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IMAGENS LABIRÍNTICAS: a narrativa fílmica de Kim Ki Duk RESUMO

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Academic year: 2021

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IMAGENS LABIRÍNTICAS: a narrativa fílmica de Kim Ki Duk

Melissa Rubio dos Santos1 Profa. Dra. Rita Lenira de Freitas Bitencourt (orientadora)2

RESUMO

Investigar a narrativa imagética do cineasta sul-coreano Kim Ki Duk a partir de um recorte de três filmes: Casa vazia (Bin-jip, 2004), Time (Shigan, 2006) e Dream

(Bi-mong, 2008). Esta é a proposta do presente artigo. Sendo assim, a análise de como as

imagens constroem os sentidos nas narrativas fílmicas de Kim Ki Duk tem como ponto de partida o estudo dos jogos criados pelos si movimento entre os corpos, o desejo e as cores. Tais conceitos são fulcrais para pensar como ocorre o movimento e a violência dos signos que constituem as imagens labirínticas dos personagens de Kim Ki Duk, personagens que vivenciam os abismos existenciais da contemporaneidade.

PALAVRAS-CHAVE: Imagem. Cinema sul-coreano. Poéticas visuais. Kim Ki Duk. 1. KIM KI DUK: O CINEASTA DOS LABIRINTOS

O cineasta sul-coreano Kim Ki Duk tece em seus filmes uma narrativa complexa e desestabilizadora. As tessituras das imagens e do texto verbal exprimem o abismo entre a(s) existência(s) humana(s) disposta em formas labirínticas. Os personagens das narrativas fílmicas de Kim Ki Duk possuem uma peculiar característica: eles estão em trânsitos constantes dos corpos, no espaço e na linguagem. Personagens que se deslocam entre presença e ausência de fala e entre os movimentos labirínticos do corpo no espaço – um espaço de clausura, sofrimento e tortura. Sendo assim, as três narrativas fílmicas de Kim Ki Duk tecem diferentes e instigantes jogos de significação.

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1 Mestranda em Literatura Comparada do programa de Pós-Graduação da UFRGS. Graduada em Letras Licenciatura pela UFRGS.

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2. O LABIRINTO DOS SIGNIFICANTES

O primeiro filme de Kim Ki Duk analisado neste artigo é Time (Shigan) (2006). Nessa narrativa fílmica, os labirintos são formados pelos jogos entre significantes- labirinto do corpo e labirinto dos significantes. O corpo é múltiplo e fragmentado, ou seja, o corpo não apresenta formação fechada e esgotada, pelo contrário, o corpo está em constante construção. A narrativa de Time explora, de forma magistral, a problematização do corpo na contemporaneidade: a construção do corpo e a relação deste como artefato de poder e a construção da identidade a partir do corpo. Sendo assim, na narrativa fílmica de Time há um elemento perturbador na construção dos corpos dos personagens: a prática de inúmeras cirurgias plásticas. Os corpos são produzidos artificialmente, o que ocasiona os múltiplos jogos entre significantes corporais e a identidade. Os protagonistas experenciam abismos entre significantes e silêncio que expõe de forma violenta o sofrimento que dilacera as possibilidades de significação. Este excesso estará expresso na materialidade da língua, no discurso em sua forma violenta como se realiza nos diálogos marcadamente verborrágicos que se alternam com o silêncio- estar em silêncio que falar em silêncio. Se Hee e Ji Woo, os protagonistas do filme, vivem o extremo da solidão humana em diferentes momentos. Eles são dois namorados que vivem um relacionamento que perdura por dois anos. Entretanto, esse convívio sofre uma ruptura quando após uma discussão entre os dois, Se Hee decide desaparecer da vida de Ji Woo. Ela desaparece totalmente, motivada pela busca de um novo rosto ideal, ou seja, uma nova identidade que seja atraente para Ji Woo, um novo rosto que atraia o olhar constante do namorado. Ela retorna em cena após seis meses, possuindo, então, um novo rosto, acreditando ter agora o poder de uma nova identidade construída e consolidada pela imagem. E os labirintos? Como eles se apresentam ao longo da narrativa? Para responder a essas perguntas, tenho que falar da falta, um elemento fulcral da constituição dos dois personagens: O que há por trás do recurso de intervenção ou de transformação do corpo? O que esse recurso significa para os personagens Se Hee e Ji Woo? Ele deixa em relevo a lacuna que os personagens estão destinados a preencher: o corpo é o elemento que agiria como o elemento que irá suprir a falta, a falta que Se Hee e Ji Woo anseiam tanto suprir...

