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UMA ANÁLISE DO PROCESSO DECISÓRIO, DO PLANEJAMENTO E DA EXECUÇÃO DA OPERAÇÃO ACOLHIDA

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(1)

Rio de Janeiro 2019

Cel Art LUCIO ALVES DE SOUZA

UMA ANÁLISE DO PROCESSO DECISÓRIO, DO PLANEJAMENTO E DA EXECUÇÃO DA OPERAÇÃO ACOLHIDA

ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO

ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO

(2)

Uma análise do processo decisório, do planejamento e da execução da Operação Acolhida

Orientador: Cel R1 Paulo Roberto Bueno Costa

Rio de Janeiro – RJ 2019

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

à Escola de Comando e Estado-Maior do

Exército, como requisito parcial para a

obtenção do título de Especialista em Política,

Estratégia e Alta Administração Militar.

(3)

A279a Souza, Lucio Alves de.

Uma análise do processo decisório, do planejamento e da execução da Operação Acolhida. / Lucio Alves de Souza. – 2019.

145 f. : il; 30 cm.

Orientação: Paulo Roberto Bueno Costa.

Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Política, Estratégia e Alta Administração do Exército) – Escola de Comando e Estado- Maior do Exército, Rio de Janeiro, 2019.

Bibliografia: f. 133-145.

1. ESTUDOS ESTRATÉGICOS. 2. RELAÇÕES INTERNACIONAIS. 3.

MIGRAÇÕES. 4. OPERAÇÃO ACOLHIDA I. Título.

CDD 327

(4)

Uma análise do processo decisório, do planejamento e da execução da Operação Acolhida

Aprovado em ____de ________de 2019

COMISSÃO AVALIADORA

_____________________________________________

Paulo Roberto Bueno Costa – Cel R1 Art – Presidente Escola de Comando e Estado-Maior do Exército

_______________________________________________

Othon Gomes Melo – Cel Cav – Membro Escola de Comando e Estado-Maior do Exército

__________________________________________________

João Luiz de Araujo Lampert – Cel Inf – Membro Escola de Comando e Estado-Maior do Exército

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

à Escola de Comando e Estado-Maior do

Exército, como requisito parcial para a

obtenção do título de Especialista em Política,

Estratégia e Alta Administração Militar.

(5)

À minha esposa Gabriela Cáceres Sureda, aos meus filhos Pedro e Lucas, e meus enteados Pietra e Gustavo, agradeço o apoio e a compreensão demonstrados durante a realização deste trabalho.

(6)

Uma análise do processo decisório, do planejamento e da execução da Operação Acolhida. A questão é desenvolvida a partir do referencial teórico sobre os movimentos migratórios desde os conceitos básicos sobre o tema passando pela legislação nacional e internacional que serviu de parâmetro para o planejamento da Operação Acolhida. Também são necessários esclarecimentos sobre os antecedentes ao movimento migratório venezuelano para o Brasil, assim como a caracterização do estado de Roraima e das cidades de Boa Vista e Pacaraima. Além disso, é explorada a problemática da regularização documental dos imigrantes em questão e dos impactos do aumento populacional na saúde e na segurança pública do estado roraimenses e das cidades em foco. São ressaltados todos os aspectos que influenciaram o processo decisório do governo federal, a edição de medidas provisórias que deram a segurança jurídica e financeira para a execução da operação de assistência humanitária e a execução propriamente dita da Operação Acolhida, sendo estes o grande foco do trabalho acadêmico. Dessa forma, o objetivo principal do trabalho é analisar o processo decisório, o planejamento e a execução da Operação Acolhida diante da problemática decorrente do fluxo migratório venezuelano no estado de Roraima. Na conclusão são apresentados os aspectos que constatam o atingimento dos objetivos propostos pelo governo federal para mitigar ou resolver os problemas decorrentes do fluxo migratório venezuelano no estado de Roraima.

Palavras-chave: Relações Internacionais, Migrações, Ajuda Humanitária, Operação

Acolhida, Exército Brasileiro.

(7)

An analysis of the decision making process, planning and execution of the Acolhida´s Operation. The issue is developed from the theoretical framework on migratory movements from the basic concepts on the subject through the national and international legislation that served as a parameter for the planning of Acolhida´s Operation. Clarification is also needed on the antecedents of the Venezuelan migratory movement to Brazil, as well as the characterization of the state of Roraima and the cities of Boa Vista and Pacaraima. In addition, the issue of documentary regularization of the immigrants in question and the impacts of population increase on the health and public safety of the Roraimese state and of the cities in focus is explored. All aspects that influenced the federal government's decision-making process, the issuing of provisional measures that provided legal and financial security for the execution of the humanitarian assistance operation and the proper execution of the Operation Welcomed, are highlighted. academic. Thus, the main objective of the paper is to analyze the decision making process, the planning and the execution of the Operation Welcomed in view of the problems arising from the Venezuelan migratory flow in the state of Roraima. In conclusion, we present the aspects that confirm the achievement of the objectives proposed by the federal government to mitigate or solve the problems arising from the Venezuelan migratory flow in the state of Roraima.

Keywords: Internacional relations, migrations, Humanitarian help, Acolhida´s

Operation, Brazilian Army.

(8)

Figura 1 – Fluxo de imigração venezuelana, entrada e saída... 64

Figura 2 – Fluxo de imigração Venezuela, rotas de saída... 65

Figura 3 – Solicitações de residência por países em 2017 e 2018... 65

Figura 4 – Solicitações de refúgio ativas no Brasil até Nov 2018 – 154.572 pedidos... 66

Figura 5 – Solicitações de refúgio de venezuelanos... 66

Figura 6 – Solicitações de refúgio e de residência de venezuelanos em Roraima... 68

Figura 7 – Perfil dos imigrantes venezuelanos segundo a PF... 68

Figura 8 – Quadro resumo da imigração venezuelana... 70

Figura 9 – Comparativo e percentual dos atendimentos aos imigrantes venezuelanos em Roraima... 72

Figura 10 – Comparativo e percentual dos atendimentos aos imigrantes venezuelanos em Boa Vista – RR... 73

Figura 11 – Comparativo e percentual dos atendimentos aos imigrantes venezuelanos nos municípios do interior de 2015 a 2017... 73

Figura 12 – Organograma da 1ª Bda Inf Sl e seus meios disponíveis... 84

Figura 13 – Missões impostas pela Operação Controle... 85

Figura 14 – Organograma da FT Log Hum... 96

Figura 15 – Composição das células da FT Log Hum... 96

Figura 16 – Organograma da FT Log Hum ampliado... 97

Figura 17 – Fluxo de atendimento aos imigrantes em situação de vulnerabilidade... 100

Figura 18 – Distribuição espacial da Base Pacaraima... 106

Figura 19 – Base de Apoio em Pacaraima... 106

Figura 20 – Extensão da Base de Apoio em Pacaraima no 3º PEF... 107

Figura 21 – Posto de Recepção e Identificação (PRI) –Pacaraima –RR... 107

Figura 22 – Posto de Triagem (PTrg) e Posto de Atendimento Avançado (PAA) em Pacaraima –RR... 109

Figura 23 – Abrigo Janokoida em Pacaraima –RR... 110

Figura 24 – Alojamento BV-8 em Pacaraima –RR... 110

Figura 25 – Posto de Atendimento Avançado (PAA) em Pacaraima –RR... 111

Figura 26 – Distribuição espacial da Base Boa Vista... 111

Figura 27 – Área de Apoio em Boa Vista... 112

Figura 28 – Posto de Triagem de Boa Vista... 113

Figura 29 – Posto de Informações, Guarda Volumes e Área de Pernoite em Boa Vista... 114

