ei em 1966 e voltei em 1968 e eu fui m ontar, instalar e fui o prim eiro di-retor do Hospital São José, que é o hospi-tal de doenças transm issivas. Foi um a prova de confiança dele, ( q u e ) estava m ontando o secretariado. Eu era um m édico que tinha o quê? Vinte e seis anos, 25 anos de idade. De-pois eu saí da Secretaria por um problem a político, dentro do partido dele com o m eu pai e com o senador Virgílio Távora ( V í r g í l i o d e M o r a e s F e r n a n d e s T á v o r a , u m d o s t r ê s " c o r o n é i s " q u e g o v e r n a r a m

o

C e a r á d u r a n t e

o r e g i m e m i l i t a r ) , um a discordância política. M as eu sem pre destaquei isso, que foi um a prova de confiança dele. Eu não vou citar nom es, m as já ( h o u v e ) vários casos aqui, se vocês forem atrás, de filhos de políticos que não deram certo. Por esta ou por aquela ra-zão, entraram , m as não funcionou. Às vezes, tiveram o prim eiro m andato m as depois não foram adiante. Então eu sem pre destaco isso do César Cais( a c o n f i a n ç a d e l e e m m i m ) . Se-gundo: ele era um hom em do regim e m ilitar,

tam bém com eteu erros e coisas próprias da época, de autoritarism o, m as era um hom em

m uito inquieto e m uito realizador e fez m uita coisa, inovou m uito aqui na adm inistração do Ceará. Você pode citar o Centro de Con-venções na época, aquela ( a n t i g a ) cadeia pública, ( q u e e l e t r a n s f o r m o u e m ) o Centro de Turism o, o negócio de caju, várias coisas. Foi um hom em , nesse sentido, um político

progressista.

Eu estava cheio do ideal de realizar coi-sas. Para m im , foi um choque m uito grande quando eu saí porque, aí sim , foi um corte. Eu

estava num a sexta-feira, recebi um cham ado para ir no Palácio, ali no Abolição ( P a l á c i o d a A b o l i ç ã o , s e d e d o G o v e r n o d o E s t a d o d o C e a r á ) . Quando eu cheguei lá, um as sete ho-ras da noite, achei que era algum despacho, algum a coisa que o governador estava m e cham ando. Foi aí ( q u e ) ele disse: "Olha, não dá m ais para continuar com este problem a político e tal, então você vai ser exonerado".

A conversa deve ter durado dez m inutos, acho que nem tanto. Para m im , foi um a coi-sa m uito ... Porque até a véspera, nunca ele havia puxado m eu tapete. Quer dizer, eu era prestigiado, e levava as coisas tudo adiante. Até a hora de sair, eu fui um secretário com plenos poderes. Isso realm ente foi um golpe

para m im , porque eu estava fazendo m uitas coisas, nós construím os o Laboratório ( C e n -t r a l ) de Saúde Pública ( L a c e n ) na época, ali na avenida Barão de Studart ( e m F o r t a l e z a ) ,

m uitas coisas no interior, etc. Enfim , eu es-tava totalm ente m obilizado para a realização de um program a na área de saúde. Então isso foi um baque que eu senti na época.

J o ã o V ic t o r - No início da sua carreira po-lítica, o senhor era filiado aos partidos liga dos ao regim e m ilitar. O senhor se considere ou já se considerou um político de direita?

L ú c io - Não. Se olhar o m eu currículo, m inha atuação nos diferentes cargos que el exerci, eu sem pre fui um dem ocrata. Ouso dizer isso. Diferente de m uita gente que se diz dem ocrata e, quando assum e o poder, é um grande autoritário, não respeita ninguém . Não, eu trabalhei inclusive atendendo as pessoas, m esm o nessa época, que eram de esquerda, que tinham sido cassadas, sem pre tiveram interlocução com igo na Prefeitura de Fortaleza ( L ú c i o f o i p r e f e i t o d e 1979 a 1 9 8 2 ) .

