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GERAÇÃO 80: PINTURA E MISTURA

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Academic year: 2018

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GERAÇÃO 80: PINTURA E MISTURA

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ANA LÚCIA ARAUJO·

... Sei que não tenho idade Sei que não tenho nome Só minha juventude O que não énada mal

VITOR RAMIL. 1987.

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S a p a t o s e m C o p a c a b a n a

No início da década de 80, uma verdadeira safra de novos artistas invade o mercado de arte, ficando conhecida como "geração 80", rótulo este oriundo de uma critica especializada de centros como São Paulo e Rio de Janeiro.

A chamada geração 80 reunia artistas na sua maioria muito jovens e com pouca experiência, vindos de escolas de arte como a FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado) em São Paulo e a Escola de Artes Visuais do Parque Lage no Rio de Janeiro ou de outros centros produtores de arte do país, como Porto Alegre.

Já nos primeiros anos da década os é'rtistas dessa geração estão presentes em várias exposições de norte a

s

JI do país, e embora não se possa falar da geração 80 como um bloco hor.ioqéneo, devido

à

diversidade das obras produzidas, há uma recuperação da pintura como linguagem, diferenciando-se da geração precedente, que havia se entregado a experiências com arte conceitual e também com a escultura e objeto.

Essa nova pintura apresenta características particulares que a distinguem até mesmo daquela pintura que estava sendo praticada nesse mesmo momento por artistas mais experientes. Entre essas características está o predomínio de uma pintura gestual, solta, carregada por uma explosão de cores e que não se pretende mais portadora de uma mensagem política, nem de um programa ou manifesto, ou seja, uma pintura que não se proclama transformadora do mundo.

As questões presentes nessa nova pintura, embora não sejam o que se' poderia chamar de novas, são diferentes das que estavam sendo colocadas pela arte nos anos 60 e 70 no Brasil, que de algum modo

• Mestre em História da Arte - PUCRS.

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propunha algum tipo de engajamento ou rnllltáncla política.

As obras da geração 80 expressam elementos do que poderia ser chamado um certo "espírito do tempo", espírito este que atravessa outros objetos culturais desse mesmo período. Dessa forma a nova pintura não

é

privilégio do Brasil, pois há uma forte retomada desta em tendências internacionais como a Transvanguarda italiana e o Neo-expressionismo alemão. Do mesmo modo, apesar de vários expoentes da geração 80 serem oriundos de centros como São Paulo e Rio de Janeiro, seu espírito espalha-se por várias regiões do país, o que resulta num .processo de homogeneização, misturado a elementos particulares de cada região, que estão presentes nas obras.

Esse espírito de tempo que penso estar presente na pintura da geração 80 está ligado a mudanças culturais que vinham se operando para além das fronteiras do Brasil, e que passam a afetar diretamente o cotidiano das grandes cidades. Essas mudanças são decorrentes do imenso crescimento dos meios de comunicação de massa e da informatização, o que permite a integração, o intercâmbio entre as regiões, rompendo com a noção até então bastante presente de centro-periferia.

Cabe também assinalar que este espírito se manifesta somado ao fato de o Brasil desde o final da década de 70 estar passando por um processo de abertura política, culminando com o fim da censura e a campanha pelas Diretas Já em

1984.

Esses dois elementos afetam essa geração não só no aspecto comportamental, como foi exaustivamente salientado pela crítica especializada do período, mas influenciam diretamente o trabalho desses artistas no que toca ao tema das obras e às questões formais da pintura. Seria pertinente então pincelar alguns desses elementos, para compreender como estão presentes nas pinturas da geração 80.

As mudanças culturais que têm lugar a partir dos anos 60 com o crescimento do papel da informática e dos meios de comunicação, entre outras questões, vão imprimir no cotidiano dos indivíduos uma nova noção de tempo, que cada vez mais é a "do aqui e agora". Um bom exemplo disso, seria a chamada "síndrome do botão" instalada com o grande número de canais de televisão, em que o espectador salta de um programa para outro, relacionando-os de forma instantânea, eliminando a distância geográfica e as diferenças históricas entre as diversas imagens.

Esse caráter de tempo simultâneo, do "estar sempre aqui", está presente na pintura da geração 80, pela presença do gesto rápido, da explosão de cores, em alguns casos, como na pintura de Jorge Guinle intitulada

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T h e Y e a r of D r a g o n , de

1986.