Figura 30 – Abrigo Pintolândia para indígenas em Boa Vista –RR... 115

Figura 31 – Abrigo Hélio Campos para famílias em Boa Vista –RR... 116

Figura 32 – Abrigo Jardim Floresta para famílias em Boa Vista –RR... 117

Figura 33 – Abrigo Tancredo Neves para adultos solteiros e casais sem filhos em Boa Vista –RR... 117

Figura 34 – Abrigo São Vicente para famílias em Boa Vista –RR... 118

(9)

Figura 37 – Abrigo Santa Tereza para homens desacompanhados em Boa Vista –RR... 120 Figura 38 – Complexo Setor Militar Marechal Rondon em Boa Vista –RR... 121 Figura 39 – Abrigo Rondon I para famílias em Boa Vista –RR... 121 Figura 40 – Abrigo Rondon III para famílias, casais e solteiros em Boa Vista –

RR... 122 Figura 41 – Abrigo Rondon II utilizado como área de interiorização em Boa

Vista –RR... 123 Figura 42 – Sequência adotada para a interiorização de imigrantes pela Op

Acolhida... 123

(10)

Gráfico 1 – CTPS para cidadãos venezuelanos nível Roraima... 70

Gráfico 2 – CPF para cidadãos venezuelanos... 71

Gráfico 3 – Venezuelanos infratores na capital e interior... 77

Gráfico 4 – Venezuelanos infratores por tipo de registro mais comum... 77

Gráfico 5 – Venezuelanos vítimas na capital e interior... 78

Gráfico 6 – Venezuelanos vítimas por tipo de registro mais comum... 78

Gráfico 7 – Entrada de imigrantes via Roraima entre 20 Fev 18 e 19 Jan 19.. 86 Gráfico 8 – Motivação de entrada de imigrantes via Roraima entre 18 Abr 18

e 19 Jan 19...

87 Gráfico 9 – Destino informado pelos solicitantes de refúgio no período de 18

Abr 18 a 19 Jan 19...

88 Gráfico 10 – Destino informado pelos solicitantes de residência temporária no

período de 18 Abr 18 a 19 Jan 19...

88 Gráfico 11 – Destino informado pelos residentes permanentes no período de

18 Abr 18 a 19 Jan 19...

89 Gráfico 12 – Destino informado pelos turistas no período de 18 Abr 18 a 19

Jan 19...

89

(11)

Tabela 1 – Atendimentos a venezuelanos nas unidades de saúde dos municípios de Boa Vista e Pacaraima de 2014 a 2017... 74 Tabela 2 –

Comparativo de atendimentos a venezuelanos nas unidades de saúde dos municípios de Boa Vista e Pacaraima de 2014 a 2017 com 1º semestre de 2018... 75 Tabela 3 – Resultados da Op Controle no período de 20 Fev 18 a 28 Fev

19... 86 Tabela 4 – Vacinação realizada no PRI de Pacaraima de 30 Out 18 a 12 Jan

19... 108 Tabela 5 – Atendimentos por entidades no PTrg Pacaraima... 108 Tabela 6 – Vacinação realizada no PTrg Boa Vista de 27 Set 18 a 12 Jan 19 113 Tabela 7 – Atendimentos por entidades no PTrg Boa Vista... 113 Tabela 8 –

Dados do Posto de Informações, Guarda Volumes e Área de

Pernoite em Boa Vista... 115

Tabela 9 – Interiorização de imigrantes venezuelanos, dados de 12 Jan 19... 124

Tabela 10 – Instituições partícipes da Operação Acolhida... 125

(12)

ABIN Agência Brasileira de Inteligência

ACNUR Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária

AVSI Associação de Voluntários para o Serviço Internacional B Ap Base de Apoio

1ª Bda Inf Sl 1ª Brigada de Infantaria de Selva

6º BEC 6º Batalhão de Engenharia de Construção

CEMCFA Chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas CF Constituição Federal

CMA Comando Militar da Amazônia CONARE Comitê̂ Nacional para Refugiados CNIg Conselho Nacional de Imigração CPF Cadastro de Pessoa Física

CTPS Carteiras de Trabalho e Previdência Social FAB Força Áerea Brasileira

FAMES flexibilidade, adaptabilidade, modularidade, elasticidade e simplicidade

FFHI Fraternidade Federação Humanitária Internacional (ONG) FMI Fundo Monetário Internacional

FT Log Hum Força Tarefa Logística Humanitária GLO Garantia da Lei e da Ordem

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDH Índice de desenvolvimento humano

ICMPD Centro Internacional para o Desenvolvimento de Políticas Migratórias

MD Ministério da Defesa

MDS Ministério do Desenvolvimento Social MP Medida provisória

NRC Norwegian Refugee Council (ONG)

OG Órgãos Governamentais

(13)

OMDS Organizações Militares diretamente subordinadas ONG Organização Não-governamental

ONU Organização das Nações Unidas

Op Operação

OPEP Organização dos Países Produtores de Petróleo PAA Posto de Atendimento Avançado

PAM Plano de Ação do México

PBCE Posto de Bloqueio e de Controle de Estradas PCRR Polícia Civil de Roraima

3º PEF 3º Pelotão Especial de Fronteira PRI Posto de Recepção e Identificação P Trg Posto de Triagem

RR Roraima

TIC Tecnologia da Informação e Comunicações UNFPA Fundo de População das Nações Unidas

UNIRIC Centro Regional de Informação das Nações Unidas

(14)

1 INTRODUÇÃO --- 13

1.1 PROBLEMA--- 15

1.2 OBJETIVOS--- 16

1.2.1 Objetivo geral--- 16

1.2.2 Objetivos específicos--- 16

1.3 HIPÓTESE--- 16

1.4 DELIMITAÇÃO DE ESTUDO--- 17

1.5 RELEVÂNCIA DO ESTUDO--- 17

1.6 REFERÊNCIAL TEÓRICO--- 18

1.6.1 Movimentos migratórios--- 18

1.6.2 Legislação internacional e nacional sobre refugiados--- 19

1.6.3 Operações interagências--- 20

1.7 METODOLOGIA--- 20

1.7.1 Tipo de pesquisa--- 20

1.7.2 Universo e amostra--- 21

1.7.3 Coleta de dados--- 21

1.7.4 Tratamento dos dados--- 21

1.7.5 Limitações do método--- 21

2 REFERENCIAL TEÓRICO--- 22

2.1 CONCEITOS--- 35

2.1.1 Legislação --- 35

3 ANTECEDENTES--- 58

(15)

3.1.2 Características do município de Boa Vista--- 62

3.1.3 Características do município de Pacaraima--- 69

3.1.4 A imigração venezuelana--- 64

3.1.4.1 A imigração venezuelana e a regularização documental--- 71

3.1.4.2 A imigração venezuelana e a saúde--- 72

3.1.4.3 A imigração venezuelana e a segurança pública--- 75

4 A OPERAÇÃO ACOLHIDA --- 79

4.1 EMPREGO DO EXÉRCITO BRASILEIRO NA OPERAÇÃO CONTROLE --- 83

4.2 EMPREGO DO EXÉRCITO BRASILEIRO NA OPERAÇÃO TUCUXI --- 90

4.3 EMPREGO DO EXÉRCITO BRASILEIRO NA OPERAÇÃO ACOLHIDA --- 92

4.3.1 Planejamento Operacional da Força Tarefa Logística Humanitária--- 94

4.3.2 Planejamento Operacional para a Base de Pacaraima – RR --- 98

4.3.3 Planejamento Operacional para a Base de Boa Vista – RR--- 100

4.3.4 Evolução das ações por ordem cronológica no ano de 2018---- 101

4.3.5 Operação Acolhida: situação em janeiro de 2019 em Pacaraima – RR--- 105

4.3.5.1 Base de Pacaraima – RR--- 106

4.3.5.2 Posto de Recepção e Identificação (PRI) em Pacaraima -RR--- 107

4.3.5.3 Posto de Triagem e Posto de Atendimento Avançado em Pacaraima -RR--- 108

4.3.5.4 Abrigo Janokoida para indígenas em Pacaraima -RR--- 109

4.3.5.5 Alojamento BV-8 para imigrantes não indígenas em Pacaraima ---- 110

(16)

