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Preditores da Aprendizagem da Leitura e da Escrita: Comparação entre dois testes de consciência fonológica utilizados em fase pré-escolar

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO

PREDITORES DA APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA:

COMPARAÇÃO ENTRE DOIS TESTES DE CONSCIÊNCIA

FONOLÓGICA UTILIZADOS EM FASE PRÉ-ESCOLAR

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

Bruno Dias Martins

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro Orientadora: Professora Doutora Ana Paula Vale

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

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UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO

PREDITORES DA APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA:

COMPARAÇÃO ENTRE DOIS TESTES DE CONSCIÊNCIA

FONOLÓGICA UTILIZADOS EM FASE PRÉ-ESCOLAR

Dissertação apresentada pelo aluno Bruno Dias Martins, na Universidade da Trás-os-Montes e Alto, para obtenção do grau de Mestre em Psicologia Clínica, sob orientação da Professora Doutora Ana Paula Simões do Vale.

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Agradecimentos

Agradeço à minha orientadora, a Professora Doutora Ana Paula Vale, que com a sua sabedoria, rigor e paciência sempre me encorajou a enfrentar os desafios e os obstáculos colocados pela realização deste trabalho.

Agradeço também, às Directoras, Educadoras de Infância e Professoras, das Escolas e Jardins-de-Infância onde foram recolhidos os dados, toda a simpatia e disponibilidade com que sempre me receberam, mesmos quando interferia nas suas aulas, e pela amabilidade com que me disponibilizaram o seu espaço e o seu tempo.

Para as crianças que participaram no estudo quero agradecer profundamente por me terem contagiado com a sua alegria que sempre me deu força para continuar. Obrigado por sempre se empenharem na realização das tarefas, mesmo quando elas exigiam muito esforço e perseverança.

Às minhas amigas, Ana Rita, Rita e Rosana, a minha gratidão por partilharem comigo as suas experiências, pelo seu apoio e solidariedade em todos os momentos.

Aos meus pais e irmão agradeço todo o apoio, ajuda e carinho com que sempre me envolveram. Obrigado por todos os sacrifícios a que se sujeitaram para me permitir concluir esta etapa. É com alegria que vos dedico este trabalho.

Quero agradecer profundamente à Andreia toda a sua dedicação, carinho e apoio incondicional. Foi a sua energia e capacidade de mobilização que me deu a força para ultrapassar os momentos de maior fragilidade. Sem a sua ajuda e companheirismo não teria sido possível, e é por isso que este trabalho também é seu.

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Resumo

O presente trabalho teve como objectivo verificar qual de entre dois testes de consciência fonológica, usados com crianças pré-leitoras, é mais potente para predizer os progressos alfabéticos ulteriores. Na primeira parte do trabalho foi realizada uma revisão da literatura científica acerca da relação entre o desenvolvimento da consciência fonológica e a aprendizagem da leitura/escrita. Em seguida são discutidas as implicações dessa relação para a avaliação das capacidades metafonológicas nas crianças pré-leitoras. Foram também revistos diversos estudos que se dedicaram a avaliar quais as tarefas metafonológicas que melhor predizem o desempenho ulterior em leitura e na escrita. A segunda parte é um estudo empírico longitudinal, elaborado a partir do enquadramento teórico anterior, com o objectivo de comparar o potencial preditivo de dois testes metafonológicos (Teste de Detecção Mesma-Diferente e Teste de Detecção do Intruso) no desempenho ulterior em leitura/escrita. Os resultados mostraram que o Teste de Detecção Mesma-Diferente tem um melhor potencial para predizer os progressos alfabéticos ulteriores. O conhecimento de letras mostrou também ter um forte potencial preditivo da leitura de palavras e pseudo-palavras, o que não se verificou com as capacidades cognitivas gerais. São discutidos possíveis explicações e implicações dos resultados verificados.

