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37º ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS ST33 - As classes sociais no Brasil contemporâneo

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Academic year: 2021

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37º ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS ST33 - As classes sociais no Brasil contemporâneo

CLASSE SOCIAL E ELITE

NOS ESTUDOS SOBRE EMPRESARIADO NO BRASIL Paulo Roberto Neves Costa1

Há aproximadamente 50 anos atrás, a análise sociológica no Brasil deu passos importantes para o avanço dos estudos sobre o empresariado2. Tais estudos, até meados da década de 1960, tendiam a uma abordagem mais ensaística, dedutiva, normativa ou até política acerca deste grupo social, fundamental no processo de constituição da sociedade capitalista no país. Após estes primeiros trabalhos, outros tantos foram surgindo, consolidando definitivamente o empresariado enquanto questão sociológica nas Ciências Sociais no Brasil. E a leitura daqueles trabalhos pioneiros inspirou e ainda inspira os estudos sobre o empresariado.

Mas, um percurso pela literatura acerca deste tema permite que sejam levantadas algumas questões que, embora nunca deixassem de ter importância para a construção de novas estratégias de análise, não foram exploradas em todas suas implicações, ou ficaram obscurecidas por trás do uso, muitas vezes pouco criterioso, de certas expressões, as quais raramente foram tratadas em todas as suas implicações teóricas, ou seja, enquanto conceitos.

Entre tais expressões estão: empresariado, executivos, empresários, elite empresarial, elite econômica, oligarquia, burguesia, frações de classe, classes dominantes etc. Por sua vez,

aquelas questões remetem a problemas diversos, tais como o papel do empresariado na construção da ordem social capitalista ou no desenvolvimento econômico no Brasil, o seu peso ou força política, o empresariado enquanto “classe dominante”, “burguesia” ou “classe

1 Professor do Programa de Mestrado em Ciência Política e do Programa de Pós-graduação em Sociologia da UFPR e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira do Departamento de Ciências Sociais da UFPR. Este trabalho está vinculado a projeto de Bolsa Produtividade do CNPq intitulado Elite econômica no Brasil em perspectiva comparada, o qual é desenvolvido em parceria com o Instituto de Sociologia Max Weber da Universidade de Heidelberg – Alemanha, cuja pesquisa conta com o apoio do CNPq e também do programa Probral da CAPES-DAAD, aos quais expressamos nossos agradecimentos. Uma apresentação inicial das idéias aqui desenvolvidas foi feita no 36º Encontro Anual da Anpocs (COSTA, 2012).

2 Neste trabalho, diante da diversidade de expressões que encontramos na literatura sobre este assunto, usaremos a noção de empresariado como uma forma padronizada de nos referirmos ao modo como os trabalhos se reportam ao grupo dos proprietários e controladores dos meios de produção (Marx) ou àqueles que são os agentes fundamentais da condução das atividades privadas voltadas para a satisfação das necessidades sociais (Weber). No Anexo contido no final deste texto, apresentamos um quadro com obras igualmente importantes, das quais apenas algumas foram aqui comentadas, visando ilustrar este e outros de nossos argumentos, e não dar conta de todos os estudos que tratam direta e indiretamente deste tema. Este quadro foi montado a partir de duas variáveis: as expressões utilizadas para se referir ao empresariado, e a questão e a forma através das quais este grupo é tratado.

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social”, “fração de classe”, ou mesmo do empresariado enquanto “elite”, econômica e/ou política3.

Neste trabalho nos limitaremos a considerar as duas últimas das questões acima destacadas, ou seja, o modo como a literatura trata do empresariado enquanto classe e/ou enquanto elite. Este percurso nos permitiu constatar, em primeiro lugar, a importância de tais questões nestes estudos, mas, em segundo lugar, a forma errática e problemática da sua ocorrência. E, por último e mais importante, procuramos ultrapassar esta mera constatação e defender que é possível retirar destas análises elementos para compor uma estratégia ou uma agenda de pesquisa sobre o empresariado a partir de proposições que já estão presentes nas

análises produzidas sobre este grupo social.

A primeira parte deste texto trata da questão da classe e da elite na literatura sobre empresariado no Brasil. Em seguida, apresentamos as proposições teóricas e metodológicas que podem ser retiradas a partir da presença esparsa, um pouco errática, mas sociologicamente rica e sugestiva, dos conceitos de classe e de elite, presentes na literatura sobre o empresariado. Por fim, faremos nossas considerações finais.

I - Empresariado como classe e como elite

Como afirmado acima, não cabe aqui uma revisão completa da já vasta literatura sobre o empresariado no Brasil, que vai de trabalhos clássicos da Sociologia brasileira a inúmeras dissertações e teses de doutorado produzidas por pesquisadores brasileiros e estrangeiros4. Acreditamos que o percurso aqui apresentado é suficiente para realizarmos os objetivos deste trabalho e, portanto, nos deteremos em alguns dos estudos mais importantes sobre o assunto e cuja natureza se aproxima das preocupações que guiam nossas reflexões. Deste percurso, verificaremos como os autores se referem ao empresariado e como eles resolvem a questão da classe e da elite, ou como tais expressões ou noções se apresentam nas diversas análises

sobre o empresariado.

Para tanto, vamos dividir a literatura em quatro grupos: os ensaístas, os sociólogos, os cientistas políticos e os marxistas. Os critérios subjacentes a estas noções são bastante

elásticos, não seguem uma lógica cronológica e são usados em função de nossos objetivos, não tendo, portanto, a pretensão de classificar ou tipificar tal literatura5.

3 Ver o Anexo.

4 Ver o Anexo.

5 Há outras importantes abordagens que tratam da questão do empresariado, mas que não se reportam à questão da classe ou da elite, por exemplo, Mancuso, 2004, Iglécias, 2007, Schneider, 2004, Payne, 1995 e Weyland, 1998, mas, nem por isso, deixarão de ser aqui comentados.

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I.1 – Os ensaístas

Estamos considerando como ensaístas os autores que tratam do empresariado a luz de uma interpretação sobre o processo histórico de constituição da sociedade brasileira para construir suas análises, e que, portanto, não se limitam ao resultado de uma pesquisa empírica específica. As reflexões destes autores se voltam para as características, a formação, a gênese, o papel e as tarefas do empresariado. Disso decorrem outras questões, tais como a da burguesia nacional, a da burguesia brasileira, da classe dominante e da revolução burguesa6. Deste grupo destacamos, em primeiro lugar, os trabalhos de Hélio Jaguaribe. No final dos anos 1950, Jaguaribe apresentou para os empresários a sua análise a respeito das tarefas e dos problemas que se colocavam para a “burguesia”, mais especificamente industrial, frente à

“transição” do “subdesenvolvimento” para o “desenvolvimento”. O autor concluiu que o desenvolvimento colocava desafios para a burguesia, entre eles a substituição de importações, o planejamento, o combate ao crescimento da máquina pública, o aperfeiçoamento do Estado e o aumento da produtividade (JAGUARIBE, 1958).

Por sua vez, Nelson Werneck Sodré trata da “gênese” da “burguesia brasileira” como forma de analisar a “classe dominante” no Brasil e como um “esforço de interpretação”, no sentido de ajudar a promover, o “desenvolvimento da revolução brasileira”. Ou seja, busca situar a burguesia brasileira no seu “desenvolvimento histórico” e “contribuir para a prática”

(SODRÉ, 1967)7.

