MANUAL DE
PSICOPATOLOGIA
Elie Cheniaux Jr.
M é d ic o . D o u to r e m P siq u ia tria p ela U n iv e rs id a d e F ed eral d o R i o de J a n e iro (U F R J). P ro fe ss o r-A d ju n to de P siq u ia tria da F acu ld ad e de C iên cias M éd ica s (F C M ) da U n iv e rs id a d e d o E stad o d o R i o de J a n e iro (U E R J).P ó s -D o u to r a n d o n a Á re a de N e u ro c iê n c ia C o m p u ta c io n a l d o P ro g ra m a de E n g e n h a ria d e Sistem as e C o m p u ta ç ã o — C O P P E / U F R J .
C a n d id a to d o In s titu to d e E n s in o de P sicanálise da S o cied ad e P sican alítica d o R i o de J a n e iro (S P R J). S u p e rv iso r de E q u ip e C lín ic a d o In s titu to de P siq u ia tria da U n iv e rsid a d e F ed eral d o R i o de J a n e iro (IP U B -U F R J ).
NOTA DA EDITORA: A área da saúde é um campo em constante mudança. As normas de segurança padronizadas precisam ser obedecidas; contudo, à medida que as novas pesquisas ampliam nossos conhecimentos, tomam-se necessárias e adequadas modificações terapêuticas e medicamentosas. O autor desta obra verificou cuidadosamente os nomes genéricos e comerciais dos medicamentos mencionados, bem como conferiu os dados referentes à posologia, de modo que as informações fossem acuradas e de acordo com os padrões aceitos por ocasião da publicação. Todavia, os leitores devem prestar atenção às inform ações fornecidas pelos fabricantes, a fim de se certificarem de que as doses preconizadas ou as contra-indicações não sofreram modificações. Isso é importante, sobretudo em relação a substâncias novas ou prescritas com pouca freqüência. O autor e a editora não podem ser responsabilizados pelo uso impróprio nem pela aplicação incorreta do produto apresentado nesta obra.
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Agradecimentos
A g ra d e ç o aos P rofessores A d e m ir P acelli F erreira, Iso J o rg e T e ix e ira , J e r s o n Laks, L e o p o ld o H u g o F ro ta, M a rc o A n tô n io A lves Brasil,
M ig u e l C h a lu b e P a u lo R o b e r t o C h av es P avão,
Prefácio
Observa-se que boa parte dos psiquiatras, hoje em dia, pouco se interessa p o r psicopatologia, apresentando um raciocínio mais ou m enos assim: “E perda de tem po dis- tinguir-se um a idéia delirante de um a idéia deliróide, ou um a alucinação verdadeira de um a pseudo-alucinação, já que os antipsicóticos irão atuar sobre esses sintomas do mesm o je ito .”
Esse espírito parece refletir-se nos critérios diagnósticos dos sistemas classificatórios psiquiátricos atuais — DSM -IV* e C ID -10.** Neles, embora sejam listadas as alterações ca racterísticas de cada transtorno mental, não há um a preocu pação em definir precisamente os sinais e sintomas, nem em explicar com o eles devem ser reconhecidos na prática.
Todavia esse aparente descaso quanto à semiologia não é exclusivo da psiquiatria, e o desenvolvim ento de m é todos com plem entares de investigação diagnostica cada vez mais precisos talvez esteja entre as principais causas disso. M uitos cardiologistas, p o r exem plo, já não auscul tam o coração de seus pacientes, pois consideram mais prático solicitar logo u m ecocardiograma.
E m psiquiatria, na grande maioria dos casos, os exames complementares p or enquanto são pouco úteis para a for mulação do diagnóstico, que é em inentem ente clínico. Daí a importância fundamental da semiologia psiquiátrica e da psicopatologia. Além disso, para a criação e utilização das escalas de sintomas, e para o em prego adequado dos crité rios diagnósticos, é necessário conhecer os conceitos psi- copatológicos e saber identificar as alterações nos pacientes.
P o r outro lado, faltam universalidade e uniform idade aos conceitos e à term inologia em psicopatologia. C o m
* Q u a rta edição do sistem a classificatório da A ssociação Psiquiátrica A m ericana. * * D é c im a ed ição da Classificação In te rn a c io n a l d e D o en ças, da O rg an ização M u n d ia l da Saúde.
parando-se os principais textos de psicopatologia, obser va-se, p o r exem plo, que: (1) u m m esm o term o é utiliza do com diferentes sentidos pelos diversos autores; (2) determ inados conceitos são considerados p o r alguns au tores, mas são ignorados p o r outros; e (3) u m m esm o conceito é designado p o r term os diferentes.
Essa falta de consenso, que afeta alguns dos principais tópicos em psicopatologia, irá, inevitavelm ente, refletir- se em qualquer discussão de um caso clínico, prejudicando qualquer argumentação, pela ausência de um a linguagem com um . Isso é bastante nítido em sessões clínicas de ser viços de psiquiatria, com o as que tenho freqüentado nos últim os anos: na U nidade Docente-Assistencial de Psi quiatria da Universidade do Estado do R io de Janeiro (U ERJ) e no Instituto de Psiquiatria da U niversidade Federal do R io de Janeiro (IPUB).
Este m anual constitui um a proposta de síntese e revi são dos conceitos da psicopatologia. Após o estudo dos principais autores, procurou-se produzir u m texto que fosse u m som atório de todos os outros textos, privilegi ando-se, nos casos de divergência entre eles, as form ula ções mais com uns.
E m cada capítulo, além da apresentação das alterações quantitativas e qualitativas de cada função psíquica, há um a introdução psicológica e um estudo de com o essas alterações se m anifestam nos principais transtornos m en tais e, ainda, u m estudo da técnica de exam e daquela função psíquica. Inclui-se tam bém um a discussão sobre descobertas das neurociéncias e formulações teóricas da psicanálise relacionadas à função psíquica estudada.
Este livro é dirigido a alunos — de graduação e pós- graduação — e a profissionais de m edicina (particular m ente psiquiatria), de psicologia e de outras áreas relaci onadas à saúde m ental.