Palavras-chave: consciência fonológica, testes metafonológicos, aprendizagem de leitura e da escrita;

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Abstract

This study aimed to examine which of two tests of phonological awareness, used with pre-readers, are the most robust for predicting the subsequent alphabetic progress. The first part of the work consists of a review of the scientific literature on the relationship between phonological awareness development and reading/spelling progression. Then we discuss the implications of this relationship for the assessment of metaphonological abilities in pre-reader. Studies that had investigated what metaphonological tasks better predict subsequent performance in reading and spelling were also examined. The second part of this work consists of a longitudinal empirical study, that aims to compare the predictive potential of two metaphonological tests (Same-Different Detection Test and Odd-one Detection Test) regarding subsequent reading and spelling performance. The results showed that the Same-Different Detection Test has a better potential than the Odd-one Detection Test to predict alphabetic progress. Letter knowledge also has shown to have a strong potential to predict reading and spelling learning, which was not the case with general cognitive abilities. Possible explanations and implications of the findings are discussed.

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Índice Agradecimentos ... ii Resumo ... iii Abstract ... iv Parte I ... 1 Resumo ... 2 1. Introdução ... 3 2. Consciência fonológica ... 4 2.1. Consciência fonémica ... 5

2.2. Componentes da consciência fonológica ... 6

2.2.1. Consciência fonológica: um constructo único ou múltiplo? ... 8

2.3. Desenvolvimento da consciência fonológica ... 9

2.3.1. Teoria progressiva do desenvolvimento metafonológico ... 10

2.3.2. Teoria disjuntiva do desenvolvimento metafonológico ... 12

3. A relação entre a consciência fonológica e a aprendizagem da leitura e da escrita ... 14

3.1. Unidade fonológica precursora da aprendizagem da leitura/escrita ... 18

4. Tarefas de consciência fonológica... 20

5. Os estudos em língua portuguesa ... 25

6. Referências Bibliográficas ... 28

Parte II ... 1

Resumo ... 2

Preditores da aprendizagem da leitura e da escrita: Comparação entre dois testes de consciência fonológica utilizados em fase pré-escolar ... 3

Método ... 9 Participantes ... 9 Testes e procedimento ... 11 Resultados ... 15 Discussão ... 25 Referências bibliográficas ... 32 Anexos ... i

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Cabeçalho: CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA E A APRENDIZAGEM ALFABÉTICA

Parte I

Consciência fonológica e a aprendizagem da leitura e da escrita Bruno Dias Martins

Departamento de Educação e Psicologia Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

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Resumo

Apesar de não existir consenso sobre como a consciência fonológica se desenvolve e, por consequência, que papel têm as diferentes unidades fonológicas na aprendizagem da leitura e da escrita, parece ser unânime que se trata de um processo intrinsecamente ligado às aprendizagens alfabéticas. A consciência fonológica que, por um lado, permite a compreensão e aplicação do princípio alfabético, por outro lado é modificada pelas experiências em leitura e escrita, estabelecendo-se assim uma relação interdependente entre ambas durante as diferentes fases de aprendizagem. A avaliação da consciência fonológica parece ser um meio eficaz para discriminar entre os bons e os maus leitores, assim como o treino destas capacidades em crianças pré-leitoras parece ter um papel facilitador na aprendizagem posterior da leitura e da escrita. A relação entre os níveis de consciência fonológica das crianças pré-leitoras e os seus progressos ulteriores nas aprendizagens alfabéticas tem sido comprovada por diversos estudos longitudinais. Por isso, a avaliação dos potenciais preditivos de diferentes testes metafonológicos para crianças pré-leitoras é importante pois permite seleccionar os instrumentos mais capazes de detectar precocemente possíveis dificuldades na aprendizagem da leitura/escrita e, consequentemente, intervir atempadamente aumentando as hipóteses de sucesso nos casos de risco.

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1. Introdução

Com a entrada para a escola, a criança confronta-se com uma nova modalidade da linguagem. A aprendizagem da vertente escrita da língua representa um progresso para o seu desenvolvimento linguístico pois permite uma reflexão mais elaborada sobre um conhecimento já adquirido, bem como novas formas de aceder à informação, que antes não estavam disponíveis. A linguagem, que anteriormente era usada como um instrumento para a comunicação, cujos processos eram essencialmente de natureza implícita, passa agora a ser objecto de uma reflexão consciente.