Sodré conclui que o “... aparelho de Estado, em nosso país, está na posse da burguesia”, mas que havia a necessidade da “burguesia nacional” de consolidar o seu poder sobre o latifúndio e o imperialismo, e para isso, teria como aliados o proletariado e o campesinato: esse seria o seu “papel”. Seria desta forma que a “burguesia nacional” realizaria

“as tarefas peculiares è revolução burguesa” (SODRÉ, 1967).

Em suma, dos ensaístas derivamos algumas indicações: a importância da questão da classe, mas tratada a partir de sua gênese e de suas tarefas, ou seja, a importância da questão da missão política e das responsabilidades do empresariado para a construção das análises, dando a estes trabalhos um forte teor normativo e prescritivo. Além disso, há a tendência a se considerar a burguesia como um todo, a despeito de toda a diversidade interna. Portanto, isso

6 Há outros trabalhos mais recentes que compartilham algumas destas características da abordagem ensaística, mas que são mais voltados para uma dada conjuntura, tais como os de Ianni (1990) e Francisco de Oliveira (1990). Isso reforça que os critérios que adotamos aqui servem apenas como uma referência para a análise, mas não para a explicação e o tratamento de todas as implicações das obras aqui referidas.

7 Segundo Luiz Carlos Bresser Pereira, Sodré e Jaguaribe faziam parte da “interpretação nacional-burguesa”, que surge nos anos 1940, predomina nos anos 1950 e seria reflexo das mudanças pós-30. Para Bresser Pereira, tal interpretação defenderia a necessidade de uma identidade e de um projeto nacional, que girava em torno da industrialização e da independência política (BRESSER PEREIRA, 1997).

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sugere uma agenda de pesquisa sobre a atualidade, ou seja, como o empresariado se relaciona com a política e o Estado, e não apenas com a política econômica, como pensa seu papel e como pretende realizá-lo. Além disso, observamos que estes trabalhos possuem uma forte conotação normativa e prescritiva, ou seja, contém uma visão do que seria correto fazer e visam a prática ou a indicação do que a burguesia deveria fazer. Mas, o que podemos ressaltar também é que várias destas questões estarão presentes nos trabalhos dos outros grupos de estudos aqui considerados. Por fim, destaca-se a importância da questão da classe e até mesmo certa tentativa de definir sociologicamente o conceito de classe, embora isso não tenha sido acompanhado do desenvolvimento de pesquisas empíricas nas quais tais conceitos seriam operacionalizados em análises históricas8.

I.2 – Os sociólogos

Em segundo lugar, podemos situar o grupo dos sociólogos, que também poderiam ser chamados de sociólogos do desenvolvimento, dada a sua preocupação com a relação entre empresariado e desenvolvimento econômico. Este grupo se caracteriza também por uma inovação em relação aos ensaístas, ou seja, a realização de pesquisas empíricas e o enfrentamento da análise sociológica do empresariado, com todas suas implicações teóricas e, sobretudo, metodológicas, voltada para as formas históricas de sua existência no Brasil. Mas, o fato de basearem suas análises em pesquisas empíricas não significa que deixaram de lado as questões que caracterizam a abordagem dos ensaístas, ou seja, uma dada interpretação da formação da sociedade capitalista no Brasil, em particular no que diz respeito ao desenvolvimento econômico.

Fernando Henrique Cardoso (1964) volta sua pesquisa para os dirigentes de grandes empresas industriais brasileiras no início dos anos 19609, com o objetivo de analisar a

“participação dos empreendedores industriais no desenvolvimento econômico do Brasil” e estudar o empresariado a partir das conseqüências das transformações na sociedade capitalista sobre as “funções empresariais” (CARDOSO, 1964).

Cardoso chama a atenção para o fato de que as “elites dirigentes da economia”

tornaram-se também “elites políticas”, pois o êxito da própria empresa exigia que se ultrapassasse o âmbito restrito dos negócios empresarias e se interferisse no sistema de poder, disputando com os novos grupos gerados pela própria dinâmica da produção moderna, sejam

8 Essas características podem ser encontradas também em trabalhos de alguns autores que aqui seriam classificados como marxistas, como é o caso de Antonio Carlos Mazzeo (1988 e 1997).

9 A pesquisa foi realizada entre julho de 1961 e outubro de 1962 e envolveu industriais de São Paulo, Blumenau, Belo Horizonte, Recife e Salvador. Utilizou-se o resultado de um survey sobre as empresas da grande São Paulo, envolvendo a aplicação de questionários para 288 empresas com mais de 500 empregados (CARDOSO, 1964).

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proprietários ou não-proprietários. Outro aspecto que merece destaque é a idéia de que as transformações nos objetivos, motivações e qualidades pessoais dos dirigentes econômicos não afetaram o aspecto essencial que é a produção do lucro, nem transformaram as “funções empresariais” em mera rotina administrativa (CARDOSO, 1964, p. 23 a 37). Para Cardoso, a questão da propriedade é decisiva. Por fim, o autor indica que considerar os industriais como

“classe social” significa levar em conta as condições sociais de formação da burguesia industrial, a forma como tomam consciência dos problemas do desenvolvimento econômico e as suas perspectivas políticas (CARDOSO, 1964, p. 159).

No final dos anos 1960, Cardoso defende a necessidade de se considerar as diferenças entre a situação histórica que define as “possibilidades de ação” e o “modo de ser” das “elites empresariais latino-americanas” e aquela da Europa e dos EUA. Apesar de reduzir esta questão às “elites industriais”, utiliza entrevistas com os dirigentes de empresa industriais e conclui que “... o estudo do empresariado deve considerar as ‘características’ típicas dos empresários e as condições sociais que regulam a formação da burguesia industrial, mas também se impõe analisar tais tópicos em conexão com as condições concretas das sociedades globais de cada país em que se insere o grupo empresarial” (CARDOSO, 1967, tradução de P.R.N.C). Para tanto, Cardoso mobiliza variáveis como a ocupação dos pais, o nível educacional, a forma pela qual se alcançou a posição de gerente, quais são os incentivos para exercer a função empresarial, aspectos de sua personalidade e como se auto-definem enquanto empresários (CARDOSO, 1967)10.

E em trabalhos posteriores de Cardoso, voltados para a conjuntura dos anos 1970 e 1980, as questões relacionadas à problemática do empresariado enquanto classe dominante permanecem e se apresentam em torno do problema de como o empresariado, identificado como “empresários”, “empresariado”, “grupos empresariais”, “burguesia local” etc., poderia exercer a “hegemonia burguesa”, seja no que diz respeito ao modelo de desenvolvimento, seja no que tange ao papel do empresariado na “liberalização” do regime político, ou “... no que consiste a ação empresarial na sociedade brasileira” no final dos anos 1970, e as possibilidades de uma “reemergência de uma ‘hegemonia burguesa’” e os seus limites (CARDOSO, 1993).

10 Em outra obra, Cardoso (1969) publica a tradução para o português deste trabalho de 1967. Nesta obra de 1969, Cardoso também trata da questão das “elites empresariais” na América Latina e se debruça mais detidamente sobre este conceito, e a ele atribui uma acepção “ambígua”: remeteria ora aos “novos grupos”

surgidos dentre das “classes produtoras” e à heterogeneidade do sistema de classes e ao papel de liderança que

“subgrupos específicos” podem desempenhar, ora à questão da “... transformação do próprio padrão estrutural das sociedades latino-americanas” e ao processo de transformação e de formação dos mercados nacionais das sociedades, no caso, latino-americanas (CARDOSO, 1969). Neste texto, Cardoso não baseia-se em uma pesquisa específica, como nos trabalhos anteriores, mas sim em uma análise da história dos países latino-americanos.

