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Vigilância e meio ambiente: aspectos conceituais e metodológicos para áreas de mineração de ouro

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VERAS, RP., et al., orgs. Epidemiologia: contextos e pluralidade [online]. Rio de Janeiro: Editora

FIOCRUZ, 1998. 172 p. EpidemioLógica series, n°4. ISBN 85-85676-54-X. Available from SciELO

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Vigilância e meio ambiente:

aspectos conceituais e metodológicos para áreas de mineração de ouro

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V I G I L Â N C I A Ε M E I O A M B I E N T E : A S P E C T O S C O N C E I T U A I S Ε M E T O D O L Ó G I C O S P A R A Á R E A S D E

M I N E R A Ç Ã O D E : O U R O

Volney de M. Câmara

Para os profissionais da saúde interessados em desenvolver p r o g r a m a s de v i g i l â n c i a e e s t u d o s e p i d e m i o l ó g i c o s , as áreas de p r o d u ç ã o de o u r o representam u m a situação muito especial, padrões de c o m p a r a ç ã o com outras atividades econômicas no Brasil. Esta característica particular dos g a r i m p o s de ouro refere-se, sobretudo, à sua estrutura social e econômica, aos intensos e freqüentes m o v i m e n t o s migratórios dos garimpeiros e à multiplicidade de fatores de fisco, tanto para os trabalhadores c o m o para a população em geral. O meio físico e social em que se desenvolve a atividade garimpeira obriga os e s p e c i a l i s t a s e m s a ú d e p ú b l i c a a e f e t u a r e m c u i d a d o s a s c o n s i d e r a ç õ e s metodológicas. Deve-se, ainda, destacar o estado precário de desenvolvimento d a s i n s t i t u i ç õ e s e d o s s e r v i ç o s e m g e r a l na A m a z ô n i a , q u e i n f l u e m significativamente no p l a n e j a m e n t o e e x e c u ç ã o de q u a l q u e r p r o p o s t a de vigilância dos problemas ambientais identificados na região (Câmara, 1992). N e s t e c o n t e x t o , s e r ã o e n f a t i z a d a s as p r i n c i p a i s q u e s t õ e s r e l a t i v a s a o desenvolvimento dos p r o g r a m a s de vigilância em áreas de mineração de ouro.

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Α metodologia utilizada pela vigilância epidemiológica é constituída por dois componentes. O primeiro é um sistema de informação r e p r e s e n t a d o pelo m é t o d o de coleta sistemática de dados de um d e t e r m i n a d o p r o b l e m a ambiental, além do processamento, análise e distribuição desta informação. O outro abrange as atividades de intervenção desenvolvidas para prevenção e c o n t r o l e . N o B r a s i l , o p r i m e i r o c o m p o n e n t e é d e n o m i n a d o v i g i l â n c i a epidemiológica e o segundo, vigilância sanitária. Nos demais países da A m é r i c a Latina, existe apenas o termo vigilância, ou vigilância epidemiológica, para o conjunto de atividades.

Os poluentes ambientais de interesse para os programas de vigilância p o d e m ser classificados c o m o naturais e antropogênicos. C o m o exemplo de poluição natural p o d e - s e destacar a c o n t a m i n a ç ã o de águas por arsênico, existente em países c o m o Argentina e Chile, em que estudos epidemiológicos d e m o n s t r a m que as populações expostas possuem uma maior prevalência de tipos específicos de câncer (Cebrián et a l , 1993). Todavia, a quase totalidade das catástrofes ambientais tem origem antropogênica e, mais especificamente, tem base e m p r o c e s s o s p r o d u t i v o s , atingindo não só t r a b a l h a d o r e s , m a s t a m b é m s e g m e n t o s da população em geral. Isto amplia a responsabilidade dos profissionais responsáveis por atividades de vigilância e m ambientes de trabalho, uma vez que devem incluir, em suas metodologias e tecnologias, a busca da informação e as atividades de intervenção fora dos limites físicos das empresas. D a m e s m a forma, é necessário que os profissionais da área da saúde ambiental a b a r q u e m os processos produtivos em suas investigações sobre os p o n t o s de emissão de poluentes.

