• Nenhum resultado encontrado

Progressividade fiscal do ITBI e do ITCMD à luz do princípio da capacidade contributiva e da teoria do direito como integridade de Dworkin

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Progressividade fiscal do ITBI e do ITCMD à luz do princípio da capacidade contributiva e da teoria do direito como integridade de Dworkin"

Copied!
16
0
0

Texto

(1)

* Mestra em Direito pela Universidade Federal do Pará (Linha de pesquisa: Constitucionalismo, Democracia e Direitos Humanos; grupo de pesquisa: Direitos Humanos e Tributação). Advogada. Professora Universitária. E-mail: uramartins@ig.com.br.

Urá Lobato Martins

*

Progressividade fi scal do ITBI e do ITCMD

à luz do princípio da capacidade

contributiva e da teoria do direito

como integridade de Dworkin

Resumo: O presente artigo visa demonstrar a necessidade de ser aplicada a progressividade fi scal

com relação ao ITBI e ao ITCMD. Para tanto, será analisada a posição atual do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, bem como a posição doutrinária. Ao fi nal, será demonstrado que é perfei-tamente cabível a progressividade fi scal com relação ao ITBI e ITCMD, de acordo com o Princí-pio da Capacidade Contributiva, bem como de acordo com o método interpretativo construtivo de Dworkin.

Palavras-chave: Progressividade fi scal. ITBI. ITCMD. Capacidade contributiva.

Progressivity of the tax ITBI and ITCMD the light of the principle of capacity contributory theory of law and integrity as Dworkin

Abstract: Th is paper aims to demonstrate the need for progressive taxation be applied with respect to ITBI and ITCMD. Th erefore, we will analyze the current position of the Supreme Court on the subject, as well as the doctrinal position. At the end, it will be shown that it is perfectly appropriate progressive taxation with respect to ITBI ITCMD and, according to the Principle of Capacity Con-tributory and according to the interpretative method of constructive Dworkin

Keywords: Progressive taxation. ITBI. ITCMD. Principle of capacity contributory.

Considerações iniciais

Um dos grandes problemas enfrentados pela sociedade brasileira con-siste na má distribuição da renda, atuando a tributação, na maioria das ve-zes, como fator de agravamento, contribuindo para a manutenção dos ní-veis de concentração de renda e de desigualdade social observados em

(2)

nos-so país. Tais fatores devem ser considerados, pois, ao interpretar as normas jurídicas, o intérprete não pode ignorar o contexto histórico, social e eco-nômico da sociedade, bem como, os fundamentos e os objetivos previstos constitucionalmente.

A problemática do tema reside no fato do STF entender que o Prin-cípio da Capacidade Contributiva não se aplica aos impostos reais, so-mente aos pessoais, o que resultou na edição de súmula impedindo tal aplicação. De acordo com o referido entendimento, os impostos denomi-nados de reais devem possuir técnica de tributação proporcional, ao invés de progressiva.

O presente artigo visa demonstrar a necessidade de ser aplicada a pro-gressividade fi scal com relação ao ITBI e ITCMD. Para tanto, será analisa-da a posição atual do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, bem como a posição doutrinária. Ao fi nal, serão propostas soluções para o problema em questão.1

1 Origem da classifi cação entre impostos reais e impostos pessoais

No Brasil, a distinção entre impostos pessoais e impostos reais já era debatida desde 1975. Durante o julgamento do RE (Recurso

Extraordiná-rio) n. 69.784,2 o Ministro Djaci Falcão mencionou a distinção dos

impos-tos em pessoais e reais, afi rmando que os imposimpos-tos pessoais seriam aqueles em que se ponderam condições individuais do contribuinte, sendo que os impostos reais seriam aqueles que se baseiam unicamente no valor da maté-ria tributável.3

O entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a progressividade fi scal não pode ser aplicada aos impostos reais, busca respal-do na respal-doutrina italiana, o que ocorreu através respal-do voto condutor respal-do

Minis-tro Moreira Alves no Recurso Extraordinário 153.771-0.4

1 O tema objeto deste artigo já foi tratado em Dissertação de Mestrado defendida em 2009 na

Universidade Federal do Pará.

2 Neste julgamento foi decidido que era inconstitucional o adicional progressivo estabelecido pela

legislação do IPTU do Município de Americana, Estado de São Paulo.

3 Voto proferido no RE 69.784, DJ 05.03.75, Relator Ministro Djaci Falcão, p.159.

4 Durante o julgamento do Recurso Extraordinário 153.771-0, foram mencionadas as obras de

Vincenzo Carullo (La Costituzione della Repubblica Italiana, p. 184, Dott. Cesare Zuffi -Editore, Bologna, 1950), Zingali (apud Cocifera, Principii di Diritto Tributario, I, os. 253/254, nota 60, Dott. A. Giuff è, Milano, 1974), Berliri (Principii di Diritto Tributario, I, 2. ed., os. 268/269, Giuff rè Editore, Milano, 1967) e Gianini (Comentario Sistematico alla Costituzione Italiana

(3)

Sobre a classifi cação dos impostos em pessoais e reais, ensina Russo:

Os primeiros trazem sua qualifi cação do fato que visam a alcançar a manifestação de capacidade contributiva projetada no contexto da situação pessoal de seu titular, onde necessariamente e coerentemente, em sede de disciplina positiva, é levado em consideração um complexo de elementos e características que dizem respeito a tal situação.