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Por sua vez, Luciano Martins pretendeu fazer um estudo da “burguesia nacional” e da

“formação histórica e do comportamento social do empresário industrial brasileiro”, o que suscitou “uma série de questões metodológicas que acabaram por obrigar o autor a uma reapreciação de todo o processo brasileiro de desenvolvimento” (MARTINS, 1968, p. 11)11. Martins usa a expressão “empresariado industrial brasileiro” para se referir ao grupo social concreto que é objeto da análise (MARTINS, 1968, p. 26) e “grandes industriais” para se referir ao grupo social concreto, objeto das pesquisas (questionários) (MARTINS, 1968, p.

120). Para o autor, os empresários industriais formam o “... estrato que, em última análise, constituiria a burguesia nacional” (itálico de Martins) (MARTINS, 1968, p. 126). Mas, as expressões mais freqüentemente usadas pelo autor são “empresários”, “setores empresariais”

etc., e a expressão “burguesia nacional”, geralmente entre aspas, aparece sem uma discussão mais detida sobre a sua fundamentação teórica.

Para Martins, a questão de fundo é a “reidentificação e redefinição dos papéis (...) dos atores sociais do processo de desenvolvimento”: “À medida que se reconhece uma tipicidade para o contexto histórico do subdesenvolvimento e seu processo, a questão do papel do empresário, e a novidade que ele possa conter, passam necessariamente a ter que ser abordadas a partir da situação que se quer compreender”; a crise “pós-desenvolvimentista” é um momento estratégico para fazer tal análise (MARTINS, 1968, p.109).

Por último, podemos mencionar o trabalho de Bresser Pereira, que estuda os

“empresários industriais e administradores” ou o papel dos “empresários industriais brasileiros” na industrialização e no desenvolvimento econômico e político do Brasil. Mas, tal questão não teria sido tratada pelo autor em todos os seus aspectos, mas sim especificamente no que tange às origens étnicas e sociais, à mobilidade social e à carreira dos dirigentes das empresas paulistas (BRESSER PEREIRA, 1974).

A pesquisa de Bresser Pereira consistiu em fazer um “... levantamento factual sobre a mobilidade social e profissional dos administradores de cúpula das empresas paulistas”12. Para tanto, foi feita apenas uma verificação das origens étnicas (nacionalidade de pais e avós) e sociais (a “classe social” da família). Segundo o autor, no Brasil, os “empresários schumpterianos” e “administradores profissionais” só surgem a partir dos anos 1930. Mas,

11 Martins realizou uma pesquisa junto aos empresários industriais em meados dos anos 1960 e tratou das questões sobre a reorientação do modelo de desenvolvimento pós-1964 através de questionário submetido aos dirigentes dos 50 maiores grupos industriais do Rio de Janeiro e de São Paulo (MARTINS, 1968, p. 26). Ainda que a pesquisa tenha se voltado para os grandes e médios industriais, estes últimos foram considerados apenas quando adicionavam algo às conclusões tiradas a partir dos primeiros (MARTINS, 1968).

12 Foram entrevistados diretores ativos das empresas nacionais e estrangeiras com mais de 249 empregados, localizadas na Grande São Paulo (BRESSER PEREIRA, 1968).

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diferentemente dos “países capitalistas desenvolvidos, até o início dos anos 1970 nem os empresários nem administradores de empresas alcançaram um poder econômico e político significativo no Brasil”. Mas, após 1930, diante dos limites do Estado e da falta de interesse do capital estrangeiro na industrialização, teria cabido aos “empresários industriais” o impulso inicial da “revolução industrial brasileira” até o final dos anos 1940. Para Bresser, a maior parte dos industriais era composta por imigrantes radicados no Brasil e a tese de que teria surgido uma burguesia nacional capaz de liderar o desenvolvimento econômico no Brasil em bases capitalistas e nacionalistas somente faria sentido até meados dos anos 1950, como é o exemplo da análise de Hélio Jaguaribe, quando já uma série de fatores novos inviabilizava o surgimento de uma burguesia nacional (BRESSER PEREIRA, 1968, p. 14-17).

A tese de Bresser Pereira é de que, no final dos anos 1950, os empresários industriais assumiram uma “posição dominante dentro da burguesia brasileira”, frente aos grandes

“comerciantes e fazendeiros” e “... não precisavam mais ser nacionalistas para defender seus interesses”. Isso teria feito com que esses empresários se acomodassem e perdessem a oportunidade de “desenvolver uma ideologia própria”, seguiu a ideologia da “velha oligarquia mercantilista”. Enfim, os empresários industriais perderam a chance de ser “nacional”: “..., os empresários industriais brasileiros nunca chegaram a se constituir em um grupo social coeso, com interesses, objetivos e ideologia definidos” (BRESSER PEREIRA, 1968, p. 19). Mas, em nota, Bresser ressalva que isso não quer dizer que a “burguesia industrial brasileira” fosse uma abstração ou um grupo sem um mínimo de coesão. Tratar-se-ia de uma “posição intermediária”: “A base material comum em que opera esta burguesia sempre lhe garantiu uma certa identidade de classe” (BRESSER PEREIRA, 1974, 28).

Quanto à origem social, a grande maioria dos empresários seria originária das classes médias e a ascensão social teria se dado por etapas, desde os avôs. A mobilidade social no Brasil ainda é baixa, comparada com outros países. Os filhos das classes mais altas teriam mais chances de fazer parte da diretoria. Isso se deveria, em parte, ao estágio de desenvolvimento no Brasil (BRESSER PEREIRA, 1974, p. 188).

O poder econômico teria sido assumido cada vez mais por “... uma nova classe de empresários industriais”, na maioria imigrantes ou descendentes de imigrantes, e originários principalmente da classe média. Para Bresser Pereira, Caio Prado Jr., Luciano Martins e Castro Gonçalves defenderiam que os empresários industriais são uma mera continuação da oligarquia agrário-comercial que dominava o país até 1930 e que, portanto, não havia conflitos entre estes dois grupos. Mas, embora compusessem uma mesma “elite econômica”,

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se trata de “... dois grupos étnica e socialmente separados”, com interesses econômicos que, no início, eram conflitantes (BRESSER PEREIRA, 1974, p. 186).

Em suma, deste breve comentário de algumas obras clássicas da Sociologia do empresariado no Brasil, destacamos a importância que eles atribuem às questões que guiam as nossas reflexões, mas, sobretudo, a indicação de procedimentos metodológicos e de hipóteses de trabalho que, como veremos mais adiante, são fundamentais para a construção da estratégia aqui proposta.

Quando se considera os estudos dos sociólogos verifica-se que: 1-a preocupação com aquilo que seriam as tarefas do empresariado ainda estão presentes; 2- a questão da classe também se apresenta, através de um conceito mais descritivo, mas este passa a ser articulado a pesquisas típicas de estudos de elite; 3- este segundo conceito também não é tratado de forma sistemática, ou seja, não há um debate mais intenso com os trabalhos clássicos (Mosca, Pareto e Michels), nem com os contemporâneos ao momento em que se estava escrevendo (Wright Mills e Robert Dahl, por exemplo), predominando a referência ao conceito de empreendedor de Schumpeter, ora de forma crítica (Cardoso, 1964 e Martins, 1968), ora de forma positiva (BRESSER PEREIRA, 1974).