Entre os diversos contaminantes ambientais que afetam p o p u l a ç õ e s ocupacionais e não-ocupacionais no Brasil, destaca-se o mercúrio (Hg), utilizado na produção de ouro. O fato de o ouro ser encontrado, na maioria das vezes, na forma de pó, requer metodologias mais complexas que uma simples bateia para sua extração. C o m o exemplo, tem-se o uso do mercúrio para formar um amálgama que facilita a identificação do metal, geralmente na proporção um para um, ou seja, para cada quilo de ouro utiliza-se, em média, outro quilo de mercúrio, podendo esta proporção variar de 0,8 até 1,3 (Pfeiffer & Lacerda, 1988; Couto, Câmara & Sabrosa, 1988; Ferreira & Appel, 1990).

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A p r o d u ç ã o deste metal e m g a r i m p o s p o d e ser classificada em três tipos: a) balsas — o material aurífero encontra-se nos sedimentos dos rios; b) v e i o — o ouro é localizado nas rochas; e c) baixão — aparece nas m a r g e n s de p e q u e n o s rios. Silva (1993) a g r u p a estes tipos de g a r i m p o s em p r i m á r i o s (veio) e secundários (baixão e dragas ou balsas). Utilizando-se o g a r i m p o de baixão c o m o modelo, pode-se dividir o processo de trabalho em quatro etapas (Couto, 1991), a saber:

• o p r e p a r o d e infra-estrutura (instalação de e q u i p a m e n t o s e l o c a i s de m o r a d i a ) ;

• o d e s m o n t e hidráulico ( m o t o - b o m b a que joga á g u a sob forte p r e s s ã o hidráulica para desmontar o barranco de cascalho);

• a c o n c e n t r a ç ã o d o o u r o , e m q u e a t e r r a m i s t u r a d a c o m á g u a é p o s t e r i o r m e n t e succionada por outra m o t o - b o m b a e drenada para u m a caixa de m a d e i r a bastante rudimentar utilizada para concentrar o material sólido. E m seguida, é realizada a r e m o ç ã o de um p a n o ou carpete que forra o fundo da caixa para ser espremido c o m a finalidade de retirar o excesso da água, retendo o material condensado ao qual são adicionadas concentrações de mercúrio;

• a q u e i m a do ouro, realizada por m e i o da q u e i m a do material a m a l g a m a d o e m uma bateia.

O uso do m e r c ú r i o e m atividades de m i n e r a ç ã o de o u r o p o d e ser i n c l u í d o entre os m u i t o s c r i t é r i o s q u e p o d e m s e r v i r p a r a a p o n t a r u m a substância química c o m o prioritária para atividades de vigilância. São eles: • taxas elevadas de m o r b i d a d e e m o r t a l i d a d e — neste caso, e m b o r a n ã o

sejam disponíveis estatísticas oficiais, o mercúrio é conhecido c o m o um metal cumulativo no o r g a n i s m o e de elevada toxicidade;

• p r o d u ç ã o , i m p o r t a ç ã o , c o m e r c i a l i z a ç ã o e u t i l i z a ç ã o d e u m a s u b s t â n c i a q u í m i c a — n o s ú l t i m o s v i n t e a n o s , a e x t r a ç ã o d o o u r o c r e s c e u m a r c a d a m e n t e n o B r a s i l . F é l i x ( 1 9 8 7 ) a p o n t a u m c r e s c i m e n t o d e 9,6 t o n e l a d a s e m 1 9 7 2 p a r a 80,1 t o n e l a d a s e m 1 9 8 6 . J á p a r a o a n o d e 1 9 8 8 , H a s s e ( 1 9 9 3 ) e s t i m o u u m total de 2 1 8 , 6 t o n e l a d a s p r o d u z i d a s e e s t e m e s m o autor, a n a l i s a n d o d a d o s do B a n c o do B r a s i l , cita q u e a i m p o r t a ç ã o de m e r c ú r i o a l c a n ç o u 3 3 9 , 9 t o n e l a d a s e m 1 9 8 9 ;