Os segundos, ao contrário, alcançam o fato índice de capacidade contributiva em si e por si considerado, prescindindo de qualquer referência de ordem subjetiva, de modo que a disciplina que o acompanha tende a não se interessar pelas características do titular do pólo passivo da obrigação tributária. (tradução nossa).5

De acordo com Pessôa, a classifi cação dos impostos em reais e pes-soais foi fruto de um contexto histórico. A Itália, após a unifi cação, teve que solucionar o dilema de como tornar uniforme seu sistema tributário, pois os diferentes reinos possuíam sistemas arrecadatórios distintos, com relação à estrutura, aos tipos de tributos previstos e ao seu peso relativo. Em 1863, Minguetti assumiu a chefi a do governo, tendo realizado refor-mas, dentre as quais, realizou a instituição de um imposto sobre a ricchezza

mobile (riqueza móvel). Durante a discussão dos projetos de reforma

tribu-tária foram apresentadas duas propostas. Uma corrente defendia a introdu-ção de um Imposto sobre a ricchezza mobile (riqueza móvel), semelhante ao que foi feito no sistema da Inglaterra e dos Estados Unidos (em tais países o imposto sobre a renda era um imposto único sobre todas as rendas do contribuinte); a outra corrente defendia que o imposto sobre a ricchezza

mobile (riqueza móvel) deveria ser um imposto sobre as diversas categorias

de renda, disciplinadas, separadamente, uma das outras, tendo prevalecido esta última posição.6

Como ensina Viti de Marco, citado por Pessôa, a opção do legislador pela instituição de imposto sobre a riqueza móvel foi fruto das

preocupa-diretto da Piero Calamandrei e Alessandro Levi, v. I, p. 284, G. Barbèra Editore, Firenze, 1950) que apontariam que a progressividade seria aplicável apenas aos impostos pessoais.

5 “Le prime traggono la loro qualifi cazione dal fatto che esse mirano a colpire la manifestazione

di capacità contributiva proiettata sullo sfondo della situazione personale del suo titolare, onde necessariamente e coerentemente, in sede di disciplina positiva, si tiene conto di un complesso di elementi e profi li facenti capo a tale situazione.

La seconde, invece, colpiscono il fatto indice di capacità contributiva in sé e per sé considerato, a prescindere da qualsiasi riferimento di ordine soggettivo, talché la disciplina che vi si accompagna tende in linea di principio a disinteressarsi dei profi li concernenti il titolare dal lalto passivo dell’obbligazione tributaria.” (RUSSO, Pasquale. Manuale di Diritto Tributario. Parte Generale. Nuova edizione. Milano: Giuff rè, 2007. p. 141-142).

6 PESSÔA, Leonel Cesarino. IPTU, progressividade e impostos reais. Revista Tributária e de

(4)

ções surgidas no período posterior à Revolução Francesa. Preocupados em abolir os privilégios pessoais da velha nobreza e evitar o seu retorno, os re-volucionários defendiam que deveria ser dada preferência à instituição de impostos que incidissem sobre as coisas e não sobre as pessoas.7

A classifi cação dos impostos em reais e pessoais foi fruto de um pro-cesso histórico, em que se buscava tributar não somente a renda da mino-ria, como também, a renda da velha nobreza.

Logo, a distinção entre impostos reais e pessoais em nada modifi ca a possibilidade de ser adotado o Princípio da Progressividade a todos os im-postos, visto que de acordo com o art. 53 da referida Constituição, o siste-ma tributário italiano é inspirado pelo critério da progressividade.8

Oportuno mencionar que a doutrina italiana atual admite a progres-sividade dos impostos reais. Como assevera Russo, há uma certa relativi-zação da distinção entre as duas categorias de impostos (reais e pessoais), sendo que o princípio da progressividade deve ser aplicado aos impostos pessoais, ainda que possam existir tributos reais ou objetivos com alíquota progressiva e, também, alguns tributos pessoais exemplo: Imposto de

ren-da de pessoa jurídica,9 aplicados com alíquotas proporcionais, por razões

específi cas.10

Embora a doutrina italiana tenha avançado sobre o tema, a jurispru-dência pátria e alguns doutrinadores continuam utilizando tal classifi cação com o fi m de vedar a aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva aos impostos denominados de reais, conforme será demonstrado a seguir. 2 Concepções doutrinárias sobre a aplicação do princípio

da capacidade contributiva aos impostos denominados de reais

Sabe-se que a progressividade tem como escopo igualar o sacrifício do ônus fi scal para todos os contribuintes, realizando, assim, o Princípio da Capacidade Contributiva, através de uma tributação justa e equitativa. Nes-se Nes-sentido, leciona Carraza:

7 DE VITI DE MARCO, Antonio. Principi de Economia Finanziaria. Torino, Einaudi, 1934, p.

184-186, Apud PESSÔA, ibidem, p. 96.