Os prim eiros instrum entos de participação popular foram criados por m im . O cham ado Fórum Adolfo Herbster, por exem plo, era um a coisa que realizava anualm ente para discutir um a determ inada política pública do m unicípio, podia ser a Lei do Uso de Ocu-pação do Solo, podia ser transporte públi-co ... E era cham ado todo m undo, inclusive

Federação de Bairros e Favelas, associações com unitárias, tudo isso. Fazíam os isso um a vez por ano e com um grande percentual de aproveitam ento dessas ideias. O prim eiro conselho, que eu criei, do M eio Am biente, o conselho para analisar os grandes projetos

urbanos de im pacto na cidade ( C o m d e m a -C o n s e l h o M u n i c i p a l d e D e f e s a d o M e i o A m -b i e n t e ) , tinha representação da com unidade, tinha tudo isso. Eu tinha um a interlocução

LÚCIO ALCÂNTARA I 105

Por conta da via-gem em fam ília, foi difl-cil conseguir entrevistar fam iliares de Lúcio. M as por sorte, no dia da pre-entrevista com Auxiliado-ra na Fundação, estava Ia Luíza, a irm ã m ais velha dele, que conversou com Raiana e João V ic t o r .

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errar, a ez, em algum m om ento por dar o benefício da dúvida a um a pessoa do que ...

O m undo da política é um m undo onde há m uita deslealdade, há m uitos interesses, m uito jogo, m uita coisa. M as eu não tinha condição de viver eternam ente desconfian-do de todo m undo, sem acreditar. Talvez seja um a visão ingênua da política. M as eu acho que, para eu viver bem , estar tranquilo, eu tenho de estar de acordo com aquilo que eu penso. Claro que, aqui ou acolá, você tem de transigir um a coisa, você não pode ser um intolerante. M as, de um a m aneira geral, eu procurei sem pre, vam os dizer assim , ter um a certa coerência para m e sentir bem e estar tranquilo. Eu fiz o que eu achava que devia fazer.

LKJIHGFEDCBA

J u lia n a - M as nesse seu prim eiro cargo de secretário de Saúde, pelo fato de o senhor já ter um a certa influência política devido

à

sua fam ília e

à

convivência que teve

ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( c o m o u t r o s p o l í t i c o s ) , o senhor acredita que já

entrou no cargo com um a visão m ais confor-m ista da política ou acredita que tinha um a visão utópica de ainda querer m udar, de fa-zer diferente?

L ú c io - Não, eu entrei com essa visão, até porque, é um a questão de justiça, prim eiro do César Cais, foi um a confiança em m im , né? Eu m e form ei em 1966 e voltei em 1968 e eu fui m ontar, instalar e fui o prim eiro di-retor do Hospital São José, que é o

hospi-tal de doenças transm issivas. Foi um a prova de confiança dele, ( q u e ) estava m ontando o secretariado. Eu era um m édico que tinha o quê? Vinte e seis anos, 25 anos de idade. De-pois eu saí da Secretaria por um problem a político, dentro do partido dele com o m eu pai e com o senador Virgílio Távora ( V í r g í l i o d e M o r a e s F e r n a n d e s T á v o r a , u m d o s t r ê s " c o r o n é i s " q u e g o v e r n a r a m

o

C e a r á d u r a n t e

o r e g i m e m i l i t a r ) , um a discordância política. M as eu sem pre destaquei isso, que foi um a prova de confiança dele. Eu não vou citar nom es, m as já ( h o u v e ) vários casos aqui, se vocês forem atrás, de filhos de políticos que não deram certo. Por esta ou por aquela ra-zão, entraram , m as não funcionou. Às vezes, tiveram o prim eiro m andato m as depois não foram adiante. Então eu sem pre destaco isso do César Cais ( a c o n f i a n ç a d e l e e m m i m ) . Se-gundo: ele era um hom em do regim e m ilitar, tam bém com eteu erros e coisas próprias da época, de autoritarism o, m as era um hom em m uito inquieto e m uito realizador e fez m uita coisa, inovou m uito aqui na adm inistração do Ceará. Você pode citar o Centro de Con-venções na epoca, aquela ( a n t i g a ) cadeia pública, q u e e l e t r a n s f o r m o u e m ) o Centro de Turisrr-o, o egocio de caju, várias coisas. Foi um o e , esse sentido, um político

progressista.