Entretanto, os limites da definição teórica e metodológica de elite é menos importante diante de outros tantos aspectos positivos, os quais, em termos da nossa problemática, implicaram em avanços importantes13. A novidade não é meramente a existência de pesquisa empírica, mas sim o enfretamento das questões metodológicas relacionadas à análise sociológica e historicamente situada do empresariado. Os sociólogos, em especial Cardoso, indicam a importância das variáveis e questões políticas nos estudos sobre o empresariado.

Para esses autores, a questão da política se coloca prioritariamente como variável de análise, e não como questão concreta, como ocorre com os ensaístas. E isso não impediu a consideração de outras variáveis, como a cultural (valores e atitudes políticas), a institucional (as entidades empresariais e a empresas) e a individual (os empresários, seus valores e suas histórias pessoais).

Mesmo que ainda persista a questão das tarefas do empresariado, há uma preocupação em verificar empiricamente o que o empresariado é, mesmo que isso seja feito também em comparação com o que ele não teria sido, como é o caso de Bresser Pereira. O problema desta abordagem é ser um tipo específico de comparação, ou seja, não se trata de um método comparativo que articula certo número de experiências históricas, mas sim da comparação

13 Em outro trabalho, destacamos a importância das contribuições de Cardoso e Martins para a análise do empresariado no Brasil (COSTA e ENGLER, 2008).

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com algo a-histórico ou um modelo de empresariado, da mesma forma que os trabalhos dos ensaístas, prática que Cardoso (1967) tenta evitar. Não se trata de negar o uso de modelos,

que todos os grupos tendem a fazer, mesmo quando criticam tal postura, mas sim de usá-la a partir de critérios metodológicos claros e não normativos, ou seja, a partir das premissas analíticas do método comparativo.

De um modo geral, os sociólogos partem da idéia de que há uma relação entre a posição de um grande empresário ou líder de grande empresa, em situação de entrevista, e o conjunto da classe ou “burguesia”. Esta é a forma se resolve a questão da forma de existência, manifestação e ação da classe. E Cardoso acrescenta uma observação interessante: qualquer prognóstico sobre o futuro da sociedade de classes no Brasil, só poderia ser feito

“concretamente” se, simultaneamente à análise das transformações porque passam as classes dominantes, se faça a análise das massas urbanas, especialmente trabalhadores, e das massas rurais (CARDOSO, 1964, p. 175). E se, por um lado, este grupo considera os empresários compreendidos pela sua pesquisa enquanto uma “classe”, no caso, a “burguesia industrial”, por outro lado, sugere que as entidades de representação seriam também formas concretas de manifestação desta classe.

Enfim, a consideração do empresariado não apenas como questão, seja teórica, seja política, mas como um objeto, é decisiva, porque indica que a forma de fazê-lo caminha na direção da análise da classe a partir de sua elite. Além disso, estes autores dão início a uma estratégia de abordagem que vai estar presente nos estudos sobre empresariado até os dias de hoje. Como vimos acima, um aspecto importante é a consideração das variáveis políticas e culturais dos empresários, agora como questão de pesquisa, e não apenas como parte de uma grande interpretação. E Cardoso e Martins sugerem que a dimensão da prática política, tão importante para os ensaístas, poderia estar presente no processo de coleta de dados, desde que passando pelo crivo teórico, ou da “coerência teórica” (MARTINS, 1964).

Há também entre estes autores a preocupação com as “funções empresariais” e sua dinâmica (Cardoso, 1964 e Martins, 1968). Cardoso já falava até em “responsabilidade social” da empresa e o impacto disso na atuação do empresariado e na sua relação com a sociedade e o Estado (Cardoso, 1964, p. 155). Como é sabido, está é uma importante agenda de pesquisa sobre empresariado no Brasil e no mundo.

Martins, por sua vez, parece usar a expressão burguesia apenas em função da importância que, naquela conjuntura do debate acadêmico e político, esta figura assumia.

Mas, é muito interessante o comentário deste autor sobre a necessidade de “trocar a cautela cientificista pelos riscos da criação” (MARTINS, 1968, p. 12) quando se trata de problemas

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que fazem parte da realidade mais imediata. Além disso, Martins considera importante trabalhar questões que eram indagações de grupos sociais concretos, o que sugere que as questões colocadas pelos próprios empresários, poderiam ser trabalhadas pelo analista (MARTINS, 1968, p.13). Para Martins, a preocupação em ter e apresentar sua interpretação desta situação de crise do desenvolvimentismo se coloca como algo necessário para se analisar a ação política do empresariado industrial e conseguir ser entendido pelo leitor. Ou seja, não seria possível fazer uma análise desta ação política sem ter uma interpretação da conjuntura estudada.

O que nos interessa também destacar no trabalho de Martins é algo que também existe nos trabalhos de Bresser Pereira (1974) e Cardoso (1967), ou seja, a articulação do levantamento de informação sobre os valores e a forma de pensar o gerenciamento por parte dos industriais brasileiros com a análise de sua trajetória social e familiar. E o trabalho de Bresser Pereira (1974) também é exemplar deste tipo de análise sobre o empresariado brasileiro, pois mesmo que não esteja centrado na variável política, indica os desafios da análise sociológica do processo de constituição do empresariado como grupo social, utilizando procedimentos típicos de estudos de elites articulado ao estudo das organizações (empresas).

Entendemos que esse é um estudo importante para se conhecer o grupo enquanto tal, ou seja, como ele é composto, o que, por sua vez, é importante para pensar suas formas de ação coletiva. Mas, o argumento de que o empresariado teria perdido uma “oportunidade” de desenvolver ideologias e formas de ação próprias, não é propriamente ‘sociológico’, pois diz respeito a um juízo em relação a o que o grupo deveria ou poderia ter feito, mas que não fez.

Caberia melhor ao menos especular porque o empresariado brasileiro não fez o que as burguesias de outros países supostamente teriam feito.

Outras observações podem ser feitas sobre os sociólogos. Em primeiro lugar, como os trabalhos acima mencionados exemplificam a predominância da preocupação com a relação entre empresariado e economia, ficando as questões relacionadas à política suas instituições, quando presentes, ocupando um segundo plano no processo de análise da classe e de sua elite.

Mas, o mais importante é o fato de estes trabalhos, realizados há praticamente 50 anos atrás, mobilizarem não apenas a questão da elite de classe, como também variáveis importantes para a composição da estratégia que aqui estamos propondo, no caso, a questão das motivações e dos valores, seja em relação à gerência, seja em relação à economia, à sociedade e à política.

Mas, principalmente a partir das proposições de Martins, observa-se que enquanto os

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interesses não se transformarem em ação política, não passam, na verdade, de valores e de atitudes. Desenvolveremos tais argumentos mais adiante.

I.3 – Os cientistas políticos

Em relação aos cientistas políticos, o mais relevante não é só o fato de os nomes mais importantes deste grupo estarem vinculados à Ciência Política, mas sim por terem colocado como centro da análise a questão do peso político do empresariado, ou do empresariado enquanto ator político, o que teve forte impacto nos estudos sobre o empresariado até os dias de hoje. Embora esta questão fundamental transcenda os nossos objetivos neste texto, a ela estão relacionadas as características que aqui destacamos deste grupo de estudiosos do empresariado. Os trabalhos mais importantes deste grupo foram produzidos na segunda metade dos anos 1970 e início dos 1980 e, em parte, procuram se contrapor aos autores que aqui alocamos no grupo dos sociólogos exatamente em relação a esta questão do peso político, defendendo, em oposição aos sociólogos, que se trata de um grupo relevante politicamente. A isso está associada a crítica em relação à tendência dos sociólogos a tomar como referência um modelo ou tipo ideal de burguesia14. Mas, outra característica importante dos cientistas políticos é a preocupação com o impacto do Estado sobre as características das formas institucionais de representação do empresariado no Brasil. Como veremos a seguir, esta é a marca fundamental da análise deste grupo quando se trata de resolver a questão do empresariado enquanto classe ou elite.

