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Dissertação de Mestrado. Proteína C Reativa prediz mortalidade em pacientes com Infarto Agudo do Miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST

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Dissertação de Mestrado

Proteína C Reativa prediz mortalidade em pacientes com

Infarto Agudo do Miocárdio com supradesnivelamento do

segmento ST

Daniel Rios Pinto Ribeiro

(2)

INSTITTUTO DE CARDIOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL

FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA DE CARDIOLOGIA

Programa de Pós-Graduação em Medicina:

Área de Concentração: Cardiologia e

Ciências da Saúde

Dissertação de Mestrado

PROTEÍNA C REATIVA PREDIZ MORTALIDADE EM

PACIENTES COM INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO COM

SUPRADESNIVELAMENTO DO SEGMENTO ST

Autor: Daniel Rios Pinto Ribeiro

Orientador (a): Dra. Vera Lúcia Portal

Dissertação submetida como requisito para obtenção do grau de Mestre ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, Área de Concentração: Cardiologia, da Fundação Universitária de Cardiologia / Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul.

Porto Alegre

2011

(3)
(4)

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer aos meus pais, Fernanda e

Paulo, pela sólida base de valores e afeto que me proporcionaram, sem a

qual este objetivo não teria sido cumprido. À minha mãe, pela paciência e por

ser incansável. Ao meu pai, pelo exemplo de caráter e por ter me despertado

para a cardiologia.

Ao meu irmão Eduardo, pelo companheirismo de sempre.

A minha irmã Paula e meu cunhado Aníbal, pelo apoio incondicional e pelos

vários momentos felizes compartilhados.

À Patrícia, por tudo o que vivemos e pela ajuda em momentos decisivos.

Aos queridos amigos Leonardo e Lisiane, por todo o auxílio e presença

constante.

Às minhas colegas Agda Mezzomo e Silvia Garoffalo, pela amizade e

conhecimentos compartilhados.

Aos colegas Dr. Antonio Pureza Duarte e Dra. Berenice Knuth, pelo incentivo.

Ao Dr. Marco Beltrão, pelas inúmeras trocas de plantão.

A todos aqueles que, de uma forma ou de outra, foram muito importantes no

andamento deste trabalho: bolsistas Pedro Vieira e Odemir Junior; Dra.

Adriane Ramos; aos colegas Marcio Bosco, Delcio Rodrigues, Marciane

Rover, Jordana Schmalz, Aníbal Abelin e Felipe Fuchs; a todos os

funcionários do SAME. Agradeço, também, às intervenções pertinentes do

Dr. Hermes Aquino, bem como a todos os funcionários e professores do

PPG, em especial ao Sérgio Kato.

(5)

Ao Dr. Alexandre Schaan de Quadros, meu co-orientador, que de forma

objetiva e perspicaz, muito enriqueceu esta dissertação.

Por fim, gostaria de fazer um agradecimento especial à Dra. Vera Lúcia

Portal, minha orientadora. Muito obrigado pela paciência, pelos inúmeros

ensinamentos e por toda a confiança depositada. Saiba que sua amizade,

competência e simplicidade representam um verdadeiro referencial para

minha formação pessoal e profissional.

(6)

SUMÁRIO BASE TEÓRICA 1 1 INTRODUÇÃO 2 2 REFERENCIAL TEÓRICO 5 2.1 Epidemiologia 5 2.2 Fisiopatologia da Aterogênese 7

2.3 Evolução até a placa vulnerável: aspectos inflamatórios 11 2.4 Mecanismos de ruptura da placa vulnerável 14 2.5 Síndromes Coronarianas Agudas: definições 17 2.6 Manejo do Infarto Agudo do Miocárdio com supradesnivelamento

do segmento ST 19

2.7 Estratificação de risco 23

2.8 Marcadores inflamatórios e doença arterial coronariana 27 2.9 Proteína C reativa e doença cardiovascular: prevenção primária 29 2.10 O papel da proteína C reativa na doença arterial coronariana

estabelecida 31

2.11 Proteína C reativa e infarto agudo do miocárdio com

supradesnivelamento do segmento ST 32

3 OBJETIVOS 39

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 40

ARTIGO 61

PROTEÍNA C REATIVA PREDIZ MORTALIDADE EM PACIENTES COM INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO COM SUPRADESNIVELAMENTO

DO SEGMENTO ST 62 RESUMO 63 ABSTRACT 64 INTRODUÇÃO 65 POPULAÇÃO E MÉTODOS 66 ANÁLISE ESTATÍSTICA 68 RESULTADOS 68 DISCUSSÃO 70 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 75 TABELAS 81 FIGURAS 86 ANEXOS 87 1 PROTOCOLO DE PESQUISA 88

(7)

LISTA DE ABREVIATURAS

DAC

Doença Arterial Coronariana

EUA

Estados Unidos da América

IAM

Infarto Agudo do Miocárdio

IAM c/SSST

Infarto Agudo do Miocárdio com

supradesnivelamento do segmento ST

ICP

Intervenção Coronariana Percutânea

p

Primária

In TIME II

Intravenous nPA for Treatment of Infarcting

Myocardium Early II

TIMI

Thrombolysis in Myocardial Infarction

ROC

Receiver Operating Curve

c

Estatística C

GRACE

Global Registry of Acute Coronary Events

PCR

Proteína C Reativa

LDL

Lipoproteína de baixa densidade

DALY

Disability-adjusted life year

SCA

Síndromes Coronarianas Agudas

AHA

American Heart Association

ACS

Acute Coronary Syndromes

TF

Fator tecidual

PAI-1

Inibidor do ativador de plasminogênio 1

(8)

VCAM-1

Moléculas de adesão de células vasculares do tipo

1

DNA

Ácido Desoxirribonucleico

CD4

Grupamento de diferenciação 4

CD8

Grupamento de diferenciação 8

Th1

T helper tipo 1

Th2

T helper tipo 2

TNF-

Fator de necrose tumoral alfa

MMP

Metaloproteinases da matriz

AI

Angina Instável

IAM s/SSST

Infarto Agudo do Miocárdio sem

supradesnivelamento do segmento ST

AVC

Acidente Vascular Cerebral

CK-MB

Creatininofosfoquinase fração MB

ECG

Eletrocardiograma

GUSTO

Global Utilization of Streptokinase and Tissue

Plasminogen Activactor for Occluded Coronary

Arteries

tPA

Ativador do plasminogênio tecidual

CRM

Cirurgia de Revascularização do Miocárdio

PCRus

Proteína C Reativa ultrassensível

AFCAPS/TexCAPS

Air Force/Texas Coronary Atherosclerosis

Prevention Study

HDL

Lipoproteína de alta densidade

(9)

HR

Hazard ratio

RR

Risco relativo

OR

Odds ratio

ENTIRE

Enoxaparin and TNK-tPA with or without GP IIb/IIIa

Inhibitor as Reperfusion strategy

MACE

Major Adverse Cardiovascular Events

T

Tempo

AINES

Anti-inflamatórios não esteroidais

BNP

Peptídeo natriurético cerebral

ECVM

Eventos cardiovasculares maiores

AMI

Acute Myocardial Infarction

pPCI

Primary Percutaneous Coronary Intervention

hsCRP

High-sensitivity C reactive protein

HIV

Vírus da imunodeficiência humana

CT

Colesterol total

TG

Triglicerídeos

CPK

Creatininofosfoquinase total

TSH

Hormônio tireoestimulante

T4 livre

Tetraiodotironina livre

(10)

BASE TEÓRICA

______________________________________________________________

(11)

1 INTRODUÇÃO

Apesar dos inúmeros avanços terapêuticos obtidos na última década e do declínio nas taxas de incidência, a Doença Arterial Coronariana (DAC) permanece sendo a principal causa de morbidade e mortalidade nos Estados Unidos e em outros países ocidentais1. Nos EUA, em 2007, a mortalidade por DAC foi de 406.351 casos, sendo a causa de 1 a cada 6 óbitos ocorridos no mesmo ano2.No referido país, o infarto agudo do miocárdio (IAM), perfazendo cerca de 30% das síndromes isquêmicas agudas, tem uma incidência estimada em 610.000 eventos novos e 325.000 eventos recorrentes por ano2. No Brasil, estima-se que ocorram de 300 a 400 mil casos anuais, dos quais cerca de 60.000 acabam evoluindo de forma letal3.