8 “Art. 53. Tutti sono tenuti a concorrere alle spese pubbliche in ragione della loro capacità

contribuiva. I sistema tributario è informato a criteri di progressività.”

9 D. P. R n. 915, de 22.12.86 (art. 91).

10 RUSSO, Pasquale. Manuale di Diritto Tributario. Parte Generale. Nuova edizione. Milano:

(5)

É por isso que, em nosso sistema jurídico, todos os impostos, em princípio, devem ser progressivos. Por quê? Porque é graças à progressividade que eles conseguem atender ao princípio da capacidade contributiva. Melhor esclarecendo, as leis que criam in abstrato os impostos devem estruturá-los de tal modo que suas alíquotas variem para mais à medida que forem aumentando suas bases de cálculo. Assim, quanto maior a base de cálculo do imposto, tanto maior deverá ser a sua alíquota.11

O referido autor ensina, ainda, que em relação aos impostos sobre a propriedade, a capacidade contributiva revela-se com o próprio bem, pois a riqueza não provém apenas da moeda, mas também do patrimônio. Se uma pessoa possui um apartamento que vale um milhão de dólares, mas não possua mais nada, mesmo assim terá capacidade contributiva, apenas tal capacidade está imobilizada.12

Com acerto, Andrade afi rma que a classifi cação dos impostos em pessoais e reais13 não elide a possibilidade de se adotar a técnica da

pro-gressividade fi scal para os impostos reais.14

A Constituição Federal não impede a aplicação do referido princípio nos casos de utilização de tributos com fi nalidade extrafi scal. Ao contrá-rio, o tributo pode ter caráter extrafi scal com base em dois vetores: o pri-meiro seria, por exemplo, para garantir a função social da propriedade, sendo que o segundo tipo de progressividade tem amparo no princípio da capacidade contributiva do contribuinte, o que ocorre no caso do IPTU.

Nessa linha, Coêlho ensina que o IPTU admite a progressividade com respaldo em duas matrizes, quais sejam: a matriz da política urbana, cujo fundamento constitucional é assegurar a função social da proprieda-de; e a capacidade contributiva do contribuinte que deriva do art. 145, § 1º da Constituição Federal.15

11 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros,

1999. p. 65-66.

12 CARRAZZA, Roque Antônio. Impostos municipais. Notas taquigráfi cas de aula em 05.04.90.

Centro de Estudo de Extensão Universitária. 10º Curso de Especialização em Direito Tributário. p. 22.

13 Os impostos pessoais são aqueles que levam em consideração as condições individuais do

contribuinte, seja na defi nição do fato gerador, da base de cálculo ou da alíquota. Os impostos reais são aqueles que levam em consideração a matéria tributável.

14 ANDRADE, Valentino de. Os impostos reais e a progressividade fi scal. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 89: 2003, p. 107.

15 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. Rio de Janeiro:

(6)

Machado entende que não existe na Constituição Federal de 1988 qualquer vedação ao emprego do princípio da capacidade contributiva em relação aos impostos reais. Ao contrário, nela existe norma expressa que o preconiza.16

Cabe ressaltar que este posicionamento não é pacífi co na doutrina, pois alguns autores entendem que o princípio da capacidade contributiva não se aplica aos impostos reais.

Barreto possui entendimento no sentido de que a progressão das alí-quotas dos impostos só é admitida nos casos previstos expressamente pela Constituição, pois entende que a Constituição teria escolhido o caminho de disciplinar, expressamente, o texto da progressividade, para evitar abusos do legislador ordinário.17

Entendo que tal posicionamento é equivocado, pois defender que é necessário existir norma expressa estabelecendo a progressividade dos im-postos, signifi ca desconsiderar o Princípio da Capacidade Contributiva como norma vinculante e efi caz.

Segundo Costa, no caso da utilização de tributação extrafi scal, ocorre-rá uma derrogação parcial do Princípio da Capacidade Contributiva. Con-tudo, defende que o legislador não poderá ofender os limites representados pelas garantias mínimas dos contribuintes, como a manutenção do mínimo vital, a vedação ao confi sco e o não cerceamento de outros direitos consti-tucionais.18

Harada apresenta um argumento interessante, pois afi rma que após o

advento da Súmula 539 do STF,19 desencadeou-se um movimento de

pau-latina personalização do imposto de natureza real, acabando por eliminar a nitidez da divisão dos impostos em pessoais e reais, razão pela qual não se-ria mais possível classifi cá-los a priori, impondo-se o exame do fato gerador de cada imposto, concretamente. Contudo, o autor ressalta que o próprio STF, com base em doutrina tradicional, fi rmou a tese de que o IPTU não comporta progressividade fi scal, por ser imposto de caráter real.20

16 MACHADO, Hugo de Brito. Progressividade e seletividade no IPTU. In: PEIXOTO, Marcelo

Magalhães (Coord.). IPTU, aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier Latin, 2002. p. 259.

17 BARRETO, Aires F. Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis – ITBI. In: MARTINS, Ives

Gandra da Silva (Org.). Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 755.