O domínio da leitura e da escrita é uma das principais metas da escolaridade. Estas aprendizagens são fundamentais, não só durante o percurso escolar da criança como no percurso da sua vida pessoal e profissional. A leitura e a escrita possibilitam aceder à informação e ao conhecimento, ajudam a estruturar o pensamento, e são competências fundamentais para uma maior inclusão e participação sociais (Lundberg, 2002; Sim-Sim, 1999).

O processo da aprendizagem da leitura e da escrita é complexo e não natural. Isto é, viver rodeado de bons modelos no domínio da linguagem escrita não é suficiente para assegurar a sua aprendizagem. É necessário adquirir algumas capacidades específicas e ter um ensino explícito para que possamos dominar o funcionamento do sistema alfabético. Ao contrário da linguagem oral, que não requer aprendizagem intencional, a mestria da escrita e da leitura exige ser ensinada (Gillon, 2004).

Os sistemas de escrita alfabética, como é o caso do sistema português, representam a fala ao nível do fonema, isto é, para aprender a ler e a escrever a criança tem que estabelecer correspondências entre os grafemas e os fonemas (e vice-versa), e para isso necessita de conhecer o código alfabético e ser capaz de descobrir a sequência de fonemas que constitui a palavra. Os fonemas são categorias abstractas da língua que só se aprendem a representar explicitamente após instrução formal, pelo que aprender a ler e a escrever implica adquirir consciência fonológica, mais concretamente consciência fonémica.

Neste sentido, a consciência fonológica tem sido apontada com um dos principais processos intervenientes na aprendizagem da leitura e da escrita (Castles & Coltheart, 2004). Vários estudos (e.g., Capovilla, Güstschow, & Capovilla, 2004; Caravolas, Volín, & Hulme, 2005; Hulme, Hatcher, Nation, Brown, Adams, & Stuart, 2002; Linklater, O´Connor, &

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Palardy, 2009; Nikolopoulos, Goulandris, Hulme, & Snowling, 2006) têm evidenciado que a consciência fonológica (mais especificamente a consciência fonémica) é um dos factores que melhor prediz a aprendizagem da leitura e da escrita nos sistemas alfabéticos, entre os quais o português Europeu (Vale & Teixeira, 2005; Vale, 2000).

As crianças já possuem algumas capacidades para reflectir sobre os sons das palavras aquando da entrada para escola. No entanto, é só com a instrução alfabética que a consciência fonológica atinge um nível que a torna num componente fundamental para a aprendizagem da leitura e da escrita. Ao longo do presente trabalho pretendeu-se reflectir sobre a relação entre a consciência fonológica e a aprendizagem alfabética (leitura e escrita). Mais concretamente este trabalho discute o estado actual do conhecimento científico acerca das influências que estas duas capacidades exercem entre si ao longo das diferentes etapas de aprendizagem. Analisa também de que forma esses conhecimentos podem ser importantes para encontrar instrumentos com potencial para predizer o percurso ulterior da aprendizagem da leitura e da escrita.

2. Consciência fonológica

A consciência fonológica pode ser definida globalmente como a capacidade para reflectir intencionalmente sobre, e manipular, os segmentos da fala, ou seja, é a representação explícita das unidades de “som” que constituem as palavras faladas (Morais, 1991, 2003; Treiman, 1991; Tunmer & Rohl, 1991).

Morais (1991) distingue duas formas de consciência fonológica: a holística e a analítica. A consciência fonológica holística, de natureza implícita, refere-se à capacidade para avaliar as propriedades supra-segmentais da fala, tais como ajuizar sobre as semelhanças globais entre duas sequências fonológicas, realizar a apreciação de rimas, e conseguir detectar pronúncias erradas. Por outro lado, a consciência fonológica analítica, de natureza mais explícita, prende-se com a capacidade para, conscientemente, isolar as partes constituintes da fala, nomeadamente a sílaba, o ataque, a rima e os fonemas. As sílabas são as estruturas fonológicas que menos esforços analíticos exigem, uma vez que correspondem aproximadamente a actos articulatórios. Em oposição, os fonemas são as estruturas que obrigam a um maior esforço analítico. Este facto é uma consequência de os fonemas não terem realidade acústica e por isso exigirem grande nível de abstracção. Num nível intermédio do esforço de explicitação exigido, estão duas estruturas denominadas ataque e rima. O ataque

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é a consoante (C-) ou o grupo consonantal inicial (CC-) da sílaba (e.g., os sons /tr/ 1da palavra /´triSt/) enquanto a rima é composta pela vogal da sílaba mais a consoante (-VC) ou as consoantes seguintes (e.g., os sons /iSt/ da palavra /´triSt/).