Em 2007, segundo dados do Ministério da Saúde, houve 48,9 óbitos/100.000 habitantes devido a doenças isquêmicas do coração. No Rio Grande do Sul, este número se elevou para 71,8 óbitos/ 100.000 habitantes4.

Dentro do espectro das síndromes isquêmicas agudas, o IAM representa a via final do processo fisiopatológico, constituindo-se de graus variáveis de necrose miocárdica secundária à cessação do aporte sanguíneo local. Quando o fluxo coronariano é interrompido de forma total, ocorre elevação do segmento ST no eletrocardiograma, configurando o quadro de infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAM c/ SSST)5.

Sendo a oclusão coronariana por trombo o principal mecanismo fisiopatológico do IAM c/ SSST, a terapia de reperfusão torna-se mandatória, na medida em que limita a necrose miocárdica e reduz a mortalidade nesse grupo de pacientes6,7. Assim, a intervenção coronariana percutânea (ICP) primária (p), bastante difundida em nosso meio, constitui-se na melhor opção para reperfusão, se iniciada até 90 minutos após o diagnóstico do IAM8.O implante adjunto de stents,

(12)

sempre que tecnicamente viável, foi consagrado no referido cenário, pois reduz significativamente a necessidade de uma nova revascularização do vaso-alvo9.

No que se refere à abordagem dos pacientes com síndromes isquêmicas agudas, a efetiva estratificação de risco é parte integrante e fundamental do manejo10. Tal prática tem impacto direto no processo decisório médico, seja em curto ou longo prazo. Mesmo no cenário do IAM c/ SSST, no qual as opções terapêuticas iniciais já estão bem definidas, a estratificação de risco precoce tem sua utilidade. Com este intuito, a partir do estudo In TIME II, foi elaborado o escore de risco TIMI, sendo um preditor de mortalidade geral até o trigésimo dia da ocorrência de um IAM c/ SSST. Analisado pela área sob a curva ROC, o método demonstrou forte capacidade prognóstica (c=0,78), mantendo-se estável até o momento da alta11. Entretanto, algumas limitações foram verificadas. Na concepção do escore, foram excluídos pacientes em choque cardiogênico ou com contra-indicação ao uso de trombolíticos. Além disso, importantes fatores prognósticos como função ventricular esquerda, resolução do segmento ST e biomarcadores cardíacos, entre outros, não são incorporados na análise. O registro GRACE, a partir do qual foram desenvolvidos escores um pouco mais recentes e com amostras mais representativas da prática clínica, também peca pela ausência dos biomarcadores12.

Com relação à fisiopatologia da DAC, um modelo de inflamação dinâmica suplantou o conceito antigo da aterosclerose como uma simples deposição de debris na parede arterial13. De tal forma, a lesão tem início através da expressão de moléculas de adesão na superfície das células endoteliais e do recrutamento e migração direta de células inflamatórias da corrente circulatória para o interior da parede arterial. Numerosos mediadores contribuem para a aterogênese, incluindo quimiocinas, citocinas, fatores de crescimento, proteases, moléculas de adesão, reguladores da hemostasia e receptores. A interação desses elementos irá regular a progressão e instabilidade da placa aterosclerótica14. Acredita-se que a inflamação

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possa contribuir em diferentes estágios da patogênese da DAC, incluindo o processo evolutivo aterosclerótico, o evento aterotrombótico agudo e o dano miocárdico que se segue à isquemia15-19.

Durante as últimas décadas, muitos marcadores de DAC têm sido descritos como ferramentas auxiliares na predição de risco futuro de eventos cardiovasculares1. Dentre os marcadores inflamatórios, a proteína C reativa (PCR), uma proteína plasmática circulante não glicosilada, é o mais extensivamente estudado20.Sabe-se que a mesma se liga à lipoproteína de baixa densidade (LDL), já tendo sido detectada em placas ateroscleróticas21. Devido a estas observações, alguns autores advogam a possibilidade de a PCR ter papel causal direto na DAC, tópico este que permanece controverso22-24. Por outro lado, admitindo-se a PCR apenas como um sinalizador, há evidências de que uma resposta inflamatória exagerada desencadeada pela lesão miocárdica no IAM poderia resultar em mais dano tecidual, favorecendo a ocorrência de eventos25.

Em termos de prognóstico, alguns estudos mostraram que a PCR prediz maior risco de eventos após o IAM c/ SSST. Outros, no entanto, são contrários a esta associação. Afora a controvérsia dos achados, algumas das evidências disponíveis apresentam falhas metodológicas importantes, além de serem mais escassas nos pacientes submetidos à intervenção coronariana primária.

Portanto, pretendemos testar o valor prognóstico de marcadores inflamatórios, aqui representados pela proteína C reativa, no IAM c/ SSST tratado percutaneamente e com implante de stent.

(14)

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 - Epidemiologia

As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no mundo. Tais doenças causaram quase 32% das mortes em mulheres e 27% entre os homens em 200426. Em 2008, a DAC ocupou o primeiro lugar entre as causas de óbito dentre todas as faixas etárias em nível global, sendo responsável por 7,25 milhões de casos (12,8%), à frente, inclusive, dos 6,15 milhões de óbitos decorrentes da doença cerebrovascular27. Embora as taxas de mortalidade por DAC tenham declinado nas últimas quatro décadas nos EUA e nos demais países, a doença mantém-se responsável por cerca de um terço de todas as mortes em pacientes acima dos 35 anos de idade28,29. Ainda na esfera mundial, se avaliada quanto ao impacto na sociedade, usando-se medida equivalente à perda de um ano de vida saudável e útil (DALY), a DAC ocasionou 62,6 milhões de anos perdidos, perdendo apenas para as infecções respiratórias baixas, diarréia e transtornos depressivos unipolares26.

Se a mortalidade por doenças cardíacas tem declinado nos EUA e em regiões onde economias e sistemas de saúde são relativamente avançados, esta observação é, com frequência, diferente em outros locais do mundo30. Os incrementos mais dramáticos em eventos isquêmicos coronarianos são previstos para o Oriente Médio e América Latina. Na última, declínios nas taxas de doenças vasculares têm sido menos favoráveis do que nos Estados Unidos; tendências adversas quanto à prática de atividade física, obesidade e tabagismo contribuem para essas diferenças31.

Nos Estados Unidos da América, de 2005 a 2008, foi quantificada prevalência de 16.300.000 portadores de DAC acima dos 20 anos de idade. Já em 2007, foram atribuídas 406.351 mortes à doença arterial coronariana, sendo esta a

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causa de 1 a cada 6 óbitos ocorridos no referido ano. Em 2011, foi estimado que 785.000 norte americanos terão um primeiro evento coronariano, enquanto 470.000 indivíduos apresentarão eventos recorrentes. Aproximadamente a cada 25 segundos, um americano terá uma síndrome isquêmica aguda e, a cada minuto, alguém falecerá devido a esta causa2.

As síndromes coronarianas agudas, compostas por suas diversas manifestações clínicas, apresentam altas taxas de ocorrência. Dados do National Heart, Lung, and Blood Institute e do National Hospital Discharge Survey, em 2007, demonstraram 1.172.000 altas hospitalares por SCA, das quais 7301.000 foram por IAM e 431.000 por angina instável2. Nos EUA, a angina instável é a causa cardiovascular mais comum de internação hospitalar, sendo também a responsável pela maioria das internações em unidades coronarianas32.

A percentagem de casos de IAM c/SSST entre as SCA difere um pouco ao analisarem-se os vários registros: 29% de acordo com o National Registry of Myocardial Infarction 4; 32% segundo o AHA Get With the Guidelines Project; 38% conforme dados do estudo GRACE e, cerca de 47% referentes ao Euro Heart Survey on ACS II2. Nos Estados Unidos, mais de 1 milhão de pessoas, a cada ano, desenvolvem um infarto agudo do miocárdio. Estima-se que um número adicional de cerca de 300.000 indivíduos morram desta causa em ambiente pré-hospitalar5.