18 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

p. 73.

19 Súmula 539 STF: “É constitucional a lei do Município que reduz o imposto predial urbano

sobre imóvel ocupado pela residência do proprietário, que não possua outro.”

(7)

Logo, todos os impostos, ainda que não permitam uma direta aferição da capacidade contributiva, devem se sujeitar ao referido princípio, na me-dida em que somente através da progressividade será possível gravar mais pesadamente os indivíduos que exteriorizam uma capacidade contributiva mais elevada.

3 Crítica à classifi cação entre impostos reais e impostos pessoais

Não guarda consonância com o texto constitucional o entendimento do Ministro Moreira Alves, no sentido de que a Constituição Federal de 1988 adota a clássica distinção dos impostos em reais e pessoais, conforme mencionado durante o voto proferido no julgamento do RE 153.771-0, trecho abaixo transcrito:

A Constituição, adotando a distinção clássica segundo a qual os impostos podem ter caráter pessoal ou real (é a classifi cação que distingue os impostos em pessoais e reais), visa a que os impostos, sempre que isso seja possível, tenham caráter pessoal, caso em que serão graduados – e um dos critérios de graduação poderá ser a progressividade – segundo a capacidade econômica do contribuinte.21

Evidenciase que o Ministro Moreira Alves, ao mencionar a classifi -cação dos impostos em pessoais e reais, apenas realizou a transposição de uma classifi cação estrangeira, estabelecida dentro de um contexto histórico peculiar. Ou seja, não foram considerados os princípios, objetivos e funda-mentos consagrados na Constituição Federal do Brasil.

Sobre as classifi cações jurídicas, já se manifestou o jusfi lósofo Car-rió, no sentido de que “as classifi cações não são verdadeiras, nem falsas, são úteis ou inúteis”.22

A adoção de classifi cações, pela dogmática jurídica, só tem relevância se existir alguma fi nalidade ou utilidade. Caso contrário, tais classifi cações serão meras distinções desnecessárias e impertinentes.

No presente caso, o Supremo Tribunal Federal e uma parte da dou-trina pátria utiliza uma classifi cação oriunda do Direito Romano,

estabe-21 Voto proferido no RE 153.771-0, p. 529.

22 “Las clasifi caciones no son ni verdaderas ni falsas, son serviciales o inútiles; sus ventajas o

desventajas están supeditadas al interés que guia a quien las formula, y a sus fecundidad para presentar un campo de conocimiento de una manera más fácilmente comprensible o más rica em consecuencias prácticas deseables. Siempre hay múltiples maneras de agrupar o clasifi car un campo de relaciones o de fenómenos; el criterio para decidirse por una de ellas no está dado sino por consideraciones de conveniencia científi ca, didáctica o práctica.” (CARRIÓ, Genaro R.

(8)

lecida em razão de peculiaridades históricas, sem contextualizá-la para o direito brasileiro. No entanto, com a promulgação do Constituição Fe-deral de 1988, fi cou instaurado um Estado Democrático de Direito, ra-zão pela qual não há justifi cação plausível para que a classifi cação entre impostos pessoais e impostos reais seja aceita, no sentido de impedir a adoção da progressividade fi scal.

Com acerto, Carrió ensina que as classifi cações não são dotadas de força perene, pois aceitar que uma classifi cação é eterna é o mesmo que imaginar que a realidade é imutável. Ou seja, não são as novas realidades que devem ser encaixadas nas classifi cações; ao contrário, as novas realida-des, para que possam ser adequadamente explicadas, devem gerar novos conceitos e classifi cações.23

Logo, nenhuma classifi cação pode ser aceita como infalível e per-manente. As classifi cações visam apenas agrupar fenômenos que possuem peculiaridades distintas, sendo que as novas realidades podem provocar mudanças signifi cativas no objeto analisado. Portanto, a distinção entre impostos reais e impostos pessoais é inútil e desnecessária, na medida em que a incidência tributária e seus efeitos sempre recairão sobre um contri-buinte, ou seja, sobre uma pessoa, em face da exteriorização de sinais de riqueza, consoante será demonstrado a seguir.

Por tais motivos, é patente a necessidade de se romper com esta clas-sifi cação, diante da ausência de utilidade, considerando o sistema jurídico brasileiro.

4 Entendimento do Supremo Tribunal Federal

4.1 Análise da construção jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal sobre a aplicação do princípio da capacidade contributiva

O entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva surgiu na vigência da Constituição Federal de 1946.24

23 CARRIÓ, Genaro R. Notas sobre derecho y lenguaje. 3. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1986.

p. 99.

24 “Art. 202 – Os tributos terão caráter pessoal, sempre que isso for possível, e serão graduados

(9)

Através do julgamento do Recurso em Mandado de Segurança (RMS) n. 8.90325 foi analisado o art. 212 da lei de tributos do Município de

Salva-dor (BA) e no caso do RMS 9.56826 foi analisado o art. 175 da lei de tributos

de Juiz de Fora (MG). As referidas leis estabeleciam que a parte proporcional do imposto de indústria e profi ssões deveria ser calculada com base no movi-mento econômico declarado e apurado, segundo a natureza da atividade.