Conteúdo
1 P sico p a to lo g ia : Q u estõ es G erais, 1 Definição de Psicopatologia, 1
O M étodo Fenom enológico, 2 Semiologia Psiquiátrica, 2
2 E n trevista e A n a m n ese P siq u iátrica, 5 A Entrevista Psiquiátrica: Aspectos Gerais, 5 Estrutura e C o nteúdo da Anamnese Psiquiátrica, 5 O Exam e Psíquico, 7
Súmula Psicopatológica, 8 O Exam e Físico, 8
Exames C om plem entares, 8 O Diagnóstico Psiquiátrico, 8 3 A p arên cia, 11
Introdução, 11
Alterações na Aparência, 11
A Aparência nos Principais Transtornos Mentais, 11 4 A titu d e, 13
Introdução, 13
Alterações da A titude, 13 O Exam e da Atitude, 14
A A titude nos Principais Transtornos M entais, 14 5 C o n sciên cia (V igilân cia ), 17
Introdução, 17
Alterações Quantitativas Fisiológicas, 18 Alterações Quantitativas Patológicas, 18 Alterações Qualitativas Fisiológicas, 19 Alterações Qualitativas Patológicas, 19 O Exam e da Consciência (Vigilância), 19 A Consciência (Vigilância) nos Principais
Transtornos M entais, 20 C ontribuições da Psicanálise, 20
C ontribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 21 6 A te n ç ã o , 25 Introdução, 25 Alterações Quantitativas, 25 Alterações Qualitativas, 26 O Exam e da Atenção, 26
A A tenção nos Principais Transtornos M entais, 27 Contribuições da Psicanálise, 28
Contribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 28 7 S e n so p e rce p ç ã o , 29 Introdução, 29 Alterações Quantitativas, 30 Alterações Qualitativas, 30 O Exam e da Sensopercepção, 33
A Sensopercepção nos Principais Transtornos Mentais, 33
Contribuições da Psicanálise, 34
Contribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 34 / 8 M e m ó ria , 37 Introdução, 37 Alterações Quantitativas, 39 Alterações Qualitativas, 41 O Exam e da M em ória, 42
A M em ória nos Principais Transtornos Mentais, 42 C ontribuições da Psicanálise, 44
C ontribuições das N eurociências, 45 9 L in g u a g em , 47 - Introdução, 47 Alterações da Linguagem, 47 Alterações Quantitativas, 48 Alterações Qualitativas, 49 O Exam e da Linguagem, 50
A Linguagem nos Principais Transtornos Mentais, 50 Contribuições da Psicanálise, 51
Contribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 51
10 P en sa m e n to (E x ceto D e lír io ), 53 Introdução, 53
C o n teú d o x i
Alterações Q uantitativas, 54 Alterações Qualitativas, 54 O Exam e do Pensam ento, 56
O Pensam ento nos Principais Transtornos M entais, 56
C ontribuições da Psicanálise, 56
C ontribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 57
11 D e lír io , 59 Introdução, 59
D elírio Prim ário, D elírio Secundário e Idéia Sobrevalorada, 60
Classificação, 61
O Exam e do D elírio, 62
O D elírio nos Principais Transtornos M entais, 62 C ontribuições da Psicanálise, 63
C ontribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 64
12 In telig ên cia , 65 Introdução, 65
Alterações da Inteligência, 66 O Exam e da Inteligência, 66
A Inteligência nos Principais Transtornos Mentais, 67 C ontribuições das N eurociências, 68
13 Im a g in a çã o , 69 Introdução, 69
Alterações da Imaginação, 69 O Exam e da Imaginação, 69
A Imaginação nos Principais Transtornos Mentais, 70 C ontribuições da Psicanálise, 70 14 V o n ta d e , 71 Introdução, 71 Alterações Q uantitativas, 71 Alterações Qualitativas, 72 O Exam e da V ontade, 74
A V ontade nos Principais Transtornos Mentais, 74 C ontribuições da Psicanálise, 75
C ontribuições das N eurociências, 77 15 P r a g m a tism o , 79
O Exam e da Psicom otricidade, 83
A Psicom otricidade nos Principais Transtornos M entais, 83
C ontribuições das N eurociências, 84 17 A fe tiv id a d e, 87
Introdução, 87
Alterações Q uantitativas, 88 Alterações Qualitativas, 89 O Exam e da Afetividade, 90
A Afetividade nos Principais Transtornos Mentais, 90 C ontribuições da Psicanálise, 90
C ontribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 91
18 O rien taçã o A lo p síq u ica , 95 Introdução, 95
Alterações da O rientação Alopsíquica, 95 Alterações Q uantitativas, 96
Alterações Qualitativas, 96
O Exam e da O rientação Alopsíquica, 97 A O rientação Alopsíquica nos Principais
Transtornos M entais, 97
C ontribuições das N eurociências, 98 19 C o n sciên cia d o E u, 99
Introdução, 99
Alterações da Consciência do Eu, 99 Alterações Quantitativas, 100 Alterações Qualitativas, 100
O Exam e da Consciência do Eu, 101
A Consciência do E u nos Principais Transtornos Mentais, 102
C ontribuições da Psicanálise, 102
C ontribuições das N eurociências e da Psicologia Cognitiva, 103
20 P r o sp e c ç ã o , 105
21 C o n sciên cia de M o rb id ad e, 107 Introdução, 107
Alterações na Consciência de M orbidade, 107 O Exam e da Consciência de M orbidade, 107 A Consciência de M orbidade nos Principais
Transtornos M entais, 107 16 P sic o m o tr ic id a d e , 81
Introdução, 81 B ib lio gra fia, 109
Alterações Q uantitativas, 81
Alterações Qualitativas, 82 ín d ic e A lfa b é tic o , 113
MANUAL DE
PSICOPATOLOGIA
CAPÍTULO
PSICOPATO LO G IA: questões gerais
D E F IN IÇ Ã O D E
P S IC O P A T O L O G IA
O term o psicopatologia foi criado p o r Jerem y B enthan, em 1817. Psyché significa alma; páthos, sofrimento ou doen ça; e lógos, estudo ou ciência. N o en tan to , E sq u iro l e Griesinger, com seus trabalhos publicados, respectiva m ente, na França (em 1837) e na Alem anha (em 1845), é que são considerados os criadores da psicopatologia.
A psicopatologia é um a disciplina científica que estu da a doença m ental em seus vários aspectos: suas causas, as alterações estruturais e funcionais relacionadas, os m é todos de investigação e suas formas de manitestação (si nais e sintomas). C om portam ento, cognição e experiên cias subjetivas anormais constituem as formas de m ani festação das doenças mentais.
Segundo Jaspers, “o objeto da psicopatologia é o fe nôm eno psíquico, mas só os patológicos” . C ontudo, a distinção entre o norm al e o patológico em m edicina é bastante imprecisa. Podem os citar pelo m enos três crité rios de norm alidade, todos considerados insuficientes: o T-subj-etiyo^o estatístico e o idealista.
D e acordo com o critério subjetivo de normalidade, está doente quem sofre ou se sente doente. N a síndrom e maníaca, contraditoriam ente, o paciente sente-se m uito bem e, apesar disso, está enferm o. Pelo critério estatísti co — ou quantitativo —, norm al é sinônim o de com um , ou significaj>róxim o à média. E m contraposição a isso, no entanto, a cárie representa um a patologia m uito freqüen te; e um a pessoa que possui u m quoeficiente intelectual
(QI) m uito alto não é considerada doente. Já segundo o critério idealista — ou qualitativo —, norm al é aquilo ade quado a determ inado padrão funcional considerado óti m o ou ideal. A crítica que se faz a esse critério é que ele
se baseia em critérios socioculturais arbitrários, os quais p od em variar de u m local para outro e m odificar-se atra vés do tem po.
A psicopatologia é um a ciência autônom a, e não m e ram ente u m ram o da psicologia. E nquanto esta tem sua origem na filosofia, a psicopatologia nasce com a clínica psiquiátrica. Os fenôm enos mentais patológicos são m ui tas vezes qualitativamente diferentes dos normais. Citando novam ente Jaspers, “a psicopatologia investiga m uitos fatos cujos correspondentes ‘norm ais’ ainda não foram estabelecidos pela psicologia” , e “ é muitas vezes a visão do anorm al que ensina a explicar o norm al” .
A psiquiatria não é um a ciência e, sim, um a especiali dade m édica, cujo fundam ento é a psicopatologia. A psi quiatria representa a aplicação prática da psicopatologia, mas se utiliza tam bém de conhecim entos de outras dis ciplinas científicas.
A psicopatologia, de um a form a geral, está relaciona da a múltiplas abordagens e referenciais teóricos. Para ser preciso, não há apenas um a psicopatologia: são várias. D i daticamente, as psicopatologias p odem ser divididas em dois grupos: as explicativas e as descritivas. As psicopato logias explicatiyas_bas_elam -se em m o d elos teóricos ou achados experim entais, e buscam esclarecimentos quan to à etiologia dos transtornos mentais. Elas po dem seguir um a orientação psicodinâmica (como a psicanálise), cog nitiva, existencial, biológica ou social, entre outras. As psicopatologias descritivas, po r sua vez, consistem na des crição e na categorização precisas de experiências anor mais, com o informadas pelo paciente e observadas em seu com portam ento. Possuem u m caráter semiológico e p ro pedêutico em relação à psiquiatria clínica. Entre as psi cologias descritivas está a psicopatologia fenom enológi- ca. Explicação e descrição não se excluem; na verdade,
2 Psicopatologia: Q uestões G erais
com plem entam -se. Só é possível explicar o que foi an teriorm ente descrito.
O M É T O D O
F E N O M E N O L Ó G IC O
Para Descartes (1596—1650), a apreensão dos objetos percebidos passa necessariam ente pela consciência do sujeito pensante. Im m anuel K ant (1724—1804), p o r sua vez, afirma que experim entam os apenas a superfície das coisas, isto é, os fenôm enos — o que está aparente —, mas não a verdadeira coisa em si. O conhecim ento é, então, o resultado da atividade m ental, que organiza as sensa ções de acordo com categorias apriorísticas, tais com o espaço, tem po, etc.