No Brasil, as doenças cardiovasculares têm sido a principal causa de morte. Em 2007, ocorreram 308.466 óbitos por doenças do aparelho circulatório, sendo 31,4% secundários ao acidente vascular encefálico e 30% decorrentes de doença arterial coronariana33. No mesmo ano, segundo dados do Ministério da Saúde, houve 48,9 óbitos/100.000 habitantes devido a doenças isquêmicas do coração. Em âmbito nacional, registros apontam para a ocorrência de 300 a 400 mil casos anuais

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de infarto agudo do miocárdio, dos quais cerca de 60.000 acabam evoluindo de forma letal3.

As doenças cardiovasculares são ainda responsáveis por grande número de internações, acarretando elevados custos médicos e socioeconômicos34,35. Esse número, em 2007, totalizou um montante de 1.157.509 admissões pelo sistema único de saúde. Com relação ao ônus, em novembro de 2009, houve 91.970 internações por doenças cardiovasculares, resultando em um custo de R$ 165.461.644,33 (DATASUS)36.

De 1990 a 2006, observou-se uma tendência lenta e constante de redução das taxas de mortalidade cardiovascular, particularmente nas regiões sudeste e sul. Mesmo com este declínio, as referidas regiões ocupam, respectivamente, os patamares mais altos em números absolutos, se comparadas ao restante da nação brasileira36.

No Rio Grande do Sul, segundo indicadores sociais do ano de 2007, as doenças do aparelho circulatório estão em primeiro lugar como causa de mortalidade, com 32,16% dos casos37. Se avaliados os grupos específicos, em 2006, as doenças cerebrovasculares ocupavam a liderança com percentual de 10,65%. Seguiam-nas as doenças isquêmicas do coração e o infarto agudo do miocárdio, que somados eram responsáveis por 17,76% do total dos óbitos38.

Em 2007, também no Rio Grande do Sul, ocorreram 71,8 mortes/ 100.000 habitantes secundárias a coronariopatias, índice superior ao nacional no mesmo período4.

2.2 - Fisiopatologia da Aterogênese

Havia, até o início do século XX, duas fortes correntes em torno da etiologia da aterosclerose. Rokitansky atribuía a doença aterosclerótica à trombose e à

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organização de trombos aderentes à parede vascular. Virchow, por sua vez, defendia que a aterosclerose decorria da degeneração da íntima39. Outros autores provaram que o conteúdo lipídico da dieta era o fator determinante da doença em coelhos39. Entretanto, não havia, até meados do século passado, unanimidade sobre a fisiopatologia da doença.

Após o início do novo milênio, vêm-se constatando que a inflamação é fator presente em todas as fases do desenvolvimento de uma lesão aterosclerótica40. A aterosclerose, do ponto de vista contemporâneo, é fruto da coexistência de elementos das teorias anteriores, sendo estes unidos por um elo: a inflamação. Dessa forma, o envolvimento da última na aterogênese é, atualmente, consensual40.

No que diz respeito à origem da aterosclerose, tem sido proposto que a disfunção endotelial tem papel de causalidade fundamental41. O endotélio, outrora considerado como barreira inerte, é hoje, sabidamente, uma superfície de propriedades biológicas únicas, tendo importante atuação como órgão endócrino42. Diversas entidades patológicas podem perturbar a função endotelial, com destaque para dislipidemia, diabetes, tabagismo e hipertensão arterial sistêmica. Através de mecanismos comuns, como o estresse oxidativo, os chamados fatores de risco acabam por promover um endotélio disfuncional, caracterizado por alteração de suas propriedades hemostáticas normais. Ao invés de caracterizar-se por ser uma superfície predominantemente antiadesiva, antiproliferativa e anticoagulante, o endotélio passa a apresentar monopólio de forças contrárias, tornando-se propício para o recrutamento de células inflamatórias circulantes e para a formação de trombos. Faz parte do cenário da disfunção endotelial uma significativa redução de vasodilatadores, principalmente o óxido nítrico, acompanhada de elevação de vasoconstritores43.

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O óxido nítrico é o mais importante fator relaxante derivado do endotélio. Difundindo-se da íntima até as fibras musculares lisas, é capaz de promover relaxamento. Propagando-se em direção ao lúmen do vaso, inibe tanto a adesão quanto a agregação plaquetárias44. Em nível transcricional, tem capacidade de inibir a expressão de P-selectina e da molécula de adesão celular vascular nas células endoteliais e da proteína quimiotática de monócitos, importante na migração de leucócitos para a íntima do vaso44. Por outro lado, também é sintetizada pelo endotélio a endotelina-1, o mais poderoso vasoconstritor já identificado, sendo formada após estimulação por hipóxia, estresse de cisalhamento (shear stress) e isquemia45. Em um contexto de disfunção endotelial, como na aterosclerose, no qual as concentrações de óxido nítrico estão reduzidas, as ações da endotelina-1, sem o antagonismo fisiológico, culminam com vasoconstrição e proliferação das células musculares lisas46.

No que tange à coagulação, a transformação do endotélio em superfície pró-trombótica, em um cenário disfuncional, está associada à expressão de diversos fatores, reprimidos no contexto de equilíbrio homeostático. Dentre estes, o fator tecidual (TF) tem papel crucial, acelerando a ativação dos fatores X e IX através do fator VII, sendo rapidamente expresso após lesão vascular. O TF tem sido largamente encontrado nas células endoteliais de placas ateroscleróticas47,48. Outro elemento importante envolvido na cadeia disfuncional, com ação anti-fibrinolítica, é o chamado inibidor do ativador de plasminogênio 1 (PAI-1). Este agente, após exposição a estímulos inflamatórios, é sintetizado por células endoteliais em quase todo o leito vascular49.

Alguns fatores de risco merecem destaque na fisiopatologia do processo aterogênico. A hipercolesterolemia, representada principalmente pelo colesterol contido na lipoproteína de baixa densidade (LDL) elevado, fornece matéria-prima fundamental na formação da placa aterosclerótica. Uma vez oxidadas, as partículas

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de LDL são incorporadas por macrófagos na íntima arterial por receptores denominados scavengers, formando, então, as células espumosas (macrófagos repletos de partículas lipídicas)50.

O diabetes melittus, sabidamente, é fator de risco importante e independente para doença arterial coronariana. A via de maior impacto na aterosclerose acelerada do diabetes parece ser a formação e deposição irreversíveis de produtos finais de glicolisação avançada. Tais elementos promovem oxidação da LDL (contribuindo para a formação de células espumosas) e alteram o colágeno da íntima vascular. Quando ligados aos seus receptores de superfície, podem, ainda, mediar a liberação de citocinas inflamatórias e fatores de crescimento e promover a migração de monócitos e a proliferação de fibras musculares lisas51,52.

A hipertensão arterial sistêmica (HAS), por sua vez, é entidade altamente prevalente, sendo um fator de risco bastante relevante para a aterosclerose. Diferentes estudos clínicos apontaram nítida relação entre a terapêutica anti-hipertensiva efetiva e a redução de eventos coronarianos e acidentes vasculares encefálicos53. A HAS apresenta-se frequentemente associada a concentrações aumentadas de angiotensina II. Esta substância não só induz vasoconstrição, produção de aldosterona e hipertrofia cardíaca, como também leva à expressão de moléculas pró-inflamatórias na parede vascular, à formação de radicais livres de oxigênio e à hipertrofia e proliferação de células musculares lisas54.

Importante fator de risco na doença aterosclerótica, particularmente a não coronariana, o tabagismo prejudica diretamente a função endotelial. Ademais, é capaz de induzir inflamação e, nesse contexto, promover a liberação de proteases pelos macrófagos55.

(20)

O quanto cada fator de risco, isoladamente ou de forma combinada, contribui para a aterogênese, é algo bastante variável de indivíduo para indivíduo, reforçando a importância de outros aspectos como idade, gênero e predisposição genética.