-RR---

4.3.6.1 Área de Apoio à FT Log Hum em Boa Vista -RR--- 112

4.3.6.2 Posto de Triagem de Boa Vista -RR--- 112

4.3.6.3 Posto de Informações Guarda Volumes e Área de Pernoite de Boa Vista -RR--- 114

4.3.6.4 Abrigo Pintolândia em Boa Vista -RR--- 115

4.3.6.5 Abrigo Hélio Campos em Boa Vista -RR--- 116

4.3.6.6 Abrigo Jardim Floresta em Boa Vista -RR--- 116

4.3.6.7 Abrigo Tancredo Neves em Boa Vista -RR--- 117

4.3.6.8 Abrigo São Vicente em Boa Vista -RR--- 118

4.3.6.9 Abrigo Nova Canaã em Boa Vista -RR--- 118

4.3.6.10 Abrigo Latife Salomão em Boa Vista -RR--- 119

4.3.6.11 Abrigo Santa Teresa em Boa Vista -RR--- 120

4.3.6.12 Abrigos do Setor Militar Marechal Rondon em Boa Vista -RR--- 120

4.3.6.13 Abrigo Rondon I em Boa Vista -RR--- 121

4.3.6.14 Abrigo Rondon III em Boa Vista -RR--- 122

4.3.6.15 Abrigo Rondon II em Boa Vista -RR--- 122

4.3.7 Processo de interiorização da Operação Acolhida--- 123

4.3.8 Estruturas de saúde para os imigrantes em Boa Vista -RR--- 124

4.3.9 Instituições participantes do sistema migratório--- 125

5 CONCLUSÃO--- 128

REFERÊNCIAS--- 133

(17)

1 INTRODUÇÃO

O Centro Regional de Informação das Nações Unidas

1

(UNIRIC) (2017) estima que a população mundial seja atualmente aproximadamente 7,6 bilhões de pessoas, devendo atingir 8,6 bilhões de habitantes em 2030, baseando-se em um crescimento estimado de 83 milhões de pessoas anualmente. Segundo aquele órgão, em uma análise das migrações e do desenvolvimento, cerca de 3% da população mundial vive num país diferente daquele em que nasceu, sendo que o primeiro terço destes migrantes mudou-se de um país em desenvolvimento para um país desenvolvido, um segundo terço de uma nação em desenvolvimento para outra e o terceiro terço é constituído por pessoas oriundas do mundo desenvolvido.

Para tanto é importante ter o entendimento que a evolução da globalização trouxe a oportunidade de se buscar uma condição de vivência melhor e mais digna ao seres humanos, tornando-os motivados a uma incansável procura por locais que possam atender suas necessidades de vida, quer seja por motivos econômicos, políticos, sociais, culturais ou religiosos.

A mobilidade internacional das pessoas pode ser traduzida em diferentes nomes e garantias jurídicas, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados distingue, segundo Edwards

2

(2015), que os refugiados como pessoas que escaparam de conflitos armados ou perseguições e frequentemente sua situação é tão perigosa e intolerável que os mesmos devem cruzar fronteiras internacionais para buscar segurança nos países mais próximos, dos migrantes que têm por opção voluntária escolher se deslocar para outros países, não por causa de uma ameaça direta de perseguição ou morte, mas principalmente para melhorar sua vida em busca de trabalho, educação, reunião familiar ou por outras razões.

Independente da motivação que levou determinada pessoa a deixar seu país, cabe ao Estado que o está acolhendo garantir todos os direitos previstos nas ordenações jurídicas pátrias e internacionais das quais é signatário, nessa idéia

1 CENTRO REGIONAL DE INFORMAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – UNRIC. Migrações

internacionais e desenvolvimento - comunicado de imprensa. Nova Iorque: 2017. Disponível em

<http://www.unric.org/pt/actualidade/6124>. Acesso em: 10 de outubro de 2017.

2 EDWARDS, Adrian. Refugiado ou Migrante? O ACNUR incentiva a usar o termo correto.

Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados – ACNUR. Genebra: 2015. Disponível em

<http://www.acnur.org/portugues/noticias/noticia/refugiado-ou-migrante-o-acnur-incentiva-a-usar-o- termo-correto/>. Acesso em: 8 de outubro de 2017.

(18)

Kant

3

(1795) já enunciava em sua obra a Paz Perpétua que o estrangeiro não deve ser tratado com hostilidade em virtude da sua vinda a outro território.

Como marco histórico será utilizada a 2ª Guerra Mundial, pois neste período aconteceram graves violações aos Direitos Humanos as quais motivaram grande mobilidade humana internacional, fator este que levou algumas nações a se unirem e criarem Organização das Nações Unidas em 1945. A criação da ONU nos encaminha ao marco legal desta pesquisa que será a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, documento este que elevou os Direitos Humanos a uma ética universal.

No Brasil, por se tratar historicamente de um país de acolhimento migratório, as políticas e legislações relativas aos cidadãos estrangeiros foram traçadas visando a garantia dos direitos individuais e a dignidade da pessoa humana, sendo positivadas mediante tratativas internacionais inseridas no direito interno do país, Bobbio

4

(2004) salienta que o cerne dos direitos humanos são os direitos naturais universais, os quais em momento futuro passam a se desenvolver como direitos positivos particulares e alcançam sua plenitude ao serem reconhecidos como direitos positivos universais, corrobora, também, Jubilut

5

(2005) quando destaca que a comunidade internacional tem que trabalhar em duas frentes visando dar uma resposta às migrações assegurando direitos e minimizando as causas relacionadas a diferença de desenvolvimento de Estados, pois estas podem ser causas da incapacidade de uma vida que respeite a dignidade da pessoa humana e consequentemente os seus direitos humanos.

Atualmente no norte do Brasil tem se destacado a evolução do fluxo migratório de cidadãos oriundos da Venezuela, os quais normalmente utilizam como porta de entrada a cidade de Pacaraima situada no estado de Roraima, devido o agravamento da situação do país vizinho, nesse sentido Vaz

6

(2017) afirma que a prolongada crise na Venezuela envolve fundamentalmente a interação, em primeiro plano, da erosão da governabilidade, o uso de medidas de exceção e o crescente isolamento internacional; em segundo plano entra o avanço da deterioração da

3 KANT, Immanuel. A paz perpétua: Um projecto filosófico. Colecção Textos Clássicos de Filosofia. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 2008.

4 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Nova ed., 7. reimp. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

5 JUBILUT, L. L. Migrações e Desenvolvimento in Alberto do Amaral Jr. (org). Direito Internacional e Desenvolvimento. São Paulo: Manole, 2005. p. 123- 154.

6 VAZ, Alcides Costa. A crise venezuelana como fator de instabilidade regional:

perspectivas sobre seu transbordamento nos espaços fronteiriços. In Análise Estratégica. ano 1. nº 3.