O STF decidiu que o legislador municipal que abandona o critério do imposto fi xo e grava proporcionalmente a receita bruta ou o movimento econômico do contribuinte está tributando conforme a capacidade econô-mica do contribuinte, razão pela qual foi declarada a constitucionalidade das referidas leis.

Posteriormente, ocorreu o julgamento de recursos que tratavam sobre a progressividade fi scal do IPTU (imposto denominado de real pelo STF). Sobre este tema, podem ser constatadas duas fases, uma anterior e a outra posterior à promulgação da Carta Magna de 1988.

Na primeira fase, ocorreu o julgamento do Recurso em Mandado

de Segurança (RMS) 16.798,27 tendo sido admitida a progressividade do

IPTU, mesmo quando a progressividade estava amparada no número total de imóveis do proprietário, e não no valor venal do imóvel.

No entanto, em 1975 tal posicionamento foi modifi cado, através do

julgamento do RE 69.784,28 tendo sido decidido que era inconstitucional

o adicional progressivo estabelecido para o IPTU, através da Lei Munici-pal 614/64 de Americana, Estado de São Paulo, considerando o número de imóveis do proprietário (extensão patrimonial do contribuinte), e não o valor do imóvel.29

Após o advento da Constituição Federal de 1988, o STF manifestou seu posicionamento sobre a aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva de forma injusta e restritiva, vinculando-o somente aos impostos denomina-dos pessoais. O referido posicionamento foi adotado pelo STF durante o

jul-gamento do RE 153.771-0,30 inclusive, de forma mais restritiva em relação

25 STF, Pleno, Relator Ministro Djalma da Cunha Mello, publicado no DJ do dia 17.10.62. 26 STF, Pleno, Relator Ministro Djalma da Cunha Mello, publicado no DJ do dia 28.11.62. 27 STF, Primeira Turma, DJ do dia 05.04.67, Relator Ministro Victor Nunes Leal.

28 STF, Pleno DJ 05.03.75, data da decisão 04.12.74, Relator Ministro Djaci Falcão.

29 Durante o julgamento, o Ministro Djaci Falcão mencionou a distinção entre impostos pessoais

e impostos reais, no sentido de que os impostos pessoais seriam aqueles “em que se ponderam condições individuais do contribuinte”, sendo que os impostos reais seriam aqueles que “se baseiam unicamente no valor da matéria tributável” (p. 159 do voto proferido no RE 69.784).

30 STF, Pleno, DJ 05.09.97, decisão 20.11.96, Relator Ministro Moreira Alves, Ementário

(10)

ao entendimento fi rmado durante o julgamento do RE 69.784, pois neste último caso, foi declarada a inconstitucionalidade da lei que instituiu a pro-gressividade do IPTU em função do número total de imóveis do contribuin-te, sendo que a progressividade com base no valor venal do imóvel era aceita.

No que tange ao ITBI, o Supremo Tribunal Federal, durante o

julga-mento do RE 234.10531 declarou que seriam inconstitucionais as alíquotas

progressivas do ITBI.32

Em 03 de janeiro de 1977 o Supremo Tribunal Federal publicou a Sú-mula n. 589, com a seguinte disposição: “É inconstitucional a fi xação de adicional progressivo do imposto predial e territorial urbano em função do número de imóveis do contribuinte”.

Em que pese a interpretação restritiva realizada pelo STF, o legislador constitucional promulgou a Emenda Constitucional de 29, de 13.09.00, al-terando os termos do § 1º do art. 156, que passou a ter a seguinte redação:

Art. 156 [...]

§ 1º .Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá:

I – ser progressivo em razão do valor do imóvel e;

II – ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e uso do imóvel.

Portanto, através da referida Emenda Constitucional o legislador determinou, expressamente, que a progressividade do IPTU (imposto classifi -cado como real) poderia ser tanto extrafi scal, como fi scal.

A referida Emenda Constitucional deveria promover uma mudança de interpretação constitucional, na medida em que a Constituição passou a ter norma autorizando expressamente a aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva a um imposto denominado de “real”. Porém, não foi isto o que ocorreu.

De maneira contraditória, no dia 09 de outubro de 2003, o STF

pu-blicou as súmulas 65633 e 66834 que tratam, respectivamente, sobre a

in-constitucionalidade das alíquotas progressivas para o ITBI e sobre a incons-titucionalidade do estabelecimento da progressividade para o IPTU, antes da edição da emenda constitucional n. 29/2000.

31 STF, Pleno, DJ 31.03.00, Relator Ministro Carlos Velloso.

32 O recurso tinha como objeto questionar a Lei 11.154/91 do Município de São Paulo.

33 Enunciado da Súmula 656: É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o

imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel.

34 Enunciado da Súmula 668: É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes

da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.

(11)

No entanto, com a edição da referida Emenda Constitucional, fi cou completamente esvaziado e insubsistente o argumento utilizado pelo Su-premo Tribunal Federal, com o fi m de vedar a aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva ao ITBI e ao ITCMD.

