ARTIGO COM APRESENTAÇÃO BANNER - RESÍDUOS SÓLIDOS
APROVEITAMENTO DA COROA DO ABACAXI NA CONFECÇÃO DE PAPEL ARTESANAL
ANA CARLA MORAES DA SILVA, ANDRÉ LUIZ DOS SANTOS TEIXEIRA
Os principais resíduos do abacaxi (Ananas comosus) são a coroa, a casca, as extremidades e o cilindro central. Os frutos apresentam o peso médio de um quilo, dos quais 25% são representados pela coroa. Com o objetivo de confeccionar papel reciclado com fibras vegetais, este trabalho apresenta uma alternativa, que visa o aproveitamento de fibras da coroa do abacaxi, facilmente encontrada como refugo, em feiras livres de Belém e normalmente são destinados aos lixões da área metropolitana. A produção de papel artesanal é resultado da oficina de Papel Reciclado, ofertada pela Fundação Cultural do Pará (FCP), que promove regularmente oficinas, eventos e atividades educativas através da Arte. O papel reciclado obtido foi utilizado como revestimento em peças provenientes de outras oficinas agregando valor a esses produtos que são comercializados nos mercados da FCP e mostrou-se como uma boa fonte alternativa de renda sustentável.
Palavras-chave: Ananas comosus; fibra; reciclagem; oficinas.
INTRODUÇÃO
Há uma tendência mundial em buscar na natureza recursos que venham a beneficiar o homem, não somente na criação de novos produtos, bem como no desenvolvimento de novas tecnologias nas quais venham a propiciar uma melhoria não só na qualidade de vida da população, mas também na oportunidade de geração de novos empregos (OLIVEIRA et al. 2004).
A necessidade de aproveitar melhor os resíduos agrícolas como fonte de fibras alternativas para produção de celulose e agregar valor aos produtos tem sido uma prática constante. No caso da utilização de fibras virgens, derivadas de matérias-primas alternativas, podem ser
incorporadas às pastas de papel reciclado, para melhorar as propriedades mecânicas das folhas de papel.
Andrade et al. (2001) analisaram a possibilidade de se produzir papéis artesanais com boas propriedades, das misturas de massa de aparas com as pastas kraft de bambu (Dendrocalamus giganteus) e de bagaço de cana-de-açúcar (Saccharum officinarum), concluindo que, principalmente, a pasta do bagaço da cana-de-açúcar pode ser utilizada para melhorar as propriedades do papel artesanal.
Bastianello et al. (2009) obtiveram bons resultados preliminares, quando avaliaram a influência da adição de pastas de fibras de palha de arroz e pseudocaule de bananeira nas propriedades físicas e mecânicas de papéis reciclados artesanalmente.
De acordo com os estudos de Braga et al. (2010) a produção de papel reciclado, a partir do uso de sobras e aparas de papel, fibra e mucilagem de curauá (Ananas erectifolius L. B. Smith), para uso em embalagens, indicou ser promissora tendo em vista que se mostrou tecnicamente e economicamente viável, podendo representar uma inovação tecnológica de forte apelo socioambiental.
Com o objetivo de confeccionar papel reciclado com fibras vegetais, o presente trabalho apresenta uma alternativa, que visa o aproveitamento de fibras da coroa do abacaxi (Ananas comosus), que é facilmente encontrada como refugo, em feiras livres de Belém e
normalmente são destinados aos lixões de sua área metropolitana.
O abacaxi ou ananás, nomes utilizados tanto para a fruta como para a planta, pertence à família Bromeliaceae e gênero Ananas (SAKAMOTO et al. 2015). É uma autêntica fruta das regiões tropicais e subtropicais, consumido em todo o mundo, tanto ao natural quanto na forma de produtos industrializados (BENGOZI et al. 2007). A indústria de alimentos produz grande volume de resíduos resultantes da produção, preparo e consumo de alimentos. Os principais resíduos do abacaxi são a coroa, a casca, as extremidades e o cilindro central (SANTINI et al. 2013). Os frutos apresentam o peso médio de um quilo, dos quais 25% são representados pela coroa (SAKAMOTO et al. 2015).