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• substância presente em diversos compartimentos ambientais - os estudos da c i n é t i c a do m e r c ú r i o m o s t r a m q u e a q u e i m a do a m á l g a m a o u r o -mercúrio libera Hg metálico para a atmosfera. Este material p o d e ser depositado nos solos, águas e sedimentos dos rios, e até atingir a biota; • alta p e r m a n ê n c i a da substância no ambiente — o mercúrio p e r m a n e c e no

ambiente por muitos anos. No caso da intoxicação por mercúrio na baía de M i n a m a t a , Japão, o início do despejo de cloreto de mercúrio ocorreu em 1932 e os efeitos somente c o m e ç a r a m a aparecer na década de 50, atingindo o pico epidêmico nos anos 60 (Cebrián et al., 1993);

• biomagnificação e bioacumulação — alguns contaminantes, ao entrarem em contato com elementos do meio, sofrem uma série de reações q u í m i c a s que alteram o seu estado inicial, tornando-se substâncias mais tóxicas. O m e t i l - m e r c ú r i o é f a c i l m e n t e a b s o r v i d o p o r p e i x e s e o u t r o s a n i m a i s a q u á t i c o s , p r o v o c a n d o u m a d e p o s i ç ã o dessa s u b s t â n c i a q u í m i c a nos tecidos destes animais, fazendo com que ao longo do tempo se a c u m u l e m e, através da cadeia biológica, atinjam concentrações bem superiores às o r i g i n a l m e n t e e n c o n t r a d a s no a m b i e n t e . O s r e s u l t a d o s d e a l g u n s pesquisadores brasileiros citados por Hacon (1990), tais como M a l m et al. (1990), sugerem a possibilidade de estar ocorrendo metilação em rios de p e q u e n o porte na Amazônia;

• população exposta - o número de garimpeiros no Brasil é praticamente impossível de ser avaliado com precisão, em v i r t u d e dos m o v i m e n t o s migratórios, da grande extensão territorial do País e do difícil acesso às áreas onde geralmente existem os pontos de garimpo. U m levantamento realizado p e l o D e p a r t a m e n t o Nacional de P r o d u ç ã o M i n e r a l ( D Ν P M ) estimou um total de trezentos mil trabalhadores concentrados, sobretudo, no estado do Pará ( D N P M , 1993). O número de garimpeiros é diretamente proporcional ao nível de produção do ouro, que, por sua vez, d e p e n d e do preço nos mercados nacionais e internacionais. Quanto ao risco potencial dos expostos ao metil-mercúrio, é ainda difícil precisar o número, pois as estimativas variam de um até cinco milhões de pessoas;

• tipo de efeito - o mercúrio é cumulativo no organismo h u m a n o e seus efeitos são de início insidioso e crônico;

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• p r o d u t o químico cuja fabricação ou utilização seja proibida em outros países — este é o caso do mercúrio, banido em atividades tais c o m o a agricultura no Brasil e que vem sendo substituído em processos industriais nos países caracterizados c o m o desenvolvidos;

• disponibilidade de recursos laboratoriais e clínicos para o diagnóstico - já existem vários laboratórios de toxicologia para estudar a exposição por intermédio da análise de teores de mercúrio em sangue, urina e cabelo, e ainda pouco investimento em pesquisas clínicas para avaliar os efeitos; • possibilidade de recursos financeiros, tecnologias e decisão política para

eliminar o risco — embora esteja explicitado em programas governamentais o p r o b l e m a do uso do m e r c ú r i o , a s i t u a ç ã o p e r m a n e c e a m e s m a . É importante assinalar que a presença do garimpeiro não ocorre por um simples 'espírito aventureiro' de pessoas que querem morar na floresta. E x i s t e m fatores sociais e e c o n ô m i c o s que e x p u l s a m os m o r a d o r e s do campo e da periferia das cidades, aumentando o contingente dos que vivem nos g a r i m p o s e estão e x p o s t o s , rotineiramente, a e l e v a d o s í n d i c e s de p r o b l e m a s de saúde tais como a malária, a violência etc. Vale ressaltar, t a m b é m , que nos últimos anos houve um decréscimo da p r o d u ç ã o de ouro no Brasil, em virtude do aumento dos custos da produção e de uma diminuição do preço do ouro nos mercados nacionais e internacionais.