O processo de evolução da placa aterosclerótica, de uma parede normal até a placa vulnerável, será descrito a seguir.

2.3 - Evolução até a placa vulnerável: aspectos inflamatórios

Estudos em animais e humanos mostraram que a hipercolesterolemia causa ativação focal do endotélio em artérias de médio e grande calibre. A infiltração e retenção de partículas de LDL na camada íntima, particularmente em sítios de deformidade hemodinâmica, iniciam uma resposta inflamatória na parede arterial56,57. A partícula de LDL retida sofre modificações oxidativas e enzimáticas, levando à liberação de fosfolipídios inflamatórios, os quais induzem as células endoteliais a expressarem moléculas de adesão leucocitária57,58.

Na medida em que moléculas de adesão de células vasculares do tipo I (VCAM-1) estão tipicamente supra-reguladas em resposta à hipercolesterolemia, monócitos e linfócitos carregando contra-receptores para VCAM-1 preferencialmente aderem a estes locais59. Uma vez estabelecida esta conexão, quimiocinas produzidas na camada íntima estimulam as referidas linhagens celulares a migrarem através das junções interendoteliais em direção ao espaço subendotelial60.

O fator estimulador da colônia de macrófagos, produzido ao nível da parede íntima e com resposta inflamatória no vaso, induz monócitos a adentrarem na placa e se diferenciarem em macrófagos. Este passo é crítico para o desenvolvimento da aterosclerose e está associado com a supra-regulação de receptores padrão ligados à imunidade inata, incluindo aqueles do tipo “catadores” e os do tipo ferramenta61,62,63.

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Os receptores do tipo “catadores ou lixeiros” internalizam um amplo espectro de moléculas e partículas, estruturas estas com padrão patogênico62. Endotoxinas bacterianas, fragmentos celulares apoptóticos e partículas de LDL oxidadas são todos capturados e destruídos através dessa via. Se o colesterol derivado da captação da LDL oxidada não puder ser mobilizado da célula em extensão suficiente, o mesmo se acumula na forma de gotículas citosólicas. Finalmente, o macrófago é transformado em uma célula espumosa, que é considerado o elemento protótipo da aterosclerose60.

Receptores tipo ferramenta também se ligam a moléculas com características patogênicas, mas ao contrário dos “lixeiros”, eles podem iniciar um sinal em cascata que leva à ativação celular63. Os macrófagos ativados produzem citocinas inflamatórias, proteases e moléculas citotóxicas de radicais de oxigênio e nitrogênio. Efeitos similares são observados nas células dendríticas, mastócitos e células endoteliais, as quais também apresentam esse tipo de receptor. Toxinas bacterianas, proteínas de estresse e fragmentos de DNA são todos reconhecidos pelos vários receptores tipo ferramenta. Estes receptores podem, ainda, ser ativados pela heat-shock protein 60 humana e pela LDL oxidada64,65. As células presentes nas lesões ateroscleróticas humanas mostram um espectro de receptores tipo ferramenta. A inflamação da placa pode, em parte, depender dessa via.66.

Infiltrados de células T estão sempre presentes em lesões ateroscleróticas. Predominam as do tipo CD4, as quais reconhecem antígenos protéicos a elas apresentados na forma de fragmentos ligados a moléculas do complexo principal de histocompatibilidade classe II. Células T CD4 reativas à LDL oxidada, heat-shock protein 60 e proteínas da clamídia foram clonadas de lesões humanas64,67,68. Outra subpopulação menor de linfócitos T, do grupo natural killer, é prevalente em lesões precoces. Também estão presentes linhagens CD8. Os 2 últimos tipos celulares

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foram associados à aceleração do processo aterosclerótico em cobaias; a ativação de linfócitos T CD8 pode causar a morte de células arteriais69,70,71.

Quando o receptor do linfócito T se liga a um antígeno, duas espécies de respostas podem ser observadas72. A resposta T helper tipo 1 (Th1) ativa macrófagos, inicia uma reação inflamatória similar à hipersensibilidade retardada e, caracteristicamente, age na defesa contra patógenos intracelulares. A T helper tipo 2 (Th2) provoca uma inflamação alérgica72.

No contexto da placa aterosclerótica, há citocinas que promovem a resposta Th173,74. Antígenos apresentados pelos macrófagos e células dendríticas desencadeiam a ativação de linfócitos T específicos na parede arterial, os quais se diferenciam em efetores Th1 e começam a produzir interferon- . Esta citocina aprimora a eficiência da apresentação dos antígenos e aumenta a síntese de fator de necrose tumoral (TNF-α) e interleucina -172

. De forma sinérgica, tais substâncias instigam a produção de muitas moléculas inflamatórias e citotóxicas nos macrófagos e células vasculares69. A combinação dessas ações tende a promover aterosclerose. Por sua vez, os mediadores químicos da via Th2 podem desencadear tanto reações imunes anti-ateroscleróticas quanto contribuir para a formação de aneurismas, por meio da indução de enzimas elastolíticas75,76.

A liberação de citocinas por parte das células imunes ativadas na placa aterosclerótica induz a produção de quantidades substanciais de interleucina 6. Tais citocinas são também produzidas em vários tecidos em resposta a quadros infecciosos e no tecido adiposo de pacientes portadores de síndrome metabólica. A interleucina-6 e a interleucina-1 estão associadas à propagação do estímulo inflamatório e à ação pró-coagulante, aumentando as concentrações plasmáticas de fibrinogênio, PAI-1, TNF-α, moléculas de adesão vascular e proteína C reativa77

. A PCR também induz monócitos a expressarem fator tecidual, o qual desempenha

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papel fundamental na trombose vascular78. Portanto, a ativação de um número limitado de células imunes pode iniciar uma cascata inflamatória potente, seja na lesão original ou de forma sistêmica60.

Na contramão dessa cascata aterogênica, substâncias como a interleucina-10 e o fator transformador do crescimento-β possuem efeito protetor, havendo evidências de aceleração do processo aterosclerótico com a remoção das mesmas79-82. Também anticorpos secretados por linfócitos B contribuem com a atividade anti-aterosclerótica83.

Um balanço entre atividade inflamatória e anti-inflamatória controla a progressão da aterosclerose. Fatores metabólicos podem afetar esse processo de algumas maneiras. Obviamente, tais fatores contribuem para a deposição lipídica no vaso, iniciando novas ondas de recrutamento de células imunes. Adicionalmente, o tecido adiposo de pacientes portadores de síndrome metabólica e obesidade produz citocinas inflamatórias, particularmente fator de necrose tumoral e interleucina-684,85

2.4 - Mecanismos de ruptura da placa vulnerável

Macrófagos ativados, linfócitos T e mastócitos, localizados nos sítios de ruptura da placa, produzem alguns tipos de moléculas (citocinas inflamatórias, proteases, fatores de coagulação, radicais livres e moléculas vasoativas) que podem desestabilizar as lesões86-88. Elas inibem a formação de uma capa fibrosa espessa, atacam o colágeno formador da capa e iniciam a formação do trombo. Todas essas reações podem induzir a ativação e ruptura da placa, trombose e isquemia.

Dois tipos de proteases foram implicados como pontos chave na ativação da placa aterosclerótica: metaloproteinases da matriz (MMP) e proteases da cisteína. Citocinas inflamatórias induzem a expressão de genes de MMP, enquanto a plasmina ativa pró-formas destas enzimas; por outro lado, uma proteína inibidora

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suprime sua ação. Similarmente, as proteases da cisteína são estimuladas por certas citocinas e bloqueadas por inibidores chamados “cistatinas”89

.

A presença, na placa aterosclerótica, de um núcleo rico em lipídios coberto por uma fina capa fibrosa é pré-requisito para ruptura90. Em artérias coronárias humanas, evidenciou-se que os núcleos ricos em lipídeos das placas rotas são maiores se comparados às placas íntegras, cobrindo cerca de 29-34% da área total da placa91-93. O papel do referido núcleo no processo de ruptura da lesão aterosclerótica se dá na medida em que, ao expandir-se, ele provoca erosão da capa fibrosa adjacente. Tal núcleo, por não possuir fibras colágenas em sua arquitetura, confere tensão aumentada à capa que o circunda.