Deste grupo, destacamos os trabalhos de Eli Diniz e Renato Boschi produzidos no final dos anos 1970. Em primeiro lugar, em relação ao trabalho de Eli Diniz de 1978, já no prefácio, Francisco Weffort destaca a preocupação da autora, de um lado, com a questão do empresariado enquanto ator político − a despeito da ausência da hegemonia entre os “grupos dominantes”, a “não hegemonia burguesa” −, e, de outro, com as conexões da “burguesia”

com o Estado através da “estrutura corporativa” − entendida como o conjunto das entidades de representação empresarial de natureza sindical − e o Estado (DINIZ, 1978). O objetivo de Diniz é analisar a atuação e a ideologia da “burguesia industrial”, “... através do desempenho

14 Além das observações de Diniz sobre este ponto, podemos citar esta passagem de Renato Boschi em relação aos sociólogos: “Na medida em que o padrão de desenvolvimento capitalista no Brasil foi caracterizado como basicamente autoritário pela literatura, não apenas o papel do Estado foi enfatizado como a burguesia foi avaliada com base no que ela não tinha sido, antes que com base no que de fato fora” (BOSCHI, 1979, p. 6).

Voltaremos a esta questão mais adiante. Mas, embora não possamos desenvolver aqui esta questão, entendemos que, de um lado, os sociólogos também buscaram romper com certos modelos na análise do empresariado e, de outro, que eles não disseram que o empresariado não era um ator político relevante, mas sim que não foi o agente da construção do desenvolvimento capitalista no Brasil, e procuram mostrar que não havia condições objetivas para isso. E se os sociólogos utilizam um modelo para pensar o papel econômico do empresariado, os cientistas políticos da mesma forma o fazem quando analisam a relação entre empresariado e Estado na construção das formas de representação.

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de seus órgãos de representação de interesses mais expressivos, das atividades e seus representantes em órgãos ligados à burocracia estatal tendo em vista a formulação e implementação de políticas específicas, ou ainda através de formas menos formalizadas de participação da liderança industrial na discussão e questões centrais da política econômica da época, tais como pronunciamentos, entrevistas, conferências e encontros com autoridades públicas” (DINIZ, 1978, p. 32).

Os termos usados para se referir ao objeto são os seguintes: “burguesia industrial” e

“burguesia comercial”; “elites dominantes”, para se reportar ao conjunto complexo e dinâmico que envolve classes de grupos e interesse dominantes; “elite burguesa”, referindo-se aos conflitos entre esta e outras elites que comporiam a coalizão dominante; “setores industriais emergentes”, “setores dominantes tradicionais”, “empresariado industrial”, “setor empresarial” e, por fim, “elite industrial”, para se referir a um pequeno número de empresas de grande porte (DINIZ, 1978)15. Em trabalhos posteriores, Eli Diniz usa expressões como

“classe empresarial”, “classes dominantes”, "elites industriais" e "frações empresariais" e

"setor empresarial" (DINIZ, 1993 e 1997).

Em segundo lugar, o trabalho de Renato Boschi tem como objetivo estudar “... o fenômeno das relações de classe e da conformação institucional do sistema político na sociedade capitalista”, considerando os “tipos de vínculos” entre “burguesia industrial nacional” e o aparelho de Estado, no contexto de uma sociedade em desenvolvimento acelerado em direção às formas de capitalismo avançado, e as condições para a “hegemonia burguesa”. Daí a necessidade de analisar a iniciativa da “burguesia local” na criação de um

“quadro institucional” para a integração do mercado e para sua expansão como classe.

A partir da preocupação em entender a “participação burguesa frente ao Estado” e na construção do Estado-nação, Boschi coleta, entre outras, informações sobre os “valores e posições da elite industrial” ou “das elites industriais nacionais”16. Diante da atribuição de

15 A pesquisa se deu nos “órgãos de natureza consultiva” criados no período. Foram selecionados apenas alguns daqueles voltados para a área econômico-financeira mais diretamente ligados aos interesses dos grupos econômicos analisados. Assim, foram considerados os processos de política econômica que tramitaram nos seguintes órgãos: Conselho Federal de Comércio Exterior, Conselho Técnico e Economia e Finanças, Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial e Comissão e Planejamento Econômico. Quanto aos órgãos de classe, foram considerados o Centro Industrial do Brasil (depois Confederação Industrial do Brasil) e a Confederação Nacional a Indústria, no Rio de Janeiro. Quanto à burguesia comercial, foi considerada a partir a Associação Comercial do Rio de Janeiro (DINIZ, 1978).

16 A pesquisa se caracterizou por entrevistas de natureza não estruturada com dirigentes industriais como forma de obter um clima mais informal e favorável à obtenção de informações. A amostra foi criada a partir das indicações feitas pelos próprios entrevistados e se concentraram em São Paulo, entre setembro de 1975 e agosto 1976. Isso foi completado com a análise de uma das principais associações da indústria, “... que compreendia o grosso dos interesses de um segmento substancial da elite empresarial”, a Associação Brasileira da Infraestrutura

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fraqueza por parte dos “empresários industriais”, buscaram-se evidências de uma “base organizacional mais forte para a atuação da burguesia enquanto classe”. Daí, “... a hipótese de que uma tal base provavelmente poderia ser delimitada ao redor de um setor da burguesia compreendido pelas empresas de maior porte e, portanto, mais consolidadas na economia brasileira” (BOSCHI, 1979).

Este trabalho merece destaque também por ter feito algo parecido com as pesquisas dos sociólogos, não apenas aos realizar entrevistas com empresários, mas por considerar seus valores e idéias como objeto de análise, e, sobretudo, por dar importância para a relação entre este grupo e o arranjo político-institucional, ou seja, o regime político, e não apenas a política econômica ou o modelo de desenvolvimento.

Outra característica de Eli Diniz e Renato Boschi é a grande produção conjunta, na qual usam as expressões “entidade de classe” e “elites empresariais” para analisar a relação entre empresariado industrial e desenvolvimento e, de forma relativamente livre, expressões como “empresariado”, “elites empresariais” e “elites econômicas”, em geral se referindo ou a grandes empresários ou às entidades de classe (Diniz e Boschi, 2000 e 2003). Em um destes trabalhos conjuntos, fica evidente o uso mais corrente da expressão “elite” na análise do empresariado, além da pesquisa articulando informações sobre as entidades de representação e os posicionamentos de dirigentes de entidades de representação e de grandes empresas industriais (DINIZ e BOSCHI, 2003).

Em terceiro lugar, outro trabalho que podem ser situado no grupo dos cientistas políticos é o de Maria Antonieta Leopoldi, cujo objetivo é, entre outros, “... verificar as

ligações entre o processo de construção da “identidade de classe” do empresariado industrial e o processo de industrialização”. A autora usa também as expressões “fração de classe” e

“burguesia industrial”, que seria uma das “classes sociais” que estariam se relacionando com o Estado no processo de desenvolvimento econômico no Brasil, de 1930 até 1990 (LEOPOLDI, 2000, p. 22 e 23), e também menciona rapidamente a “elite industrial”, composta por nomes como Roberto Simonsen, Jorge Street, Euvaldo Lodi e Oliveira Passos.