O SISTEMA DE INFORMAÇÃO

A i n f o r m a ç ã o é indispensável para o d e s e n v o l v i m e n t o de qualquer atividade de vigilância e, para fins didáticos, pode ser classificada em quatro categorias, a saber:

A INFORMAÇÃO SOBRE O AGENTE

E x i s t e m d u a s f o r m a s de a p r e s e n t a ç ã o d o m e r c ú r i o ( m e t á l i c a e metilada) que, c o m o veremos adiante, conferem diferentes tipos de exposição

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e efeitos. O u t r o s a s p e c t o s i m p o r t a n t e s são o p e r í o d o d o a n o e a á r e a geográfica. N a s épocas de chuvas na A m a z ô n i a (geralmente a b r a n g e m os m e s e s de n o v e m b r o até abril), a velocidade das águas praticamente i m p e d e a atividade garimpeira e a p r o d u ç ã o de ouro diminui consideravelmente. C o m o conseqüência, decrescem os índices de exposição e, portanto, a possibilidade de a p a r e c i m e n t o dos efeitos adversos à saúde. Q u a n t o à área geográfica, fatores c o m o clima, pH do solo etc. irão influir, por exemplo, no processo de metilação do Hg. Além disso, existem diferentes abordagens de a c o r d o c o m o tipo de g a r i m p o .

A I N F O R M A Ç Ã O S O B R E AS P O P U L A Ç Õ E S E X P O S T A S

Existem vários tipos de populações que estão expostas às duas formas de mercúrio e, conseqüentemente, a caracterização da exposição e dos efeitos d e v e s e r f e i t a d e f o r m a d i f e r e n t e . E s t e s t i p o s s ã o : a p o p u l a ç ã o o c u p a c i o n a l m e n t e exposta ao mercúrio metálico — garimpeiros que q u e i m a m ouro, g a r i m p e i r o s próximos às áreas de q u e i m a e funcionários de lojas que c o m e r c i a l i z a m o ouro; a p o p u l a ç ã o geral exposta ao mercúrio m e t á l i c o — pessoas p r ó x i m a s aos locais de garimpo e às lojas que comercializam o ouro; a população geral ou ocupacional potencialmente exposta ao metil-mercúrio - c o n s u m i d o r e s de peixes.

De todos os g r u p o s populacionais citados, os garimpeiros m e r e c e m considerações adicionais. O seu intenso movimento migratório pela A m a z ô n i a legal dificulta sua inclusão nos programas de vigilância. G e r a l m e n t e são do sexo masculino, adolescentes ou adultos jovens, solteiros ou casados vivendo longe da família, oriundos da agricultura e naturais de outros estados. A s mulheres em garimpos, na maioria das vezes, são cozinheiras e / o u prostitutas.

A I N F O R M A Ç Ã O S O B R E A S C A R A C T E R Í S T I C A S D O A M B I E N T E

Interessam para o sistema de informação as características gerais do a m b i e n t e , a cinética do mercúrio, a existência de cadastros de p o n t o s de g a r i m p o s , os registros de importação do mercúrio e as denúncias de situações ambientais de alerta. O único cadastro de g a r i m p o s existente é o do DNPM e

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outras i n f o r m a ç õ e s p o d e m ser obtidas p o r intermédio das prefeituras dos municípios o n d e h á g a r i m p o s , sindicatos e associações comunitárias. Os d a d o s de i m p o r t a ç ã o d e mercúrio d e v e r i a m ser obtidos no Instituto Brasileiro d o M e i o A m b i e n t e e dos Recursos Naturais Renováveis (ΙΒAΜA). Todavia, h á indícios d e c o n t r a b a n d o deste m e t a l para d e n t r o d o País, o q u e diminui, consideravelmente, a confiabilidade dos dados existentes.