Brasília: CEEEx, 2017. p. 1

(19)

condição econômica e, em terceiro plano, o agravamento da crise social marcada pelos elevados indicadores de criminalidade e violência.

Nos últimos anos, o Brasil e, em particular o estado de Roraima, vem experimentando um aumento considerável na entrada de migrantes venezuelanos, os quais têm solicitado refúgio ou residência temporária, alegando fatores ligados à problemas humanitários. A falta de estrutura no estado para receber este fluxo migratório repentino levou o governo federal a intervir por intermédio da Operação Acolhida.

A problematização desta pesquisa surge do questionamento que levará a análise do processo decisório, do planejamento e da execução da Operação Acolhida como solução eficiente na mitigação dos problemas decorrentes do fluxo migratório venezuelano no estado de Roraima.

1.1 PROBLEMA

A motivação deste trabalho é a problemática atual que acontece no Estado de Roraima envolvendo a migração de cidadãos oriundos da Venezuela, fator este que hipoteticamente poderá se tornar uma crise migratória. Caso este evento se materialize, a União em parceria com o estado e os municípios de Roraima poderão dispor de um ato normativo preparado, o qual visará autorizar a utilização de estruturas cedidas pelo Exército Brasileiro, de forma pontual, sistemática e temporária enquanto durar a crise, em apoio ao sistema migratório do estado de Roraima e dos municípios envolvidos, visando complementar ou suplementar as possíveis demandas originadas, e, ainda, minimizar o sentimento de impotência e fragilidade que acomete os cidadãos após deixarem seus lares, laços afetivos, cidades e país natal, contribuindo assim para o desenvolvimento e dignidade da pessoa humana.

O presente trabalho de conclusão de curso será desenvolvido em torno do

seguinte problema: O processo decisório, o planejamento e a execução da

Operação Acolhida atingiram os objetivos propostos pelo governo federal para

mitigar ou resolver os problemas decorrentes do fluxo migratório venezuelano no

estado de Roraima.

(20)

1.2 OBJETIVOS 1.2.1 Objetivo geral

Analisar o processo decisório, o planejamento e a execução da Operação Acolhida diante da problemática decorrente do fluxo migratório venezuelano no estado de Roraima.

1.2.2 Objetivos específicos

a) estudar a Declaração Universal dos Direitos Humanos;

b) estudar as teorias das migrações internacionais;

c) apresentar o conceito de refugiados;

d) caracterizar o estado de Roraima;

e) estudar o aumento do fluxo de migrantes venezuelanos a partir de 2016;

f) analisar as legislações brasileiras vigentes referentes ao refugiado e ao migrante;

g) analisar a Política Nacional de Defesa (PND) no que se refere às questões migratórias e fronteiriças;

h) analisar os modelos da ONU para casos semelhantes de refugiados no mundo;

i) apresentar o processo decisório para resolver os problemas decorrentes do fluxo migratório venezuelano no estado de Roraima; e

j) apresentar o planejamento e a execução da Operação Acolhida.

1.3 HIPÓTESE

O processo decisório, o planejamento e a execução da Operação Acolhida atingiram os objetivos propostos pelo governo federal para mitigar ou resolver os problemas decorrentes do fluxo migratório venezuelano no estado de Roraima.

1.4 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO

Estudar-se-á o fluxo migratório venezuelano, a atuação do governo federal e

da Operação Acolhida, no período de 2016 a 2018, no estado de Roraima. Por sua

vez, os movimentos migratórios motivados por turismo, trabalho ou estudos, não

comporão o presente trabalho, bem como as migrações dentro do território nacional.

(21)

1.5 RELEVÂNCIA DO ESTUDO

A Venezuela possui as maiores reservas de petróleo do planeta tendo sido inclusive um dos fundadores da Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP). Este dado por si já seria suficiente para compreender a importância deste país no contexto do subcontinente sul americano.

Com o surgimento do Hugo Chaves como líder daquela nação, a Venezuela ocupou um papel de destaque na disseminação do pensamento de esquerda após a queda do Muro de Berlim, no âmbito da América do Sul, juntamente com os idealizadores do Foro São Paulo, por meio do bolivarianismo.

A execução desse pensamento bolivariano, em termos práticos, fez com que a Venezuela carreasse seus ativos econômicos para políticas sociais e para reaparelhamento das forças armadas com recursos provenientes da venda do petróleo. Entretanto, a queda do preço do barril do petróleo no final da primeira década dos anos 2000 comprometeu decisivamente a economia venezuelana, levando o país ao desabastecimento e ao empobrecimento da população.

A combinação desses fatores aliada à incapacidade do Presidente Maduro de conduzir a Venezuela num cenário tão complexo e desfavorável, levou a população a buscar meios de sobrevivência nos países vizinhos, ou seja, Colômbia e Brasil.

Esse movimento migratório iniciado em 2015 ganhou força em 2016, atingindo números assustadores em 2017. Esse fluxo de pessoas ocupou, em pouco tempo, a cidade de Boa Vista, capital do estado de Roraima, elevando em 10% a população da cidade em 2017. Obviamente que a cidade e o estado não estavam preparados para este aumento repentino de pessoas buscando moradia, emprego, saúde, educação e em muitos casos a própria sobrevivência em termos alimentares.

A relevância do assunto para o Brasil foi demonstrada pelos esforços do

Governo Temer, no ano de 2018, para mitigar os efeitos dessa migração inesperada

no estado de Roraima. Além disso, o tratamento dado pela Operação Acolhida para

mitigar os efeitos desse movimento migratório nas cidades de Boa Vista e

Pacaraima e ao mesmo tempo atender aos tratados internacionais aos quais o Brasil

é signatários baseou-se em soluções de outros países mas com a devida adaptação

ao cenário local e com a criatividade peculiar do povo brasileiro aqui representado

pelas Forças Armadas, e, em especial o Exército Brasileiro.

(22)

1.6 REFERENCIAL TEÓRICO 1.6.1 Movimentos migratórios

O tema da migração não era uma questão relevante para os estudos sociológicos da virada do século XIX para XX. Richmond (1988), ao analisar os clássicos – Malthus, Marx, Durkheim e Weber – demonstrou que a migração era analisada enquanto consequência do processo de desenvolvimento do capitalismo, assim como os processos de industrialização e urbanização.

Segundo Malthus, a migração era vista como uma consequência inevitável da superpopulação. O Novo Mundo possibilitava um espaço para as migrações temporárias para fugir do ciclo de pobreza e miséria. Este pensamento derivava de sua concepção de que a população crescia em ordem geométrica, enquanto a capacidade de gerar tecnologias crescia em ordem aritmética.

Já Marx discordava de Malthus, cuja visão ele considerava reacionária, pois apontava para a inevitabilidade e/ou naturalização da pobreza. Marx colocava a culpa do quadro de pobreza nos empreendedores capitalistas que deliberadamente abaixavam os salários para maximizar seus ganhos.

Durkheim reconhecia claramente a migração como um dos fatores de quebra das comunidades tradicionais mantidas juntas pelos laços de solidariedade mecânica. A transição para a solidariedade orgânica, baseada numa divisão social de trabalho e interdependência econômica, era frequentemente acompanhada pela anomia, ou o colapso do sistema de valores comuns, que resultava em desintegração social, que, por sua vez, poderia levar a consequências patológicas.

Max Weber percebia a migração de forma menos definida. Como Marx e Durkheim, Weber estava concentrado nas consequências da industrialização e crescimento do capitalismo. Ele estava impressionado com os efeitos desintegradores e notava a importância da religião, particularmente pelo que chamou de "ética protestante", a qual reconhecia como condição necessária para acumulação de capital e para impor um código de disciplina sobre a forca de trabalho. Weber dizia que a migração era um fator incidental, criando classes sociais e grupos de status étnicos.