Isto porque após a edição da Emenda Constitucional n. 29/00, o re-ferido argumento não poderia mais ser utilizado, pois a emenda mencio-nada estabelece que é possível a progressividade fi scal do IPTU (conside-rado pelo Supremo Tribunal Federal como um imposto real).

Coaduno com a sábia lição de Andrade:

[...] Pode-se concluir que mesmo antes da Emenda de número 29, autorizava o Sistema Positivo Brasileiro a instituição de alíquotas progressivas para o IPTU. Para tanto, bastaria invocar o art. 145, § 1º, da Constituição da República de 1988.

A nova Emenda, assim, cuidou apenas de explicitar a possibilidade do Legislador infraconstitucional manejar a técnica da progressividade fi scal para o IPTU, dês que o faça com base em critérios ou índices que se relacione com o valor do imóvel.35

É patente a gravidade da utilização, pelo Supremo Tribunal Federal, de uma classifi cação desnecessária e inútil (classifi cação entre impostos reais e pessoais), a fi m de subsidiar decisões judiciais que limitam a aplicação de um Princípio Constitucional (Capacidade Contributiva), contrariando va-lores e objetivos consagrados constitucionalmente.

Oportuno mencionar a lição de Oliveira:

Quer se pense, portanto, no princípio como pressuposto da tributação, quer enquanto critério de graduação do tributo, não se poderá conceber um sistema tributário apenas "parcialmente" adequado à capacidade contributiva, ou seja, com somente certo tipo de tributo respeitando a Ordem Constitucional e outros não.36

Ora, se o Supremo Tribunal Federal, através da Súmula n. 668, acatou a possibilidade do IPTU ser progressivo, após a Emenda Constitucional 29, de 2000, representa arraigado positivismo a sua posição em manter a Sú-mula n. 656, visto que tanto o IPTU, como o ITBI, são denominados de impostos reais.

35 ANDRADE, op. cit., p. 115.

36 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário – Capacidade contributiva – Conteúdo e efi cácia do princípio. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 78.

(12)

4.2 Julgamento do Recurso Extraordinário 562.045: “uma luz no fi m do túnel”

Atualmente, tramita perante o STF o RE n. 562045,37 interposto pelo

Estado do Rio Grande do Sul, que trata justamente sobre a possibilidade do estabelecimento de alíquotas progressivas para o ITCMD. Ou seja, in-voca-se novamente o Princípio da Capacidade Contributiva para autorizar o estabelecimento de alíquotas progressivas para um imposto classifi cado como “real”.

Após o voto do Min. Relator Ricardo Lewandowski, mantendo a orientação anterior do STF, isto é, contrária à adoção de alíquotas progres-sivas para “impostos reais”, surgiu uma possibilidade de mudança de inter-pretação, visto que abriu divergência o Ministro Eros Grau, com base nos seguintes argumentos:

Todos os impostos estão sujeitos ao princípio da capacidade contributiva, mesmo os que não tenham caráter pessoal, e que o que esse dispositivo [art. 145, § 1º] estabelece é que os impostos, sempre que possível, deverão ter caráter pessoal.

[...]

Assim, todos os impostos, independentemente de sua classifi cação como de caráter real ou pessoal, podem e devem guardar relação com a capacidade contributiva do sujeito passivo.38

O Ministro Eros Roberto Grau foi acompanhado por mais três votos (Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Ministra Cármen Lúcia Antu-nes Rocha e Ministro Joaquim Benedito Barbosa Gomes), sendo interrom-pido o julgamento pelo pedido de vista do Ministro Carlos Ayres Britto.

Posteriormente, em voto-vista o Min. Ayres Britto seguiu a divergên-cia inidivergên-ciada pelo Min. Eros Grau e proveu o recurso para assentar a cons-titucionalidade do dispositivo questionado. Preliminarmente, registrou

que a alteração do preceito impugnado pelo art. 1º, III, da Lei gaúcha

13.337/2009 não implicaria perda de objeto do extraordinário. Salientou que, embora a novel regra tenha reintroduzido alíquota única, não

bene-37 Através da decisão publicada no DJ do dia 29.02.08, o Pleno do STF reconheceu a existência

de repercussão geral da questão constitucional suscitada no recurso, por entender que a alegação de constitucionalidade da progressividade fi scal do Imposto sobre a Transmissão causa mortis – ITCMD é uma questão relevante do ponto de vista econômico, social e jurídico. Dessa forma, fi cou reconhecida a existência do novo requisito de admissão do Recurso Extraordinário, introduzido no ordenamento jurídico através da Emenda Constitucional 45, de 08/12/2004, que acrescentou o parágrafo § 3º ao inciso III do art. 102 da Constituição Federal, e regulamentado pela Lei n. 11.418/06 que introduziu o art. 543-A, § 1º, no Código de Processo Civil.