A INFORMAÇÃO SOBRE AS CARACTERÍSTICAS DOS EFEITOS

O mercúrio metálico penetra no organismo h u m a n o pela via respiratória e p o d e c a u s a r u m a i n t o x i c a ç ã o a g u d a , e m q u e p r e d o m i n a m o s e f e i t o s p u l m o n a r e s , e u m a i n t o x i c a ç ã o crônica, afetando s i s t e m a n e r v o s o e rins ( W H O , 1991). O metil-mercúrio penetra pela via digestiva e não apresenta o q u a d r o a g u d o descrito na forma metálica, atingindo d e forma insidiosa e crônica especialmente sistema nervoso e rins, podendo, ainda, causar lesões teratogênicas ( W H O , 1990).

A l é m das diferenças entre as formas d e apresentação, destaca-se entre os aspectos metodológicos associados c o m a definição d e ' c a s o ' e a avaliação dos efeitos d o m e r c ú r i o nas áreas de g a r i m p o s de ouro, a dificuldade d o profissional r e s p o n s á v e l pela vigilância e m lidar c o m a m u l t i p l i c i d a d e d e riscos e a possibilidade de interação de diversos tipos d e efeitos adversos â saúde. U m p r o g r a m a de vigilância precisa do apoio da p o p u l a ç ã o n a busca da i n f o r m a ç ã o e n o desenvolvimento das ações preventivas. S e n d o assim, é lógico supor que p r e o c u p a m a i s à população exposta os eventos agudos m a i s freqüentes tais c o m o a malária e a violência, entre outros, d o que a exposição crônica ao mercúrio, que produzirá efeitos tardiamente.

Os diversos agentes etiológicos d e acidentes e d o e n ç a s e m áreas de g a r i m p o s estão associados ao processo de trabalho, relações d e trabalho e condições d e vida.

A l é m da exposição a elevadas concentrações de mercúrio, o processo de p r o d u ç ã o de ouro nos g a r i m p o s apresenta riscos e efeitos q u e incluem m a l á r i a , l e i s h m a n i o s e , d o e n ç a s s e x u a l m e n t e t r a n s m i s s í v e i s , h a n s e n í a s e , g a s t r o e n t e r i t e s , v e r m i n o s e s , d e s c o n f o r t o t é r m i c o , v i o l ê n c i a , a l c o o l i s m o , d e p e n d ê n c i a d e drogas, efeitos traumáticos g r a v e s pela m a n i p u l a ç ã o de m o t o ¬

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serras, esforços físicos excessivos, exposição aos elementos da natureza, surdez, tétano, lombalgia, lesão por vibração excessiva, possibilidade da ocorrência de desabamentos e o câncer de pele associado ao trabalho a céu aberto.

Outros tipos de efeitos podem estar vinculados às relações de trabalho e às c o n d i ç õ e s de vida dos g a r i m p e i r o s . A s relações de trabalho g e r a m violência que tem origem nos conflitos entre os empresários dos g a r i m p o s e os g a r i m p e i r o s , índios, c o l o n o s , p r o p r i e t á r i o s e o u t r o s e m p r e s á r i o s . As condições de vida evidenciam renda insuficiente para os gastos, acarretando habitações em condições precárias, falta de saneamento básico, alimentação não balanceada e ausência completa de assistência médica. U m diagnóstico da saúde de 223 residentes realizado no g a r i m p o do Rato, Pará (Santos et al., 1 9 9 5 ) , d e m o n s t r o u c i s t e r n a s c o m até trezentos c o l i f o r m e s por 100 ml, coproscopia com 9 6 % dos indivíduos parasitados, hematimetria de 5 7 % de anêmicos, 6 5 % de relatos de morbidade nos últimos 15 dias, 9 4 % de relatos de malária pregressa ( 2 6 % com mais de 12 episódios) e 4 1 % destas pessoas apresentando sorologia para Lues positiva.