Eu estava cheio do ideal de realizar coi-sas. Para m im , foi um choque m uito grande quando eu saí porque, aí sim , foi um corte. Eu estava num a sexta-feira, recebi um cham ado para ir no Palácio, ali no Abolição ( P a l á c i o d a A b o l i ç ã o , s e d e d o G o v e r n o d o E s t a d o d o C e a r á ) . Quando eu cheguei lá, um as sete ho-ras da noite, achei que era algum despacho, algum a coisa que o governador estava m e cham ando. Foi aí ( q u e ) ele disse: "Olha, não dá m ais para continuar com este problem a político e tal, então você vai ser exonerado". A conversa deve ter durado dez m inutos, acho que nem tanto. Para m im , foi um a coi-sa m uito ... Porque até a véspera, nunca ele havia puxado m eu tapete. Quer dizer, eu era prestigiado, e levava as coisas tudo adiante. Até a hora de sair, eu fui um secretário com plenos poderes. Isso realm ente foi um golpe para m im , porque eu estava fazendo m uitas coisas, nós construím os o Laboratório ( C e n -t r a l ) de Saúde Pública ( L a c e n ) na época, ali na avenida Barão de Studart ( e m F o r t a l e z a ) ,

m uitas coisas no interior, etc. Enfim , eu es-tava totalm ente m obilizado para a realização de um program a na área de saúde. Então isso foi um baque que eu senti na época.

J o ã o V ic t o r - No início da sua carreira po-lítica, o senhor era filiado aos partidos liga dos ao regim e m ilitar. O senhor se considerr ou já se considerou um político de direita?

L ú c io - Não. Se olhar o m eu currículo, m inha atuação nos diferentes cargos que el exerci, eu sem pre fui um dem ocrata. Ouso dizer isso. Diferente de m uita gente que se diz dem ocrata e, quando assum e o poder, é um grande autoritário, não respeita ninguém . Não, eu trabalhei inclusive atendendo as pessoas, m esm o nessa época, que eram de esquerda, que tinham sido cassadas, sem pre tiveram interlocução com igo na Prefeitura de Fortaleza ( L ú c i o f o i p r e f e i t o d e 1979 a 1 9 8 2 ) .

Os prim eiros instrum entos de participação popular foram criados por m im . O cham ado Fórum Adolfo Herbster, por exem plo, era um a coisa que realizava anualm ente para discutir um a determ inada política pública do m unicípio, podia ser a Lei do Uso de Ocu-pação do Solo, podia ser transporte públi-co ... E era cham ado todo m undo, inclusive Federação de Bairros e Favelas, associações com unitárias, tudo isso. Fazíam os isso um a vez por ano e com um grande percentual de aproveitam ento dessas ideias. O prim eiro conselho, que eu criei, do M eio Am biente, o conselho para analisar os grandes projetos urbanos de im pacto na cidade ( C o m d e m a -C o n s e l h o M u n i c i p a l d e D e f e s a d o M e i o A m -b i e n t e ) , tinha representação da com unidade, tinha tudo isso. Eu tinha um a interlocução

LÚCIO ALCÂNTARA

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105

Por conta da via-gem em fam ília, foi difí-cil conseguir entrevistar fam iliares de Lúcio. M as por sorte, no dia da pré -entrevista com Auxiliado-ra na Fundação, estava lá Luíza, a irm ã m ais velha dele, que conversou com Raiana e João Victor.

(12)

A equipe de produção queria m uito conversar com um especialista em política antes da entrevista, por isso procurou alguns historiadores e jornalistas, m as nenhum deles teve disponibilidade de tem po.

A historiadora Adelay-de Gonçalves sugeriu à produção que procurasse algum cientista político. Na m esm a hora, João Vi c-tor e Raiana foram para o bloco das Ciências Sociais tentar conseguir o contato de algum professor.

m uito am pla, nunca m e vali disso para per-seguir ninguém , para fazer qualquer m al a

al-guém . Depois eu estive na Constituinte

ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( A s -s e m b le ia C o n s t it u in t e r e a liz a d a e n t r e 1987e

1 9 8 8 , a p ó s a q u e d a d o r e g im e m ilit a r ) , onde nós tivem os um a atuação bastante ativa, inclusive com posições bem avançadas do

ponto de vista social na nova Constituição.

LKJIHGFEDCBA

R o b e r t a - E outro fato que eu conversei com o m eu avô, e le era presidente de um a escola de sam ba aqui de Fortaleza, a G iras-sol ( f u n d a d a e m 1979, d e s f ilo u n o c a r n a v a l d u r a n t e a s d é c a d a s d e 1 9 8 0 e 1 9 9 0 ) ,

e

e le

estava m e contando ...

L ú c io - Com o é o nom e do teu avô?

R o b e r t a - É Fran Tavares. Eu até trouxe a revista e tem o senhor aí tam bém ( R o b e r t a e n t r e g a a L ú c io a r e v is t a c o m u m a f o t o d e le ) .

Ele falou que, no início dos anos 1980, o se-nhor participou ativam ente do carnaval de Fortaleza.