Pensando nisso o Núcleo de Prática de Ofício e Produção (NPOP) da Diretoria de Oficinas Curro Velho da Fundação Cultural do Pará (FCP), desenvolve ao longo de sua histórica trajetória a Oficina de Papel Artesanal, onde produz papéis de excelente qualidade e singularidade do
ponto de vista artístico, e principalmente, contribui com o aproveitamento de resíduos vegetais.
O Núcleo de Prática de Ofício e Produção (NPOP) tem como objetivo o aperfeiçoamento das práticas em arte e ofício visando à geração de produtos criativos, baseados nos aspectos regionais, com ênfase na cultura local e principalmente à formação de agentes multiplicadores. O que justifica a importância do NPOP no cumprimento de práticas e divulgação de técnicas sobre o aprimoramento da reciclagem, estimulando a população a adotar técnicas que visa em especial à redução, reutilização e reciclagem de papel com utilização de resíduos agrícolas.
A produção de papel artesanal aconteceu no NPOP, como resultado obtido da oficina de Papel Reciclado ofertada em 2015, sendo utilizada como revestimento em peças, provenientes de outras oficinas ministradas no NPOP como de cartonagem, serigrafia, aproveitamento de matérias, dando, assim, o diferencial às peças, agregando valor aos produtos comercializados nos mercados da FCP, e mostrou-se como uma boa fonte alternativa de renda.
OBJETIVOS
O presente trabalho tem como objetivos:
- Apresentar uma metodologia utilizada em oficinas ministradas no NPOP para a produção de papel artesanal a partir da fibra da coroa do abacaxi, como uma fonte alternativa de renda sustentável.
- Utilizar o papel artesanal, em revestimento de peças produzidas em outras oficinasministradas no NPOP,como de cartonagem, serigrafia, aproveitamento de matérias, dando, assim, o diferencial às peças comercializadas nos mercados da instituição.
- Contribuir para promover a Educação Ambiental levando elementos para sensibilização das comunidades, através de um destino alternativo de aproveitamento da coroa do abacaxi.
METODOLOGIA
A oficina aconteceu em 2015, com carga horária de 45h, atendendo um público a partir de 16 anos, na sua maioria, oriundos da comunidade local Vila da Barca, no bairro do Telégrafo, Belém-PA, área de situação de risco social e pobreza.
A produção de papel artesanal foi obtida de três formas: somente fibras vegetais; mistura de papel branco tingido com fibras vegetais e mistura de papel branco e amarelo, com fibras vegetais. Os papéis utilizados foram de doações que a FCP recebe constantemente. Os amarelos são provenientes de envelopes de correspondência institucional de gestões anteriores e os brancos de escritórios.
Para a confecção do papel artesanal a partir de fibras vegetais, utilizaram-se as coroas dos abacaxis (Ananas comosus) coletadas pelos alunos, em feiras livres do bairro do Telégrafo em Belém-PA. Transportadas para o NPOP, onde foram cortadas manualmente com tesouras e/ou estiletes, em pedaços pequenos de aproximadamente 2 a 4 cm (Figura 1) e colocados em uma bacia com água por 24h.
O cozimento da fibra ocorreu em uma lata de 5L, contendo água e fibra na proporção de 2:1 por 30min, após fervura (fogo brando, Figura 2). Para cada litro de água foi adicionado ½ colher de hidróxido de sódio (NaOH). Após o resfriamento do licor (ou caldo) obtido do cozimento, foi realizada a filtração através de telas de nylon, onde o primeiro licor fica reservado em um balde, para ser reutilizado em futuros cozimentos de fibras. Foram realizadas sucessivas lavagens com a finalidade de obter-se um licor claro e retirar resíduos de NaOH.
Um liquidificador industrial foi utilizado para desagregar e homogeneizar as fibras até obter uma consistência pasto-fibrosa (Figura 3). A massa obtida nesse processo, cerca de 1L de fibra foi transferida com o auxílio de uma jarra, para uma cuba, contendo água até a metade da sua capacidade. Com o auxílio de telas de madeira no tamanho de 30 x 40 cm, sempre em pares, sendo uma tela forrada com nylon e a outra sem nylon, cuja função é reter as fibras dentro do molde. A tela foi introduzida de forma inclinada na cuba, e em movimentos horizontais, para que as fibras se entrelacem. Em seguida, retirou-se verticalmente a tela permanecendo paralela, até escorrer toda água e verificar a quantidade de polpa que deve estar sobre a tela na faixa de 150 - 200 mL. A cada retirada de polpa em tela, são adicionados 150 a 200 mL de fibra e água para manter o volume inicial.