Para estes autores portanto, a migração era analisada como consequência do

desenvolvimento do capitalismo, que, por sua vez, dá-se através da industrialização,

(23)

urbanização e mobilidade populacional. Assim, a migração é uma preocupação secundária para estes autores, naquele contexto.

Entretanto, no início do século XX, os sociólogos americanos foram levados a colocar a migração como um problema, dada a crescente mobilidade populacional da Europa para os países do Novo Mundo, particularmente os Estados Unidos. Essa mobilidade, decorrente do crescimento populacional e das crises econômicas naqueles países, gerou um intenso debate político nos Estados Unidos, sobretudo tendo em vista a preocupação emergente nesse país com a constituição da sociedade frente à presença de imigrantes, debate este que ainda hoje é bastante polêmico.

1.6.2 Legislação internacional e nacional sobre refugiados

O Brasil tem uma tradição histórica de acolhimento de migrantes em nosso território. Pode-se dizer que o colonizador português foi um dos primeiros migrantes dessas terras continentais, seguidos dos africanos que vieram como escravos e depois os europeus e japoneses que substituíram os escravos na lavoura cafeeira no final do século XIX.

Essa movimento migratório para o Brasil permaneceu ao longo do início do século XX, tendo sido intensificado ao final da II Guerra Mundial com a vinda de muitos refugiados da guerra.

Ao fim do desse conflito mundial, fruto da Convenção de Genebra de 1951, surgem vários entendimentos para tratar da problemática do refugiado: o Protocolo de 1967, a Declaração de Cartagena, bem como a Declaração e o Plano de Ação do México, todos instrumentos valiosos e sólidos, voltados a oferecer soluções concretas em favor daqueles e daquelas que se vêem forçados a abandonar seus lares e ir para outros espaços onde possam reconstruir sua vida.

Consonante com a tradição brasileira no concerto das nações, o Brasil como

signatário de todos estes entendimentos produziu também legislação atinente ao

tema para regulamentar a situação do refugiado em nosso país, estando em

destaque a Lei 9474/97 e as Resoluções do Comitê Nacional para Refugiados

(CONARE) e do Conselho Nacional de Imigração (CNIg).

(24)

1.6.3 Operações interagências

A atuação das Forças Armadas, em especial do Exército Brasileiro, nesta tarefa de ajuda humanitária para mitigar os efeitos do fluxo desordenado de venezuelanos para o Brasil foi tipicamente um emprego em Operações Interagências.

Esse conhecimento sobre esse tipo específico de operação militar está consubstanciado no Manual MD33-M-12, Operações Interagências, mas também é fruto da expertise adquirida pelas tropas brasileiras que foram empregadas em diversas operações de paz da ONU pelo mundo e, em especial, da experiência na MINUSTAH, no Haiti.

Além do conhecimento militar, as ações da Operação Acolhida também foram pautadas pelas orientações da ACNUR, agência da ONU para refugiados, por intermédio Manual de Procedimentos e critérios para a determinação da condição de refugiado, baseado no acordo com a Convenção de 1951 e o protocolo de 1967 relativos ao estatuto dos refugiados.

1.7 METODOLOGIA

1.7.1 Tipo de pesquisa

O presente estudo será realizado, principalmente, por meio de uma pesquisa bibliográfica, pois baseará sua fundamentação teórico-metodológica na investigação sobre os assuntos relacionados aos movimentos migratórios e à Operação Acolhida em livros, manuais, artigos de acesso livre ao público em geral e documentos oficiais, incluindo-se nesses aqueles disponibilizados pela rede mundial de computadores.

1.7.2 Universo e amostra

O universo do presente estudo são as legislações internacionais e nacionais relacionados aos movimentos migratórios e, em especial, ao tema dos refugiados.

Além dos documentos oficiais do governo brasileiro que antecederam a implementação da Operação Acolhida e, também, os documentos decorrentes.

Como principais amostras serão utilizadas do tipo não probabilísticas e classificadas

como sendo de por acessibilidade.

(25)

As amostras que serão utilizadas são os documentos que tratam especificamente de refugiados com ênfase no movimento migratório venezuelano para o Brasil no período de 2015 a 2018.

1.7.3 Coleta de dados

A coleta de dados do presente trabalho de conclusão de curso dar-se-á por meio da coleta na literatura, realizando-se uma pesquisa bibliográfica na literatura disponível, tais como livros, manuais, revistas especializadas, jornais, artigos, internet, monografias, teses e dissertações, sempre buscando os dados pertinentes ao assunto. Nessa oportunidade, serão levantadas as fundamentações teóricas para a comprovação ou não da hipótese levantada.

1.7.4 Tratamento dos dados

O método de tratamento de dados que será utilizado no presente estudo será a análise de conteúdo, no qual serão realizados estudos de textos para se obter a fundamentação teórico para se confirmar ou não a hipótese apresentada.

1.7.5 Limitações do método

A metodologia em questão possui limitações, particularmente, quanto à

profundida do estudo a ser realizado, pois não contempla, dentre outros aspectos, o

estudo de campo e a entrevista com pessoas diretamente ligadas aos processos em

estudo. Porém, devido ao fato de se tratar de um trabalho de término de curso, a ser

realizado em aproximadamente seis meses (ver item 4 CRONOGRAMA), o método

escolhido é adequado e possibilitará o alcance dos objetivos propostos no presente

Projeto de Pesquisa.

(26)

2 REFERENCIAL TEÓRICO

O tema da migração não era uma questão relevante para os estudos sociológicos da virada do século XIX para XX. Richmond (1988), ao analisar os clássicos – Malthus, Marx, Durkheim e Weber – demonstrou que a migração era analisada enquanto consequência do processo de desenvolvimento do capitalismo, assim como os processos de industrialização e urbanização. Isto envolvia o declínio das comunidades rurais e a criação de culturas heterogêneas e cosmopolitas, na concorrência dos imigrantes por emprego e na luta para sobreviver numa cidade de ambiente estranho. Para demonstrar este argumento, Richmond demonstra como os autores clássicos da sociologia abordaram a questão da migração.

Segundo Malthus, a migração era vista como uma consequência inevitável da superpopulação. O Novo Mundo possibilitava um espaço para as migrações temporárias para fugir do ciclo de pobreza e miséria. Este pensamento derivava de sua concepção de que a população crescia em ordem geométrica, enquanto a capacidade de gerar tecnologias crescia em ordem aritmética.

Já Marx discordava de Malthus, cuja visão ele considerava reacionária, pois apontava para a inevitabilidade e/ou naturalização da pobreza. Marx colocava a culpa do quadro de pobreza nos empreendedores capitalistas que deliberadamente abaixavam os salários para maximizar seus ganhos. Ao examinar os efeitos das mudanças econômicas e políticas na França, Irlanda, e Escócia, Marx realçou a cumplicidade dos governos e dos militares na coerção de camponeses e pequenos proprietários para migração, através de movimentos de cercamentos (enclosures), autorização de partida e assistência estatal aos movimentos de emigração.

Durkheim reconhecia claramente a migração como um dos fatores de

quebra das comunidades tradicionais mantidas juntas pelos laços de

solidariedade mecânica. A transição para a solidariedade orgânica, baseada

numa divisão social de trabalho e interdependência econômica, era

frequentemente acompanhada pela anomia, ou o colapso do sistema de valores

comuns, que resultava em desintegração social, que, por sua vez, poderia levar

a consequências patológicas. Tais consequências incluíam crime, suicídio e

conflito de grupo.