Outro elemento pertinente a destacar é a nuvem de significantes que constrói os labirintos. Se Hee e Ji Woo se deslocam dentro desse labirinto ao longo de toda a narrativa fílmica. Porém, essa nuvem deixa a visão e os movimentos turvos, não sendo

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possível ver de forma nítida, como também compreender os significantes que ali são constituintes. Kim Ki Duk também constrói uma cena em que a narrativa imagética descreve claramente como é o universo em que os personagens Se Hee e Ji Woo estão inseridos. A cena é 37min36s, na qual Sae Hee escreve várias vezes a palavra

(Sarangheyo/Te amo). Ela escreve várias vezes ‘Sarangheyo’ em sobreposição, disposicionados em diversos ângulos. A imagem construída no papel é de uma nuvem, mancha vermelha, uma mancha de tonalidade agressiva e intensa, tal como o sentimento de Se Hee por Ji Woo. O significante ‘Sarangheyo’ em forma de nuvem no papel é uma nuvem de repetição de significantes desordenados, repetição do verbo ‘amar’ que mostra, de forma concreta, como está constituída a nuvem labiríntica da mente dos personagens Se Hee e Ji Woo na narrativa fílmica de Time. Que amor é esse retratado nessa nuvem de significantes sobrepostos agressivamente, um sufocando, ocultando a existência do outro? O amor possessivo.

Sendo assim, a narrativa de Time apresenta elementos imagéticos que exploram o labirinto dos significantes: labirinto nuvem, construção/transformação do corpo, labirinto do corpo, imagens essas que compõem um conjunto que explora os não-limites dos significantes imagéticos e verbais.

3. O LABIRINTO DO DESEJO

Dream (Bi-mong) (2008) tem como protagonistas Ran e Jin. Duas pessoas

desconhecidas que estão interligadas através dos sonhos e do desejo. Kim Ki Duk tece uma narrativa que coloca em questão a realidade: os sonhos de Jin se tornam ações realizadas por Ran em estado de sonambulismo. Sendo assim, fica a questão: como o sonho de um desconhecido pode expressar o mesmo desejo de outra pessoa? Ainda, como um sonho pode ter ações praticadas por outra pessoa no plano do real? Se os sonhos são produtos do desejo, logo os personagens não podem escapar do desejo que povoa a mente. O desejo produz o labirinto e, ao mesmo tempo, os conduz e os aprisionam em redemoinhos labirínticos. Se esses movimentos labirínticos são construídos por uma violência dos signos, então, qual é o limite dos significantes? Talvez o infinito...

Sendo assim, os dois protagonistas são uma espécie de duplicação de papéis: um abandonou o objeto de amor, já o outro foi o abandonado. Portanto, aqui se instaura uma interessante questão: será a linguagem do sonho, logo, a linguagem do desejo, algo

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que sublima a língua (ela coreano e ele japonês)? O filme Dream nos mostra que sim, que o desejo ultrapassa qualquer barreira na busca pela sua concretização.

O cineasta constrói um labirinto do desejo a partir das imagens na Cena 55min54s. Nessa cena, Jin e Ran aparecem em um jogo narrativo e de imagens muito intrigante: há uma alternação de papéis entre Ran, Jin e seus respectivos ex-namorados. Recurso que ilustra de forma mais clara a relação entre os personagens Jin e Ran. Eles vivem em diferentes posições de sujeito e objeto: ele era o ciumento obsessivo e ela a pessoa oprimida e sufocada pelo ciúme. Enclausurados no passado por causa da paixão, ambos estão presos pelo olhar do Outro e seguem incessantemente uma trajetória no labirinto do desejo. Essa cena labiríntica problematiza a questão do tempo e do espaço, pois ela se encontra deslocada da sequência de cenas anteriores, ou seja, não há como ter certeza qual é o tempo do plano em questão: seria um flashback, um acontecimento do presente ou um deslocamento do futuro? A cena poderia ser interpretada como o pensamento de Ran ou um momento de revelação do passado de Ran e Jin.