Foi Lam bert, u m m édico francês, quem , em 1764, criou a palavra fenomenologia, que designou com o “des crição da aparência” . P araE dm u nd Husserl (1859—1938), o criador da corrente filosófica denom inada feno m eno logia, o m éto d o fen o m en o ló g ico é pu ro , descritivo, apriorístico e baseado na apreensão intuitiva dos fenô m enos psíquicos, tais com o se dão na consciência. Tais características m erecem maiores esclarecimentos.
Para a fenom enologia, tudo o que existe é fenôm eno e só existem fenômenos. Fenôm eno é todo objeto apa rente, é o que se apresenta à nossa consciência. Esta pos sui um a intencionalidade, isto é, ela se m ove em direção aos objetos para apreender o fenôm eno: é sempre cons ciência de algo. A consciência é doadora de sentido às coisas, tem o po d er de constituir e criar as essências. A fenom enologia descreve experiências psicológicas subje tivas, e seu objeto é o que aparece na consciência; ela centra-se na vivência das coisas pelo sujeito, e não nas coisas em si. O observador deve prestar atenção aos seus próprios pressupostos, deixando de lado todas as teorias, para evitar que distorçam a observação. A intuição, que é o instrum ento p o r excelência da captação fenom eno- lógica, consiste na com preensão empática das vivências; empatia esta que representa a capacidade de sentir-se na situação de outra pessoa.
A fenom enologia contrapõe-se ao em pirism o, que aceita que o espírito assimile passivamente os objetos, ou seja, que estes o im pressionem com o se ele fosse um a tábua rasa. Já o positivismo, tam bém diferentem ente da fenomenologia, negava qualquer importância à introspec ção. Ele veio influenciar, mais recentem ente, a reflexo- logia e o behaviorismo.
C o ub e aK arlJaspers (1883—1969), filósofo alemão, a aplicação do m étodo lenom enológico na investigação psi quiátrica, a partir de 1913. Segundo ele, a psicopatologia representa um a descrição com preensiva. P or com preen
são entende-se a intuição do psiquism o do outro alcan çada no interior do próprio psiquismo. O m étodo feno m enológico utiliza com o instrum ento a m ente do entre vistador, sua experiência em ocional e cognitiva. Trata- se de m étodo em pírico que enfoca dados subjetivos. As vivências dos pacientes não p odem ser percebidas dire tam ente com o os fenôm enos físicos. Mas, após o relato do paciente (subjetivo), fazemos, p o r m eio da empatia, um a analogia (comparação) com as nossas vivências, e assim podem os com preender a sua experiência subjeti va. A m era observação objetiva de seu com portam ento não perm itiria u m m aior aprofundam ento no fenôm eno psicopatológico. O toco da psicopatologia fenom enoló- gica são, portanto, as vivências subjetivas — conscientes — dos pacientes, descritas pelos próprios. O que está incons ciente não é objeto da fenom enologia. P or fim, a psico patologia fenom enológica não busca explicações teóri cas para eventos psicológicos. Através da redução fen o m e- nológica, os fenôm enos são colocados “entre parênteses” : são descritas as vivências em si, sem a preocupação com as suas origens e conseqüências.
S E M IO L O G IA
P S IQ U IÁ T R IC A
D efine-se a semiologia com o a “ciência dos signos” . E ntende-se com o sinal qualquer estímulo em itido pelos objetos do m undo. Já o signo é u m sinal provido de sig nificado, representa a ligação de u m significante a u m significado.
H á três tipos de signos: os ícones, os indicadores ou índices e os símbolos. N o caso do ícone, há um a sem e lhança entre o significante e o significado; p o r exemplo, o m apa do Brasil representando o nosso País. O indica dor caracteriza-se pela existência de um a relação de con - tigüidade; p o r exem plo, fumaça significando fogo. Os sinais e sintomas clínicos são tam bém indicadores: a fe bre indica a presença de um a infecção. N o símbolo, no entanto, a relação é convencional e arbitrária. P o r exem plo, o n om e Brasil dado ao nosso País, a utilização do term o alucinação para designar determ inada alteração da sensopercepção.
Sem iótica ou semiologia m édica é o estudo dos sinais e sintomas das enfermidades, estudo este que inclui a iden tificação das alterações físicas e mentais, a ordenação dos lenôm enos observados e a formulação de diagnósticos.
Os sinais e sintomas representam os signos da psico patologia e da m edicina em geral. Os sintomas são sub jetivos e aparecem nas queixas do paciente. D o r, o sen tim ento de tristeza e a escuta alucinatória, p o r exemplo, são sintom as. Já os sinais são objetivos, o u seja, são
Psicopatologia: Q u estões G erais 3
verificáveis pela observação direta. Eles pod em ser de tectados p o r outra pessoa, às vezes pelo próprio pacien te. A flexibilidade cerácea, um a fácies de tristeza e o so lilóquio são sinais.
U m a experiência psíquica anorm al possui tanto for ma com o conteúdo. A form a se refere à estrutura em
term os fenom enológicos — p o r exem plo, delírio —, e o conteúdo, ao “colorido” ou “recheio ” da experiência — p o r exem plo, estar sendo perseguido p o r marcianos.
P o r sem iotécnica entendem os os procedim entos es pecíficos e sistematizados de observação e coleta dos si nais e sintomas, assim com o a interpretação destes.
CAPÍTULO
E N T R E V IS T A E A N A M N E S E P S IQ U IÁ T R IC A
A E N T R E V IS T A P S IQ U IÁ T R IC A :
A S P E C T O S G E R A IS
A entrevista psiquiátrica possui três objetivos básicos: a form ulação de um diagnóstico, a formulação de um prognóstico e o planejam ento terapêutico. E a partir da entrevista que se começa a estabelecer, ou não, um a ali ança terapêutica entre o paciente e o m édico.
A entrevista pode se dar em situações m uito diversas: na internação do paciente, que pode ser voluntária ou involuntária; num a consulta no am bulatório; quando o psiquiatra vai responder a um pedido de parecer em um a enfermaria de hospital geral; no dom icílio do paciente; e, até m esm o, em via pública.
Para a entrevista, deve-se preferir u m am biente fecha do, isolado acusticamente e com um a tem peratura agra dável. D eve-se evitar o m áxim o possível que haja in ter rupções. N o início é essencial que o m édico se apresen te, explique o objetivo da entrevista e, se possível, obte nha o consentim ento do paciente. Se não há plena cons ciência de m orbidade p or parte do paciente, é fundam en tal que se entrevistem os familiares — ou outras pessoas que possam prestar informações —, de preferência com a concordância (e a presença) do paciente.
A arte de entrevistar só pode ser adquirida m ediante o treinam ento com um supervisor, e com a prática. Aulas e manuais pouco auxílio trazem. Ensina-se ao aluno como trabalhar com as evidências apuradas, mas é difícil m os trar com o obtê-las. D e qualquer m odo, há algumas re gras básicas que devem ser seguidas:
— N o com eço, deve-se deixar o paciente falar livrem en te, e só depois perguntar de m odo mais específico te mas ou pontos duvidosos.
— É preciso saber quando e com o interrom per o paci ente: sem cortar o fluxo da com unicação, mas sem deixar que a m inuciosidade ou a prolixidade prejudi quem a obtenção da história clínica. Sem pre co n tro lar e dirigir a entrevista.
— As perguntas não devem ser formuladas em um a se qüência m onóton a e mecânica. D evem ser tão infor mais quanto possível.
— Evitar perguntas m uito sugestivas, fechadas, que p o dem ser respondidas com um simples sim ou não: é m elhor perguntar “C om o você está se sentindo?” do que “Você está ansioso?” .
— N ão aceitar jargões fornecidos pelos pacientes, com o “nervoso” , “deprim ido” , “tenho pânico” : pedir que ele explique o que quer dizer com essas palavras. — Certificar-se de que o paciente com preende as p er
guntas: utilizar linguagem acessível, sem term os m é dicos.
E S T R U T U R A E C O N T E Ú D O D A
A N A M N E S E P S IQ U IÁ T R IC A
Os dois com ponentes da avaliação psiquiátrica são: a anamnese e o exame psíquico. A palavra anamnese origi na-se do grego e significa literalm ente rememoração (ana
= novo; mnesis = m em ória). A anamnese psiquiátrica segue, em linhas gerais, o roteiro da anamnese em m ed i cina. E preciso ter em m ente u m roteiro de anamnese, mas este não pode perturbar a espontaneidade da entre vista.