(13)

fi ciara os contribuintes que estariam sujeitos a alíquotas progressivamente estabelecidas em patamar igual ou inferior àquele disposto na lei adver-sada, bem como não previra restituição ou compensação no que concer-ne ao recolhimento superior, de modo que o interesse jurídico permaconcer-ne- permane-ceria. No mérito, asseverou que a progressividade de alíquotas do imposto em comento não teria como descambar para o confi sco, porquanto haveria

o controle do teto das alíquotas pelo Senado Federal (CF, art. 155, § 1º,

IV). Ademais, assinalou inexistir incompatibilidade com o Enunciado 668 da Súmula do STF. Por derradeiro, esclareceu que, diferentemente do que ocorreria com o IPTU, no âmbito do ITCMD não haveria a necessidade de emenda constitucional para que o imposto fosse progressivo. Após o voto da Min. Ellen Gracie, que proveu o recurso, pediu vista o Min. Marco

Aurélio. (Fonte: Informativo STF 634).39

Atualmente o referido Recurso Extraordinário está pendente de julga-mento, em virtude do pedido de vistas dos autos pelo Min. Marco Aurélio. Logo, surge novamente a possibilidade do STF mudar seu posicionamento em relação ao tema ora estudado.

5 Método interpretativo construtivo de Ronald Dworkin

Ao elaborar sua Teoria Direito como Integridade Dworkin defende que tal direito estaria sempre apto a abandonar os princípios utilizados no pas-sado, através de interpretação que possua consonância com as exigências atuais da sociedade, permitindo, assim, que o direito evolua de acordo com os valores da comunidade, sem perder a sua integridade.40

Dessa forma, o referido autor afi rma que a integridade é a melhor in-terpretação construtiva das práticas jurídicas.41

O referido autor faz um contraponto entre o conceito de integridade e o conceito de coerência, razão pela qual sustenta que a integridade condena a incoerência de princípios entre os atos do Estado, no sentido de impedir a utilização de determinados princípios para justifi car apenas uma parte de seus atos.42

Integridade, para Dworkin, não é o mesmo que coerência, pois a coe-rência requer a repetição de decisões anteriores, enquanto a integridade

re-39 RE 562045/RS. DJ 04.08.11.

40 DWORKIN, Ronald. O império do direito. Tradução de Jeff erson Luiz Camargo. São Paulo:

Martins Fontes, 2003. p. 492.

41 Ibidem, p. 260-261. 42 Ibidem. p. 264.

(14)

quer que as normas públicas da comunidade sejam criadas e vistas no sentido de expressar um sistema único de justiça e equidade, o que não signifi ca, ne-cessariamente, repetição de decisões. Nesse sentido, o referido autor afi rma que “uma instituição que aceite esse ideal às vezes irá, por esta razão, afastar-se da estreita linha das decisões anteriores, em busca da fi delidade aos

princí-pios concebidos como mais fundamentais a esse sistema como um todo”.43

Ou seja, a interpretação construtiva não busca a coerência no sentido de repetição de decisões, mas sim, busca a evolução dos direitos de acordo com os valores da comunidade. A integridade exige que as normas sejam

consideradas como se o Estado tivesse uma única voz.44

Portanto, Dworkin sustenta que o direito como integridade nega as manifestações do direito como sendo meros relatos factuais voltados ao

pas-sado (Convencionalismo).45

Da mesma forma, não concebe o direito como instrumento do Prag-matismo46 que se direciona ao futuro.

O presente estudo aborda um caso típico da adoção de repetição de decisões anteriores, o que, em tese, garantiria coerência, falhando no que tange à busca pela integridade. Isto porque o Supremo Tribunal Federal adota o argumento de que os impostos reais não podem ser progressivos, pois entende que o Princípio da Capacidade Contributiva não pode ser aplicado com relação a estes impostos.

No entanto, a Emenda Constitucional 29, de 2000, introduziu norma

expressa estabelecendo a progressividade do IPTU.47 Logo, o fato do

Supre-43 Ibidem, p. 264. 44 Ibidem, p. 263.

45 O autor entende que o Convencionalismo limita o alcance do direito que fi caria adstrito às

decisões políticas do passado, o que seria incabível, segundo Dworkin, pois, para este autor, o direito não deve estar fi xado no passado, mas sim, deve acompanhar os valores da comunidade e as exigências sociais. (DWORKIN, ibidem, p. 271-272).

46 “O pragmatismo é uma concepção cética do direito porque rejeita a existência de pretensões

juridicamente tuteladas genuínas, não estratégicas. Não rejeita a moral, nem mesmo as pretensões morais e políticas. Afi rma que, para decidir os casos, os juízes devem seguir qualquer método que produza aquilo que acreditam ser a melhor comunidade futura, e ainda que alguns juristas pragmáticos pudessem pensar que isso signifi ca uma comunidade mais rica, mais feliz ou poderosa, outros escolheriam uma comunidade com menos injustiças, com uma melhor tradição cultural e com aquilo que chamamos de alta qualidade de vida. O pragmatismo não exclui nenhuma teoria sobre o que torna uma comunidade melhor. Mas também não leva a sério as pretensões juridicamente tuteladas.” (DWORKIN, Ronald. O império do direito. Tradução de Jeff erson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 195.)

47 Cabe esclarecer que antes da EC n. 29/00, o sistema jurídico já autoriza a utilização de alíquotas

progressivas para os impostos reais através do Princípio da Capacidade Contributiva (art. 145, § 1º, CF).