Alguns autores sugeriram que a formação do núcleo lipídico começa com pequenos extratos de lipídios acumulados na parte basal da íntima, os quais coalescem para constituir um conjunto maior. Este, por sua vez, se torna acelular devido à apoptose e necrose de células espumosas e musculares lisas91,94-96. Além das lipoproteínas provenientes das células necróticas, o crescimento do compartimento nuclear ocorre devido à hemorragia de “neovasos” no interior da placa, às custas de membranas de eritrócitos com altas concentrações de colesterol97. Desta forma, fica facilitada a deposição de cristais de colesterol, os quais estão associados com a ruptura da placa aterosclerótica91.

A capa fibrosa, em sua composição, consiste de células musculares lisas, colágeno e proteoglicanos91,94-96. Também contém células inflamatórias, principalmente do tipo “espumosas”. A ruptura só ocorre quando a estrutura é extremamente fina. O afinamento da capa fibrosa é resultado de uma degradação aumentada da matriz promovida pelos macrófagos infiltrantes, bem como de uma síntese reduzida da mesma matriz decorrente do decréscimo de fibras musculares lisas. Placas rotas têm densidade de macrófagos superior e densidade de células

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musculares lisas inferior à das intactas98. A linhagem de organismos celulares musculares, por outro lado, é responsável pela produção da matriz que estabiliza a placa, antagonizando a ruptura99. A diminuição das fibras musculares lisas parece acontecer por mecanismos apoptóticos100,101.

A placa vulnerável é caracterizada por neovascularização oriunda da vasa vasorum da adventícia, sendo o processo de duas a quatro vezes mais frequente neste tipo de lesão do que nas estáveis. A extensão da neovascularização se correlaciona positivamente com o tamanho da placa, conteúdo lipídico e grau de inflamação102-106.

Após a ruptura da placa, a resposta imediata consiste de agregação plaquetária. Caso haja persistência do processo, o trombo rico em plaquetas é estabilizado pela fibrina90.

O núcleo necrótico rico em lipídeos exposto à circulação após a ruptura da placa aterosclerótica tem características bastante trombogênicas, provavelmente devido às micropartículas apoptóticas nele contidas, as quais expressam fator tecidual. Quanto maior a ruptura, maior a trombogenicidade90.

Sistemicamente, o estado de ativação das plaquetas, coagulação e fibrinólise são críticos para a resposta trombótica face à solução de continuidade da lesão ateromatosa. Tal interação é ratificada pelo efeito protetor de agentes antiplaquetários e anticoagulantes em pacientes sob risco de trombose coronariana.

Como foi visto até o momento, a aterosclerose é considerada uma doença inflamatória sistêmica na qual o grau de inflamação junto à placa determina seu risco de ruptura. Capas fibrosas rotas, mas não a lesão como um todo, estão sempre intensamente inflamadas91. Portanto, do ponto de vista inflamatório, o rompimento da placa aterosclerótica representa um processo localizado dentro de uma doença generalizada.

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2.5 - Síndromes Coronarianas Agudas: Definições

O termo síndrome coronariana aguda (SCA) tem sido cada vez mais utilizado para descrever um continuum de estados isquêmicos que engloba a angina instável (AI), o infarto do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST (IAM s/ SSST) e o infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAM c/ SSST). Tal espectro de síndromes clínicas é usualmente causado pela doença aterosclerótica das artérias coronárias, geralmente com trombose coronariana superposta. A ruptura de uma placa aterosclerótica é a causa mais frequente de trombose arterial, sendo responsável por cerca de 75% dos trombos coronarianos que levam ao IAM ou morte e por cerca de 90% das placas carotídeas trombosadas que causam o AVC isquêmico90.

A AI é um quadro clínico intermediário entre angina crônica estável e IAM. Estudos angiográficos e angioscópicos mostram que AI e IAM s/ SSST resultam da ruptura de uma placa aterosclerótica seguida de trombose, que leva à redução do fluxo sanguíneo coronário e isquemia miocárdica107. A angina instável e o infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST têm apresentações clínicas semelhantes, às vezes indistinguíveis e diferenciam-se pela intensidade da isquemia que produzem. No caso do IAM s/ SSST, esta é importante e compromete a integridade do cardiomiócito, levando à liberação de marcadores de necrose miocárdica, como a CK-MB, troponina I e troponina T107. Em linhas gerais, o IAM sem supradesnivelamento do segmento ST ocorre pela oclusão parcial ao fluxo coronariano.

Por outro lado, um vaso completamente ocluído por um trombo caracteristicamente evolui para uma maior zona de necrose envolvendo a totalidade ou quase totalidade da parede ventricular suprida pelo ramo coronariano afetado.

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Esse processo tipicamente produz elevação do segmento ST no ECG, caracterizando o IAM c/ SSST108.

As placas ateroscleróticas são espessamentos focais da camada íntima da parede arterial, compostos de células, elementos do tecido conjuntivo, lipídeos e debris. Células sanguíneas imunes e inflamatórias, como já foi visto, constituem parte importante do ateroma, sendo as demais do tipo endoteliais e musculares lisas60. A placa de ateroma é precedida por uma camada gordurosa, formada por um acúmulo de células repletas de lipídios abaixo do endotélio. A maior parte destas se constitui em macrófagos, junto com algumas células T60. Tais camadas gordurosas são prevalentes em indivíduos jovens, podendo progredir para lesões ateroscleróticas ou eventualmente desaparecer.

Lesões de caráter mais estenótico, com crescimento em direção ao lúmen, pequenos núcleos ricos em lipídeos e capas fibrosas espessas, tipicamente ocorrem em pacientes com angina de esforço, sendo identificadas por testes de estresse positivos. Placas muito estenóticas como as já mencionadas, desencadeando sintomas, respondem positivamente à terapia local e métodos de revascularização. Por outro lado, é frequente as lesões assintomáticas e de grau de estenose discreto serem aquelas potencialmente fatais109.

O infarto agudo do miocárdio ocorre quando o processo ateromatoso interrompe o fluxo sanguíneo através do vaso coronariano. Acreditava-se que um estreitamento progressivo do lúmen, decorrente do crescimento das células musculares lisas na placa, era a principal causa de IAM. No entanto, estudos angiográficos identificaram lesões culpadas que não cursavam com estenose marcada, sendo agora evidente que a ativação da placa, ao invés da estenose, é que precipita isquemia e infarto. Falk e cols evidenciaram que a maioria dos casos de IAM advêm de lesões com estenose inferior a 50%. Somente 16% dos infartos

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ocorrem com obstruções acima de 70%110. Além disso, um estudo de Kolodgie mostrou que 76% das mortes súbitas foram atribuídas à ruptura da placa e que somente 24% dos infartos agudos do miocárdio foram associados com estreitamento luminal coronariano severo92. Embora o mecanismo de espasmo coronariano possa estar envolvido, a maioria dos casos de IAM se deve à formação de um trombo oclusivo junto à superfície de uma placa60.

Há duas causas principais de trombose coronariana: a ruptura da placa e a erosão endotelial. A primeira, detectada em 60 a 70% dos casos, é perigosa porque expõe material pró-trombótico do núcleo (fosfolipídeos, fator tissular e moléculas da matriz aderentes às plaquetas) à corrente circulatória. As rupturas ocorrem, preferencialmente, onde a capa fibrosa é fina e parcialmente destruída. Nestes sítios, células ativadas imunes são abundantes, produzindo numerosas moléculas inflamatórias e enzimas proteolíticas que podem enfraquecer a capa e ativar linhagens celulares no núcleo. Esse processo culminará com a transformação de uma placa estável em uma estrutura vulnerável e instável, a qual pode romper, gerar um trombo e desencadear uma síndrome coronariana aguda60.

2.6 - Manejo do Infarto Agudo do Miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST

O primeiro passo no manejo do paciente com IAM c/ SSST é o pronto reconhecimento da condição, uma vez que os benefícios da terapia de reperfusão são maiores quanto mais rápida for a instituição da mesma111.