(27)

Max Weber percebia a migração de forma menos definida. Como Marx e Durkheim, Weber estava concentrado nas consequências da industrialização e crescimento do capitalismo. Ele estava impressionado com os efeitos desintegradores e notava a importância da religião, particularmente pelo que chamou de "ética protestante", a qual reconhecia como condição necessária para acumulação de capital e para impor um código de disciplina sobre a força de trabalho. Weber dizia que a migração era um fator incidental, criando novas classes sociais e grupos de status étnicos.

Para estes autores portanto, a migração era analisada como consequência do desenvolvimento do capitalismo, que, por sua vez, dá-se através da industrialização, urbanização e mobilidade populacional. Assim, a migração é uma preocupação secundária para estes autores, naquele contexto.

Entretanto, no início do século XX, os sociólogos americanos foram levados a colocar a migração como um problema, dada a crescente mobilidade populacional da Europa para os países do Novo Mundo, particularmente os Estados Unidos. Essa mobilidade, decorrente do crescimento populacional e das crises econômicas naqueles países, gerou um intenso debate político nos Estados Unidos, sobretudo tendo em vista a preocupação emergente nesse país com a constituição da sociedade frente à presença de imigrantes, debate este que ainda hoje é bastante polêmico.

O estudo pioneiro dentro dessa abordagem, a obra de Thomas &

Znaniecki (1918), The Polish Peasant in Europe and America, influenciou fortemente os estudos posteriores de migração. Esta obra é considerada importante por que, embora tratasse de um objeto específico – os cerca de dois milhões de poloneses que migraram para a América entre 1880 e 1910 –também demonstrou como o processo de migração quebra os laços de solidariedade, particularmente o sistema familiar. Os estudos influenciaram o surgimento da sociologia urbana e da sociologia do desvio, temas retomados pela Escola de Chicago.

A Escola de Chicago desenvolveu as análises de Thomas & Znaniecki em

várias direções. O foco destas análises estava nos processos de adaptação,

aculturação e assimilação dos grupos imigrantes dentro da sociedade

americana. Estes teóricos acreditavam que ocorreria uma completa assimilação

(28)

estrutural e cultural, embora não fosse claro se isso envolveria a adoção de valores anglo-americanos.

O termo melting pot passaria a se referir a esse processo de assimilação e/ou americanização dos imigrantes, não implicando, no entanto, no total abandono de seus valores e modo de vida, mas sim, em tornar-se grupos cada vez mais amplos e inclusivos. A maior crítica ao modelo clássico de adaptação dos imigrantes e às ideias de ciclo das relações raciais consiste no reconhecimento de que esta não era adequada para tratar a migração, pois não reconhecia as diferenças resultantes dos processos de colonialismo e imperialismo, que configuravam os vários fluxos migratórios.

Neste sentido, os pressupostos colocados por esta Escola foram postos em xeque na medida em que o melting pot não se concretizou, pois, ao contrário, esses grupos se transformaram em grupos étnicos

7

afirmando suas distintividades.

Ao longo dos anos 50, como uma das consequências das transformações políticas e econômicas do período pós-guerra, ocorreu uma reconfiguração dos fluxos migratórios internacionais. Novos grupos migrantes, tais como latino- americanos, asiáticos e outros não brancos, entraram no melting pot e evidenciaram a persistência dos grupos étnicos, o que colocou em questão os pressupostos assimilacionistas. A partir dos anos 60, os estudos realizados podem ser caracterizados como revival étnico e expressaram a crise das análises baseadas nos princípios da modernização (Poutignat & Streiff-Fenart:

1998).

As teorias marxistas enfocaram aspectos diferentes em relação aos temas tratados pela Escola de Chicago. O crescimento do uso de trabalhadores temporários em países europeus como França, Alemanha e Suíça, reacendeu o interesse pela ideia de exército de reserva de trabalhadores que o sistema capitalista mobiliza quando necessita. Segundo Richmond (1988:34), os trabalhadores nativos nas sociedades industriais são hábeis em se beneficiar dos sindicatos e do welfare state. Eles formavam uma ‘aristocracia de trabalho’

que não estava preparada para ser pouco remunerada em trabalhos duros que requeriam trabalho manual pesado e longas horas. Empregadores encorajavam,

7 Sobre a transformação de grupos imigrantes em grupos étnicos na sociedade americana, ver Poutignat & Streiff-Fenart (1998), que fazem uma discussão sobre o conceito de etnicidade.

(29)

portanto, a migração de outros países de menor desenvolvimento para encarregá-los de serviços subalternos e menos remunerados. Entretanto, tais empregadores não encorajavam os imigrantes a permanecerem e esses últimos eram desprovidos de benefícios maiores de cidadania nos países receptores.

Castles & Kosak (1973) aplicaram esta teoria na Europa e Portes (1981) aplicou aos Estados Unidos.

Uma outra contribuição teórica é a compreensão da migração a partir de estudos da sociologia e economia nos Estados Unidos, com ênfase na estratificação e divisão ou segmentação do mercado de trabalho nas sociedades industriais avançadas. Imigrantes, assim como as minorias étnicas e as mulheres, tenderiam a permanecer em indústrias marginais e mercado secundário de trabalho, sem qualificação para conseguir remuneração melhor do que os trabalhadores nativos, que por sua vez, são protegidos pelos sindicatos, licença de trabalho e mercado de trabalho interno gerado por grandes corporações.

Neste contexto, as redes sociais e discriminação institucional servem para excluir o migrante e colocá-los no emprego menos remunerado e temporário.

Imigrantes não documentados tendem a ser particularmente mais vulneráveis a este respeito. Mulheres e minorias étnicas podem sofrer uma dupla ou tripla exploração face a discriminação dentro do mercado secundário. A análise que enfatiza a estratificação étnica e mercado de trabalho segmentado, combina características do conflito de classe e modelos de pluralismo cultural.

Como Gabaccia (1992) ressaltou, esse novo interesse pelos fenômenos migratórios está muito marcado por uma análise econômica dos processos migratórios. Isso significa estudos macrossociológicos, tendo o foco deslocado para análises mais quantitativas, de surveys, e nesse sentido, há uma ênfase muito maior no indivíduo migrante do que nas suas relações sociais. Nesse momento, a sociologia faz fronteira mais próxima à economia do que à história e psicologia social, que influenciaram muito os estudos dos funcionalistas e da própria Escola de Chicago.

Dentre as abordagens econômicas, a perspectiva neoclássica enfatiza

que a migração internacional de trabalhadores é causada pelas diferenças de

taxas salariais entre países. Os mercados de trabalho – e não outros, como

financeiro, por exemplo – são os mecanismos primários pelos quais os fluxos

(30)

internacionais são induzidos, isto é, eles defendem a teoria do equilíbrio de renda e emprego de diferentes países. Para os neoclássicos, o migrante calcula o custo e o benefício da experiência migratória e é isso que influencia e determina a sua decisão, sendo que a migração é entendida aqui como simples somatória de indivíduos que se movem em função do diferencial de renda (Harris & Todaro, 1970). O modelo neoclássico definia o sucesso do migrante pela sua educação, experiência de trabalho, domínio da língua da sociedade hospedeira, tempo de permanência no destino e outros elementos do capital humano.