Esta se parece com este tempo televisivo de mistura de imagens, de movimento. Para esses artistas essa noção diferente de tempo se mostra muitas vezes através do uso de

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citações de obras de outros artistas e períodos da história da arte. A história da arte passa a ser um depósito de imagens à disposição do artista.

Nas cidades brasileiras, essas mudanças culturais estão presentes na década de 80, com a forte presença de uma indústria cultural já consolidada, em que há um crescimento do mercado fonográfico e editorial e também do mercado de arte, com a abertura de muitas galerias sedentas por novos talentos, que vão acolher esses novos artistas.

Outra marca do período seria a proliferação de emissoras de rádio FM, que, além de divulgar os grupos internacionais da moda ( p u n k , n e w w a v e , d a r k ) ,lançam dezenas de bandas de rock nacional que exploram nas letras de suas músicas, como em seus próprios nomes, o tema do cotidiano das grandes cidades, do sexo e do amor. Entre essas bandas estão a Legião Urbana, Blitz, Metrô, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso e muitas outras. Bandas como Barão Vermelho e Blítz cantam o sexo, os bares, as noitadas e as drogas, em letras que já não pretendem ter nenhum conteúdo político

e

se assemelham às histórias em quadrinhos.

Nas letras das músicas como as da banda Legião Urbana, ao mesmo tempo em que a juventude é exaltada, um desencanto com o progresso das cidades está presente, junto a um ceticismo em relação à política tradicional. Na letra da música C o n e x ã o A m a z ô n ic a (Legião Urbana, 1980), por exemplo, encontra-se o seguinte:

E s t o u c a n s a d o d e o u v ir f a la r E m F r e u d , J u n g , E n g e ls , M a r x I n t r ig a s in t e le c t u a is

R o d a n d o em m e s a d e b a r O q u e e u q u e r o e u n ã o t e n h o O q u e e u n ã o t e n h o q u e r o t e r

N ã o p o s s o t e r

o

q u e e u q u e r o E a c h o q u e is s o n ã o t e m n a d a

a

v e r

Os t a m b o r e s d a s e lv a já c o m e ç a r a m ag r it a r A c o c a í n a n ã o v a i c h e g a r

A C o n e x ã o A m a z ô n ic a e s t á in t e r r o m p id a . . .

Na pintura da geração 80 se encontram questões semelhantes, pois os artistas utilizam em suas obras imagens recolhidas preferencialmente da história da arte e do meio urbano (indústria cultural). Jorge Guinle, por exemplo, na revista M ó d u lo , edição-catálogo especial da mostra "Como vai Você geração 80?", realizada em 1984 no Rio de Janeiro, intitula seu artigo de "Papai era surfista profissional, mamãe fazia mapa astral legal: Geração 80 ou como matei uma aula de arte num shopping center", parafraseando a letra de uma música da banda Sempre Livre. A presença de elementos da

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mídia e da indústria cultural nos trabalhos dos artistas coloca em xeque a noção de alta e baixa cultura, ocasionando uma mistura de códigos que até então, salvo algumas exceções, eram mantidos separados.

Em algumas pinturas, como a de Vítor de Arruda, intitulada O

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C a s a m e n t o (1981), o que se percebe é uma linguagem semelhante àdo grafiti dos muros das cidades, que recupera elementos das histórias em quadrinhos.

As pinturas da geração 80 na maioria das vezes poderiam ser chamadas de "feias"; há um exagero nas formas, nas cores e até no tamanho dos suportes. Apesar de haver uma recuperação da preocupação com o fazer artesanal, essas pinturas geralmente não apresentam apuro técnico e são feitas em materiais de pouca durabilidade, pois não há intenção de permanência para a posteridade.

Também a utilização de elementos da chamada cultura "popular" é feita por alguns artistas, como Beatriz Milhazes, que se utiliza de materiais dos grandes bazares baratos, como tecidos com padronagens floridas, para construir seus trabalhos. Milhazes faz uma pintura decorativa, não no sentido pejorativo dado ao termo, mas porque está preocupada com a pele da obra, com a superfície da tela e não com a nobreza dos temas que pinta.

Toda essa diversidade da produção da geração 80 e a recuperação do prazer quase sensorial de pintar vêm ao encontro do momento que o país vivia, momento de abertura política, em que um clima festivo invadia as ruas com os comícios da campanha pelas Diretas. Esse clima de alívio, de uma certa liberação, também contribui para que esta pintura exploda sem se preocupar com o amanhã, sem nenhum tipo de projeto que vá além de si mesma.