Neste processo, o Estado teria ocupado um papel importante no processo de “construção da identidade de classe” e na definição dos moldes das relações entre tais classes e o Estado (LEOPOLDI, 2000, p. 296).

Angela Maria de Castro Gomes realiza um estudo muito interessante sobre a relação entre empresariado e a “questão social”, mais especificamente o peso político das entidades e Indústrias de Base (ABDIB), como forma de “qualificar a hipótese geral”, dada a impossibilidade de um teste empírico rigoroso (BOSCHI, 1979, p. 9).

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de representação empresarial dos comerciantes e dos industriais, através de suas entidades de representação, no processo de formulação das leis que regulavam as relações entre capital e trabalho (GOMES, 1979). Neste trabalho estão presentes não apenas as expressões como também a preocupação que vimos também difusas nos trabalhos de Diniz e Boschi dos anos 1970, tais como “classes”, “classe dominante”, “burguesia” e “fração burguesa”, igualmente sem referências, ao menos explícitas, ao marxismo.

Mas, também podemos destacar a afirmação de Gomes de que, ao se considerar a ação dos empresários a partir da análise das entidades, deve-se ter a clareza de que não se trata do comércio e da indústria como um todo, mas sim de uma “elite”. Entretanto, de um lado, esta é uma forma possível e útil de investigação e, de outro, “... esta elite empresarial representa, de fato, um conjunto de elementos bastante significativos para o conhecimento do setor”, dado que permite identificar um conjunto de empresários muito atuantes, familiarizados com os problemas da “liderança” e experientes em como solucioná-los (GOMES, 1979, p. 29).

Por último, além do fato de que os cientistas políticos também estarem preocupados com a questão do desenvolvimento econômico, tema fundamental da forma como os sociólogos trataram o empresariado (DINIZ, 1978, p. 19 e BOSCHI, 1979, p. 5), há um

interessante encontro entre autores destes dois grupos. Trata-se de uma análise da relação entre empresariado e política no final dos anos 2000 feita por Luiz Carlos Bresser Pereira e Eli Diniz. Neste artigo, os autores usam as noções de “classe empresarial”, “elites empresariais” e “classe capitalista brasileira” e a caracterizam a partir do posicionamento, obtido através de entrevistas, de alguns grandes empresários industriais e de algumas de suas entidades de representação (PEREIRA e DINIZ, 2009).

Em suma, os cientistas políticos têm uma primeira e importante característica que, ao menos em parte, não é original, pois já a encontramos entre os sociólogos, ou seja, a combinação das questões da classe e da elite, combinada à análise das entidades de representação. Mas, a constituição desta classe enquanto ator político é pensada como consequência da ação do Estado na institucionalização das formas de representação política.

A este aspecto está relacionada a preocupação dos autores com a ausência de uma entidade de cúpula que representasse o conjunto do empresariado. Voltaremos a esta questão mais adiante.

Mas, os cientistas políticos utilizam as expressões tanto de classe quanto de elite, mas sem um desenvolvimento do que elas significariam enquanto conceito e sem realizar pesquisas mais próximas metodologicamente dos estudos de elite, como acontece com os sociólogos, ou debater as questões teóricas relacionadas ao conceito de classe, como fazem os

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marxistas. Ou seja, da mesma forma como acontece com o conceito de classe, se trata de um

uso mais descritivo do que teórica e metodologicamente orientado. Vimos que isso também acontece com a expressão burguesia nos estudos dos sociólogos. Enfim, isso mostra a forma como este grupo resolve a questão do empresariado enquanto classe e enquanto elite.

Por último, vemos que, em seus trabalhos iniciais, os cientistas políticos se referiam e utilizavam expressões relacionadas à análise de classe, e que isso deixou de acontecer nos estudos posteriores dos nomes mais importantes deste grupo, ou seja, Eli Diniz e Renato Boschi, embora tenha permanecido o estudo empírico daquilo que seriam as “elites empresariais”, no caso, os dirigentes de grandes empresas industriais e de entidades de representação. Enfim, esta abordagem se aproximou mais de outro grupo de estudiosos do empresariado, o qual poderíamos chamar de institucionalistas, dado que analisam o empresariado a partir da questão de suas instituições representativas não apenas como objeto de análise, como acontece com praticamente todos aos grupos aqui propostos, mas como variável explicativa fundamental, algo mais próximo do chamado neo-institucionalismo histórico17. Neste grupo poderíamos situar autores como Schmitter (1971), Schneider (2004), Payne (1995), Vanda Costa (1994 e 1998) e Mancuso, 2004, e até mesmo, como vimos acima, Bresser Pereira e Eli Diniz (2009).

Como veremos mais adiante, essa é mais uma constatação do que uma explicação ou uma crítica, mas reforça a necessidade de se enfatizar que a problemática do empresariado enquanto classe, mesmo de uma perspectiva não necessariamente marxista, já teve maior relevância neste campo de estudo, e defender a importância desta tradição, não para recuperar um passado glorioso, mas sim de buscar novos ganhos analíticos a partir desta velha questão.

I.4 – Os marxistas

Esse grupo contempla os trabalhos que utilizam as categorias propostas por autores no campo do marxismo. Dada a óbvia importância da questão das classes sociais para este campo teórico, procuraremos verificar como eles resolvem analiticamente a questão do empresariado, através de categorias como “burguesia”, “frações burguesas” e “classes dominantes”. Entretanto, neste grupo serão colocados os autores que tratam da questão do empresariado enquanto classe social, mais especificamente enquanto burguesia, e em especial a sua relação com o Estado, mas que fazem uma referência explícita ao marxismo. Enfim, remetem a uma problemática que, embora não seja exclusiva, como vimos acima, é característica do marxismo e dos autores que aqui estamos chamando de marxistas.

17 Diante da diversidade de estudos sobre o institucionalismo, estamos aqui nos referindo à classificação feita por Hall e Taylor (2003).

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Deste grupo destacamos, primeiramente, o trabalho de Florestan Fernandes (1974), o que exemplifica a natureza elástica acima referida dos critérios que estamos usando, dado que a abordagem deste autor possui também alguns aspectos dos outros grupos, mas sem fugir de nossa estratégia de análise. Florestan analisa as “principais linhas da evolução do capitalismo e da sociedade de classes no Brasil” e a situação da “burguesia brasileira” no processo de constituição do poder e das formas de “dominação burguesa”, ou seja, a “revolução burguesa”. Sua conclusão é que, análise da burguesia enquanto classe, passa pela consideração de seus interesses materiais, seu “estilo de vida” e sua “concepção de mundo”

(FERNANDES, 1974). A questão da elite não se coloca, ao menos de forma mais sistemática18.

Para Florestan, a questão é a forma, a natureza e as funções da dominação burguesa na transição do capitalismo competitivo para o capitalismo monopolista no Brasil. Desta transição decorreria uma forma específica de dominação burguesa que tem que se adaptar às injunções históricas, estruturais e funcionais tanto das condições internas, quanto externas, advindas do imperialismo. Sem tal consideração não seria possível tratar sociologicamente das “aspirações sócio-econômicas” e das “identificações políticas” da burguesia no Brasil e da forma como ela realizou a “revolução nacional”. E seria até possível pensar em uma ou mais alternativas que poderiam ter sido realizadas pela burguesia, mas sem desconsiderar que isso não se deu. No processo de transformação capitalista, as “classes que compõem a burguesia no Brasil” definiram suas escolhas, suas “tarefas políticas e sua missão histórica na direção de um ‘desenvolvimento acelerado’ e de uma ‘revolução institucional’ que implicavam a mesma saída: a revolução nacional continuaria a ser dimensionada pela infausta conjugação de desenvolvimento desigual interno e imperialista externo” (FERNANDES, 1967, p. 300).

