IDENTIFICAÇÃO DE ARRAIAS MARINHAS COMERCIAIS DA COSTA NORTE BRASILEIRA COM BASE EM SEQUÊNCIAS DE DNA MITOCONDRIAL
1 Nadir Carmona 2 Iracilda Sampaio 3 Simôni Santos 4
Rosália Furtado Cutrim Souza
5
Horácio Schneider
RESUMO
Arraias marinhas são bastante exploradas comercialmente na região norte do Brasil, sendo sua pesca realizada principalmente pela frota pesqueira artesanal. Para efeito da estatística pesqueira realizada pelo IBAMA, todas as espécies de arraia são classificadas apenas como “Arraia”, sem vinculação a qualquer categoria taxonômica mais específica. No município de Bragança, terceiro maior produtor de pescado no estado do Pará, pelo menos 10 nomes comuns de arraias são observados nas feiras de peixe: arraia-pedra, bicuda, morcego, carapirá, baté, azeite, jereba, roxa, arraia-jamanta e arraia-pintada. O presente estudo contribui para uma melhor identificação deste recurso pesqueiro, ao gerar seqüências de DNA espécie-específicas para arraias marinhas da costa norte brasileira, a partir de peças frescas comercializadas nas feiras. Com base em 100% de similaridade nas seqüências de DNA do gene mitocondrial 16S, foram diferenciadas pelo menos oito espécies, sendo que seis foram identificadas em nível de espécie (Aetobatus narinari, Dasyatis guttata, Dasyatis giejskesi,
Gymnura micrura, Rhinoptera bonasus) e duas em nível de gênero (Dasyatis sp e Rhinoptera sp.); o oitavo
tipo, a arraia-jamanta, por falta de exemplares de referência não pode ser identificada sequer em nível de gênero. Os resultados demonstram que esta abordagem molecular é uma ferramenta bastante robusta para auxiliar na identificação taxonômica de arraias marinhas da região Norte, e pode ser útil para refinar a coleta de dados para a estatística pesqueira na região.
Palavras-chave: arraias marinhas, DNA mitocondrial, rRNA 16S, região Norte. ABSTRACT
Identification of commercial marine rays from northern Brazil based on mitochondrial DNA sequences
Marine rays are subject to considerable commercial exploitation in Brazil's northern region, where they are targeted mainly by the artisan fishing fleet. In the fisheries statistics compiled by IBAMA, all the different types of ray are classified only as “Arraia”, without reference to a more specific taxonomic category. In the city of Bragança, Pará (the state's third largest fishing port), at least ten different names for marine rays are used in local fish markets: pedra, bicuda, morcego, carapirá, baté, arraia-azeite, arraia-jereba, arraia-roxa, arraia-jamanta, and arraia-pintada. The present study contributes to a better systematic identification of this fishery resource, by generating species-specific DNA sequences for the marine rays of the northern coast of Brazil, from fresh specimens sold in fish markets. Based on 100% similarity in the DNA sequences of the mitochondrial 16S gene, at least eight species were differentiated and seven identified: Aetobatus narinari, Dasyatis guttata, Dasyatis giejskesi, Dasyatis sp., Gymnura micrura,
Rhinoptera bonasus, and Rhinoptera sp. The eighth morphospecies was the arraia-jamanta, which could
not be identified even to genus because of a lack of reference samples. The results show that this molecular approach is an extremely robust tool for the taxonomic identification of the region's marine rays, and may be useful in order to refine the collection of data for the compilation of local fishery statistics.
INTRODUÇÃO
As arraias, assim como cações ou tubarões, pertencem à classe Elasmobranchii e apresentam algumas características anatômicas bem peculiares, como o corpo achatado dorso-ventralmente, boca e fendas branquiais dispostas na região ventral, nadadeiras peitorais grandes e unidas à cabeça e ao tronco, nadadeiras dorsais e caudais reduzidas ou ausentes, presença de espiráculo na região posterior aos olhos (que tem a função de auxiliar no envio de água para as brânquias), e mandíbulas com dentes geralmente em forma de um pavimento, em bandas ou mosaicos (NELSON, 1994).
As raias são recursos pesqueiros com distribuição mundial, predominantemente marinhos e habitantes de águas tropicais. McEachran e de Carvalho (2002) reportam para o Atlântico Ocidental 11 famílias de arraias, arranjadas em 31 gêneros e 74 espécies, sendo 18 espécies referidas como possivelmente ocorrendo na costa brasileira, a maioria já documentada em alguns estudos realizados até o presente nas regiões norte e nordeste.