Estes artistas, embora não estivessem alheios a todo este processo político, eram participantes como quaisquer outros, sendo conscientes de que seus trabalhos não iriam mudar muita coisa, mas quem sabe trariam um pouco de prazer e alegria para a arte, qualidades que estavam há tempos esquecidas.

No caso da pintura da geração 80 de Porto Alegre há uma situação semelhante: no início dos anos oitenta se pode assistir ao surgimento de vários novos jovens artistas, com propostas que apresentam aspectos bem particulares e ao mesmo tempo similares aos que estavam presentes em obras destes outros centros.

Aquelas tendências artísticas como a arte conceitual, que questionavam a materialização do objeto artístico e que estavam presentes nas artes plásticas desde o final da década de 60 em centros da Europa, Estados Unidos, e de alguma forma no eixo Rio-São Paulo, até os anos 70 não tiveram quase repercussão em cidades como Porto Alegre.

Fatores como a distância de outros centros importantes e a falta de informação também dificultavam o intercâmbio, e na maioria das vezes OS

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artistas plásticos entravam em contato com essas novas tendências somente através de viagens de estudo ou passeio, em que as informações adquiridas seriam repassadas de forma mais lenta através do ensino em instituições ou ateliers particulares. Outra razão que poderia explicar esse descompasso seria a existência de poucos espaços para veiculação e difusão desse tipo de obra de arte, e sendo assim o mercado incipiente que aqui existia se apoiava naquelas produções mais vendáveis.

Nos anos 70, com o crescimento da indústria cultural e dos meios de comunicação de massa, essa situação se modifica um pouco, pois a informação chega mais rápido a centros como Porto Alegre e o mercado de arte que passa a existir nos anos 60 não só está mais consolidado como apresenta um crescimento, com a abertura de várias galerias e outros tipos de espaço para veiculação de obras de arte, sejam eles instituciónais ou não.

Por isso penso ser importante retomar alguns aspectos do que estava sendo produzido em termos de artes plásticas na década de 70 em Porto Alegre, pois algumas dessas produções, embora tivessem algumas diferenças importantes em relação à chamada geração 80, influenciaram fortemente os trabalhos desses jovens artistas.

Essa influência se deu em grande parte pelo Grupo Nervo Óptico, criado em 1976 e composto por Carlos Asp, Carlos Pasquetti, Clóvis Dariano, Jesus Escobar, Mara Alvares, Romanita Disconzi, Teimo Lanes e Vera Chaves Barcellos. Esses artistas desenvolviam na época trabalhos que questionavam a concepção tradicional de objeto artístico, trabalhando com novas linguagens como objetos, performances, filmes super-8, fotografia, arte em xerox, arte postal e intervenções no espaço urbano. Com base nessa concepção de arte de certa forma inovadora para os moldes vigentes na cidade de Porto Alegre, esses artistas fundam o Grupo Nervo Óptico, assumindo uma postura crítica não só frente à política cultural do governo do estado, mas também em relação ao mercado de arte, que não via nessas novas linguagens uma possibilidade de lucro e por isso não oferecia espaço. Fruto dessa experiência, em 1979, alguns integrantes desse grupo, juntamente com alguns jovens artistas vinculados ao Instituto de Artes que trabalhavam com arte postal e outros que trabalhavam com performance, passam a se reunir, na tentativa de fundar um espaço de cultura alternativo para veicular obras com novas linguagens de artistas atuantes não só no Rio Grande do Sul, como também de São Paulo, Rio de Janeiro e de outros países. Entre os artistas que participam do Espaço N.O., além de Vera Chaves Barcellos e Teimo Lanes, estão Ana Torrano, Heloísa Schneiders, Simone Basso, Karin Lambrecht, Regina Coei i Rodrigues, Rogério Nazari, Milton Kurtz, Mário Rohnelt, Cris Vigiano e Carlas Wladimirsky.