L ú c io - Éverdade.

R o b e r t a - E até hoje, ( o s e n h o r ) é lem -brado por eles, pelos carnavalescos, devido a esse fato, pelo excelente carnaval de rua. E isso coincidiu ainda na ditadura m ilitar. O senhor não se sentia lim itado ou pressiona-do por participar de m ovim entos populares nessa época?

L ú c io - Não, eu na verdade nunca tive ... Não m e lem bro de ter tido assim nenhum a oressão em cim a de m im para fazer algum a .oisa com que eu não estivesse de acordo. :u considero que eu tive um grau de liberda-de m uito bom na adm inistração.

E outra: eu, por exem plo, quando eu era deputado, lem bro da votação para a eleição direta ( v o t a ç ã o d a E m e n d a C o n s t it u c io n a l D a n t e d e O liv e ir a e m 1984,r e s u lt a d o d o m o -v im e n t o D ir e t a s J á , q u e p r o p u n h a e le iç õ e s p a r a P r e s id e n t e ) . Eu era do partido do go-verno ( P D S , P a r t id o D e m o c r á t ic o S o c ia l, q u e s u b s t it u iu a A r e n a e m 1 9 8 0 a p ó s

o

f im d o b ip a r t id a r is m o ) . O Presidente da República era o João Figueiredo ( J o ã o B a p t is t a F ig u e i-r e d o , ú lt im o p r e s id e n t e d o r e g im e m ilit a r ) . E eu, junto com outros colegas, criei um grupo dentro do partido "pró-diretas", para a elei-ção direta, que evidentem ente o governo não queria na época.

Eu m e lem bro que eu fiz um a viagem com a fam ília para ir às cidades históricas de M i-nas ( G e r a is ) na Sem ana Santa. Q uando eu cheguei em casa, um dom ingo à tardinha, m e telefonou o m inistro Leitão de Abreu ( J o ã o L e it ã o d e A b r e u , m in is t r o - c h e f e d a C a s a C i-v il d e 1981a 1985), que era o chefe da Casa Civil e era um hom em de m uita autoridade, um a pessoa de direita, um senhor já com um a certa idade. E ( d is s e q u e ) o presidente Figueiredo gostaria de falar com igo, t p e r

-g u n t o u ) se eu tinha algum a dificuldade, s eu aceitava ir lá num a audiência com ele. E

d is s e : ) "Não, de m aneira nenhum a, m inistro. Se o presidente cham a, eu irei atendê-Io, não tenha dúvida". E realm ente eu fui. O Figueire-do era grosso que só! Eu cheguei lá e ele dis-se: "O lha, m as com o é, o senhor é a favor de eleição direta? Isso é um absurdo! Q uem vai ganhar esta eleição aqui é o Brizola ( L e o n e l d e M o u r a B r iz o la , f u n d a d o r d o P a r t id o D e -m o c r á t ic o T r a b a lh is t a e o p o s it o r d o r e g im e m ilit a r ) e isso aqui vai virar um a anarquia!" Eu digo:

"Ó,

presidente, eu lhe peço licença m as eu discordo. Se tiver de ser o Brizola, que seja! Se o povo escolher, nós não pode-m os ficar nessa situação, tepode-m os que voltar e tal". Ele engrossou lá e ficou danado, atacou a im prensa tam bém , m e lem bro bem . Enfim , foi um a reunião m uito tensa, m as eu m anti-ve m eu ponto de vista. Vários outros que ele cham ou m udaram .

Então eu sem pre tive um cuidado de ir até onde eu posso ir e ( q u e ) não recue, porque é m uito ruim , eu sem pre achei isso um a coisa m uito negativa pro político, pra im agem do político, estar recuando. Se não pode assu-m ir, só vá até onde você sustente. Eu exerci cargos durante esse período m as procurei m anter um a postura que am anhã eu não tivesse que m e arrepender ou m e envergo-nhar disso.

J u lia n a - Doutor Lúcio, o senhor falou que não se considera um político de direita, m as sim um dem ocrata. M as o senhor foi integrante do PFL e do PSDB (O P a r t id o d a F r e n t e L ib e r a l, a t u a l D e m o c r a t a s , f o i f u n d a d o e m 1985p o r d is s id e n t e s d o P D S e o P a r t id o d a S o c ia l D e m o c r a c ia B r a s ile ir a f o i f u n d a d o e m 1988 p e lo g r u p o d o e x - p r e s id e n t e F e r -n a -n d o H e n r iq u e C a r d o s o ) . O que, na prática, diferencia um dem ocrata de um político de direita?