Podemos mencionar também o trabalho de Jacob Gorender, que trata da “gênese” e das perspectivas da “burguesia brasileira” e defende que o conceito de burguesia se define pelo tipo de propriedade e não pela forma de controle. Em uma abordagem que também poderia ser ensaística, Gorender defende que a burguesia brasileira nasce sob influência do liberalismo (livre iniciativa, iniciativa privada etc.), apesar do papel do Estado na promoção do capitalismo. E, enquanto houver capitalismo no Brasil, haverá uma “burguesia brasileira”, à qual pertenceria o poder de Estado, mesmo que não o exerça diretamente (GORENDER, 1981).

18 Florestan menciona muito rapidamente as “elites” das classes burguesas (FERNANDES, 1967, p. 347 e 353).

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Armando Boito Jr. é um autor fundamental da abordagem que aqui estamos chamando de marxista. Desde seu primeiro trabalho a respeito da relação entre burguesia e política na crise de 1953-1954 (BOITO, 1982), assim como em seus trabalhos mais recentes, Boito, utiliza expressões como “burguesia”, “classes proprietárias”, “frações de classe”, “classe capitalista” e “classe dominante”, a partir das proposições de Marx e de Poulantzas (BOITO 2007 e 2012)19. Mas, das reflexões de Boito merece destaque também a observação em relação à importância que a questão e o conceito de classe possuíam nos estudos, de diversos matizes teóricos, não apenas do que aqui estamos chamando de empresariado, mas de questões fundamentais do processo de formação a sociedade e do Estado no Brasil, salvo algumas poucas exceções20. Tal processo estaria associado ao declínio do marxismo no meio universitário brasileiro, o que teria implicado no desaparecimento de “noções”, entre outras, de “classe” e “fração de classe”, e na consideração do Estado como mero cenário da luta entre setores do empresariado e em estudos segmentados que isolam tais setores do conjunto da

“burguesia”. Apesar de indicar os ganhos analíticos decorrentes do avanço nas pesquisas empíricas sobre o empresariado no Brasil, considera “burguesia” como “... o conjunto do empresariado – banqueiros, industriais, fazendeiros, comerciantes – como integrantes da classe capitalista e o Estado brasileiro como uma entidade moldada, pelas suas instituições e pelo pessoal que as ocupa, para servir aos interesses fundamentais dessa classe social”

(BOITO, 2007).

Lúcio Flávio de Almeida também analisa as lutas no interior da classe dominante e as políticas estatais no Governo JK, a partir dos conceitos de Marx e Poulantzas. Almeida entende que somente a análise do “fracionamento da classe dominante”, do papel do Estado burguês de “... ‘soldar’ as frações desta classe em um bloco político-ideológico – o bloco no poder”, da relação entre estas frações e da “ideologia dominante”, da presença das ideologias nos “aparelhos” e da forma como as “classe dominadas” se relacionam com a ideologia dominante, permitiria uma compreensão mais profunda e contundente do “nacionalismo- populista” que marcou o Brasil entre 1930 e 1964. Almeida localiza as classes dominantes e suas frações a partir da questão das ideologias, e sua incorporação e materialização em

“aparelhos”, subjacentes às práticas das classes e das frações de classe (ALMEIDA, 2006, p.

32).

19 Em outro trabalho de nossa autoria, trabalhamos com a relação entre “burguesia comercial”, no caso, paulista, através da entidade de representação de segundo grau, a Federação do Comércio do Estado de São Paulo, e o Congresso Nacional no Brasil dos anos de 1950. Enfim, neste trabalho também consideramos as proposições de Poulantzas e tomamos esta entidade como forma de analisar a ação política desta fração da “burguesia”, tentando, a partir disso, pensar algumas características da democracia no Brasil naquele período (COSTA, 1998).

20 Boito cita o trabalho de Renato Perissinotto, o qual será também comentado posteriormente.

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Além de bastante sugestiva em termos de análise do empresariado e de seu papel político e do nacionalismo e do Brasil pós-1930, a análise de Almeida tem algumas características que vale a pena destacar, de acordo com os nossos objetivos. Em primeiro lugar, são feitas afirmações em relação aos interesses das “frações burguesas”, mas de forma próxima a o que vimos nos trabalhos dos ensaístas, quando se afirma que uma dada fração burguesa se beneficiou de certa política (ALMEIDA, 2006, p. 45). Enfim, se estabelece a relação de determinação da natureza de classe das políticas de Estado a partir somente da coincidência entre tais políticas e aquilo que seriam os interesses das frações de classe dominantes.

No entanto, permanece o problema da localização e da representação da classe. A referência ao trabalho de Armando Boito, acima comentado, como forma de indicar a pertinência desta análise acaba por sofrer dos mesmos problemas que, a nosso ver, tal análise possui, ou seja, resolve a questão da localização do empresariado enquanto classe, de um lado, a partir dos depoimentos e posicionamentos expressos na imprensa por parte de líderes destacados dos empresários e, de outro, pelo posicionamento das entidades de representação (sindicatos, federações e associações).

Por sua vez, Álvaro Bianchi usa as expressões “empresariado” e “burguesia”, enquanto uma das “classes” em luta na sociedade capitalista brasileira para analisar a “crise econômica e política” no Brasil dos anos 1990, a partir posição do empresariado e do caso do PNBE, no processo de construção da hegemonia burguesa (BIANCHI, 2001). Neste trabalho, também a questão a classe é resolvida a partir da consideração de uma entidade de representação, no caso, associativa.

Outro trabalho interessante que merece um mesmo que breve destaque é o de Ignácio Delgado, no qual o autor analisa a ação do empresariado no Brasil a luz do caso mineiro entre 1945 e 1956. Em torno da relação entre “burguesia” e “Estado burguês”, Godinho reforça um dos argumentos, já correntes e que aqui vamos retomar, ou seja, a idéia de que os trabalhos dos autores que aqui estamos chamando de sociólogos do desenvolvimento partiram de uma visão “economicista” de classe, exatamente por centrar a análise na relação com o desenvolvimento econômico, o que teria implicado em voltar-se para o que o empresariado brasileiro teria deixado de ser, ficando em aberto a questão do que ele de fato teria sido (DELGADO, 1990, p. 19).

Vimos que esta preocupação é uma marca do grupo que chamamos de cientistas políticos, a exemplo de Renato Boschi (1977). Mas, o que pretendemos destacar também das proposições de Delgado em sua análise da “prática burguesa” é, de um lado, o fato de buscar a

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fazê-la a luz de autores marxistas, como Poulantzas, Claus Offe e Gramsci e, de outro, a referência à emergência de uma “elite industrial”, presente nas suas entidades de representação. Delgado associa a “elite industrial” ao processo de constituição de um grupo de grandes empresas industriais que se constituíram em Minas entre 1920 e 1940 e leva em conta as características do discurso desta elite e até aspectos da sua trajetória (DELGADO, 1990, p. 55 e 71). Enfim, articula a análise das caraterísticas dos dirigentes de empresa e dos dirigentes de entidades, o que, como veremos a seguir, nos parece ser fundamental para o desenvolvimento da análise do empresariado enquanto elite e enquanto classe.