Penso que a experiência do Grupo Nervo Óptico e do Espaço N.O. foi um marco para a produção artística de Porto Alegre, pois até a década de

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70 o que existia eram produções vinculadas a uma concepção de arte que privilegiava a figuração e em alguns casos uma ternática ligada ao regionalismo, com o uso de suportes e linguagens tradicionais tais como a pintura, o desenho e a escultura. Enquanto isso, centros como São Paulo e Rio de Janeiro já vivenciavam experiências não só com o abstracionismo desde as primeiras bienais, como no caso do movimento concreto e neoconcreto, mas também com uma arte mais experimental, como a de Hélio Oiticica, que rompia com a noção tradicional de objeto artístico. Portanto, essa experiência, embora pontual, pois havia uma parte importante de artistas que continuavam trabalhando com suportes tradicionais, coloca Porto Alegre em diálogo com o que estava sendo produzido em outros centros e de certa forma lança as bases do que é inaugurado com os anos 80, em que o intercâmbio entre as diversas regiões do país ocorre de forma fluida, possibilitando uma homogeneização maior, mas também uma melhor aceitação das produções locais.

No início dos anos 80, Porto Alegre era uma capital que vivia uma grande efervescência cultural. Havia uma verdadeira proliferação de bandas de rock que participavam dos inúmeros shows coletivos de música popular

gaúcha que aconteciam na cidade, várias peças teatrais, como a famosa

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B a ile i n a C u r v a , além da imensa produção em cinema super-8, bem como de festivais de música nativista. Embora algumas dessas produções estivessem relacionadas com o regionalismo, como boa parte da música produzida nessa época, em contrapartida é a diversidade a maior característica das produções, que não assumem uma única linha, mas se afinam com diversas tendências muitas vezes misturadas a elementos da vida cotidiana e com o sotaque de Porto Alegre. Essas características são visíveis tanto na música como nas produções de teatro e cinema.

Em relação às artes plásticas, o que acontece não é muito diferente. Se lançássemos um olhar mesmo que rápido para o que estava sendo produzido pelos artistas no início dos anos 80, seria difícil enumerar as diversas tendências presentes. Possivelmente encontraríamos aqueles artistas atuantes desde os anos 60, agora com uma trajetória bastante amadurecida e também com uma boa aceitação do mercado, como seria o caso de Xico Stockinger, Vasco Prado, Danúbio Gonçalves e Iberê Camargo, sendo que este último retornava para Porto Alegre nesse momento depois de longa estada no Rio de Janeiro. Também encontraríamos boa parte dos artistas atuantes nos anos 70, agora consagrados, não só participando de exposições, como é o caso de Vera Chaves Barcellos, mas também exercendo atividade docente no Instituto de Artes, como Romanita Disconzi e Carlos Pasquetti.

A maioria dos artistas que compõem a chamada geração 80 passam a ser atuantes no início da década e são oriundos do Instituto de Artes da

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Universidade Federal do Rio Grande do Sul ou ainda estudam nessa escola. Alguns desses artistas, como Karin Lambrecht, Michael Chapman, Heloísa Schneiders e Carlos Wladimirsky, têm uma passagem importante pelo Espaço N.O. (1979 a 1982), o que penso ter repercutido bastante nas suas produções. Outros artistas que não passaram por esse espaço estudaram no Instituto de Artes da UFRGS, onde, nesse período, Carlos Pasquetti, ex-integrante do Grupo Nervo Óptico, é professor e um referencial importante para os novos artistas, entre os quais estão Lia Menna Barreto, Mauro Fuke, Cynthia Vasconcellos, Kátia Prates, Flávia Duzzo, Rochelle Costi, Lúcia Koch, Luiza Meyer, Marijane Ricacheneisky, Élcio Rossini, Jailton Moreira e Fernando Limberger. Outros dois artistas com passagem pelo Instituto de Artes e que nessa época são bastante atuantes são Maria Lúcia Cattani e Renato Heuser, que se tornam docentes do Instituto de Artes nessa mesma década.

A produção artística dessa nova geração no entanto possui características peculiares, que se distanciam da produção dos artistas dos anos 70, mas em alguns casos tem uma forte influência da arte mais ligada ao conceitualismo da geração precedente. Embora seja impossível fazer generalizações, algumas características perpassam a quase totalidade das obras, como o retorno aos suportes tradicionais, as telas, no caso da pintura, e também uma certa recuperação da obra de arte enquanto objeto. Os novos artistas trabalham com diversas linguagens, que passam desde a gravura e o objeto até a pintura propriamente dita. Portanto, a produção da qer=çào