(15)

mo Tribunal Federal manter as súmulas 656 e 668, demonstra, claramente, a incoerência entre princípios, bem como a opção pela ótica estritamente positivista.

Portanto, fi ca evidenciada a necessidade de ser adotada uma concep-ção única de direito que garanta justiça e equidade, bem como, garanta a efetividade aos objetivos e valores garantidos na Constituição Federal de 1988, os quais devem fi gurar como vetores interpretativos.48

Considerações fi nais

Carta Magna traça objetivos a serem atingidos, sendo que um dos

ob-jetivos fundamentais, previsto no art. 3º da Constituição Federal, é

cons-truir uma sociedade livre, justa e solidária, na qual cada cidadão participe

dos gastos públicos na medida da sua capacidade contributiva. Tais objeti-vos representam diretrizes para a interpretação das normas constitucionais, razão pela qual tal interpretação deve considerar o conteúdo material das normas jurídicas.

Evidencia-se que a Súmula 656 subsiste pela tradição, ou seja, pelo Convencionalismo, como ensina Dworkin. Nesse sentido, o Supremo Tri-bunal Federal, ao editar a Súmula n. 668, aceitou a progressividade fi scal do IPTU, somente após a Edição da Emenda Constitucional n. 29, de 2000, revelando a sua opção pela interpretação estritamente positivista, o que é inconcebível para a construção de um Estado Democrático de Direito.

Diante do exposto, constata-se que está sendo feita uma interpreta-ção restritiva do Princípio da Capacidade Contributiva, resultando numa tributação regressiva e injusta. Tal fato representa um entrave à construção do Estado Democrático de Direito, bem como à efetivação dos objetivos e fundamentos consagrados constitucionalmente.

Portanto, é perfeitamente cabível a progressividade fi scal com relação ao ITBI e ITCMD, de acordo com o Princípio da Capacidade Contribu-tiva, bem como de acordo com o método interpretativo construtivo de Dworkin, decorrente de sua Teoria Direito como integridade.

48 “A Constituição brasileira de 1988, em seu Título I, dedicado aos princípios fundamentais, abriu

um artigo específi co para as fi nalidades do Estado brasileiro, cuja consecução deve fi gurar como vetor interpretativo de toda a atuação dos órgãos públicos. É o que decorre do art. 3º e seus incisos [...]”. (BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5. ed., rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 140.)

(16)

Referências

ANDRADE, Valentino de. Os impostos reais e a progressividade fi scal. Revista Dialética de Direito

Tributário, São Paulo, n. 89: 2003.

BARRETO, Aires F. Imposto sobre a transmissão de bens imóveis – ITBI. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Org.). Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2001.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003.

CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros, 1999.

______. Impostos municipais. Notas taquigráfi cas de aula em 05.04.90. Centro de Estudo de Extensão Universitária. 10º Curso de Especialização em Direito Tributário.

CARRIÓ, Genaro R. Notas sobre derecho y lenguaje. 3. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1986. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

COSTA,Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. DWORKIN, Ronald. O império do direito. Tradução de Jeff erson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

MACHADO, Hugo de Brito. Progressividade e seletividade no IPTU. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães (Coord.). IPTU, aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier Latin, 2002.

OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário – Capacidade contributiva – Conteúdo e

efi cácia do princípio. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998.

PESSÔA, Leonel Cesarino. IPTU, progressividade e impostos reais. Revista Tributária e de Finanças

Públicas, São Paulo, Revista dos Tribunais, ano 13, n. 60, jan./fev. 2005).

RUSSO, Pasquale. Manuale di Diritto Tributario. Parte Generale. Nuova edizione. Milano: Giuff rè, 2007.

Referências

Documentos relacionados

O tema proposto neste estudo “O exercício da advocacia e o crime de lavagem de dinheiro: responsabilização dos advogados pelo recebimento de honorários advocatícios maculados

de professores, contudo, os resultados encontrados dão conta de que este aspecto constitui-se em preocupação para gestores de escola e da sede da SEduc/AM, em

Introduzido no cenário acadêmico com maior ênfase por Campos (1990), o termo accountability é de conceituação complexa (AKUTSU e PINHO, 2001; ROCHA, 2009) sendo

A variável em causa pretende representar o elemento do modelo que se associa às competências TIC. Ainda que o Plano Tecnológico da Educação preveja a conclusão da

Neste estágio, assisti a diversas consultas de cariz mais subespecializado, como as que elenquei anteriormente, bem como Imunoalergologia e Pneumologia; frequentei o berçário

As análises serão aplicadas em chapas de aços de alta resistência (22MnB5) de 1 mm de espessura e não esperados são a realização de um mapeamento do processo

Quanto às suas desvantagens, com este modelo, não é possível o aluno rever perguntas ou imagens sendo o tempo de visualização e de resposta fixo e limitado;

Estudos sobre privação de sono sugerem que neurônios da área pré-óptica lateral e do núcleo pré-óptico lateral se- jam também responsáveis pelos mecanismos que regulam o