Renato Perissinotto trata da relação entre “classes dominantes” e regime político na Primeira República a luz do conceito de hegemonia de Poulantzas, fazendo uma revisão da literatura sobre este período e a crítica do uso de expressões como “oligarquias regionais” e

“burguesia cafeeira”, analisando os conflitos no interior do bloco no poder (PERISSINOTTO, 1994). Mas, em outro trabalho, como o próprio autor explica, a preocupação volta-se não apenas para verificar a relação entre interesses de uma dada fração e as políticas de Estado, mas para o modo como se deram as relações entre “grande capital cafeeiro” e o aparelho de Estado, tomando como objeto o estado de São Paulo (PERISSINOTTO, 1996).

Em uma linha analítica próxima, Adriano Codato estuda o comportamento das

“frações dominantes” e as “lutas burguesas” frente ao “sistema decisório” da política econômica no Brasil pós-64, mais especificamente no Conselho de Desenvolvimento Econômico no período Geisel (1974-1979).

Codato (1997) e Perissinotto (1994 e 1996) seguem as proposições e Poulantzas de que a política e a “materialidade institucional do Estado” (CODATO, 1997) no Brasil devem ser vistas a luz da dinâmica da luta de classes. Esta luta de classes, particularmente no que diz respeito ao empresariado, se dá através das entidades de representação, mais especificamente em relação à definição da política econômica. A presença das “frações burguesas” é apreendida pela relação, com maior ou menor proximidade, de dirigentes de grandes empresas e de entidades de representação nos órgãos do Estado voltados para a definição da política econômica (CODATO, 1997).

Enfim, esses trabalhos são importantes pela tentativa de superar a análise da relação entre empresariado e Estado exclusivamente a partir da relação entre a política econômica e aquilo que se toma como os interesses das “classes dominantes”. Falta uma análise da relação entre esta classe e o outro lado da “materialidade institucional do Estado”, ou seja, as

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instituições representativas, em especial quando funciona uma democracia21. Mas, Codato se aproxima de uma questão importante para os nossos objetivos, que é a análise do processo decisório, e não apenas, de forma, separada, as demandas do empresariado, de um lado, e os

resultados da política econômica, de outro. Esta intermediação é uma questão ainda em aberto, seja nos trabalhos dos marxistas, seja no dos cientistas políticos22.

Em suma, dos comentários dos trabalhos dos marxistas, alguns aspectos podem ser destacados. Em primeiro lugar, dada a importância da questão das classes sociais e da dominação de classe para este referencial teórico, era de se esperar uma maior atenção para as formas históricas da burguesia e da dominação burguesa em suas reflexões e pesquisas. O que vemos em relação a esse aspecto é que nem todos os trabalhos mencionados se debruçam especifica e prioritariamente sobre a questão da burguesia brasileira em suas formas históricas concretas, ao menos em toda a riqueza de seus detalhes.

Mas, há a preocupação em delimitar com precisão o referencial teórico do qual se parte para analisar a burguesia no Brasil. Neste aspecto, vale a pena destacar os trabalhos de Armando Boito. Independentemente da avaliação acerca de seu referencial teórico, é fundamental a sua preocupação com a consideração do conjunto do empresariado, o que é feito através do conceito poulantziano de bloco no poder. Isso não dispensa nem se contrapõe a estudos setorizados. Sabemos da predominância dos estudos sobre os industriais, aos quais por vezes é subsumido o conjunto dos setores do empresariado e interpretada a relação entre este grupo, ou classe social, e o Estado e a sociedade, como acontece com os sociólogos e com os cientistas políticos.

Em segundo lugar, há também indicações importantes, como as de Florestan, no sentido de valorizar a consideração não apenas de aspectos econômicos, mas também políticos, culturais e até seu “estilo de vida” e sua “concepção de mundo”. A partir de Florestan Fernandes, vimos a preocupação em considerar as alternativas não realizadas, no máximo, como um procedimento analítico, e não como critério sociológico para analisar, ou avaliar e julgar, o comportamento do empresariado. E, por fim, de Gorender a ênfase da relação intrínseca entre burguesia e capitalismo, seja qual for o estágio, o tipo e as formas geográficas que este assuma.

Em terceiro lugar, de um modo geral, os marxistas enfatizam a necessidade da consideração das formas concretas de funcionamento do capitalismo no Brasil e suas

21 Isso é compreensível, dado que, ao menos Codato trata de período de funcionamento de um regime autoritário e Perissinotto foca mais particularmente as políticas econômicas e a constituição do aparelho de Estado.

22 Procuramos contemplar parcialmente esta questão ao tratar dos “padrões de ação política” do empresariado nos períodos democráticos (COSTA, 2003 e 2005).

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injunções sobre o empresariado, ou seja, sobre a própria classe, preocupação que vimos nos outros grupos. Além disso, tais trabalhos indicam também a necessidade de considerar os pequenos e médios empresários no arranjo econômico e político (Gorender, 1981), o que reforça a necessidade de tratar o conjunto do empresariado, não como um todo homogêneo mas sim na sua diversidade de setores e regiões e dos diversos níveis da condição de empresário e de elite econômica.

Enfim, resolve as questões da classe e da representação e da ação de classe e de suas frações a partir, de um lado, dos depoimentos de nomes destacados do empresariado, e de outro, da dimensão organizacional, ou seja, as entidades de representação do empresariado.

Mas, esta abordagem desconsidera que o “fracionamento” proposto pela forma sindical ou mesmo espontaneamente expresso através das associações livres pode não ser suficiente para dar conta da complexidade e segmentação das atividades empresariais que o próprio capitalismo gera, e não atende necessariamente aos requisitos teóricos colocados pelos conceitos, por exemplo, o de efeito pertinente de Poulantzas, autor fundamental na argumentação dos marxistas.

Outro problema desta abordagem é a sobreposição das questões da ação coletiva, no caso, de classe e a questão da dominação, ou seja, a questão do empresariado enquanto classe dominante. Além disso, há momentos em que a expressão fração de classe refere-se a um

setor de atividade, como os industriais, os banqueiros ou os comerciantes, a partir do critério da propriedade, e momentos em que se refere ao porte da atividade industrial, como, por exemplo, a “média burguesia industrial” (ALMEIDA, 2006, p. 51) ou à localização geográfica das “frações regionais” (SAES, 1985), ou mesmo a uma frente de frações de classe (BOITO, 2012).

Enfim, a análise se volta para os proprietários dos meios de produção, ora às pessoas dos dirigentes de grandes empresas, ora às suas entidades de representação. Não é nosso objetivo discutir neste momento as implicações teóricas desta abordagem, mas apenas ressaltar que, ainda que considerados como classe, tais estudos se voltam para os proprietários e controladores dos meios de produção. Ou seja, em termos de objeto, trata-se do mesmo considerado pelos sociólogos e pelos cientistas políticos, obviamente a partir de referenciais teóricos distintos. Isso remete à importância da pesquisa empírica sobre estes indivíduos que ocupam as posições de direção das empresas ou das entidades de representação, que aqui estamos chamando de elite. Neste aspecto é que destacamos a análise de Delgado (1990), pois, mesmo que não tenha feito um estudo mais detido das características do grupo que chama de “elite industrial”, levantou a possibilidade da articulação entre estes dois conceitos.

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