Diversos estudos (e.g., Cardoso-Martins, Michalick, & Pollo, 2002; Carroll, Snowling, Hulme, & Stevenson, 2003; Høien, Lundberg, Stanovich, & Bjaalid, 1995; Hulme et al., 2002; Treiman & Zukowski, 1991, 1996; Vanasse, Bégin-Bertrand, Courcy, Lassonde, & Béland, 2005) têm comprovado que quanto mais abstractas forem as estruturas fonológicas avaliadas nas tarefas de consciência fonológica, maior a dificuldade das crianças pré-leitoras em fazer a sua análise, o que decorre de uma maior exigência ao nível do esforço analítico colocado por essas tarefas.

2.1. Consciência fonémica

A consciência fonémica (na literatura é também nomeada de análise fonémica, ou análise segmental) é um caso específico da consciência fonológica, que se refere à capacidade para reflectir e manipular intencionalmente os fonemas que constituem as palavras e as sílabas. Geralmente as crianças tornam-se conscientes de algumas unidades fonológicas amplas, como a rima ou a sílaba, sem nunca ter aprendido a ler/escrever (Muter, Hulme, Snowling, & Taylor, 1998; Vale, 2000; Vanasse et al., 2005). Todavia, como os estudos com adultos iletrados têm demonstrado (Adrián, Alegria, & Morais, 1995; Loureiro et al., 2004; Lukatela, Carello, Shankweiler, & Liberman, 1995; Morais, Cary, & Bertelson, 1979; Mota & Castro, 2007), para se atingir a consciência dos fonemas, a aprendizagem da leitura/escrita parece ser fundamental. Estes estudos demonstraram que os adultos iletrados têm desempenhos, nas tarefas que envolvem a consciência de segmentos fonológicos maiores, como a sílaba e a rima, semelhantes aos dos adultos com idades e características socioeconómicas equivalentes mas que têm maiores competências alfabéticas. Por outro lado, os adultos iletrados apresentam um desempenho significativamente inferior nas tarefas que envolvem a consciência fonémica comparativamente com os sujeitos que tiveram instrução alfabética. Como referido anteriormente, adquirir a consciência fonémica é um processo difícil porque os fonemas não são discrimináveis acusticamente, ao contrário do que acontece com as sílabas que, grosso modo, reflectem os actos articulatórios (Morais, 1997).

Aprender a ler e a escrever implica que se compreenda que as letras (ou grafemas) representam os sons mais básicos e abstractos da fala - os fonemas (Castles & Coltheart,

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Transcrição dos sons da fala através do sistema Unibet, adaptado ao português europeu por Castro e Gomes, 2001 (ver anexo 1).

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2004). Por isso a consciência fonémica torna-se importante, uma vez que possibilita o reconhecimento e a identificação dos elementos fonológicos indivisíveis das palavras (Vale, 2000). A literatura (Caravolas, Hulme, & Snowling, 2001; Caravolas et al., 2005; Capovilla et al., 2004; Hulme et al., 2002; Linklater et al., 2009; Muter, Hulme, Snowling, & Stevenson, 2004; Nikolopoulos et al., 2006; Høien et al., 1995; Vale, 2000) tem comprovado que existe uma estreita relação entre a consciência fonémica e a capacidade de ler e escrever.

2.2. Componentes da consciência fonológica

De acordo com Treiman (1991) a consciência fonológica não é uma capacidade única e homogénea, e pode ser diferenciada de duas formas. Uma é a referida atrás (Morais, 1991), em que diferentes tarefas se podem distinguir quanto ao nível de análise exigida para as resolver. A outra forma de diferenciar os níveis de consciência fonológica tem a ver com a unidade fonológica envolvida em cada tarefa. Da mesma forma que a sílaba pode ser subdividida, também a consciência fonológica pode ser distinguida de acordo com a estrutura da sílaba que avalia: consciência silábica, consciência ataque-rima, ou consciência fonémica (Treiman, 1991).