L ú c io - Eu acho o seguinte. Prim eiro, eu acho que tem político de direita que é dem

o-crata. Até eu quero deixar bem claro isso. Políticos que respeitam a opinião do outro, que lutam pelas suas ideias num am biente dem ocrático claram ente. E ninguém tem o privilégio da verdade, de ser o detentor úni-co da verdade. A verdade, às vezes, está um pouco com você, com e le , com igo. Não há um m onopólio da verdade. Porque você veja

o seguinte: essas barreiras ideológicas, de algum a m aneira, foram se esm aecendo, foram ruindo ao longo do tem po. O m aior sím -bolo disso é a queda do M uro de Berlim ( f a t o o c o r r id o e m 1989q u e m a r c o u a r e u n if ic a ç ã o d a A le m a n h a a p ó s o f im d o r e g im e c o m u n is -t a ) . O que eu acho é que o que distingue um político do outro é a sensibilidade social, é a form a com o e le , vam os dizer assim , se

(13)

tifica com essas questões da desigualdade social, um a certa em patia com os grupos m i-noritários, com m ecanism os dem ocráticos, que precisam ser estabelecidos, de partici-pação, de controvérsias.

Agora você veja o seguinte: m uitos polí-ticos são cham ados de esquerda - e nós te-m os aqui no Brasil isso bete-m claro - e assute-m i-ram depois posições que são clai-ram ente de direita ou conservadoras, não vou nem cha-m ar de direita. São posições conservadoras que assum iram em função da realidade eco-nôm ica, da realidade política, da realidade social. Era m uito fácil na época do governo

m ilitar porque era "preto e branco". E ago-ra, que não é só "preto e branco"? O próprio Lula

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( L u í s I n á c í o L u la d a S ilv a ) deu um a de-claração ( d iz e n d o ) que não era de esquerda. A coisa ficou m uito m ais com plexa, o m atiz

ideológico está m uito m enos nítido.

LKJIHGFEDCBA

R a ia n a - E o senhor? Em m eio a esse m o-m ento, que é essa coisa da ideologia nesse m atiz que o senhor falou, quais são os prin-cípios ideológicos que guiam o político Lúcio Alcântara?

L ú c io - O lha, princípios ideológicos ... Aci-m a de tudo, o espírito deAci-m ocrático. Porque, se você é um dem ocrata ... Um dia desses, eu estava conversando num a entrevista que eu fiz num a televisão, estava lá um advogado, que era funcionário da Assem bleia ( L e g is -la t iv a d o C e a r á ) , e ele disse: "O lha, eu não sou um a pessoa que fica elogiando os outros e tal". Ainda m ais, eu agora, que não tenho cargo ( p ú b lic o ) nenhum , então ninguém

pre-"Não

h o u v e

a q u e le

e s ta lo :

J A h , e u v o u

I,·

1 '(

)

s e r p o ItIC O .

. ..

M e u

p r o je to

e r a

e s te : s e r m é d ic o ,

s e r p r o fe s s o r

d a F a c u ld a d e

d e M e d ic in a

e

fa z e r p r o d u ç ã o

c ie n tífic a ... "

cisa ficar com a preocupação de m e agradar. Ele disse: "M as, na Assem bleia, há um con-senso de que o seu governo foi um gover-no altam ente dem ocrático". Porque eu não I

discrim inei, eu não discrim ino, eu procuro entender a posição do outro, procuro ser honesto naquilo que eu digo, até o que eu posso fazer, o que eu não posso ... Agora, eu estou convencido de que ninguém faz

cur-so de dem ocracia. Eu acho que hoje isso é m uito da índole da pessoa. O que eu sem pre procurei foi isto: ter um com portam ento de-m ocrático que m e deixe confortável no rela- I

LÚCIO ALCÂNT ARA

I

107

O s colegas pediram um a indicação para o chefe do departam ento de Ciências Sociais da UFC, Valm ir Lopes. O professor conversou um pouco com a equipe so-bre Lúcio e sugeriu um a pré-entrevista com a pro-fessora M aria Auxiliadora Lem enhe.

(14)

Quando a turm a foi in-form ada por e-m ail que a pauta seria a m ais extensa por causa da quantidade de inform ações, Juliana com entou: "Im aginei 100 páginas de clipping!". De-pois de m uita filtragem , a pauta fechou em 79 pági-nas!