A redação final de um a observação psiquiátrica preci sa ser completa, sem ser sobrecarregada ou repetitiva, mas nunca será totalm ente com pleta e precisa. Dois exam
i-6 E n trevista e A n a m n e se Psiquiátrica
nadores jamais farão a mesma anamnese do m esm o paci ente.
Observa-se, entre os diversos livros de psiquiatria, um a ausência de uniform idade quanto à estrutura da anam nese. Algumas informações podem se adequar a mais de um item da anamnese, cuja divisão é arbitrária, conven cional.
Ite n s da A valiação P s iq u iá tric a
A redação da avaliação psiquiátrica - incluindo a ana m nese e o exame psíquico — pode ser dividida nos se guintes itens: (1) identificação; (2) queixa principal; (3) m otivo do atendim ento; (4) história da doença atual; (5) história patológica pregressa; (6) história fisiológica; (7) história pessoal; (8) história social; (9) história familiar; (10) exame psíquico; (11) súmula psicopatológica; (12) exame físico; (13) exames complementares; (14) diagnós tico sindrôm ico; (15) diagnóstico nosológico; (16) con duta terapêutica.
Id e n tific a ç ã o
A identificação é composta pelos seguintes itens: nom e, data de nascim ento, sexo, estado civil, naturalidade, ní vel de instrução, profissão, etnia, religião, residência, procedência, filiação.
A identificação pode ser de grande auxílio para a for m ulação do diagnóstico. P o r exem plo, o alcoolismo é mais com um em homens; esquizofrênicos em geral não são casados; pacientes com retardo m ental costum am apresentar u m baixo nível educacional; etc.
N a apresentação pública de casos — com o em sessões clínicas —, o n om e pode ser representado pelas iniciais, mas é preferível, para preservar o sigilo, usar u m pseu dônim o.
Q u e ix a P rin c ip a l (Q P )
A Q P , que constitui o foco da história da doença atu al, deve ser sucinta. C onvém relacionar no m áxim o três queixas, de preferência apenas uma.
A Q P é redigida com as palavras do paciente (entre aspas, ou usando sic), devendo ser registrada m esm o que absurda. Caso o paciente não form ule n enhum a queixa, isso tam bém tem que ser apontado.
M o tiv o do A te n d im e n to
O item motivo do atendimento só é necessário quando não há consciência de m orbidade p o r parte do paciente. O seu conteúdo é fornecido p o r outra pessoa: u m fami
liar, vizinho, bom beiro, policial, outro profissional de saúde, etc. São reproduzidas literalm ente as palavras do inform ante.
H is tó ria d a D o e n ç a A tu a l (H D A )
A H D A consta de u m relato sobre a época e m odo de início da doença, a presença de fatores desencadeantes, tratam entos efetuados e o m od o de evolução, o im pacto sobre a vida do paciente, intercorrência de outros sinto mas e as queixas atuais.
Ela é narrada pelo paciente, ou p o r inform antes - no caso de pacientes psicóticos —, ou p o r ambos. Faz-se n e cessário identificar sempre, para cada informação, qual foi a fonte. N a redação da H D A , evitam -se term os técni cos: são utilizadas as palavras do paciente ou do inform an te. Os quadros clínicos são descritos, porém não n o m e ados. A redação deve seguir um a ordem cronológica, m esm o que a narrativa, p o r parte do paciente ou dos inform antes, não tenha sido assim.
São ainda incluídas na H D A inform ações (sobre alte rações psíquicas e físicas) pesquisadas ativam ente pelo en trevistador, m esm o que não tenham sido trazidas espon taneam ente pelo paciente ou inform ante. Fazem parte tam bém da H D A os negativos pertinentes, ou seja, certos sintomas cuja ausência pode ser significativa para a iden tificação da doença ou da fase evolutiva em que esta se encontra. Episódios psiquiátricos anteriores devem ser relatados tam bém aqui, já que estes devem estar relacio nados ao atual, visto que os transtornos mentais são, em geral, crônicos.
E m casos de transtorno de personalidade ou de retar do m ental, será impossível separar H D A e história pes soal, que p od em ser fundidas.
H is tó ria P a to ló g ic a P re g ressa (H P P )
A H P P refere-se a estados m órbidos passados, em ge ral nâo-psiquiátricos, que não m ostrem possuir relação direta ou indireta de causa e efeito com a moléstia atual. Se existir essa relação, eles são incluídos na H D A .
São investigadas principalm ente as seguintes ocorrên cias: enurese, sonilóquio, pesadelos freqüentes, terro r no turn o, sonam bulismo, asma, tartam udez, fobia esco lar, na infância; convulsões ou desmaios; doenças vené reas; outras doenças infecciosas, tóxicas ou degenerati vas; traumatismos cranianos; alergia; intervenções cirúr gicas; hábitos tóxicos (álcool, tabaco, drogas ilícitas); uso de m edicam entos. Faz parte tam bém da H P P a revisão de sistemas, isto é, o questionam ento ju n to ao paciente rela tivo a cada aparelho de seu organism o (cardiovascular, respiratório, etc.).
E n tre v ista e A n a m n e s e Psiquiátrica 7
N a redação da H P P incluem -se todas as doenças im portantes relatadas. N ão se deve listar doenças ausentes, já que não se pode citar todas as que existem, a não ser que tal ausência seja significativa para a formulação do diagnóstico.
H is tó ria F isio ló g ica
São investigados os seguintes elementos relativos à his tória fisiológica: gestação (da mãe), nascim ento, aleita m ento, desenvolvim ento psicom otor (andar, falar, co n trole esfmcteriano), menarca, catamêmos, atividade se xual, gestações, partos, abortamentos, menopausa, padrões de sono e de alimentação.
H is tó ria P essoal
Pode-se optar p o r fundir a H P P , a história fisiológica, a história pessoal e a história social, sob a denom inação de história pessoal. Caso se m antenha a história pessoal com o u m item mais restrito, pesquisam-se as seguintes informações:
— Infância: personalidade, socialização, jogos e brincadei ras, aproveitamento escolar, ansiedade de separação. — Adolescência: desem penho escolar, uso de álcool e
drogas, delinqüência, relacionam entos interpessoais. — Sexualidade: iniciação, preferência, orientação, n úm e
ro de parceiros, freqüência.
— Vida profissional: vocações; estabilidade nos em pre gos; relacionam ento com chefes, subordinados e co legas; desempenho.
— Personalidade pré-m órbida: relacionam entos sociais, interesses, hábitos de lazer e culturais, padrão de h u m or, agressividade, introversão/extroversão, egoísm o/ altruísmo, independência/dependência, atividade/pas- sividade, valores, adaptação ao am biente.
H is tó ria S ocial
Fazem parte da história social informações relativas à moradia — condições sanitárias, pessoas com quem convi ve, núm ero de cômodos, privacidade, características socio- demográficas da região —; situação socioeconômica; carac terísticas socioculturais; atividade ocupacional atual; situa ção previdenciária; vínculo com o sistema da saúde; ativi dades religiosas e políticas; antecedentes criminais.
H is tó ria F a m ilia r
A história familiar abrange dados relacionados a d o enças psiquiátricas e nào-psiquiátricas; ter sido a gravi
dez desejada ou não pelos pais do paciente, separação dos pais, quem criou o paciente; ordem de nascim ento entre os irmãos, diferenças de idade; características de perso nalidade dos familiares, o relacionam ento entre estes e destes com o paciente; atitude da família diante da doen ça do paciente; relacionam ento com o cônjuge e filhos.
O E X A M E P S ÍQ U IC O
O exame psíquico tam bém é cham ado de exame do estado m ental, exame m ental, exame psicopatológico, exame psiquiátrico. Ele começa no prim eiro contato com o paciente, antes de se obterem os dados de identifica ção. O psiquiatra experiente será capaz de realizar a m ai or parte do exame do estado m ental ao m esm o tem po em que com pleta a tom ada da história.