Desta forma, a investigação sobre a organização estrutural da sílaba concebida pelas crianças, e sobre as dificuldades colocadas pelas diversas unidades fonológicas no processo de representação das estruturas das sílabas, são questões importantes para compreender quais os principais níveis de consciência fonológica envolvidos na aprendizagem da leitura e da escrita.

Treiman e Zukowsky (1991) propõem uma visão hierárquica da sílaba, sendo esta composta por sub-unidades, que são mais pequenas do que a sílaba mas maiores do que os fonemas. Estas sub-unidades são, por sua vez, compostas por fonemas. Segundo estas autoras a sílaba pode ser subdividida em ataque (e.g., /tr/ da palavra /´triSt/), rima (e.g., /iSt/ da palavra /´triSt/), e por fim nos diferentes fonemas (e.g., os som /t/, /r/, /i/, /S/ e /t/ da palavra /´triSt/). No estudo realizado pelas autoras, foi pedido a crianças pré-leitoras e leitoras principiantes que detectassem se existia ou não um “bocadinho de som igual” num par de palavras. Os resultados indicaram que as crianças eram capazes de detectar mais facilmente as sílabas, iniciais e finais, seguindo-se as unidades fonológicas ataque-rima, sendo os fonemas as unidades menos eficazmente detectadas. Estes resultados corroboram uma hierarquia, em que os diferentes níveis da estrutura silábica se organizam num tamanho decrescente das estruturas fonológicas (da sílaba para o fonema) e num grau de dificuldade crescente em

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serem identificados (o fonema é a unidade mais abstracta e por isso mais difícil de identificar).

De acordo com Duncan, Seymour e Hill (1997) foram propostos diferentes modelos sobre a importância relativa das sub-estruturas da sílaba. Um dos modelos, denominado modelo ataque-rima (C-VC) considera a rima como a unidade fonológica mais pregnante da sílaba, enquanto outra perspectiva defende que a sílaba se constitui em função da única unidade que obrigatoriamente tem que estar presente, o núcleo. O núcleo é representado pela vogal (V) da sílaba, por exemplo, o /E/ da palavra /mE9/ (<mel>). Segundo este último modelo, o núcleo pode agrupar-se com a consoante inicial formando o corpo da sílaba (CV-), ou com a consoante final formando a rima (-VC). A diferença de organização depende da sonoridade dos fonemas (na escala de sonoridade, as oclusivas, por exemplo, são as consoantes com menos energia acústica), de regras de acentuação, constrangimentos de co-ocorrência entre a vogal e a consoante final, ou mesmo a erros da fala. Duncan et al. (1997) afirmam que ambas as teorias se apoiam nos mesmos fundamentos, pelo que nenhum dos modelos de organização pode ser privilegiado.

Por outro lado, alguns trabalhos têm indicado que as crianças podem representar a estrutura de uma sílaba de formas distintas da apresentada por Treiman e Zukowsky (1991). Numa investigação de Seymour e Evans (1994) foram comparados diferentes modelos hierárquicos da sílaba, um com duas dimensões (ataque/rima), outro com três dimensões (ataque, núcleo e coda2) e um terceiro modelo n-dimensional (fonemas). Foi pedido às crianças que segmentassem as sílabas em duas partes, três partes e em todas as partes que conseguissem. Os resultados não demonstraram que o desenvolvimento ocorria segundo a hierarquia proposta por Treiman e Zukowsky (1991), desde as unidades maiores até às mais pequenas. Para além das respostas que eram esperadas tendo em conta as instruções dadas (dividir as sílabas em duas, três ou n partes), as crianças segmentaram as sílabas em outros tipos de organização, que não foram aquelas que Treiman e Zukowsky propunham. Por exemplo, nos itens que continham grupos consonantais (CCVC e CVCC), foi verificada uma grande variedade de ocorrências, nomeadamente algumas respostas manifestavam uma divisão do grupo consonantal quer em ataque (C-CVC), quer em coda (CVC-C). Em outro estudo, de Geudens e Sandra (2003), foi pedido a crianças pré-leitoras e leitoras iniciantes alemãs, que referissem quais os sons que ouviam em determinadas palavras. Os resultados

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indicaram que quando era pedido às crianças para segmentar sílabas CVC, o corpo da sílaba (CV-) era mais vezes deixado intacto do que as rimas (-VC). Estes resultados parecem não suportar a importância das unidades fonológicas ataque-rima como proposto por Treiman e Zukowsky (1991).