Pinheiro e Frédou (2004) caracterizaram os recursos pesqueiros desembarcados da frota industrial do Pará e relataram a ocorrência de seis espécies de raia: Aetobatus narinari Euphrasen, 1790; Dasyatis guttata Bloch and Schneider, 1801; Dasyatis geijskesi Boeseman, 1948, Gymnura
micrura Bloch and Schneider, 1801; Narcine brasiliensis von Olfers, 1831 e Rhinoptera bonasus
Mitchill, 1815. Espírito Santo et al (2005) reportaram para o litoral bragantino as espécies Dasyatis
guttata, Dasyatis geijskesi e Gymnura micrura.
Para as águas rasas do litoral maranhense, Nunes et al (2005) relataram a ocorrência de 11 espécies de arraias marinhas: Aetobatus narinari, Dasyatis geijskesi, Dasyatis guttata, Gymnura
micrura, Mobula hypostoma Bancroft, 1831, Narcine brasiliensis, Pristis perotteti Muller and Henle, 1841, Rhinobatos percellens Walbaum, 1792, Rhinoptera bonasus, Urotrygon microphthalmum
Delsman, 1941 e Urotrygon venezuelae Schultz, 1949.
O estudo realizado por Meneses et al. (2005) junto ao desembarque da frota artesanal de Sergipe (Praia de Mosqueiro e Aracaju) reportou a ocorrência de sete espécies de arraias: Aetobatus
narinari, Dasyatis americana Hildebrand and Schroeder, 1928, Dasyatis guttata, Gymnura micrura, Narcine cf. brasiliensis, Rhinobatos percellens e Rhinoptera bonasus.
Yokota e Lessa (2006) registraram a ocorrência de oito espécies de arraias em uma área de berçário no litoral do Rio Grande do Norte: Aetobatus narinari, Dasyatis americana, Dasyatis guttata,
Gymnura micrura, Manta birostris Walbaum, 1792, Narcine brasiliensis, Rhinobatos percellens e Rhinoptera bonasus.
No Estado do Pará foram desembarcadas 1.242 t de arraias marinhas e estuarinas no ano de 2005, sendo 9 t oriundas da pesca industrial e 1.233 t da pesca artesanal; as espécies são usualmente referidos em uma única categoria, “arraia ou raia: várias espécies das famílias Rajidae, Rhinobatidae, Myliobatidae, Gymnuridae, Narcinidae, Dasyatidae” (IBAMA, 2007). Esta falta de detalhamento taxonômico decorre possivelmente do fato de que estes peixes chegam aos portos de desembarque já processados, sem a cabeça e a cauda, dificultando assim uma identificação mais precisa.
O presente estudo teve como objetivo utilizar seqüências de DNA mitocondrial para identificar de forma inequívoca as espécies de arraias marinhas comercializadas nos mercados de peixe da cidade de Bragança, Pará. Com isso, será possível refinar a identificação deste recurso durante a obtenção de dados para as análises estatísticas de desembarque.
MATERIAL E MÉTODOS
Amostras frescas de arraias foram obtidas nos mercados-de-peixe e feiras da cidade de Bragança, Pará (Figura 1) em 2005. Para esta análise foram utilizados 26 espécimes identificados pelos seguintes nomes comuns atribuídos pelos feirantes: arraia-pedra (n = 3), arraia-bicuda (n = 2), arraia-morcego (n = 1), arraia-carapirá (n = 3), arraia-baté (n = 3), arraia-azeite (n = 5), arraia-jereba (n = 3), arraia-roxa (n = 2), arraia-jamanta (n =1) e arraia-pintada (n = 3). Esta amostragem cobre a maior parte da diversidade de arraias comercializadas no mercado local. Para confrontar a identificação
molecular com a morfológica, exemplares inteiros das espécies Aetobatus narinari, Dasyatis
geijskesi, Dasyatis guttata, Narcine brasiliensis, Gymnura micrura e Rhinoptera bonasus, todas de
ocorrência na área (um exemplar de cada), foram obtidos com pescadores ou cedidos pelo Centro de Pesquisa e Gestão dos Recursos Pesqueiros do Litoral Norte - CEPNOR. Estas espécies foram identificadas segundo a chave de identificação de McEachran e Carvalho (2002).
Figura 1 – Localização do município de Bragança, Estado do Pará. Fonte: adaptado de Souza-Filho (2005).