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apresenta algumas sutilezas que cabe destacar, pois ao mesmo tempo que recebe influência da arte conceitual e da arte experimental, retoma o prazer do fazer artístico. Esse fazer, no entanto, não é aquele preocupado com o apuro técnico, com a representar-ão fiel do real. A maioria desses artistas não estão preocupados com estudos incansáveis da figura humana ou da perspectiva, nem mesmo em utilizar técnicas ou materiais duráveis. Essas obras acabam aliando de certa forma o prazer manual do fazer artístico, onde o conceito está presente junto com um sabor artesanal e que ao mesmo tempo não se pretende bem-feito, bem-acabado. Muitas vezes inclusive há o uso de materiais prontos, que são retrabalhados, tais como plásticos, peles, tecidos. Por essa razão a pintura que está sendo feita nesse período, embora não tenha sido totalmente abandonada na década de 70, é uma pintura diferente, em que a tela, embora seja usada como suporte, está sendo constantemente transgredida. Esse prazer no fazer se encontra na maioria das obras dos artistas. Mauro Fuke trabalha faz suas esculturas em madeira, onde o trabalho artesanal é parte primordial; Lia Menna Barreto constrói suas esculturas em blocos de espuma e mais tarde seus bichos de espuma e tecido, em que o ato de costurar está presente, enquanto Karin Lambrecht constrói os chassis das suas pinturas monumentais.

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a

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mercado de arte, já consolidado nos anos 70, nos anos 80 se

encontra a pleno vapor, mas estas novíssimas produções só adquirem maior espaço em galerias a partir da metade da década, restando então os espaços oferecidos pelos salões de arte promovidos por instituições, mas que também já eram escassos em Porto Alegre.

Em 1981, com a abertura da Galeria Tina Presser, os trabalhos da geração 80 conquistam maior espaço, pois essa galeria tinha como proposta trabalhar com artistas gaúchos preferencialmente. A partir de 1983, alguns artistas da geração 80 de São Paulo e Rio de Janeiro, como Leonilson e Daniel Senise, expõem na galeria, que passa a fazer um intercâmbio com a Galeria Thomas Cohn, do Rio de Janeiro, representando uma abertura de espaço local e nacional às novas produções. Mesmo assim, essa galeria trabalha com artistas de certa forma bastante reconhecidos, seja por premiações em salões, no caso dos mais jovens, ou pelo mercado de uma forma geral, no caso dos mais antigos.

Em julho de 1985 acontece a abertura da Galeria Arte & Fato, com a mostra

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" a i T e n t a " , que de certa forma se refere à mostra " C o m o v a i v o c ê g e r a ç ã o a O ? " realizada no Parque Lage. Essa mostra contou com a participação de vinte jovens artistas nascidos entre 1954 e 1964, que eram na sua maioria ligados ao Instituto de Artes da UFRGS ou ao Atelier Livre da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Entre os participantes estão Cynthia Vasconcellos, Elida Tessler, Dione Veiga Vieira, Fernando Limberger, Laura Castilhos, Luiza Meyer, Maria Lúcia Cattani, Marijane Ricacheneisky, Moacir Guis, Regina Coeli, Ricardo Prado Lima, Rochelle Costi, Ronaldo Kiel e Teti Waldraff. Com a nova galeria, a produção dessa geração ganha maior espaço, pois esta tem como preferência não só o trabalho com artistas gaúchos, mas também com artistas jovens.

Mas a movimentação mais rica em termos de exposições da geração 80 é aquela ocorrida em termos de salões, principalmente do Salão Nacional de Artes Plásticas e também do Instituto de Arte da UFRGS. Esta última instituição, através da formação de artistas e também da Pinacoteca Barão de Santo Ângelo, foi de suma importância para estes novos artistas. Era no Instituto de Artes que eles formavam seus grupos, gestavam seus trabalhos e onde também faziam suas primeiras exposições, pois a Pinacoteca, além de ser um espaço para artistas de fora, era lugar de divulgação da obras dos alunos.