N o m odelo m édico, a história é reconhecida com o subjetiva, enquanto o exame físico é considerado a fonte principal de inform ações objetivas. O exame psíquico é comparável ao exame físico na m edicina geral. Assim, na avaliação psiquiátrica, o que é relatado pelo paciente deve ser incluído na anamnese, enquanto o que é observado pelo exam inador representa o exame psíquico. P ortan to, expressões com o “o paciente refere” são quase sem pre mais apropriadam ente colocadas na história do que no exame psíquico.
M ackinnon & Yudofsky (1988) questionam a objeti vidade do exame psíquico, alertando que não se pode palpar diretam ente a m ente do paciente ou auscultar seus processos de pensam ento da mesm a forma com o se exa m ina o abdôm en ou o tórax do paciente; e que o exame físico tam bém teria elem entos subjetivos. Mas, na ver dade, apenas os elem entos subjetivos relacionados dire tam ente a manobras do exam inador é que são incluídos na descrição do exame físico (por exemplo: dor à palpa ção abdominal, a pesquisa da sensibilidade térmica). Além disso, grande parte das vivências internas, subjetivas, dos pacientes são expressas em seu com portam ento, sua m í m ica ou sua fala, tornando-se assim passíveis de serem observadas e descritas p o r outras pessoas, isto é, tornan do-se objetivas. Jaspers (1913), p o r sua vez, aponta a fal ta de fidedignidade dos relatos de m uitos pacientes: “ ... não só os doentes histéricos não m erecem confiança mas a grande m aioria das autodescrições psicopáticas deve ser considerada de m odo bastante crítico. Os doentes rela tam para serem agradáveis, o que deles se espera, ou por sensação quando notam o interesse” .
N o exame psíquico, são descritas apenas as alterações presenciadas durante a entrevista. P ortanto, na redação do exame psíquico, expressões com o no momento ou du rante a entrevista são redundantes. D e u m m om en to para
8 E ntrevista e A n a m n e se Psiquiátrica
outro, a sintom atologia psiquiátrica pode m udar — com o podem m udar a freqüência cardíaca, a pressão arterial, etc. —, constituindo assim um outro exame psíquico. N os casos em que a sintomatologia é interm itente, o que não é raro com alucinações e com alterações do nível da consciên cia, um exame psíquico isolado pode ser pouco revela dor. U m a possível solução seria to m ar o exame psíquico mais amplo, com preendendo mais de um a observação, com intervalos de horas ou dias entre um a e outra.
N a redação, é conveniente a descrição das condições nas quais se realizou o exame: se no domicílio do pacien te, em consultório ou ambulatório, em quarto de hospi tal, ou num a enfermaria; se havia mais alguém presente.
H á um a influência m útua entre as funções mentais. N a verdade, qualquer subdivisão das funções mentais é arti ficial, e as diversas funções psíquicas são avaliadas de for m a praticam ente simultânea. As funções psíquicas podem alterar-se quantitativa e /o u qualitativamente.
Além do registro das alterações psicopatológicas, faz parte do exame psíquico a descrição das funções mentais preservadas. N ã o devem ser consideradas as possíveis causas dos fenômenos: são apontadas todas as alterações presentes, m esm o que, p o r exemplo, se acredite que elas sejam devidas à medicação em uso. Para a avaliação de algumas funções, com o m em ória, orientação, inteligên cia, etc., são necessárias perguntas mais específicas ou m esm o testes. A redação do exame psíquico deve restrin gir-se a um a descrição dos fenôm enos observados, sem o uso de term os técnicos.
SÚ M U LA P S IC O P A T O L Ó G IC A
Os itens que com põem a súmula psicopatológica são: (1) aparência; (2) atitude; (3) consciência; (4) atenção; (5) sensopercepção; (6) m em ória; (7) fala e linguagem ; (8) pensam ento; (9) inteligência; (10) imaginação; (11) vo n tade; (12) psicom otricidade; (13) pragmatismo; (14) h u m o r e afetividade; (15) orientação; (16) consciência do eu; (17) prospecção; (18) consciência de m orbidade.
Esses mesmos elementos são examinados no exame psí quico. A súmula psicopatológica e o exame psíquico pos suem o m esm o conteúdo, sendo a súmula u m resum o do exame psíquico: a partir de u m exame psíquico bem feito, qualquer outra pessoa terá que form ular a mesma súmula psicopatológica. Além disso, na súmula tom a-se explícita a subdivisão das funções mentais e são utiliza dos term os técnicos.
N ão há uniformidade quanto a uma configuração ideal da súmula, nem quanto ao núm ero ou ordem de apre sentação dos itens. É interessante a tentativa de estimar a intensidade das alterações quantitativas com um a m aior
precisão, prática com um no exame físico: p o r exemplo, “pensam ento acelerado (3 + / 4 + ) ” . E válida tam bém a atribuição de graus de certeza quanto à presença de deter m inada alteração (por exemplo: “alucinações auditivas?”).
O E X A M E F ÍS IC O
Existe um a falsa crença de que o doente m ental sofre menos freqüentem ente de doenças físicas, que são po r isso subdiagnosticadas. M uitos transtornos mentais possuem etiologia orgânica — com o a depressão no hipotireoidis- m o —, ou levam a complicações físicas — po r exemplo, u m quadro de desnutrição em função de perda do apeti te na depressão.
N o exame físico deve ser dada ênfase ao exame n eu rológico e ao do sistema endócrino.
O exame da constituição (morfologia corporal) pode ser incluído no exame físico, na parte da inspeção geral. K retschm er (1921) relacionou os biótipos leptossômico, atlético e displásico à esquizofrenia; o pícnico à psicose maníaco-depressiva; e o atlético à epilepsia. Mas com e teu im portantes falhas m etodológicas em seu trabalho, com o a ausência de critérios rígidos e objetivos para a di ferenciação entre os biótipos, e a criação de novas teorias para explicar as numerosas exceções à sua teoria principal. Apesar disso, as idéias de Kretschm er são ainda bastante valorizadas po r m uitos psiquiatras, os quais talvez tenham um a tendência a se lem brarem mais dos casos que as con firm am do que daqueles que as contradizem .
E X A M E S C O M P L E M E N T A R E S
H em ogram a, bioquím ica sangüínea, sorologia para lues, exame do líquor, neuroim agem cerebral, eletroen- cefalografia, estudos genéticos, dosagens horm onais, tes- tagem neuropsicológica e psicodiagnóstico estão entre os principais exames com plem entares que p o d em ajudar na formulação do diagnóstico psiquiátrico. Todavia, em geral é desnecessária e onerosa a solicitação de u m grande núm ero de exames. Os mais im portantes para cada caso em particular vão ser indicados pelos dados da anamnese e pelos achados dos exames psíquico e físico.
O D IA G N Ó S T IC O P S IQ U IÁ T R IC O
A palavra diagnóstico tem origem grega: significa conhecer
(ou percebei•) dois; distinguir ou reconhecer. Já doença vem do latim dolentia, e significa dor, sofrimento.
As doenças são apenas conceitos, abstrações criadas pelo hom em , que p o d em ser a qualquer m om en to m odifica
E n tre v ista e A n a m n e s e Psiquiátrica 9
das ou descartadas. C onstituem condições relacionadas a desconforto, dor, incapacitação ou m orte, mas que só vão ser consideradas doenças em função de m uitos fatores (sociais, econôm icos, biológicos, etc.).
São levantadas algumas objeções ã formulação de diag nósticos. U m a delas está relacionada à idéia de que cada pessoa é um a realidade única e inclassificável: “não exis tem doenças, mas doentes” . Afirma-se ainda que o diag nóstico é estigmatizante, e que ele apenas serviria para
rotular as pessoas diferentes, perm itindo e legitim ando o
poder médico, o controle social sobre o indivíduo desadapta- do ou questionador.
Mas, entre diagnosticar e reduzir a pessoa que rece beu o diagnóstico a u m rótulo, há um a grande diferen ça. Em bora possua algumas desvantagens e possa ser usa do indevidam ente, o diagnóstico representa um a neces sidade prática na m edicina e na ciência. As finalidades principais do diagnóstico são: com unicação — perm itir um a linguagem co m u m — e previsão (“ diagnóstico é prognóstico”). Além disso, o diagnóstico favorece a in vestigação científica e fundam enta as medidas terapêuti cas e preventivas.