Os tecidos coletados eram congelados ou mantidos em álcool etílico absoluto até o momento das análises moleculares. O DNA total foi extraído a partir de um pequeno fragmento de 50 mg de músculo, usando-se o protocolo padrão fenol-clorofórmio (SAMBROOK et al., 1989), adaptado para microtubos de 1,5 mL. Um fragmento de DNA com cerca de 500 pares de bases de parte do gene mitocondrial 16S foi isolado através da Reação em Cadeia da Polimerase (PCR), usando-se o seguinte par de oligonucleotídeos descritos por Palumbi et al. (1991):
16S L1987 – 5'-GCCTCGCCTGTTTACCAAAAAC-3' e 16S H2609 - 5' CCGGTCTGAACTCAGATCACGT 3'.
As reações de PCR em volume de 25 microlitros foram realizadas em um termociclador programado para as seguintes etapas: um ciclo inicial de desnaturação de 3 min. a 94°C, seguido de 30 ciclos de 30 s a 94ºC para desnaturação, 1 min. a 55ºC para hibridização e 2 min. a 72ºC para extensão; após os 30 ciclos era realizado um ciclo adicional de extensão por 7 min. a 72°C. O seqüenciamento de DNA foi realizado no ABI 377, utilizando-se o método didesoxiterminal (SANGER
et al., 1977), com reagentes do Kit Big Dye (ABI PrismTM Dye Terminator Cycle Sequencing Reading Reaction – Applied Biosystems).
As 32 seqüências de 16S obtidas (26 espécimes do mercado e 6 espécies de referência) foram editadas e alinhadas no BioEdit (HALL, 1999), gerando-se uma base de dados com 450 sítios considerando-se os indels (deleções ou inserções colocadas pelo programa de alinhamento). Através do programa MEGA4 (TAMURA et al., 2007) construiu-se uma matriz de divergência nucleotídica com base no algorítimo de Kimura 2-parâmetros (KIMURA, 1980) e um cladograma de agrupamento de vizinhos (SAITOU; NEI, 1987). O critério para identificação inequívoca em nível de espécie foi baseado em uma similaridade de 100% com as seqüências de DNA das espécies da área
previamente identificadas com base em morfologia. Adicionalmente, as seqüências também foram checadas contra o GenBank, através do programa BLAST (ALTSCHUL et al., 1997), para verificação dos níveis de similaridade com espécies registradas naquela base de dados. Todas as seqüências de 16S geradas foram depositadas no Genbank.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com base na análise realizada é possível demonstrar que pelo menos oito espécies de arraias marinhas são comercializadas nos mercados da cidade de Bragança, Pará. Cinco espécies são concordantes com os espécimes adultos usados como referência na comparação, e três são claramente distintas pela análise de DNA, que por falta de espécimes de referência não foi possível identificar a que espécie pertencem exatamente. O cladograma apresentado na Figura 2 mostra os oito ramos claramente distintos e, na Tabela 1, a matriz de divergência nucleotídica complementa esta interpretação.
Figura 2 – Cladograma obtido para raias a partir de seqüências de DNA do gene mitocondrial 16S, usando-se o método de agrupamento de vizinhos. Os asteriscos indicam os ramos onde a similaridade nas seqüências de DNA foi de 100% (0,0% de divergência na Tabela 1). Divergências nucleotídicas são mostradas nos ramos de Dasyatis, Rhinoptera e Jamanta x Rhinoptera. Todas as fotos foram obtidas pelos autores do trabalho.
Tabela 1 – Matriz de divergências nucleotídicas par-a-par obtida a partir de seqüências do gene mitocondrial 16S em arraias, usando o método de Kimura 2-parâmetros (valores em percentuais). Foram considerados como sendo da mesma espécie os que não apresentaram qualquer diferença na seqüência de DNA (negrito).
Através da análise de DNA confirma-se a ocorrência das espécies Aetobatus narinari,
Dasyatis geijskesi, Dasyatis guttata, Gymnura micrura e Rhinoptera bonasus, na costa norte
brasileira. Os três ramos adicionais da árvore correspondem aos tipos denominados de arraia-pedra - arraia-azeite ou arraia-roxa – e arraia-jamanta. A espécie Narcine brasiliensis, de ocorrência comprovada no desembarque da pesca no Pará (PINHEIRO; FRÉDOU, 2004), não foi registrada em nossa amostragem de mercado, indicando que esta espécie não é comumente comercializada para consumo.