As telas foram retiradas lentamente para obter um papel mais uniforme e o excesso de água foi retirado para evitar que caia pingos sobre a folha formada (Figura 4). As folhas formadas são transferidas e empilhadas intercaladas com TNT (Figura 5), para serem prensadas (Figura 6) e secas em varal ao ar livre (Figura 7). Após a secagem, os papéis passaram pelo processo de calandragem, cuja função é alisar a superfície da folha (Figura 8).
Os papéis reciclados com adição de fibras foram obtidos, conforme descrição a seguir: os papéis branco e amarelo foram rasgados manualmente e separadamente deixados submersos em água em baldes por 24 horas. Depois triturado em um liquidificador industrial até a consistência desejada, obtendo-se assim, uma polpa de papel branco e uma polpa de papel amarelo. Uma parte da polpa proveniente do papel branco recebeu tingimento cinza e a outra parte foi misturada a polpa de papel amarelo na proporção de 1:1.
Na reciclagem de papéis artesanais com adição de fibras a proporção foi de 1:1 (polpa e fibra). Seguindo o mesmo procedimento já citado na obtenção do papel confeccionado somente de fibras. O fluxograma do processo está representado na Figura 9.
Figura 9- Fluxograma do processo de confecção de papel artesanal
RESULTADO
Observou-se que do papel artesanal confeccionado apenas com a fibra da coroa do abacaxi obtém-se um material flexível, resistente e com aparência rústica (Figura 10).
Da mistura da fibra da cora do abacaxi com papéis na proporção de 1:1 pode-se observar variações, tanto na flexibilidade quanto na coloração, predominando a cor inicial dos papéis utilizados na reciclagem (Figura11).
Durante a formação dos papéis artesanais, observam-se também variações nas características físicas como gramatura e aparência, mesmo promovendo-se a reposição da massa após a formação de cada folha. Isso pode está relacionado a alguns fatores como:profundidade de imersão da tela de nylon, velocidade de descida da tela e seu ângulo de imersão, volume de fibras em suspensão, metodologia de secagem e processo de prensagem da folha.
Essas variações nos papéis são importantes tanto no campo da arte quanto no artesanato, pois resulta num dos seus maiores atrativos, possibilitando obter produtos personalizados e exclusivos.
Figura 10- Papel confeccionado com a fibra da coroa do abacaxi
A
Figura 11- Papel reciclado com adição de fibras. (A) papel branco e amarelo, com fibras e (B) papel branco tingido de cinza com fibras.
Existem muitas alternativas para o papel artesanal produzido, tais como embalagens, caixas, capas de agendas, etc. Os papéis produzidos durante as oficinas realizadas no NPOP são utilizados principalmente em revestimentos de produtos obtidos nas oficinas de cartonagem (Figura 11) e comercializados nos mercados da Fundação Cultural do Pará (FCP) no valor de R$ 2,00 e R$ 5,00 sem serigrafia e com serigrafia, respectivamente.
B
Figura 11- Produtos obtidos nas oficinas realizadas no NPOP Fonte: Acervo da FCP
CONCLUSÕES
Por meio do trabalho apresentado, nota-se que o papel artesanal de fibra, ou papel reciclado com adição de fibras é uma maneira promissora de agregar valor ao material coletado pelos alunos, inicialmente considerado apenas como refugo.
Apresenta uma solução sustentável do ponto de vista ambiental. Prioriza o aproveitamento da coroa do abacaxi como fonte de matéria prima natural disponível e de fácil acesso. Contribui para redução de resíduos, através do resgate de técnicas artesanais. Melhora a rentabilidade, pois os papeis artesanais, após serigrafados, são usados em revestimento de material de escritório, confecção de convites, caixas, e entre outros fins, portanto, facilmente aceito no comércio local.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A produção de papel artesanal apresenta-se como alternativa e acréscimo de renda por ser um processo que exige pouco investimento em estrutura física, por ser simples e, principalmente, por ser muito rentável e sustentável. Podendo ser utilizada como recurso na Educação Ambiental, para sensibilizar os participantes desta iniciativa promovida pela Fundação Cultural do Pará (FCP).
REFERÊNCIAS
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