A recanalização precoce da coronária responsável pelo infarto limita a necrose miocárdica e reduz mortalidade nesses indivíduos112. Quando analisamos a mortalidade, em curto prazo por IAM, ao longo da história, percebemos a importância do advento de ações terapêuticas como as unidades coronarianas, o ácido acetilsalicílico e as técnicas de reperfusão, como ilustrado pela figura abaixo:

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Adaptada de: Acute Myocardial Infarction. Antman EM, Braunwald E. In: Heart Disease: A

Textbook of Cardiovascular Medicine – 5th edition, 1997; Pg 1184-1288.

A reperfusão pode ser química (através do uso de agentes fibrinolíticos) ou percutânea (por meio de angioplastia com balão acompanhada ou não de stent). Cada uma das modalidades citadas, dependendo do cenário, tem suas vantagens e limitações. Vejamos, agora, alguns aspectos de cada uma das estratégias de reperfusão.

- Fibrinolíticos

Indicados nos pacientes com quadro clínico compatível com IAM associado à elevação do segmento ST no eletrocardiograma em duas ou mais derivações contíguas ou bloqueio de ramo esquerdo novo ou presumivelmente novo, salvo se contraindicações112.

Quanto mais precocemente for instituído o tratamento com trombolítico, maior o benefício no que diz respeito à preservação da função ventricular e redução da mortalidade. Prova disso é que, na primeira hora, são salvas cerca de 65 vidas por mil pacientes tratados, enquanto que, naqueles submetidos à fibrinólise entre 6 e

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12 horas de evolução, este número cai para 10 vidas salvas por mil tratados113. Além das 12 horas, não há evidências inequívocas de benefício114.

Com relação aos tipos de fibrinolíticos, de acordo com achados do estudo GUSTO, o tPA foi mais eficiente na redução de mortalidade do que a estreptoquinase115. A tenecteplase, por sua vez, tem como vantagem o uso em bolus em dose única, sendo equivalente em termos de mortalidade ao tPA116.

- Intervenção coronariana percutânea

A intervenção coronariana transluminal percutânea (ICP) foi realizada pela primeira vez por Andreas Gruentzig, em 1977, usando um dispositivo com guia e balão. O procedimento foi inicialmente limitado a menos de 10% dos pacientes com DAC sintomática que tinham uma lesão isolada, focal e não calcificada, em vaso proximal. Com a evolução dos equipamentos e da experiência dos operadores, na década seguinte, o uso da ICP se expandiu, incluindo um espectro crescente de lesões: doença de mais de um vaso, oclusões totais, enxertos de veia safena e pacientes com IAM c/ SSST, entre outros117, 8.

Duas limitações, em um primeiro momento, evitaram a disseminação do uso da angioplastia com balão no manejo da DAC: a oclusão abrupta do vaso tratado ocorria em 5 a 8% dos casos; também, a CRM de emergência era requerida em 3 a 5% dos pacientes. Além disso, a re-estenose resultava em recorrência de sintomas em 30% dos pacientes em até 6 a 9 meses da intervenção118.

Novos dispositivos coronarianos foram desenvolvidos no final dos anos 80 para suprir as limitações associadas à angioplastia com balão. Stents coronarianos foram desenhados para revestir o interior da parede arterial a fim de prevenir o remodelamento vascular tardio e precoce. Marcada evolução tecnológica e técnica se fizeram nos últimos anos, de forma a promover, definitivamente, a intervenção percutânea como um dos pilares da terapêutica cardiológica contemporânea118.

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A ICP primária consiste no uso do cateter balão (com ou sem implante de stent) para fins de re-estabelecimento do fluxo coronariano anterógrado, sem que tenha sido usado trombolítico previamente. Tal técnica constitui-se na melhor opção de reperfusão, se iniciada até 90 minutos após o diagnóstico do IAM. Vários estudos randomizados comparando a ICP à fibrinólise mostraram melhora da sobrevida com taxas menores de hemorragia intracraniana e infarto recorrente em favor do procedimento hemodinâmico. Revisão sistemática que incluiu 7.739 indivíduos com IAM c/ SSST tratados com angioplastia coronariana primária ou fibrinolítico mostrou que, ao final de 30 dias, naqueles tratados por reperfusão mecânica, houve redução de mortalidade (7% x 9%; p = 0,0002), reinfarto (2,5% x 6,8%; p < 0,0001) e AVC (1% x 2%; p = 0,0004)8.

Para pacientes que estejam em choque cardiogênico ou com contraindicação para fibrinólise, a angioplastia é a alternativa preferencial112.

O advento dos stents no contexto da intervenção coronariana primária, quando tecnicamente viável, veio agregar benefícios. Quando comparado ao cateter balão, apesar de não reduzir mortalidade e reinfarto, acrescentou diminuição significativa das taxas tardias de nova revascularização do vaso-alvo9.

Dilema frequente na prática clínica envolve a escolha da melhor estratégia de reperfusão em centros sem laboratório de hemodinâmica. São candidatos preferenciais à transferência visando a ICP primária, de uma forma geral112:

a) Pacientes com início dos sintomas de IAM > 3 horas e < 12 horas;

b) Contraindicação para fibrinólise;

c) Expectativa de transferência, do diagnóstico até a insuflação do balão, inferior a 90 minutos;

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d) Transporte rodoviário ou aéreo em ambiente de terapia intensiva com monitoramento e médico treinado;

Em estudo que recrutou 1.527 pacientes, a estratégia de transferência foi avaliada, sendo que os indivíduos foram classificados como de baixo risco (escore TIMI entre 0 a 4) e de alto risco (escore TIMI maior do que 5). Como resultado, foi observada redução significativa da mortalidade no grupo de alto risco (25,1% x 36,2%; p = 0,0002). Naqueles de baixo risco, a redução de mortalidade foi marginal (5,6% x 8%; p = 0,11)119.

2.7 - Estratificação de risco

No que se refere à abordagem dos pacientes com síndromes isquêmicas agudas, a efetiva estratificação de risco é parte integrante e fundamental do manejo10. Tal prática tem impacto direto no processo decisório médico, seja em curto ou longo prazo. Mesmo no cenário do IAM c/ SSST, no qual as opções terapêuticas iniciais já estão bem definidas, a estratificação de risco precoce tem sua utilidade. Esta serve como triagem para níveis alternativos de cuidado hospitalar (incluindo a decisão de transferir ou não o paciente para centros terciários que disponham de modalidades de tratamento mais complexas) e identificação de pacientes de menor risco que poderiam ter alta hospitalar mais precoce. Como ferramenta epidemiológica, através do uso de escores de risco, pode identificar diferenças de base em grupos diversos de uma população, bem como auxiliar na construção de estudos clínicos efetivos com amostras menores (selecionando para estes grupos indivíduos com maiores taxas de eventos)11. As aplicações mencionadas implicam, diretamente, na adequação dos recursos financeiros. Por outro lado, é de extrema necessidade a estratificação de risco no sentido de acessar o prognóstico do paciente, a fim de poder prestar informações precisas para o mesmo e para seus familiares.

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Modelos sofisticados de análise multivariada, desenvolvidos no estudo GUSTO-I, permitiram identificar preditores clínicos independentes e sua contribuição relativa quanto ao risco de mortalidade no contexto de IAM c/ SSST120. Sua aplicabilidade na prática diária contudo, era limitada pela complexidade na efetuação dos cálculos e pelo grande número de variáveis. Outros escores de risco foram lançados; no entanto, pecavam por terem sido concebidos antes do uso corrente da trombólise, por serem baseados em opiniões de especialistas ou por não predizerem desfechos em curto prazo121-125.