A identificação molecular e sua utilização para o aprimoramento da coleta de dados no desembarque podem ser resumidas da seguinte maneira:
Aetobatus narinari e Gymnura micrura
Na associação dos nomes vulgares com os nomes científicos verifica-se que A. narinari e G.
micrura poderão ser facilmente identificadas nos desembarques através de seus nomes comuns. Em
nossa análise todas as amostras chamadas de arraia-pintada são Aetobatus narinari, assim como todas as amostras denominadas de arraia-baté são da espécie G. micrura. As manchas brancas arredondadas da arraia-pintada, assim como a parte ventral de cor amarelo intenso da arraia-baté, são marcas muito características destas duas espécies que podem orientar a identificação dos indivíduos.
Dasyatis
Três amostras apontadas pelos comerciantes como arraia-jereba foram identificadas com sendo D. guttata. Por sua vez, aquelas chamadas de carapirá (3), bicuda (2) e arraia-morcego (1) mostraram 100% de similaridade com D. geijskesi. Entretanto, arraia-pedra corresponde possivelmente a uma terceira espécie de Dasyatis, por causa da grande similaridade nas seqüências de DNA com D. guttata e D. geijskesi. Como pode ser visto no cladograma (Figura 2), arraia-pedra agrupa com D. guttata e D. geijskesi, e a divergência nucleotídica variando entre 2,5 a 3,7% em relação a estas duas espécies (Tabela 1), é da mesma ordem de magnitude da divergência entre D.
guttata e D. geijskesi (2,7%). A melhor similaridade de arraia-pedra com seqüências do Genbank,
(7%) é com D. dipterura do Pacífico (AY836583), o que estaria de acordo com nossa sugestão de que arraia-pedra pertence ao gênero Dasyatis.
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 1 Dasyatis guttata 17 2 Jereba 120, 121, 122 0 3 Dasyatis giejskesi 166 2,7 2,7 4 Carapira 101, 165, 167 2,7 2,7 0 5 Bicuda 116, 168 2,7 2,7 0 0 6 Morcego 169 2,7 2,7 0 0 0 7 Pedra 105, 106, 110 2,5 2,5 3,7 3,7 3,7 3,7 8 Jamanta 130 9,5 9,5 8,7 8,7 8,7 8,7 9,6 9 Rhinoptera bonasus 54 9,8 9,8 10,1 10,1 10,1 10,1 9,6 6,3 10 Roxa 82 9,8 9,8 10,1 10,1 10,1 10,1 9,6 6,3 0 11 Azeite 115, 109 9,8 9,8 10,1 10,1 10,1 10,1 9,6 6,3 0 0 12 Roxa 111 9,3 9,3 9,3 9,3 9,3 9,3 9,6 5 2 2 2 13 Azeite 97, 114, 116 9,3 9,3 9,3 9,3 9,3 9,3 9,6 5 2 2 2 0 14 Gymnura micrura 14 13,9 13,9 14,8 14,8 14,8 14,8 14,8 14,2 12,1 12,1 12,1 12,4 12,4 15 Bate 100, 102, 112 13,9 13,9 14,8 14,8 14,8 14,8 14,8 14,2 12,1 12,1 12,1 12,4 12,4 0 16 Aetobatus narinari 103 15,1 15,1 14,8 14,8 14,8 14,8 14,8 12,9 14,4 14,4 14,4 14,1 14,1 14,4 14,4 17 Pintada 117, 170, 171 15,1 15,1 14,8 14,8 14,8 14,8 14,8 12,9 14,4 14,4 14,4 14,1 14,1 14,4 14,4 0 18 Narcine brasiliensis 11 23,0 23,0 22,3 22,3 22,3 22,3 22 20,4 20,4 20,4 20,4 20,1 20,1 22 22 22,4 22,4 Matriz de divergências Espécies
Os dados do presente estudo mostram então que, para efeito de estatística de desembarque,
D. guttata (jereba) e D. geijskesi (bicuda, morcego e carapirá) poderiam ser identificadas através de
seus nomes comuns. Entretanto, considerando a presença desta terceira espécie de Dasyatis e também em função da grande similaridade morfológica na cor marrom do couro dos indivíduos, sugere-se um estudo mais refinado em busca de características morfológicas adicionais na pele ou no aspecto da carne que possam discriminar melhor os tipos de Dasyatis desembarcados.
Com relação ainda a esta terceira espécie de Dasyatis, a literatura reporta para a costa norte brasileira a ocorrência de D. americana e D. say (MCEACHRAN; CARVALHO, 2002), embora estas não constem nas listas geradas pelos estudos até agora realizados na área (PINHEIRO; FRÉDOU, 2004); (ESPIRITO SANTO et al., 2005); (NUNES et al., 2005). D. americana é referida para a costa nordeste do Brasil no levantamento que Meneses et al. (2005) realizaram no desembarque da frota artesanal de Sergipe (Praia de Mosqueiro e Aracaju), e no estudo de Yokota & Lessa (2006) sobre áreas de berçário de arraias no litoral do Rio Grande do Norte. Fica em aberto então a confirmação desta terceira espécie de Dasyatis do litoral bragantino.