Prim eiram ente a entre-vista estava m arcada para o dia 29 de novem bro, na biblioteca particular do entrevistado. Por causa de um a audiência de que ele deveria participar, o en-contro foi rem arcado para o dia 1º de dezem bro.

cionam ento pessoal e, em larga escala, com a sociedade.

Pedro - A gente está falando um pouco das características do político Lúcio Alcânta-ra, e m uitos denom inam com o um a caracte-rística prim ordial do senhor o espírito con-ciliador. O senhor se considera um político conciliador?

Lúcio - Considero. Eu sem pre tento en-contrar um denom inador com um . Não sou adepto da radicalização. Procuro chegar a

um m eio term o, ceder

ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

( ê n f a s e ) , que é outra coisa que as pessoas têm dificuldade,

ce-der um pouco ... Eu acho que esse rótulo eu aceito. ( r i s o s d e t o d o s ) Em bora eu já tenha tom ado algum as ... Porque, na m inha m esa, até tinha um a frase, que eu acho que está até ali, atrás dessa m uralha chinesa ( a p o n t a p a r a u m q u a d r o c h i n ê s n a e s t a n t e ) . . .

Juliana - Aqui? ( t i r a o q u a d r o c h i n ê s p a r a v e r

o

q u e e s t á a t r á s ) .

Lúcio -

É.

Estava lá no m eu birô quando eu era governador. ( L ê a f r a s e e s c r i t a e m l a -t i m n o q u a d r o d a e s t a n t e : ) "Fortiter in re, su-aviter in m odo". ( T r a d u z : ) "Forte nas ações, m as suave na m aneira de dizer". Então não precisa estar batendo na m esa, xingando ninguém . Eu penso assim , acho que o cer-to é esse. Com o eu fiz com o Figueiredo. Eu podia ter dito: "M inistro, eu não vou não porque eu já tenho m inha posição". O pre-sidente cham ou? Pronto, vou lá! Por exem -plo, ser pela eleição direta quando eu era do partido do governo ... Eu tom ei a posição! Não fui xingar o governo, não fui brigar. Eu acho que o certo é isso. E outras atitudes que nós tom am os aqui. Por exem plo, ( n a )

eleição do Lula contra o Collor, ( F e r n a n d o C o l / o r d e M e i o , p r e s i d e n t e d o B r a s i l d e 1 9 9 0 a

1992,

q u a n d o v e n c e u L u l a n a s e l e i ç õ e s d e 1 9 8 9 ) ( d u r a n t e ) segundo turno, eu era do PO T ( P a r t i d o D e m o c r á t i c o T r a b a l h i s t a , f u n -d a -d o p o r L e o n e l B r i z o l a ) e apoiei o Brizola, que não passou pro segundo turno. O Bri-zola ligou para m im e pediu para eu assum ir aqui a responsabilidade de organizar um co-m ício do Lula. Eu( d i s s e : ) "Pois não", aceitei, na época com o João Alfredo ( h o j e v e r e a d o r p e l o P S O L , f o i u m d o s f u n d a d o r e s d o P a r t i -d o d o s T r a b a l h a d o r e s n o C e a r á n a d é c a d a d e 1 9 8 0 ) , com o G eraldo Accyoli ( h o j e c o -o r d e n a d -o r d e P r o j e t o s E s p e c i a i s , R e l a ç õ e s I n s t i t u c i o n a i s e I n t e r n a c i o n a i s d a P r e f e i t u r a d e F o r t a l e z a ) , e organizam os ... Talvez foi o m aior com ício que houve aqui em Fortaleza.

( F o i ) no dia daquele debate na televisão en-tre o Lula e o Collor, o da G lobo, quando o Lula realm ente ficou m al colocado, a edição do debate Pois bem , eu fui pra frente, botei m inha cara M as nessa época o Lula ainda era ( t i d o c o m o ) um dem ônio - para vocês

te-rem um a ideia. E eu tinha sido secretário do César Cais, tinha sido secretário de Saúde do Adauto Bezerra J o s é A d a u t o B e z e r r a , g o v e r -n a d o r d o C e a r á d e

1974

a

1978,

t a m b é m c o -n h e c i d o c o m o u m d o s " c o r o n é i s " ) e prefeito do Virgílio ( T á v o r a ) . Eu sou o único aqui no Ceará que trabalhou com os três coronéis. Isso causou um grande m al-estar aqui ( c o m )

em presário, todo m undo ... Então eu assum i, fiquei, fom os lá. Sabia que o PT( P a r t i d o d o s T r a b a l h a d o r e s ) tam bém m e via cheio de des-confiança. Q uem foi arranjar ônibus fui eu,

quem foi arranjar palanque, quem foi arran-jar o gerador, com m edo de que cortassem a energia, fui eu. E fui lá pro palanque.