Para Portes

8

(1995), a ênfase dada à ação racional pelos neoclássicos seria questionável, pois estes autores não consideravam a ação econômica sendo socialmente orientada, o que significa dizer que a busca por ganhos materiais também deve estar relacionada às expectativas de reciprocidade no curso da interação social no interior do seu grupo. Desta forma, estas críticas vão sugerir que os migrantes não devem ser vistos apenas como indivíduos, mas como integrantes de estruturas sociais que afetam os múltiplos caminhos de sua mobilidade espacial e socioeconômica. Ao considerar os migrantes como inseridos em grupos étnicos, redes sociais e utilizando-se do capital social para o seu empreendimento migratório, Portes (1995) nos fornece categorias analíticas que permitem compreender melhor a complexidade dos novos movimentos migratórios.

No contexto de mudança das características dos fluxos, Portes propõe princípios – tais como influência centro-periferia e desequilíbrio estrutural; modos de incorporação; grupos intermediários e enclaves étnicos; e economia informal – questionando a perspectiva neoclássica sobre as origens da migração e adaptação econômica dos imigrantes.

Nos anos recentes, os “novos economistas” da migração têm contribuído para desafiar muitas hipóteses e conclusões da teoria neoclássica (Stark &

Bloom, 1985). A principal contribuição desta nova abordagem é que entendem que as decisões migratórias não são tomadas pelos atores individuais isolados,

8 Este autor, partindo do conceito de Weber de ação social, considera que os indivíduos, ao optarem por uma ação racional, levam em consideração não apenas princípios econômicos, mas, também procuram atender as expectativas relacionadas ao grupo ao qual pertencem. O impacto dessa forma de entender a ação racional nos estudos sobre migração – a decisão de migrar e o próprio processo de inserção do migrante na sociedade de destino – passa a ser analisado considerando a influência das relações sociais e não apenas a decisão individual.

(31)

mas por unidades maiores de pessoas relacionadas – tipicamente famílias ou domicílios – nas quais as pessoas agem coletivamente, não apenas para maximizar a renda esperada, mas também para minimizar e afrouxar os constrangimentos associados a uma variedade de mercados de trabalho. Os modelos teóricos que crescem nesta linha dos “novos economistas” da migração, baseiam-se em um conjunto de proposições e hipóteses que são completamente diferentes da teoria neoclássica, levando a um conjunto muito diferente de prescrições políticas.

Como os novos economistas, Massey (1997) aponta para os limites das proposições neoclássicas. A partir das características gerais, levantou alguns pontos que resumiremos a seguir: a unidade de analise não seria o indivíduo autônomo mas sim, as famílias, domicílios ou outras unidades de produção e consumo culturalmente definidas; o diferencial de renda não é uma condição necessária para ocorrer a migração internacional, uma vez que podem contar com incentivos para diversificar os riscos através das redes sociais; a migração internacional, emprego e produção local não são mutuamente possibilidades exclusivas; as políticas governamentais ocasionam mudanças econômicas que afetam a distribuição de renda podendo influenciar a migração internacional independente de seus efeitos sobre a renda. Podemos considerar ainda uma outra abordagem, a dos estudos do funcionamento do mercado de trabalho.

Estes foram feitos nos Estados Unidos, dividindo-se em duas perspectivas diferentes sobre a inserção e o desempenho dos imigrantes. A primeira abordagem seria a dos teóricos da segmentação (Piore & Doeringer 1971, e Gordon et al. 1982, 1964) e a segunda seria os teóricos do capital humano (Borjas 1990).

Os principais argumentos dos teóricos do capital humano seriam que os

imigrantes ilegais têm acesso aos bens e serviços assistenciais do welfare

americano, o que vem penalizando os orçamentos de alguns estados como a

Flórida e Califórnia. No âmbito do mercado de trabalho, estes imigrantes com

baixa qualificação são acusados de tirar os empregos dos nativos e rebaixar os

salários das regiões ou cidades onde se concentram. Estes teóricos acreditam

que a política imigratória deve priorizar a entrada e a permanência de imigrantes

com melhor qualificação, a fim de atingir um sistema econômico mais produtivo.

(32)

Os teóricos da segmentação, diferentemente da perspectiva anterior, argumentam que haveria uma complementaridade entre o imigrante e o nativo quanto à locação de mercado de trabalho. Esses dois grupos de trabalhadores atenderiam a diferentes oportunidades de emprego de um mercado de trabalho que é segmentado em dois estratos: o mercado de trabalho primário e o secundário. O primário se caracteriza por requerer alta qualificação, melhores salários e possibilidades de ascensão hierárquica e estão presentes nas grandes empresas capitalistas. O secundário frequentemente oferece baixos salários, alta rotatividade, baixa qualificação e poucas possibilidades de ascensão hierárquica. Este mercado secundário seria ocupado por trabalhadores migrantes, mulheres e jovens. Neste sentido, os teóricos da segmentação argumentam, ao contrário dos teóricos do capital humano, que os migrantes não concorrem com os nativos pelo emprego.

Criticando pressupostos implícitos em vários estudos da migração, Sassen (1988) demonstrou que, embora seja inegável que a pobreza, desemprego e superpopulação possibilitam as migrações, é também necessário identificar os processos que transformam essas condições, criando uma situação que leva à migração. Tais processos estão relacionados com a reorganização da economia mundial nas duas últimas décadas, resultando na formação de um espaço transnacional, onde a circulação de trabalhadores é apenas um dos fluxos dentre outros, como os de capital, mercadorias, serviços e informações.

Nesse sentido, diante da internacionalização da produção e da reorganização da economia mundial, o investimento estrangeiro é uma das variáveis para entendermos os fluxos das migrações internacionais.

O paradoxo de ocorrer emigração em países com altas taxas de

crescimento e haver desemprego nos países de destino, como os Estados

Unidos, explica-se pela generalização das relações de mercado e pelo

desenvolvimento das formas modernas de produção, que têm levado a uma

ruptura nas relações de emprego, desembocando na internacionalização da

produção. A expansão da manufatura e da agricultura para exportação estão

intimamente relacionadas com o investimento estrangeiro direto dos países

industrializados e tem levado novos segmentos da população às migrações

regionais e de longa distância.

(33)

A transformação da estrutura do mercado de trabalho está intimamente relacionada com as mudanças que também ocorreram na organização industrial.

É o que Sassen chama de ruptura da estrutura tradicional do trabalho. A subcontratação organizada, por exemplo, a oportunidade para formação de pequenos negócios, em alguns casos, permite que antigos sistemas de trabalho doméstico, artesanal e familiar revivam e floresçam. Constata-se também a proliferação das economias ‘informais’ e ‘clandestinas’ no mundo capitalista avançado, com retorno de formas de produção que envolvem exploração, principalmente nos setores ocupacionais mais baixos nas grandes cidades. Isso significa, portanto, uma transformação no modo de controle de trabalho e de emprego.

Nesse cenário mundial, nas duas últimas décadas, sobretudo a partir do período pós II Guerra Mundial, o capitalismo está se tornando cada vez mais organizado através da dispersão, da mobilidade geográfica e das respostas flexíveis nos mercados de trabalho, nos processos de trabalho e nos mercados de consumo, sempre acompanhado por grandes inovações tecnológicas, de produtos e institucionais. É a partir desse quadro internacional que Sassen busca a ideia de ruptura nas estruturas tradicionais de emprego, que está intimamente relacionada com a internacionalização da produção que, por sua vez, está inteiramente assentada no investimento estrangeiro, nas novas regiões que tomaram impulso com a emergência e implantação da nova indústria de processamento para exportação.