Assim, a consciência fonológica pode assumir vários níveis de representação, e por isso torna-se importante avaliar o impacto de outros níveis, além da consciência fonémica e/ou da estrutura ataque/rima, na aprendizagem da leitura e da escrita.

2.2.1. Consciência fonológica: um constructo único ou múltiplo?

Alguns autores (Anthony & Francis, 2005; Anthony & Lonigan, 2004; Anthony, Lonigan, Burgess, Driscoll, Phillips, & Cantor, 2002; Anthony, Lonigan, Driscoll, Phillips, & Burgess, 2003) defendem que a consciência fonológica é um constructo unificado. Segundo esta perspectiva a consciência fonológica é vista como uma capacidade cognitiva única que se manifesta comportamentalmente de maneiras diferentes. Anthony et al. (2002) examinaram a relação entre a sensibilidade a palavras, sílabas, rimas, e fonemas, em 258 crianças com idades compreendidas entre os 2 e os 5 anos. Através da análise factorial confirmatória, os autores verificaram que o modelo que melhor explicava os resultados era aquele que considerava a consciência fonológica num único factor. Num outro estudo, Anthony e Loningan (2004) realizaram uma análise factorial confirmatória sobre os dados de quatro estudos anteriores (Lonigan, Burgess, Anthony, & Barker, 1998; Muter, Hulme, & Snowling, 1997; Muter, Hulme, Snowling, & Taylor, 1997; Wagner et al., 1997) e chegaram a resultados semelhantes ao estudo de Anthony et al. (2002). A análise dos dados dos quatros estudos, realizados no total com 1200 crianças de idades compreendidas entre os 2 e os 8 anos, indicaram que nas crianças mais novas a sensibilidade à rima era indistinguível da consciência fonémica e da sensibilidade fonológica global. Nas crianças mais velhas a sensibilidade à rima, apesar de apresentar correlações com as restantes unidades fonológicas, era distinta dessas capacidades fonológicas. No entanto, a análise factorial indicou que a sensibilidade à rima era um forte preditor das restantes capacidades fonológicas avaliadas.

Estes dados suportam a visão da consciência fonológica como um constructo unificado. No entanto, esta é uma questão na qual ainda não existe consenso, uma vez que outros estudos têm apontado em direcções opostas.

Num estudo de Høien et al. (1995) 128 crianças, sem experiência de instrução formal em leitura/escrita, foram testadas com uma bateria de tarefas que pretendia avaliar vários

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aspectos da consciência fonológica: reconhecimento de rima, contagem de sílabas, detecção do fonema inicial correspondente (a criança tinha que escolher de três imagens aquela que retratava uma palavra que começava com o mesmo som que aquele que experimentador pronunciou), supressão do fonema inicial, síntese fonémica e contagem fonémica. Através da análise de componentes principais foram extraídos três componentes básicos: factor fonema, factor sílaba e factor rima. Num segundo estudo realizado pelos mesmos autores (publicado no mesmo artigo) numa amostra de 1509 crianças, esta relação estrutural foi confirmada.

Uma investigação longitudinal de Muter et al. (1998), realizada com uma amostra de 38 crianças, com idades compreendidas entre 3 anos e 10 meses e os 4 anos e 9 meses, mostrou que nos dois primeiros anos de aprendizagem da leitura existiam duas capacidades fonológicas distintas, relativamente independentes: consciência fonémica (incluiu tarefas de supressão de fonemas, e identificação de fonemas), e consciência da rima (incluiu tarefas de detecção da rima e pela produção de rima). Os resultados do estudo de Carroll et al. (2003) realizado com 67 crianças pré-leitoras confirmaram que a consciência da rima e a consciência fonémica são capacidades distintas, referindo os autores que as tarefas com rimas e fonemas envolvem diferentes processos. Segundo os autores, estes dados corroboram a distinção de Gombert (1992) entre consciência fonológica epilinguística e metalinguística. Isto é, a consciência epilinguística é entendida como uma organização linguística preliminar, que por natureza não é consciente, e que consiste numa sensibilidade global às semelhanças dos sons da fala, enquanto a consciência metalinguística se refere à consciência e ao controlo deliberado sobre as unidades fonológicas nas palavras e que apenas surge quando uma pressão externa, como a instrução alfabética, obriga a um controlo intencional sobre as unidades fonológicas da fala. Os resultados indicaram, ainda, que a consciência da rima estava correlacionada com as provas de percepção da fala e memória de curto-prazo, enquanto a consciência fonémica se apresentou correlacionada com a leitura e o conhecimento de letras, o que confirma diferentes processos envolvidos em ambas as tarefas.