Eu sem pre procurei tom ar um a posição, m as agir com m aneira suave. A m edida pode ser enérgica, m as não precisa você insultar os outros, nem ofender ninguém , nem ir às vezes naquele ponto que você sabe ... A pes-soa é vulnerável. M eu negócio é dem ocracia,

respeitar os outros, a opinião dos outros, ter respeito por isso, ouvir as partes, a capacida-de capacida-de ouvir ...

Juliana - M as, doutor Lúcio, se apoiar o Lula ia gerar um m al-estar entre seus colegas e apoiadores, qual era o seu interesse político?

Lúcio - ( P a u s a ) Era coerência. Porque eu estava no PO T... (E) eu fui colega do Collor,

( F e r n a n d o C o l / o r d e M e l / o ) eu sabia o que era o Collor.

Juliana - M as não seria incoerência, ( s e )o senhor foi colega do Collor e logo depois ...

Lúcio - Não, colega assim , deixa eu ex-plicar ( r i s o s ) . Eu era prefeito de Fortaleza e ele era prefeito de M aceió. A gente tinha reuniões de prefeitos do Nordeste com um a certa regularidade. Ele era o últim o a chegar, era o prim eiro a sair, era sem pre aquele tipo assim ... Depois eu fui colega dele com o de-putado federal. Então eu não acreditava no Collor. Eu achava que ele não tinha equilí-brio, era um a pessoa m uito oportunista. Ele era o prim eiro que saía para dar um a entre-vista, dizer um a coisa bem bom bástica da reunião. Era um m idiático! E votei e trabalhei pelo Brizola, que só por pouco não foi para o segundo turno. Eu acho que, naquela época, o Brizola teria sido m elhor para o Brasil do que o Lula. O Lula daquela época era dife-rente do Lula de 2002. M as o que é que eu ia fazer? Porque, no segundo turno, o Collor eu não queria. ( E u ) estava no PO T, e fom os apoiar o Lula. O PT aqui não tinha estrutura de nada, e o governador ( L e o n e l B r i z o l a ) liga para m im , m e pede para eu fazer isso (oc o -m í c i o ) . E eu realm ente enfrentei, e fizem os, foi um grande com ício.

João Victor - Doutor Lúcio, a sua entrada no PO T se deu logo após a saída do PFL. M as por que essa m udança tão radical?

(15)

L ú c io -

vutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

Po assumi uma série de posições na eia aciona I

Constituin-te que desag a a am ao PFL, e havia

posi-ções do PF com as quais eu não concorda-

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

v a . Criou-se um clima muito ruim. Eu tinha de sair porque não era mais possível, eu era inclusive perseguido dentro do partido, não me davam oportunidade. Principalmente na Câmara ( d o s D e p u ta d o s ) .

J o ã o V ic to r - Mas por que se deu a esco-lha pelo PDT?

L ú c io - Porque era a escolha mais viável. No PT, eu não tinha chance. No PMDB ( P a r -tid o d o M o v im e n to D e m o c r á tic o B r a s ile ir o , a n tig o M D B , q u e fo i o p a r tid o d e o p o s iç ã o a o r e g im e m ilita r c o m a in s titu iç ã o d o b ip a r tid a -r ls m o i, eu não v ia muita diferença do que era

(o P D T ) . Era uma "guinada à esquerda", v a

-mos chamar assim. Embora numa esquerda em que o Brizola conseguia permear outros setores da sociedade, a classe média. Ele parecia radical em umas coisas mas ele, na verdade, transitava também melhor em áre-as onde eu tinha penetração, onde eu tinha respaldo também.

N a y a n a - Doutor Lúcio, o senhor se acha um político coerente?