Com o intuito de criar uma ferramenta simples, acurada, e que pudesse ser usada à beira do leito, foi proposto, a partir de 14.114 pacientes elegíveis para trombólise, arrolados no estudo In TIME II (Intravenous nPA for Treatment of Infarcting Myocardium Early ), o escore TIMI (Thrombolysis in Myocardial Infarction) para IAM c/SSST. O mesmo foi elaborado através da análise multivariada de diversos fatores relacionados à mortalidade, em até 30 dias, sendo escolhidas as 8 variáveis com maior capacidade discriminatória, conforme mostra a figura abaixo:

Fonte: Morrow DA, Antman EM, Charlesworth A, et al. TIMI risk score for ST-elevation

myocardial infarction: a convenient, bedside, clinical score for risk assesment at presentation:

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Para cada indivíduo, o escore é calculado como a soma aritmética dos pontos correspondentes aos fatores de risco presentes (conforme ilustrado abaixo):

Analisado pela área sob a curva ROC, o método demonstrou forte capacidade prognóstica (c=0,78), mantendo-se estável até o momento da alta. Posteriormente, o escore foi validado entre os pacientes do National Registry of Myocardial Infarction 3, refletindo uma população similar à da prática clínica diária, incluindo também indivíduos reperfundidos percutaneamente. O poder discriminatório foi comparável ao estudo anterior126.

No entanto, algumas limitações do escore TIMI foram verificadas. Objetividade e simplicidade de um modelo “à beira do leito” foram conseguidas às custas de redução no número de variáveis e categorização daquelas do tipo contínuas, resultando em perda de performance em relação a uma equação de regressão completa. Por outro lado, tendo sido um instrumento concebido a partir de pacientes elegíveis para fibrinólise em um ensaio clínico, fica claro imaginar que aqueles com restrição ao uso de trombolíticos ou preenchendo critérios de exclusão (p. ex.: choque cardiogênico) podem estar em maior risco para resultados adversos127,128. Finalmente, importantes fatores prognósticos como função

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ventricular esquerda, resolução do segmento ST e biomarcadores cardíacos, entre outros, não são incorporados na análise.

De forma mais recente que o escore TIMI, foi desenvolvido um registro prospectivo e contemporâneo global de síndromes coronarianas agudas denominado Global Registry of Acute Coronary Events (GRACE), oriundo de 94 hospitais, em 14 países129. A partir deste registro, foram desenvolvidos 3 modelos para estimar, respectivamente, o risco de mortalidade intra-hospitalar, de mortalidade 6 meses após a alta hospitalar e de mortalidade ou de infarto agudo do miocárdio cumulativos até o sexto mês, para todo o espectro das SCA12, 130, 131.

Os modelos concebidos a partir do registro GRACE diferem dos demais escores, em particular do TIMI, em alguns pontos: são baseados em uma população relativamente não selecionada, representando os pacientes vistos na prática clínica; são aplicáveis a pacientes com todos os tipos de síndromes isquêmicas agudas e incorporam novas variáveis que adicionam considerável informação preditiva, como função renal e parada cárdio-respiratória na admissão12.

Em série composta por 21.688 pessoas utilizadas para derivação do escore e 22.122 na etapa de validação, nove fatores foram preditores independentes de morte e do desfecho composto de morte e infarto do miocárdio, do período da baixa por evento isquêmico agudo até 6 meses sucedendo a alta. O modelo simplificado foi considerado robusto, com estatística C de 0,81 para predição de óbito e 0,73 para morte ou IAM, no seguimento referido acima131.

Noutro estudo, que se propôs a averiguar o desfecho de mortalidade hospitalar na vigência de uma SCA, foi desenvolvido um modelo de regressão logística multivariável arrolando 11.389 pacientes com e sem elevação do ST incluídos no registro GRACE de 1999 a 2001. Foram obtidos 2 grupos de validação, sendo um proveniente do registro GRACE e outro do estudo GUSTO-IIb. Os 8

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fatores seguintes foram responsáveis por 89,9% da informação prognóstica: idade, classificação de Killip, pressão arterial sistólica, desvio do segmento ST, parada cardíaca na admissão, creatinina sérica, elevação inicial dos marcadores de necrose miocárdica e frequência cardíaca. A habilidade discriminatória do modelo foi bastante satisfatória, com estatística C de 0,8312.

Os escores GRACE, em seus diferentes tipos, possuem algumas limitações. Como em alguns centros participantes do registro há a necessidade de obter consentimento informado do paciente antes de incluí-lo, mortes precoces e indivíduos com complicações clínicas também precoces podem ser sub-representados. Por fim, é possível que a ausência de variáveis como troponina e marcadores inflamatórios, as quais têm mostrado serem fatores prognósticos independentes específicos, tenha deixado de agregar acurácia aos modelos12.

2.8 Marcadores inflamatórios e doença arterial coronariana

Evidências clínicas e epidemiológicas acumuladas desde a década de 90 têm caracterizado os processos inflamatórios como fatores de importante papel na aterogênese, assim como na vulnerabilidade de uma placa aterosclerótica à ruptura ou erosão132. A compreensão do processo aterosclerótico passou de um modelo de doença focal, em que os sintomas são causados por uma estenose severa, para o de uma doença sistêmica caracterizada por disfunção endotelial e inflamação da placa. Neste novo paradigma, a lesão ateromatosa com estenose subcrítica tem maior potencial de ruptura e trombose109.

Com base em tais evidências, marcadores inflamatórios têm sido estudados tanto no contexto de indicadores de aterosclerose oculta em indivíduos aparentemente saudáveis, quanto na predição de risco de eventos recorrentes em pacientes com doença estabelecida132.

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Dentre os marcadores inflamatórios, a proteína C reativa (PCR), uma proteína plasmática circulante não glicosilada, é aquele mais extensivamente pesquisado20. Tal marcador consiste em uma proteína de fase aguda, a qual é produzida predominantemente pelos hepatócitos, sob a influência de citocinas como interleucina-6 e fator de necrose tumoral-α133

.

Tradicionalmente, a PCR tem sido usada para medir a atividade de doenças inflamatórias e infecciosas, com limite de detecção que fica em torno de 3 a 5 mg/l, acima das concentrações normalmente observadas em indivíduos aparentemente saudáveis. Métodos de alta sensibilidade para a quantificação da proteína C reativa (proteína C reativa ultrassensível – PCRus) são capazes de detectar concentrações abaixo de 0,3 mg/l. Kits com esta sensibilidade são necessários para a estratificação de risco cardiovascular, a qual é baseada na discriminação de níveis que se situam abaixo de 3 mg/l132.

Pontos de corte para valores de PCRus considerados elevados, no que tange à estratificação de risco cardiovascular, ainda não são consensuais. Segundo diretriz do Centro de Controle e Prevenção de Doenças e da American Heart Association, sugere-se um valor maior do que 3 mg/l como indicativo de desfechos em pacientes com coronariopatia estável. Na vigência de uma síndrome coronariana aguda, por outro lado, níveis superiores a 10 mg/l parecem ser mais preditivos134.

Sabe-se que a PCR se liga à LDL, já tendo sido detectada em placas ateroscleróticas21. Devido a estas observações, alguns autores advogam a possibilidade de a PCR ter papel causal direto na DAC, tópico este que permanece controverso22-24. Zacho e cols, em estudo de cerca de 50.000 indivíduos nos quais os genótipos para 4 polimorfismos de PCR eram conhecidos, não verificaram associação de qualquer das combinações dos genótipos com aumento de risco para doença cardiovascular isquêmica135.

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Mesmo que a proteína C reativa não exerça um papel de causalidade direta na doença cardiovascular, há uma estreita relação do marcador com a doença coronariana132. Tal força de associação talvez se deva à possibilidade da PCR ser um sinalizador de outros fatores inflamatórios que promovem a doença cardiovascular, ou de ter seus níveis elevados em resposta à referida doença136. Admitindo-se a PCR apenas como um sinalizador, há evidências de que uma resposta inflamatória exagerada desencadeada pela lesão miocárdica no IAM poderia resultar em mais dano tecidual, favorecendo a ocorrência de eventos25.

2.9 - Proteína C Reativa e doença cardiovascular: prevenção primária

Segundo Khot e colaboradores, há quatro fatores de risco estabelecidos para a doença arterial coronariana: hipertensão, tabagismo, hipercolesterolemia e diabetes. A despeito desse dado, aproximadamente 62,4% dos pacientes já diagnosticados como portadores de DAC apresentam no máximo um dos referidos fatores. Cerca de 19% dos indivíduos não possuem qualquer dos fatores de risco mencionados137. À luz dos mecanismos inflamatórios envolvidos no processo aterosclerótico, torna-se possível admitir a participação da inflamação como importante fator adicional causal.