Dentro deste contexto, a imigração é um processo em que o investimento

estrangeiro direto não é uma causa, mas é a própria estrutura da nova economia

reorganizada pela acumulação flexível que cria certas condições para a

emigração emergir como opção Os níveis significativos e a concentração de

investimento estrangeiro podem ser vistos como um fator promotor de emigração

na medida em que: (a) a incorporação de novos segmentos da população no

trabalho e a ruptura da estrutura tradicional de trabalho criaram uma oferta de

trabalhadores migrantes; (b) ocorre a feminização da nova força de trabalho

industrial provocando impacto sobre as oportunidades de trabalho dos homens,

tanto nas novas zonas industriais quanto na estrutura tradicional de trabalho; e

(c) consolida as relações objetivas e ideológicas entre os países em

desenvolvimento e os avançados (onde se origina a maioria do capital

(34)

estrangeiro). Nesse sentido, existe um efeito de “ocidentalização” generalizado que contribui para formação de um exército de emigrantes potenciais e ao mesmo tempo, contribui para que a emigração seja vista como uma opção atual (Sassen 1988).

Esta síntese das abordagens teóricas sobre a migração internacional demonstra a necessidade de se complexificar as análises que se restringem aos aspectos econômicos nos quais os migrantes parecem indivíduos que agem desconectados de relações sociais, apontando para a importância de se analisar as redes sociais no processo migratório.

Segundo Boyd (1986), a utilização das redes sociais não é uma novidade na pesquisa sobre a migração. Nos anos 70, estudiosos analisaram os processos de redes de migração e o papel que parentes e amigos desempenhavam no fornecimento de informações e auxílio no processo migratório. Entretanto, os padrões de migração recente e novas conceitualizações da migração concentram mais interesses na importância da família, amigos e origem comum que sustentam essas redes.

Neste sentido, as migrações recentes resultariam também de um momento do desenvolvimento das redes sociais, mais do que apenas decorrência de crises econômicas. Massey (1990) afirma que as redes migratórias compõem um conjunto de laços sociais que ligam comunidades de origem a específicos pontos de destino nas sociedades receptoras. Tais laços unem migrantes e não migrantes em uma complexa teia de papéis sociais complementares e relacionamentos interpessoais que são mantidos por um quadro informal de expectativas mútuas e comportamentos predeterminados.

Segundo Tilly (1990) as redes migram; as categorias permanecem e as redes criam novas categorias. As unidades efetivas da migração não são nem individuais nem domiciliares, mas sim conjuntos de pessoas ligadas por laços de amizade, parentesco e experiência de trabalho, que incorporaram o país de destino nas alternativas de mobilidade por eles consideradas.

A migração de longa distância se vincula a muitos riscos: segurança

pessoal, conforto, renda, possibilidade de satisfazer as relações sociais. Onde

parentes, amigos, vizinhos e colegas de trabalho já têm bons contatos com o

possível destino, a confiança sobre as redes de informações interpessoais

estabelecidas minimizam e diluem os riscos. Portanto, assim como outros fluxos

(35)

migratórios, os migrantes brasileiros utilizam-se das redes sociais para minimizarem os riscos presentes na migração de longa distância. Assim, os migrantes potenciais concentram-se naquelas poucas localidades onde têm fortes ligações com o lugar de origem deixando de considerar muitos outros destinos teoricamente disponíveis.

Neste sentido, as redes limitariam as opções dos migrantes. A frequência das remessas mandadas pelos migrantes para suas casas no país de origem e as passagens previamente pagas por pessoas no destino, revelam a extensão da ajuda mútua. O volume de remessas para o Brasil, por exemplo, evidencia a importância e a extensão das redes sociais, pois os migrantes investem nos locais de origem adquirindo imóveis e outro bens de consumo, auxiliando a família, pagando a passagem de futuros migrantes, etc., evidenciando uma particular dinâmica social nesses locais, envolvendo pessoas que não migraram nesse processo4. As redes também transformam as categorias existentes. Os emigrantes levam consigo suas identidades étnicas que se alteram no contexto de migração, nas relações com a sociedade de destino e com outros grupos de migrantes.

Assim, alguns elementos de identidade do país de origem são eleitos, negociados e reconstruídos no contexto de migração. Portanto, ao invés de um

“transplante” coletivo, há uma recriação seletiva de laços sociais (Tilly 1990:86).

Massey (1990) ofereceu uma significativa contribuição às questões relacionadas à migração internacional ao analisar fatores sociais à luz de dados quantitativos. Ao demonstrar aspectos mensuráveis da organização social, que mudam com o passar dos anos, possibilitou algumas conjecturas sobre padrões e tendências do fenômeno migratório, as quais consideramos extremamente relevantes para a compreensão do processo como um todo.

Os trabalhos de Massey, Tilly e Boyd, demostraram a importância das

redes sociais na articulação dos processos migratórios, enfatizando a

solidariedade no interior dos grupos migrantes como uma das características que

configuram e sustentam as redes. Entretanto, estes mesmos autores apontam

para a ambiguidade dessas relações, pois a própria dinâmica da migração revela

que os laços de parentesco, amizade e origem comum são também permeados

por conflitos e ambiguidade. Além disso, as redes sociais evidenciam que nos

processos migratórios contemporâneos, os migrantes mantêm múltiplas

(36)

relações tanto na sociedade de destino quanto na de origem. Estas relações sugerem características que apontam para o contexto transnacional dos fluxos migratórios contemporâneos, como demonstraremos a seguir.

Para abordar os novos fluxos migratórios, Glick-Schiller, Basch e Blanc- Szanton (1992) sugeriram a adoção da transnacionalização como um novo campo analítico para compreensão da migração. Este conceito foi formulado a partir de pesquisas com vários grupos de migrantes para os EUA: caribenhos, haitianos e filipinos.

Realizando um breve histórico sobre os estudos de migração, as autoras afirmam que a palavra migrante evoca imagens de ruptura permanente, de abandono de velhos padrões, aprendizado difícil de uma nova língua e cultura.

Ao olharem para o imigrante sob esta perspectiva, como rapidamente assimilados ou aculturados pela sociedade de destino, tais estudos obscureceram os dados sobre as ligações com o lar, o país de origem. Esta perspectiva é constatada também nos estudos brasileiros sobre imigração

9

.

Diferentemente destes estudos, as referidas autoras, ao compararem os dados de suas pesquisas, perceberam que os novos migrantes mantêm múltiplas relações sociais entre o local de emigração e a sociedade hospedeira.

Os migrantes passam a ser chamados de transmigrantes quando desenvolvem e mantêm múltiplas relações - familiares, econômicas, sociais, organizacionais, religiosas e políticas que ampliam as fronteiras colocando em interrelação o global e o local (Glick-Schiller, Basch e Blanc- Szanton 1992). O enfoque transnacional enfatiza a emergência de um processo social que cruza fronteiras geográficas, culturais e políticas.

No plano teórico, Glick-Schiller, Basch e Blanc-Szaton argumentaram que, embora na literatura sobre migração ocorressem algumas descrições e caracterizações no sentido de transnacionalização, estes estudos, por estarem

9 FAUSTO (1991), numa análise da historiografia sobre a imigração estrangeira para São Paulo, destaca que os estudos sobre a interação do imigrante com a sociedade nacional estão marcados pelos enfoques onde a assimilação e a aculturação são as premissas básicas para compreender os imigrantes. O autor analisa tendências recentes como o estudo de Giralda Seyferth que introduziu o conceito de etnicidade para analisar as relações entre os imigrantes e a sociedade local. O autor, neste ponto dialoga, com as modificações nos enfoques teóricos sobre migrações internacionais nos EUA onde saiu-se da noção de “Melting pot“ para a de pluralismo cultural colocando-o como perspectiva adequada para os estudos migratórios por não partirem a priori da noção de assimilação ou aculturação.

Referências

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