L ú c io - Olha, coerência 100% em políti-ca é difícil. Se você for olhar a minha políti- carrei-ra, certamente vai encontrar momentos em que eu não fui totalmente coerente, ou não fui coerente. Porque a política tem um lado pragmático. O que você precisa é se colocar em um determinado contexto. Eu acho que essa coerência total é incompatível com a política. Mas tem um limite. Você não pode é perder o respeito das pessoas. Eu já tive muitos adversários, pessoas que, às v e z e s ,

por essa ou por aquela razão nem gostam de mim, mas me respeitam. Eu já fico feliz, por-que é uma coisa boa. O pior é quando você perde o respeito. Então há limites. A políti-ca tem uma certa faixa em que você pode atuar, mas não pode é ultrapassar, o que faz

v o c ê perder o respeito das pessoas, ser uma pessoa que não merece consideração, que perde espaço porque não tem uma boa ima-gem. Eu sempre me preocupei com a minha imagem como homem público, como políti-co, porque eu acho que é o único patrimônio que eu tenho.

Hoje em dia, você tem muito empresário na política, ou então a pessoa é sindicalista, ou é radialista ... E eu nunca tive estrutura econômica. Muitas v e z e s , diziam que eu não podia ser candidato porque eu não tinha di-nheiro. Isso era muito comum. E eu realmen-te não tinha! Eu não sou pobre mas eu sou uma pessoa de classe média e vivo de salá-rio. O que acontecia, volto a repetir algumas vezes, é que eu aparecia como uma solução

natural às v e z e s até dos conflitos dentro do partido, de grupos ou de tendências, e eu surgia como aquele nome que conciliava, que procurava ...

R a ís s a - O senhor acha que essa caracte-rística do senhor de ser um político discre-to, de certa forma, não impediu o senhor de tomar proporções maiores, ter um destaque maior?

É

uma característica que o senhor tem por receio de manchar essa herança da sua família ou é realmente parte da sua per-sonalidade?

L ú c io - Não, é parte da minha personali-dade! E, como em tudo na vida, essa carac-terística, em certos momentos, foi boa e, em outros, não.

R a ís s a - Em que momentos foi boa e em que momentos foi ruim?

L ú c io - Não sei, assim ... Momentos como esse, em que eu surgia como a solução natu-ral de consenso ( fo i b o a ) , eta lv e z em outros momentos em que eu devesse ter rompido

( fo i r u im ) . Por exemplo, ( e m ) um episódio re-lativamente recente, muita gente queria que eu tivesse rompido com o Tasso ( T a s s o R i-b e ir o J e r e is s a ti, e x - g o v e r n a d o r e e x - s e n a d o r d o C e a r á ) logo no primeiro ano do ( m e u )

governo ( L ú c io g o v e r n o u o C e a r á d e 2 0 0 3 a 2 0 0 6 ) , no segundo. Já eu não pensava assim. Por quê? Quando as pessoas perguntam, eu digo: "Olha, eu, se eu não tivesse tido o apoio do Tasso ..." ( E n tã o q u e s tio n a m :) "Ah, mas o senhor acha que foi importante? O se-nhor já era um nome ...tr Eu digo: "Olha, eu, se não tivesse recebido o apoio dele, não teria sido nem candidato", reconhecendo a importância que ele te v e para a minha che-gada ao g o v e rn o . E consequentemente eu acho que eud e v ia ser leal, claro, fazendo no governo o que achasse que d e v ia fazer, mas devia ser leal a alguém que foi decisivo para minha chegada ao g o v e rn o .

Ao mesmo tempo, isso me dá o direito de fazer outras críticas a ele. Naquele epi-sódio de 2006 ( r e fe r e - s e à r e c u s a d e T a s s o e m a p o iá - Ia à r e e le iç ã o ) , eu acho que ele foi totalmente injusto, agiu de uma maneira des-cabida, até desleal. Então eu procuro sempre pesar essas coisas. Isso na política ta lv e z não seja bom. Política é paixão, política é muito emoção. A razão nem sempre convive bem na política. Mas eu sou assim. Eu acho que, de certa forma, isso é um traço ... Não v e jo

isso como uma ... Como eu te diria? Como eu querendo me colocar numa posição supe-rior. Eu acho que isso é um traço do intelec-tual na política. Que o intelecintelec-tual ele sempre sopesa melhor as coisas, vê onde é que está av e rd a d e , pelo menos a tentativa de buscar

( a v e r d a d e ) . Eu acho que o intelectual tem essa preocupação de examinar, de analisar,

LÚCIO ALCÂNT ARA

I

109

A biblioteca de Lúcio, local onde foi realizada a entrevista, fica em frente ao prédio onde ele mora, no Meireles. Segundo Teima, que também tra-balha lá, "são quatro sa-Ias em que não cabe mais nenhum livro".

Referências

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