Numerosos estudos demonstraram o papel da proteína C reativa em identificar risco de complicações ateroscleróticas14. Algumas publicações evidenciam adição de predição da PCR no que se refere ao risco cardiovascular global. O marcador foi, inclusive, incorporado ao escore de risco de Reynolds, o qual já foi validado para uso clínico138,139.

No estudo AFCAPS/TexCAPS, foi constatada, às custas do uso de lovastatina, uma significativa redução de eventos coronarianos tanto em pacientes com razão colesterol total/HDL elevada, quanto naqueles com PCR aumentada e razão lipídica normal140. Modelos desenvolvidos a partir deste ensaio clínico

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sugeriram que indivíduos de meia idade de ambos os sexos, com LDL abaixo de 149 mg/dl, na ausência de dois ou mais fatores de risco e com proteína C reativa maior ou igual a 1,6 mg/l, poderiam se beneficiar do uso de estatina141.

O ensaio clínico Jupiter, publicado em 2008, avaliou 17.802 pacientes aparentemente saudáveis com níveis de LDL < 130 mg/dl e PCRus > 2mg/l, randomizados para rosuvastatina 20 mg/dia ou placebo. Houve redução significativa na incidência de eventos cardiovasculares maiores no grupo da intervenção142. Como consequência desses resultados, em particular do último estudo, a pesquisa de biomarcadores para aprimorar algoritmos de risco tem atraído atenção crescente.

Por outro lado, estudo de coorte foi realizado por Melander e colaboradores, arrolando 5.067 participantes em seguimento médio de 12,8 anos. Foram dosados a proteína C reativa e outros marcadores, com o objetivo de avaliar a utilidade dos mesmos em predizer o risco cardiovascular quando adicionados aos fatores de risco convencionais. Tais marcadores, quando avaliados em uma reclassificação de risco, não mostraram significância com relação a eventos cardiovasculares (0,0%; 95% CI, -4,3% a 4,3%) e eventos coronarianos (4,7%; 95% CI, -0,76% a 10,1%). Embora resultados melhores tenham sido verificados em análises restritas a pacientes de risco intermediário, a adequada reclassificação foi quase completamente confinada à diminuição da pontuação de indivíduos que não tiveram eventos, ao invés da supraclassificação daqueles que atingiram os desfechos143.

Definitivamente, há controvérsias quanto à recomendação de marcadores de risco não tradicionais (como a PCRus) na predição de DAC em pacientes assintomáticos. Órgãos como a American Heart Association e American College of Cardiology são favoráveis a essa prática. A Força Tarefa de Serviços Preventivos norte-americana, entretanto, tem a posição de não incentivar o uso rotineiro dos

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marcadores não convencionais, por considerar, para tal conduta, a evidência disponível apenas moderada144.

Ainda em termos de prevenção primária, importante metanálise avaliou dados de 160.309 pacientes provenientes de 54 estudos prospectivos. As concentrações de PCR tiveram associações contínuas com risco de DAC, AVC isquêmico, mortalidade vascular e não vascular. Porém, tais associações foram enfraquecidas por sucessivos ajustes por idade, sexo, fatores de risco tradicionais e fibrinogênio - razão de risco de 1,23 (1,07-1,42) para doença arterial coronariana, 1,32 (1,18-1,49) para AVC isquêmico, 1,34 (1,18-1,52) para mortalidade vascular e 1,34 (1,20-1,50) para mortalidade não vascular. Dessa forma, a hipótese da causalidade direta da proteína C reativa no processo aterosclerótico ficou enfraquecida145.

2.10 - O papel da Proteína C Reativa na Doença Arterial Coronariana estabelecida

Em se tratando de pacientes com doença cardiovascular conhecida, o valor preditivo da proteína C reativa para severidade da doença e prognóstico tem sido pesquisado em uma ampla variedade de cenários.

Considerando indivíduos portadores de DAC clinicamente estável, alguns estudos demonstraram correlação robusta entre a PCR dosada no momento da inclusão dos pacientes no estudo e eventos coronarianos agudos futuros132. Em trabalho conduzido por Sabatine e colaboradores, foram acompanhados 3.771 pacientes com cardiopatia isquêmica estável durante período médio de 4,8 anos. A PCRus foi medida no início do estudo; os desfechos considerados foram morte cardiovascular, infarto do miocárdio e AVC. Em todos os subgrupos, níveis do biomarcador maiores do que 1 mg/l se associaram a números significativamente

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maiores de eventos cardiovasculares (PCRus de 1 a 3 mg/l: HR 1,39, 95% CI 1,06-1,81; >3 mg/l: HR 1,52; 95% CI 1,15-2,02)146.

No cenário das síndromes coronarianas agudas sem supradesnivelamento do segmento ST, do ponto de vista prognóstico, níveis aumentados de proteína C reativa na admissão e antes da alta hospitalar são marcadores de eventos adversos, seja em curto ou longo prazo147-153.

Em trabalho de Liuzzo e colaboradores, considerando-se como elevada PCRus acima de 3 mg/l, verificaram-se maiores concentrações do marcador nos pacientes com angina instável do que naqueles com doença estável. No primeiro grupo, houve ainda maior número de episódios isquêmicos e risco de óbito do que nos pacientes com PCRus baixa147.

Em sub estudo do GUSTO IV, mais de 7.000 pacientes foram divididos em quartis de PCR e troponina T. Do primeiro ao quarto quartil de PCR, a mortalidade dos pacientes no trigésimo dia de evolução da síndrome isquêmica aguda subiu de 2 para 6,3%. Não houve, contudo, correlação entre os níveis de proteína C reativa e a ocorrência de IAM em 30 dias153.

No Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul, foi conduzido estudo de coorte em 199 pacientes portadores de síndromes coronarianas agudas, internados na Unidade de Terapia Intensiva entre março e novembro de 2002. Neste estudo, a PCRus e a glicemia alterada associaram-se, significativamente, com eventos intra hospitalares (p=0,03 e p<0,01, respectivamente), nos quais os maiores valores do marcador ocorreram em pacientes que apresentaram angina, insuficiência cardíaca e óbito. Entretanto, em análise multivariada, a PCRus não se manteve como preditor para mortalidade hospitalar. Além disso, também não houve associação com eventos pós-hospitalares154.

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2.11 - Proteína C reativa e Infarto Agudo do Miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST

O valor preditivo da proteína C reativa nas síndromes coronarianas agudas tem sido atribuído a fatores como sua associação com um processo de aterosclerose coronariana mais difusa, bem como com propriedades inflamatórias e de instabilidade da placa. Adicionalmente, reações inflamatórias relacionadas à necrose miocárdica podem ser responsáveis, pelo menos em parte, pela elevação da PCR nesses pacientes. Acredita-se que a última não seja apenas um marcador de necrose, mas sim que possa estar diretamente ligada aos processos inflamatórios associados com a cicatrização ou expansão do infarto e com o remodelamento ventricular pós evento155.

À luz dos conhecimentos supracitados, em termos de prognóstico, alguns estudos têm mostrado dados conflitantes da proteína C reativa em relação ao risco de eventos após o IAM.

Em trabalho arrolando 1.309 pacientes admitidos no Japão com quadro de infarto agudo do miocárdio com elevação de ST, a PCR foi medida já na fase estável, a fim de que a mesma não se relacionasse com o tamanho do IAM, com média de 25 dias de evolução do quadro isquêmico. Noventa por cento dos pacientes foram submetidos à terapia de reperfusão. Assim, os maiores valores do marcador foram preditores independentes de mortalidade em longo prazo, num seguimento médio de 522 dias156.

Sanchis e colaboradores evidenciaram que a PCR está associada à mortalidade em adição à idade, classificação de Killip e fração de ejeção do ventrículo esquerdo nos sobreviventes de um IAM. Entretanto, seu papel prognóstico aditivo foi marginal (estatística C do modelo sem PCR: 0,77; com PCR: 0,78)157.

Referências

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