Outro elemento das imagens labirínticas no filme Dream é a cor. O uso das cores contrastantes permeia as cenas finais, nas quais mostram Ran e Jin cometendo suicídio. Nessas cenas, as cores atuam de forma contrastiva: azul, branco, bege, vermelho e preto. As cores na composição da sequência e do cenário não foi inocente, uma vez que “o valor exato de cada cor dependerá do conjunto em que é vista. Dependerá, portanto, sempre de um “contexto colorístico” (OSTROWER, 1991, p. 235). Dessa forma, a cor neutra, o bege ganha destaque em relação às outras cores e será ela quem atrai o olhar do espectador. O olhar se torna mais lento nos objetos de cores contrastantes e esse recurso antecipa a atenção a ser demandada pelo espectador no desfecho da narrativa fílmica. Nesse jogo contrastivo das cores é construído um labirinto, o labirinto das cores: o único elemento se move seja o de cor bege, a borboleta e será ela quem captura o olhar do espectador. Os significantes através das cores constroem mais um labirinto. 4. O LABIRINTO DO SILÊNCIO

A terceira e última narrativa fílmica é Casa vazia (Bin jip) (2004). O elemento de destaque desse filme é o silêncio. Entretanto, apresento uma análise um pouco diferente acerca do elemento silêncio constituinte da narrativa fílmica de Casa vazia. A análise é feita a partir da teoria do esgotamento proposta por Gilles Deleuze em O

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imagem pura se insere na linguagem, nos nomes e nas vozes. “Entretanto, às vezes será no silêncio, num silêncio em que todas as vozes parecem ter se calado”. É nesse movimento de se calar, ou seja, se colocar em silêncio, escolher se expressar através do silêncio que os personagens Sunhwa e Taeseuk irão construir seus labirintos de significação. Através do silêncio, os personagens atingem o esgotamento das possibilidades de comunicação, o esgotamento das possibilidades e dos espaços previsíveis e possíveis... Romper com a fala e com o espaço para construir uma imagem que extrapola a língua da descrição e a língua das múltiplas vozes, esgotar a voz através do silêncio para poder proporcionar a criação da imagem estelar, imagem corpo celeste, imagem fugidia, imagem que tem intensidade que atinge o seu ápice em seu próprio dissipar, queimar, combustão de seu próprio corpo. Em Casa vazia, o silêncio atua como a forma motriz da construção de imagens, uma vez que somente é possível criar uma imagem a partir de seu esgotamento... A imagem estrela entra em dissipação... Imagens do silêncio que compõem os labirintos que ao mesmo tempo criam os personagens, dão vozes a eles e os dissipam.

5. A POÉTICA DOS LABIRINTOS

Após investigar os universos narrativos de Time (Shigan), Dream (Bi-mong) e

Casa Vazia (Bin Jip), posso afirmar que a poética do cineasta sul-coreano Kim Ki Duk,

nesses três filmes constrói narrativas complexas que desestabilizam o espectador devido ao fato de ilustrar os abismos entre a(s) existência(s) humana(s). O ponto de convergência entre as três narrativas é o labirinto com a relação com o Outro: Como eu me vejo diante do Outro? O que o Outro vê em mim? O que ele quer de mim? Nesse jogo de significação se constroem os labirintos de significantes, de desejos e de silêncios.

REFERÊNCIAS

CASA VAZIA, Direção, produção e roteiro de Kim Ki Duk. Seul: Happynet Films ; Kim Ki Duk Films, 2004.

CHUNG, Hye Seung. Kim Ki-duk. Chicago: University of Illinois, 2012.

DELEUZE, Gilles. O esgotado. In: Sobre teatro: um manifesto de menos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2010.

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DREAM, Direção, produção e roteiro de Kim Ki Duk. Seul: Kim Ki Duk Films, 2008. DVD (95 min).

ELENA, Alberto (org). Seul Express: 97-04. Madrid: T&B Editores, 2004.

LACAN, Jacques. Livro 5: as formações do inconsciente. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1999.

_____. Livro 10: a Angústia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2005.

_____. Livro 6: o desejo e sua interpretação (Seminários 1958-1959). Porto Alegre: APPOA, s. d.

OSTROWER, Fayga. Universos da arte. Rio de Janeiro: Campus, 1991.

TIME, Direção, produção e roteiro de Kim Ki Duk. Seul: Happynet Films ; Kim Ki Duk Films, 2006. DVD (97 min), color, 35mm.

 

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