Embora na década de 80 os trabalhos coletivos tenham sido preteridos em função de experiências mais individuais, havia ainda uma efervescência de grupos de artistas, que, embora na maioria das vezes não se reunissem para produzir conjuntamente, reuniam-se para mostrar suas obras. Esse espírito de grupo que se formava adquiria um tom de bom humor, que estava presente não só nas obras, mas também nos próprioS

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nomes das exposições. Entre essas exposições estão " A r le M o r d e " realizada na Pinacoteca do Instituto de Artes da UFRGS em outubro d~ 1984, da qual participaram Karin Lambrecht, Michael Chapman, Mara Alvares, Maria Lúcia Cattani, Mauro Fuke, Marijane Ricacheneisky, Élcio Rossini, Fernando Limberger e Kátia Prates, e " A h N ã o ! " , nesse mesmo ano e local, e da qual participaram Cynthia Vasconcellos, Eleonora Graebin, Fernando Limberger, Lia Menna Barreto, Marijane Ricacheneisky e Flávia Duzzo. .

a

Instituto Goethe também exerce uma influência importante no período, pois promove inúmeras exposições, palestras e projeções de filmes de arte alemã, em conjunto com o MARGS e com o Instituto de Artes da UFRGS. Essas exposições são as mais diversas, incluindo desde fotografia, arquitetura, até pintura dos mais diversos períodos. Isso adquire valor significativo, pois boa parte da geração 80 em Porto Alegre é influenciada pela arte alemã, que se encontra em evidência desde o conceitualismo de Joseph Beuys até o neo-expressionismo do fim dos anos 70. Entre os artistas nos quais percebo essa influência estão Karin Lambrecht, Michael Chapman, Frantz, Renato Heuser e Heloísa Schneiders. Com exceção desta última, todos tiveram passagem pela Alemanha, onde realizaram cursos de formação, e essa influência será de alguma forma transmitida através de atividades docentes que estes artistas exerceram.

Com o tempo a produção da geração 80 foi criando mais corpo, adquirindo maior espaço não só em Porto Alegre, mas também em centros como São Paulo e Rio de Janeiro. Karin Lambrecht participa da Bienal Internacional de São Paulo de 1985 e 1987, e Cynthia Vasconcellos também participa desta última. Vários desses artistas adquirem um certo reconhecimento nesses centros, realizando fora de Porto Alegre exposições periódicas, sem no entanto precisar se transferir da cidade. Esse é o caso da maioria dos artistas dessa geração, como Mauro Fuke, Heloísa Schneiders, Lia Menna Barreto, Maria Lúcia Cattani, Frantz, Fernando Limberger, Michael Chapman e Karin Lambrecht. A permanência em Porto Alegre, embora apresente várias dificuldades, seja pela distância, seja pela falta de mercado ou até pela dificuldade de conseguir material para a produção, já não representa ausência de mérito, até porque esses artistas mantêm contato permanente com outros centros de dentro e fora do país, seja participando de mostras ou de cursos.

A marca da produção artística da geração 80 em Porto Alegre, ao Contrário do que ocorre em São Paulo e Rio de Janeiro, onde a pintura é predominante, é a diversidade. Essa diversidade se dá principalmente em relação ao uso de diferentes linguagens. Embora as experiências de produÇão de obras coletivas sejam quase inexistentes, uma série de pequenos grupos, quase todos do Instituto de Artes da UFRGS, se formam

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para mostrar seus trabalhos aglutinando várias tendências, o que enriquece estes pequenos grupos, que possuem como único objetivo realizar suas pesquisas individuais. Esta característica me parece fundamental, pois rompe com o pensamento de que os anos 80 foram anos em que o individualismo, a superficialidade e a sede pelo mercado tomaram conta das artes plásticas. Penso que esta pelo menos não foi a característica do que ocorreu em Porto Alegre, talvez devido

à

experiência do Espaço N.O., muito presente ainda nos anos 80.

De qualquer forma, o mercado de arte, representado pelas galerias, apesar de ter usufruído da nova safra de artistas, não foi o seu maior incentivador, cabendo este papel a determinadas instituições, como o

i~I~111 Instituto de Artes, que não possuía uma política clara em relação aos jovens

artistas, mas que se constituiu num espaço para produção e veiculação das obras.

Outra questão importante

é

a influência do conceitualismo e de outras tendências nas produções dos artistas, que, embora trabalhem com objetos materializados, dialogam com as tendências conceituais anteriores, onde acrescentam uma boa dose de bom humor e de uma certa humildade, pois sabem que seus trabalhos são feitos, acima de tudo, movidos por um sentimento de necessidade interna, individual, ou seja, não se pretendem porta-vozes de uma transformação social, o que não significa pessimismo, nem diminuição da importância de suas obras.

FONTES BIBLIOGRÁFICAS

BR-80. Pintura Brasil Década de 80. 2.

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126 BIBLOS, Rio Grande, 10: 117-126. 1998·

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