A não existência de consenso acerca de como as diferentes capacidades de consciência fonológica se organizam estruturalmente reflectem o facto de também não existir acordo relativamente à forma como essas capacidades se desenvolvem e são adquiridas.

2.3. Desenvolvimento da consciência fonológica

O desenvolvimento da consciência fonológica tem sido explicado por diferentes teorias, não existindo actualmente consenso acerca de como se processa a aquisição destas

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capacidades, nem de qual é a estrutura fonológica fundamental para a aprendizagem da leitura/escrita. Diferentes estudos e diferentes autores têm apontado direcções diferentes sobre como se desenrola a aquisição da consciência fonológica e qual a importância das estruturas fonológicas neste processo. Seymour e Evans (1994) referem a existência de duas teorias alternativas sobre a sequência do desenvolvimento da consciência fonológica: a teoria progressiva e a teoria disjuntiva.

2.3.1. Teoria progressiva do desenvolvimento metafonológico

A teoria progressiva (Anthony & Francis, 2005; Treiman & Zukowsky, 1991; Zeigler & Goswami, 2005) defende que durante os anos que antecedem a, e os primeiros anos de, aprendizagem da leitura e da escrita, as crianças progridem através de três níveis de desenvolvimento da consciência fonológica: primeiro a consciência da sílaba, depois a consciência do ataque-rima, e por fim a consciência fonémica. Esta visão defende que há uma organização linear do conhecimento fonológico desde a consciência das unidades fonológicas maiores (sílaba) até às menores (fonemas). Neste sentido o desenvolvimento da consciência fonológica é descrita como um continuum entre a sensibilidade superficial das unidades fonológicas maiores e a consciência mais profunda das unidades fonológicas mais pequenas.

Esta teoria tem sido apoiada por diferentes tipos de estudos. Uma investigação de Anthony et al. (2003) estudou a aquisição das capacidades de sensibilidade fonológica em 947 crianças com idades compreendidas entre os 2 e os 5 anos, com diversas proveniências socio-culturais. Este estudo examinou a sensibilidade fonológica em quatro níveis linguísticos diferentes (palavras, sílabas, ataque-rima, fonemas) através de quatro tarefas com diferentes níveis de complexidade (tarefas de escolha múltipla envolvendo síntese e supressão, e tarefas de análise envolvendo síntese, e supressão). A análise estatística revelou que quanto mais velhas as crianças, mais facilidade tinham na resolução das tarefas com estruturas fonológicas mais pequenas, e pelo contrário quanto mais novas as crianças mais dificuldades apresentavam. Outra das conclusões deste estudo é que as crianças conseguiam detectar ou manipular sílabas antes de o conseguirem fazer ao nível ataque-rima, assim como conseguiam detectar ou manipular ataques-rimas antes de o conseguirem fazer com fonemas isolados.

Como referido anteriormente, os estudos de Anthony e colegas (Anthony & Francis, 2005; Anthony & Lonigan, 2004; Anthony et al., 2002) argumentam que a consciência fonológica é um constructo unitário e não o reflexo de diferentes capacidades. Os resultados destes estudos mostraram que a progressão da sensibilidade linguística seguia o modelo hierárquico da estrutura da palavra, sendo que o desenvolvimento metafonológico se inicia

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pela detecção das unidades fonológicas maiores, tais como as, sílabas, ou ataques e rimas e nas fases posteriores do desenvolvimento metafonológico, o progresso que estas capacidades sofreram permitem a manipulação dos fonemas. Os resultados indicaram que a sensibilidade da rima foi um forte preditor das restantes capacidades fonológicas avaliadas, ou seja quanto melhores eram as crianças nas tarefas de sensibilidade à rima, melhores se tornaram os seus desempenhos posteriores em tarefas de consciência de unidades linguísticas menores. Os autores referem que estes dados corroboram a teoria de que as crianças vão aperfeiçoando as capacidades metafonológicas que já tinham adquirido e não aprendendo novas capacidades de consciência fonológica.