O D ia g n ó s tic o S in d rô m ic o
A síndrom e constitui um a associação de sinais e sin tomas que evoluem em conjunto, provocada p o r m eca nismos vários e dependente de causas diversas.
São exemplos de síndromes: pneum onia, hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, demência, depressão. A es quizofrenia não é um a síndrom e, pois está relacionada a critérios com o curso crônico e ausência de etiologia or gânica. Síndrom e de imunodeficiência adquirida (AIDS), sín drome pré-menstrual, síndrome de dependência de drogas psico- ativas, síndrome orgânica da personalidade, apesar das respec tivas denom inações, não são síndromes, já que o que as caracteriza não é a sintomatologia, mas a etiologia ou o curso.
U m a mesma entidade nosológica pode, em diferentes m om entos, manifestar-se sob a forma de diferentes sín dromes. P or exem plo, a esquizofrenia está associada às síndromes paranóide, catatônica, hebefrênica e apático- abúlica. P or outro lado, um a mesma síndrom e pode es tar presente em diferentes entidades nosológicas. P o r exemplo: a depressão pode ser primária, ou associada ao hipotireoidism o, ou associada ao uso de anti-hipertensi- vos, etc.
E m bora não haja um a identidade de opinião entre os diferentes autores quanto à enumeração das síndromes psi quiátricas, po dem ser listadas as síndromes: de ansiedade; fóbica; obsessiva; compulsiva; de conversão; dissociati- va; hipocondríaca; de somatizaçào; depressiva; maníaca;
de estado m isto (manifestações maníacas e depressivas associadas); delirante (ou paranóide); alucinatória; hebe- frênica (ou desorganizada); catatônica (hipercinética, hipocinética); apático-abúlica; de retardo mental; dem en- cial; de delirium; amnéstica; anoréxica; bulímica; de des- personalização—desrealização. Algumas com binações sin- drômicas são freqüentes: fóbico-ansiosa; obsessivo-com- p ulsiva; d ep ressiv o -an sio sa; h e b e fre n o -c a ta tô n ic a ; hebefreno-paranóide; delirante-alucinatória.
O diagnóstico sindrôm ico baseia-se na súmula psico- patológica, podendo ser considerado tam bém , desde que haja confiabilidade, o relato incluído na H D A das altera ções atuais — não as pretéritas — que não foram detecta das no exame psíquico. C o m o sempre é possível realizar um exame psíquico, m esmo que não haja cooperação por p arte do p ac ie n te, a fo rm ulação de u m diagnóstico sindrôm ico é obrigatória.
E m função da larga m argem de desconhecim ento acer ca da etiopatogenia das doenças mentais e da inespecifi- c id a d e da ação dos p s ic o fá rm a c o s , o d ia g n ó s tic o sindrôm ico em psiquiatria reveste-se de grande im p or tância. N a verdade, basicamente diagnosticamos e trata mos síndromes, e não doenças.
O D ia g n ó stic o N o so ló g ic o
X o s o , do g reg o , significa doença. O d iag n ó stico nosológico baseia-se na anamnese e nos exames psíqui co, físico e com plem entares.
O diagnóstico de um a doença pode seguir o m odelo categorial ou o dimensional. D e acordo com o prim ei ro, adotado pela C ID -1 0 e pelo D SM -IV , as doenças se distinguem da saúde e entre si: a categoria esquizofrenia é
qualitativam ente diferente da categoria transtornos do h u mor e da norm alidade. Já segundo o m odelo dim ensio nal, haveria u m continuum entre a saúde e a doença, a diferença entre ambas seria quantitativa.
U m a classificação nosográfica é baseada ou nos sinto mas, ou então na etiologia. Esta segunda opção é consi derada a ideal, já que, de acordo com o conceito clássi co, um a doença possui causas, alterações estruturais e funcionais, e história natural conhecidas. Causa é qual quer coisa que aum ente a probabilidade de um a doença; pode ser necessária e suficiente, necessária mas não sufi ciente, ou nem necessária nem suficiente.
C o m o o co n h ecim en to a respeito da etiologia das doenças mentais é bastante lim itado, o diagnóstico psi quiátrico é baseado na sintom atologia, o que o torna pouco válido e pouco fidedigno. O term o transtorno, en contrado na C ID -1 0 e no D S M -IV para designar as en tidades nosológicas, é bastante impreciso: é mais especí fico que síndrome, mas não representa doença.
10 E ntrevista e A n a m n e se Psiquiátrica
O D S M -IV caracteriza-se p o r um a abordagem des critiva, não baseada em inferências teóricas; p o r critérios operacionais para o diagnóstico; e p o r um a avaliação multiaxial. Esta tenta contem plar as abordagens sintom a- tológica e etiológica: eixo I — transtornos mentais; eixo II — transtornos de personalidade e do desenvolvim ento; eixo III — distúrbios físicos; eixo IV — estressores psicos
sociais; eixo V — o mais alto nível de funcionam ento adaptativo no ano anterior.
E m 1954, Lem e Lopes já p ropunha o diagnóstico psi quiátrico em três dimensões: (1) a síndrom e, (2) a perso nalidade pré-m órbida — que corresponderia à predispo sição biológica, psicológica ou social — e (3) a constela ção etiológica — fatores causais endógenos ou exógenos.
CAPÍTULO
A P A R Ê N C IA
IN T R O D U Ç Ã O
P ouco foi escrito sobre a aparência nos tratados de psi- copatologia. Encontram -se algumas palavras em Vallejo N ágera (1944), Leme Lopes (1980), Pio A breu (1997), Ey (1988), M ackinnon & Yudofsky (1988) e Sá (1988).
N o exame de paciente psiquiátrico, só podem os o b servar o que está aparente, não oculto. Assim, podería mos chamar de aparência todo o conteúdo do exame psíquico. Mas, no exame psíquico e na súmula psicopa- tológica, o term o aparência tem u m significado bem mais restrito, referindo-se basicamente aos cuidados higiêni cos e estéticos relativos ao corpo (incluindo cabelos, barba, unhas, dentes),, roupas, m aquiagem e adereços (brincos, colares, pulseiras, etc.).
E m geral, a aparência é o prim eiro elem ento observa do no paciente, e o seu exame oferece indicações sobre o estado de diversas funções mentais.
A L T E R A Ç Õ E S N A A P A R Ê N C IA
A aparência de um paciente ou está cuidada, ou então descuidada (desleixada). Neste último caso, ele se apresenta com a hígiènexurporal com prom etida; roupas sujas, ras gadas ou desalinhadas; m au cheiro; cabelos despenteados e excessivamente compridos; barba p o r fazer; dentes es tragados, ausentes; ou unhas sujas e compridas.
U m a outra forma de classificar a aparência seria em: ade quada, bizarra (ou extravagante, ou excêntrica) e exibicio- nista. Denomina-se bizarra a aparência destoante do usual no ambiente do indivíduo, qualitativamente diferente ou apenas exagerada em relação ao padrão da maioria das pes soas. Já a aparência exibicionista caracteriza-se pela excessi va exposição do corpo, sendo apresentada por pacientes com aumento da libido ou com portamento sedutor.
A A P A R Ê N C IA N O S P R IN C IP A IS
T R A N S T O R N O S M E N T A IS
D ep ressão
N a depressão, o desinteresse ou a falta de energia pode inviabilizar os cuidados pessoais.
M ania
A aparência de mulheres maníacas costuma ser mais ou menos assim: roupas m uito coloridas e chamativas, excesso, de maquiagem, perfume em excesso, muitos enfeites, unhas e cabelo às vezes pintados com várias cores diferentes (apa rência bizarra); roupas muito curtas e decotadas (aparência exi bicionista) . Alguns pacientes maníacos, contudo, podem apre sentar uma aparência descuidada, em função de uma intensa agitação, que impede que eles completem qualquer ativida de, inclusive as relativas aos cuidados pessoais.