P o d e - s e i n c l u i r o m o n i t o r a m e n t o , t a m b é m , e n t r e as a t i v i d a d e s indispensáveis do programa de vigilância, tanto na busca da informação c o m o na a v a l i a ç ã o do próprio p r o g r a m a . O m o n i t o r a m e n t o oferece o feedback i n d i s p e n s á v e l para a v a l i a r o i m p a c t o das a ç õ e s p r e v e n t i v a s e p o d e ser classificado em:

• m o n i t o r a m e n t o das fontes de emissão — principalmente nos locais de queima do amálgama ouro-mercúrio;

• m o n i t o r a m e n t o do ambiente — para o mercúrio metálico as amostras de ar são p r i o r i t á r i a s . N o c a s o do m e t i l - m e r c ú r i o , u t i l i z a - s e a b i o t a , m a i s precisamente os peixes carnívoros;

• monitoramento de doses absorvidas — o monitoramento biológico da forma metálica, que é concentrada nos rins, é feito pela análise na urina (Clarkson et al., 1988). No caso do metil-mercúrio, as amostras de escolha são os cabelos. A forma metilada penetra nas células que formam o cabelo e, por ter carga, liga-se à sua estrutura interna. É importante assinalar que a parte proximal do cabelo representa exposição recente e a parte distai, de acordo com o seu comprimento, exposições pregressas;

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• m o n i t o r a m e n t o d o s efeitos c l í n i c o s — p a r a q u a l q u e r u m a das f o r m a s , o d i a g n ó s t i c o de u m a p e s s o a i n t o x i c a d a d eve ser r e a l i z a d o t e n d o c o m o p r i o r i d a d e a a v a l i a ç ã o clínica. U m a p e s s o a t o t a l m e n t e i n t o x i c a d a p o d e a p r e s e n t a r teores de m e r c ú r i o em s a n g u e , c a b e l o e urina n o r m a i s , d e s d e q u e as a m o s t r a s t e n h a m sido c o l e t a d a s em um p e r í o d o d i s t a n t e da fase de e x p o s i ç ã o . A falta d e u m s i s t e m a de i n f o r m a ç ã o , c o m os d a d o s d e s a ú d e indispensáveis para a implantação da atividade de monitoramento nos estados da A m a z ô n i a legal, faz com que seja necessário o desenvolvimento de estudos epidemiológicos. Os estudos de prevalência são os mais factíveis para serem realizados nas condições dos garimpos, porque podem ser feitos em períodos curtos de tempo, até apenas em um dia, uma vez que não é preciso esperar por um tempo suficiente para o surgimento de casos novos.

Q u a n d o o p r o g r a m a de v i g i l â n c i a n e c e s s i t a r i n f o r m a ç õ e s s o b r e associações entre riscos e efeitos, o estudo analítico de tipo seccional ou t r a n s v e r s a l , p o r ser um e s t u d o de curta d u r a ç ã o , é a l t a m e n t e i n d i c a d o . Apresenta c o m o principal característica o fato da comparação dos níveis de exposição e da freqüência dos efeitos entre os g r u p o s estudo e controle ser feita s i m u l t a n e a m e n t e .

As ATIVIDADES DE INTERVENÇÃO

As a t i v i d a d e s de i n t e r v e n ç ã o para p r e v e n i r e c o n t r o l a r os efeitos a d v e r s o s à s a ú d e c a u s a d o s p e l o s c o n t a m i n a n t e s a m b i e n t a i s p o d e m ser divididas em medidas gerais (como a melhoria das condições de vida das pessoas) e específicas.