Rhinoptera
McEachran e Carvalho (2002) apontam R. bonasus como a única espécie deste gênero para a costa norte brasileira, e esta tem sido a única referida nos vários estudos até agora realizados no litoral norte e nordeste (PINHEIRO; FRÉDOU, 2004); (NUNES et al., 2005); (MENESES et al., 2005); (YOKOTA; LESSA, 2006).
O presente estudo, entretanto, indica a ocorrência no litoral bragantino de uma segunda espécie de Rhinoptera além de R. bonasus. Os seis espécimes denominados pelos feirantes como arraia-azeite (4) e arraia-roxa (2) dividiram-se em dois grupos no cladograma (Figura 2): dois espécimes de “azeite” (109 e 115) e um de “roxa” (82) são 100% similares a R. bonasus, enquanto os demais (“azeite” 97, 114 e 116 e “roxa” 111) agruparam em um ramo a parte, que mostra 2% de divergência nucleotídica em relação a R. bonasus (Tabela 1).
Curiosamente, McEachran e Carvalho (2002) apontam R. brasiliensis para o Atlântico ocidental, com ocorrência no Golfo do México, Caribe e sul do Brasil. Se esta é a espécie observada no presente estudo, somente uma análise futura mais detalhada com espécimes adultos poderá esclarecer.
Arraia-jamanta
Jamanta é a arraia de maior porte da costa brasileira, com o disco de alguns exemplares da espécie Manta birostris chegando a atingir até 7 m de largura (MCEACHRAN; CARVALHO, 2002). Uma segunda espécie da costa brasileira também conhecida com este nome é Mobula hypostoma. Para a presente análise apenas uma amostra foi obtida no mercado de Bragança, mas por falta de exemplar adulto de referência não foi possível comprovar a qual das duas espécies acima mencionadas esta amostra pertence.
Em termos de similaridade genética com as demais arraias do presente estudo, jamanta apresenta maior proximidade com Rhinoptera do que com os demais gêneros (Figura 2). A divergência nucleotídica entre jamanta e Rhinoptera é de 5-6% (Tabela 1), enquanto entre jamanta e demais exemplares do estudo é de 9% ou superior. A pesquisa no GenBank também não revelou nenhuma seqüência que possa ajudar na identificação desta arraia-jamanta analisada, ficando em aberto sua identificação taxonômica.
Narcine brasiliensis
Como já mencionado, N. brasiliensis, conhecida na região como arraia-elétrica, não foi encontrada entre os espécimes comercializados nos mercados de Bragança. Esta arraia foi referida no desembarque da pesca industrial do Pará (PINHEIRO; FRÉDOU, 2004), assim como nos levantamentos realizados no litoral do Maranhão (NUNES et al., 2005), Sergipe (MENESES et al., 2005) e Rio Grande do Norte (YOKOTA; LESSA, 2006). Sua ausência na amostragem indica que
CONCLUSÕES
O presente estudo gerou seqüências de DNA mitocondrial do gene 16S para fragmentos de 26 exemplares de arraias marinhas comercializadas nos mercados de peixe de Bragança, Pará e, com base em uma similaridade de 100% nas seqüências de DNA, esta análise mostrou que é possível discriminar pelo menos oito espécies diferentes. Embora arraia-elétrica não apareça entre as arraias vendidas para consumo, pode também ser identificada separadamente nos desembarques.
Esta análise, embora preliminar, significa um avanço para identificação de arraias marinhas, aprimorando a coleta de dados para a estatística da pesca, e, quando necessário, orientando o manejo de estoques específicos. Com base neste estudo, pelo menos cinco categorias taxonômicas, três em nível de espécie e duas em nível de gênero, já poderiam ser criadas com segurança com base somente nos nomes vulgares e morfologia do material desembarcado.
Em nível de espécie:
Gymnura micrura - arraia-baté: Aetobatus narinari - arraia-pintada: Narcine brasiliensis - arraia-elétrica
Em nível de gênero:
Dasyatis - arraia-jereba, arraia-pedra, arraia-bicuda, arraia-morcego, arraia-carapirá Rhinoptera - arraia-azeite, arraia-roxa
AGRADECIMENTOS
Ao CEPNOR, pela cessão de exemplares de arraias das espécies Dasyatis geijskesi,
Dasyatis guttata, Narcine brasiliensis e Gymnura micrura.
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