E sq u iz o fre n ia
N os quadros apático-abúlicos, a aparência é descuida da. N os hebefrênicos, costuma ser bizarra, assim com o em muitos quadros paranóides, em que a aparência reflete a atividade delirante. Vallejo Nágera (1944) cita o uso de condecorações de papelão no peito e de tiaras de papelão na cabeça com o expressões de delírios de grandeza.
D e m ê n c ia
N os casos de'dem ência que cursam com apraxia, fre qüentem ente a aparência está descuidada.
T ra n s to rn o s D isso c ia tiv o s/C o n v e rsiv o s
CAPÍTULO 4
A T IT U D E
IN T R O D U Ç Ã O
N os livros de psicopatologia, pouco espaço foi dedi cado ao estudo da atitude. H á algumas breves referências ao assunto apenas em Valle-jo N ágera (1944), Pio A breu (1997), Ey (1988), M ackinnon & Yudofsky (1988) e Sá (1988). E alguns desses autores fazem certa confusão en tre psicom otricidade e atitude (ou com portam ento).
N a entrevista psiquiátrica, são considerados o relato do paciente (ou de u m familiar) — a partir do qual é elabora da a história — e a observação do com portam ento do paciente — base do exame psíquico. Dessa forma, o com portam ento (ou atitude), n u m sentido amplo — englo bando a fala, os gestos, a m ím ica e os demais m ovim en tos corporais —, seria tudo no exame psíquico. Todavia, parece mais interessante, na súmula psicopatológica, res tringir o term o atitude àquela que está especificamente relacionada ao examinador e à entrevista. Esse, por exem plo, não é o caso da atitude alucinatória, expressão m uito empregada no m eio psiquiátrico. Assim, a atitude alucina tória não constituiria um a alteração da atitude, conside rando o sentido de atitude aqui adotado.
A L T E R A Ç Õ E S D A A T IT U D E
Quase não há term os técnicos para descrever as for mas de atitude, sendo usadas basicamente palavras de uso corriqueiro. Alguns com portam entos p o r parte dos pa cientes são considerados desejáveis, no sentido de contri buírem positivam ente para a realização da avaliação psi quiátrica: atitude cooperante, atitude amistosa, atitude de confiança, atitude interessada. Essas atitudes desejáveis em geral estão relacionadas a um a plena consciência de m o r- bidade.
Seriam basicamente estas as formas de atitude im po r tantes do p o n to de vista sem ioló gico : atitu d e n ã o - cooperante, de oposição, hostil, de fuga, suspicaz, que- relante, reivindicativa, arrogante, evasiva, invasiva, de esquiva, inibida, desinibida, jocosa, irônica, lamuriosa, dramática, teatral, sedutora, pueril, gliscróide, sim ulado ra, dissimuladora, indiferente, m anipuladora, submissa, expansiva, amaneirada; além da reação de últim o m om en to. Essa lista não é fechada e, provavelm ente, não abran ge todas as m aneiras de o do en te se p o rtar diante do m édico. A lém disso, na prática um a mesma atitude pode enquadrar-se em mais de um a categoria.
— A titude não-cooperante: dizer que o paciente não é cooperante é m uito vago, já que há diversas formas de não cooperar.
— A titude de oposição (ou negativista): o paciente se recusa a participar da entrevista.
— A titude hostil: o paciente ofende, ameaça ou agride fisicamente o examinador.
— A titude de fuga: reflete o m edo p o r parte do pacien te.
— A titude suspicaz (ou de desconfiança): “Você é mes m o m édico?” , “H á m icrofones escondidos aqui?” e “P o r que o senhor está perguntando sobre isso?” são perguntas formuladas pelos pacientes que apresentam esse tipo de atitude, a qual costum a estar relacionada a um a atividade delirante.
— A titude querelante: o paciente discute ou briga com o examinador, p o r se sentir prejudicado ou ofendido. — A titude reivindicativa: o paciente exige, de forma in sistente, que aquilo que julga ser seu direito seja cum prido. P o r exemplo: ter alta da internação.
— A titude arrogante: o paciente sente-se superior e trata com desdém o m édico.
14 A titu d e
— Atitude evasiva: o paciente evita responder a certas per guntas, sem se recusar explicitam ente.
— A titude invasiva: o paciente deseja saber sobre a vida pessoal do examinador; m exe, sem pedir autorização, nos objetos deste no consultório.
— A titude de esquiva: o paciente não deseja o contato social.
— A titude inibida (ou contida): o paciente não encara o exam inador, e dem onstra estar pouco à vontade. — A titude desinibida: o paciente apresenta grande faci
lidade quanto ao contato social, não se sente constran gido ao falar até m esm o de sua vida sexual, podendo violar normas sociais e tornar-se inconveniente. P o r exemplo: pode assediar sexualm ente o entrevistador. — Atitude jocosa: o paciente está freqüentem ente fazendo
piadas, ou brincando com as outras pessoas.
— A titude irônica: as piadas e o to m de voz refletem sua arrogância e agressividade.
— A titude lamuriosa: o paciente queixa-se o tem po todo de seu sofrim ento e dem onstra autopiedade.
— A titude dramática: reflete um a hiperem ocionalidade. — Atitude teatral: o paciente parece estar fingindo ou exa gerando, ou querendo chamar a atenção dos outros. — A titude sedutora: o paciente elogia e tenta agradar o
examinador, ou tenta despertar o interesse sexual deste. — A titude pueril: o com portam ento do paciente é com o
o de um a criança (faz pirraça, brinca, chama o m édi co de tio, etc.).
— A titude gliscróide (ou viscosa): o paciente égrudento;
é difícil encerrar a conversa com ele.
— A titude simuladora: o paciente tenta parecer que tem u m sintom a (ou doença) na verdade ausente.
— Atitude dissimuladora: o paciente tenta ocultar u m sin to m a (ou doença) existente, co m o objetiv o, p o r exemplo, de receber alta da internação.
— A titude indiferente: o paciente não se sente sequer incom odado pela entrevista ou pela presença do m é dico.
— A titu d e m anipuladora: o paciente ten ta o brigar o m édico a fazer o que ele, paciente, quer, muitas vezes po r m eio de ameaças ou chantagem emocional. — A titude submissa: o paciente, passivamente, atende a
todas as solicitações do examinador.
— A titude expansiva: o paciente deseja intensam ente o contato social, e trata o m édico com o se fosse íntim o deste.
— A titude amaneirada: o com portam ento é caricatural. P o r exemplo: tratar o m édico de “vossa excelência” , ou curvar-se toda vez em que o vê.
— R eação de últim o m om ento: após intenso negativis m o, quando o exam inador já está desistindo do con tato, o paciente com eça a cooperar com a entrevista.
O E X A M E D A A T IT U D E
O examinador não deve provocar ativamente qualquer atitude no paciente, a qual deve ser espontânea.
A A T IT U D E N O S P R IN C IP A IS
T R A N S T O R N O S M E N T A IS
M an ia
O paciente m aníaco pode apresentar um a atitude ex pansiva, desinibida, jocosa; ou então irônica, arrogante, hostil.
D ep ressão
N a depressão, é com um um a atitude lamuriosa. T o davia, o desinteresse pode levar a um a atitude de indife rença.
E sq u iz o fre n ia
N os quadros em que predom inam os sintomas nega tivos ou na catatonia, pode haver indiferença em relação ao exame. N a catatonia, encontram -se muitas vezes um a atitude de oposição e a reação de últim o m om ento. N os quadros paranóides, observa-se um a atitude suspicaz, hostil, querelante, ou de fuga. E típica da hebefrenia um a atitude pueril.
Delirium, D e m ê n c ia
N o delirium e em quadros de dem ência avançada, pode haver indiferença em relação ao exame, em função da nâo-com preensão do significado deste.
R e ta rd o M en tal
N o retardo m ental é m uito característico u m com por tam ento pueril.
E p ilep sia
N a epilepsia do lobo tem poral, assim com o em o u tros distúrbios cerebrais relacionados a essa região do cérebro, observa-se u m com portam ento gliscróide.
H is te ria
N a histeria sem pre há teatralidade. C ostum am estar presentes tam bém sedução, dramaticidade, simulação, pue rilidade e manipulação.