Entre as medidas específicas, destacam-se o tratamento das pessoas intoxicadas; o afastamento dos expostos das fontes de emissão; a difusão de equipamentos de proteção coletiva e, caso seja possível, dos equipamentos de p r o t e ç ã o i n d i v i d u a l ; a f i s c a l i z a ç ã o e r e p r e s s ã o d o u s o d o H g ; o d e s e n v o l v i m e n t o de p r o g r a m a s educativos voltados para a c o m u n i d a d e ; a

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capacitação do pessoal do setor da saúde no diagnóstico e tratamento dos intoxicados; o c u m p r i m e n t o da legislação vigente; a elaboração de propostas de alteração da legislação etc. E m b o r a , c o m o dito anteriormente, a solução c o m p l e t a d e s s e p r o b l e m a a m b i e n t a l n ã o d e p e n d a d o s e t o r da s a ú d e , é necessário que as equipes dos p r o g r a m a s de vigilância d e s e n v o l v a m ações que, ao menos, levem à mitigação desses problemas.

O diagnóstico da intoxicação pode ser feito pela anamnese, notadamente pela história ocupacional, pelos dados clínicos e pelos e x a m e s laboratoriais que d e p e n d e m do tipo de composto mercurial responsável pelo quadro clínico. N ã o existe n e n h u m tratamento eficaz contra as intoxicações, p o d e n d o ser realizada a m e d i c a ç ã o para os sintomas e administradas drogas q u e l a n t e s , tais c o m o o B A L (British-anti-Lewisite), Edta-Ca e outras. O i m p o r t a n t e é a realização do diagnóstico precoce, para o imediato afastamento do trabalhador da f o n t e d e e x p o s i ç ã o , o d e s e n v o l v i m e n t o d e i n v e s t i g a ç õ e s c l í n i c a s e epidemiológicas e a aplicação de medidas de prevenção coletiva e individual (Câmara & Corey, 1992).

O s e q u i p a m e n t o s q u e d i m i n u e m a e m i s s ã o d e m e r c ú r i o p a r a a atmosfera, d e n o m i n a d o s 'retortas', q u e i m a m o a m á l g a m a ouro-mercúrio em circuito fechado, diminuindo a poluição por mercúrio na fase de q u e i m a do ouro (responsável por cerca de 7 0 % do mercúrio lançado no meio ambiente) e, logicamente, decrescendo t a m b é m o risco a que os trabalhadores estão submetidos e m relação à exposição atmosférica (Pfeiffer, 1993). Todavia, os g a r i m p e i r o s n ã o c o s t u m a m u t i l i z a r e s t e e q u i p a m e n t o e m v i r t u d e , notadam ent e, de fatores econômicos. Eles relatam que a retorta p o d e reter ouro e citam um a r g u m e n t o decisivo: o preço do mercúrio é muito baixo, não c o m p e n s a n d o o seu reaproveitamento (Câmara & Corey, 1992).

O papel do Estado em vista das questões relacionadas aos ambientes em áreas garimpeiras é definido pela Constituição brasileira em uma série de a r t i g o s s o b r e a p r o t e ç ã o d o m e i o a m b i e n t e e e m leis e s p e c í f i c a s p a r a importação, comercialização e uso do mercúrio, além de outras leis c o m o a d o S i s t e m a Ú n i c o d e S a ú d e ( S U S ) . O c u m p r i m e n t o d o s p r e c e i t o s c o n s t i t u c i o n a i s e da lei do S U S cabe às instituições, das quais p o d e m - s e incluir o Ministério da S a ú d e , o Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis, o Ministério do Trabalho, o Ministério da Previdência Social e o

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D e p a r t a m e n t o N a c i o n a l d e P r o d u ç ã o M i n e r a l . T a n t o o s p r e c e i t o s constitucionais c o m o as leis existentes não estão sendo cumpridos e a atuação das i n s t i t u i ç õ e s p ú b l i c a s t e m se c a r a c t e r i z a d o p o r p o u c o i n v e s t i m e n t o e ausência de continuidade dos p r o g r a m a s (Câmara & Corey, 1992). O pior é q u e p o u c a s secretarias estaduais e m u n i c i p a i s d e s e n v o l v e m a t i v i d a d e s de vigilância nos locais em que existem pontos de g a r i m p o s .

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