A titu d e 15
F o b ia S ocial, T ra n s to rn o de
P e rs o n a lid a d e de E v ita ç ã o
A inibição é um elemento fundamental dos quadros de fobia social e do transtorno de personalidade de evitação.
T ra n s to rn o d e P e rs o n a lid a d e
A n ti-so c ia l
O sociopata apresenta u m com portam ento sedutor, m anipulador e hostil.
T ra n s to rn o D e lira n te , T ra n s to rn o de
P e rs o n a lid a d e P a ra n o id e
T ra n s to rn o de P e rs o n a lid a d e
Borderline
N o transtorno delirante e no transtorno de personali- O borderline apresenta um com portam ento m anipula-dade paranoide, a atitude é querelante, reivindicativa ou dor e hostil,
CAPÍTULO
C O N S C IÊ N C IA (vigilância)
IN T R O D U Ç Ã O
E tim o lo g ia
A palavra consciência vem do latim, cum scientia, que, por sua vez, é um a tradução da palavra grega syneidesis. C um scientia significa literalm ente uma ciência acompanha da de outra ciência, ou um a relação cognoscitiva com.
O riginalm ente, a palavra consciência tinha o significa do de consciência moral, que equivale no alemão a Q em ssen,
e, no inglês, a conscience. Só posteriorm ente surgiu o con ceito de consciência psicológica — mais amplo que o concei to de consciência moral, abarcando este —, que correspon de a Bewusstsein, no alemão, e a consciousness, no inglês. Nas línguas neolatinas, com o o português, consciência se refere a ambos os conceitos.
C o n sc iê n c ia P sic o ló g ic a
Segundo Jaspers, consciência é_j3 todo m om entâneo da vida psíquica” . E m outras palavras, constitui um a sín tese ou integração de todos os processos m entais em de term inado m om ento.
As características da consciência psicológica são as se guintes:
— tratase de um a vivência interna e atual; -— está relacionada à distinção eu /n âo -eu ;
— é o conhecim ento (o dar-se conta) que o indivíduo tem de suas vivências internas, de seu corpo e do m undo externo — podendo ser didaticam ente dividi da em consciência do eu e consciência dos objetos; — segundo a fenom enologia, possui intencionalidade
(“to da consciência é sem pre consciência de alg o” [Husserl]), é doadora de significado às coisas;
— é reflexiva, ou seja, o indivíduo tem consciência de que tem consciência, e assim pode refletir sobre os seus conteúdos psíquicos.
S er C o n sc ie n te c o m o u m a Q u a lid a d e
Talvez a consciência psicológica seja m enos um a fun ção psíquica propriam ente dita do que um a qualidade subjetiva que os processos mentais — com o sensopercep- ção, m em ória, imaginação, pensam ento, afeto, vontade — po dem ter, em oposição à qualidade de ser inconsci ente (Alves Garcia, 1942; Bleuler, 1985; Pally & Olds, 1998). U m a visão u m pouco diferente seria a de consi derar a consciência com o um a função m ental que cons titui o palco onde ocorrem as outras funções mentais (Del N ero , 1997).
V ig ilâ n c ia
Vigilância é u m term o criado p o r H ead, em 1923, de finido com o “um a capacidade fisiológica que serve de suporte a um a atividade adaptativa, qualquer que seja a m odalidade desta” .
Trata-se de um a acepção de consciência mais particu lar, que corresponde ao conceito de ativação ou atenção tô nica. Refere-se a um estado de consciência, no sentido neu- rofisiológico. Aqui, estar consciente significa que o indi víduo está vígil, desperto, alerta, com o sensório claro.
L u c id e z d e C o n sc iê n c ia
A lucidez constitui um estado de consciência clara, ou de vigilância plena — a consciência teria um a função ilum inadora quanto aos conteúdos mentais. N a lucidez,
18 Consciência (V igilância)
os processos psíquicos são experimentados com suficiente intensidade; os estímulos são adequadam ente apreendi dos; e os conteúdos mentais possuem nitidez e são clara m ente delimitados e identificados.
E m oposição à lucidez estão o sono e o coma. E ntre esses extremos, há diversos níveis de clareza da consciên cia, o que representa a dimensão vertical da consciência.
C a m p o da C o n sc iê n c ia
O campo (ou am plitude) da consciência refere-se à quantidade de conteúdos que a consciência abarca em de term inado m om ento, e representa a dimensão h o rizo n tal da consciência.
A L T E R A Ç Õ E S Q U A N T IT A T IV A S
F IS IO L Ó G IC A S
As alterações quantitativas da consciência (vigilância), que p odem ser normais ou patológicas, referem -se à in tensidade da clareza das vivências psíquicas.
N o estado norm al, o indivíduo desperto está constan tem ente apresentando oscilações na intensidade de sua consciência, em geral pequenas. H á certa dim inuição no nível de consciência quando o indivíduo está cansado ou sonolento, quando se encontra n u m estado de relaxamen to ou repouso, e quando os estímulos sensoriais externos e internos e os afetos são pouco intensos. H á tam bém um a redução do nível de consciência na transição da vigília para o sono, e vice-versa.
S o n o
O sono pode ser definido com o u m estado de incons ciência do qual a pessoa pode ser despertada p o r estím u los sensoriais. O sono profundo (sem sonhos) constitui u m estado fisiológico de abolição da consciência.
A L T E R A Ç Õ E S Q U A N T IT A T IV A S
P A T O L Ó G IC A S
Alguns autores falam em elevação do nível de consci ência (ou hiperlucidez, ou hipervigilância). N o entanto, esse é u m c o n c e ito b astan te in a d e q u a d o . S egu n d o A lonso-Fernández (1976), a situação de a consciência adquirir características mais intensas que as da consciên cia norm al constitui apenas um a possibilidade teórica, que não tem base empírica. Esse fenôm eno ocorreria na in toxicação p o r alucinógenos (LSD, mescalina, etc.) e p or anfetamina, na mania, no início da esquizofrenia e em auras epilépticas. Haveria u m aum ento de intensidade das
percepções, do afeto, da atividade, da m em ória de evo cação e da atenção espontânea; todavia, isso se daria com prejuízo na capacidade de concentração e de raciocínio, e na m em ória de fixação, além de incoerência, desorga nização e hipopragm atism o.
R e b a ix a m e n to do N ível de
C o n sc iê n c ia
A expressão rebaixamento do nível de consciência refere- se a u m nível de consciência entre a lucidez e o coma. C onstitui um a perda da clareza da consciência: a percep ção do m undo externo tom a-se vaga e imprecisa (aumen ta o limiar para a captação de estímulos externos), havendo ainda um a dificuldade para a introspecção, para a apre ensão do próprio eu.
O rebaixam ento do nível de consciência está relacio nado a u m com prom etim ento difuso, generalizado, do funcionam ento cerebral. Sem pre possui um a etiologia orgânica. O co rre u m déficit cognitivo global. Estão es pecialm ente afetadas as funções de atenção, orientação alopsíquica, pensam ento, inteligência, sensopercepção, m em ória, afeto e psicom otricidade.
Há, entre os diversos autores, um a grande falta de uni form idade quanto à term inologia da classificação dos quadros de rebaixam ento da consciência. U m a opção é dividi-los em: estados confusionais simples e estados con- fuso-oniróides.
E sta d o C o n fu sio n a l S im p les
O estado confusional simples (ou obnubilação* sim ples da consciência) caracteriza-se pela ausência de sin tom as psicóticos. O paciente apresenta hipoprosexia, desorientação no tem po e no espaço, pensam ento em pobrecido e alentecido (às vezes, m utism o), dificuldades de com preensão e de raciocínio, hipoestesia, hipom nesia de fixação e de evocação, apatia e inibição psicom otora (às vezes, estupor).
E sta d o C o n fu s o -o n iró id e
O estado confuso-oniróide** (ou obnubilação oniróide da consciência) caracteriza-se pela presença de sintomas psi cóticos, especialmente ilusões e pseudo-alucinações visu ais (menos freqüentem ente, de outras modalidades senso riais), além de idéias deliróides (muitas vezes, persecutórias).
* N .A .: Obnubilação v e m d o latim , ob + nubilare, q u e significa “p ô r u m a n u v e m na fre n te ” , " e n e v o a r” .