Outros estudos e autores têm corroborado esta perspectiva. Por exemplo, num estudo de Cardoso-Martins et al. (2002) foram administradas tarefas fonológicas (detecção da rima, detecção do fonema inicial e do fonema do meio) em crianças leitoras e não leitoras. Os resultados replicaram os estudos anteriores, sugerindo que a capacidade para detectar rimas é um precursor desenvolvimental da capacidade de detectar fonemas. No entanto, os resultados mostraram que todas as tarefas eram fáceis paras as crianças que já tinham começado a ler, enquanto os pré-leitores acharam as tarefas de detecção do fonema mais difíceis do que as de detecção da rima.

Num estudo longitudinal de Carroll et al. (2003) foram avaliadas 67 crianças do nível pré-escolar em três momentos ao longo de 12 meses. Estas crianças realizaram testes de correspondência da sílaba inicial, sílaba final, de rima e do fonema inicial, e testes de completamento de sílaba e fonema, e supressão do fonema inicial. Os resultados mostraram que, em geral, as capacidades que envolviam a rima se desenvolviam antes das que envolviam o fonema. As análises estatísticas revelaram que a consciência da sílaba e da rima prediziam fortemente a consciência fonémica, o que corrobora a abordagem que defende uma continuidade entre o desenvolvimento da consciência dos segmentos fonológicos maiores e o desenvolvimento posterior das capacidades de consciência fonémica. No entanto, o modelo de equações estruturais mostrou que a consciência fonémica é uma capacidade distinta da consciência da rima, o que evidencia que as tarefas que envolvem estes dois níveis diferem no tipo de processos cognitivos envolvidos, o que argumenta a favor da posição oposta à teoria progressiva do desenvolvimento metafonológico.

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2.3.2. Teoria disjuntiva do desenvolvimento metafonológico

Apesar das evidências apresentadas anteriormente, existem estudos que têm demonstrado que o percurso do desenvolvimento da consciência fonológica pode ser diferente. As teorias disjuntivas, em oposição às progressivas, argumentam que existe uma transição abrupta da consciência das sílabas para a consciência dos fonemas, que coincide com o inicio da aprendizagem da leitura e da escrita. Assim, as representações explícitas não se adquiriam apenas pela via da maturação, mas antes surgiriam após a aprendizagem da leitura e da escrita.

Mann e Wimmer (2002) compararam crianças a frequentar o pré-escolar nos EUA e na Alemanha quanto ao desenvolvimento da consciência fonémica. Os resultados indicaram que entre as crianças da mesma idade as americanas obtiveram resultados superiores nas tarefas que envolviam a consciência fonémica. Estes dados confirmam a importância da instrução alfabética para aceder às representações mais abstractas da linguagem, pois as crianças americanas são instruídas acerca das correspondências sons-letras (fonemas-grafemas) antes de entrarem no ensino primário, enquanto as crianças alemãs apenas são ensinadas no primeiro ano de escolaridade, o que indica que instrução alfabética parece ter sido determinante para os resultados verificados.

Um estudo realizado com crianças francesas (Vanasse et al., 2005) avaliou as capacidades metafonológicas em diferentes anos de escolaridade. O estudo comparou sete grupos que correspondiam a sete anos de escolaridade diferentes, desde o último ano do Jardim-de-Infância até ao 6º ano de escolaridade. Os resultados demonstraram que as tarefas que envolviam unidades linguísticas maiores (rimas e sílabas: julgamento de rimas; síntese, segmentação, e inversão silábica) eram fáceis para todas as crianças, inclusivamente para as crianças do Jardim-de-Infância que obtiveram uma percentagem média de acertos de pelo menos 81.1%. Por outro lado, observaram-se diferenças significativas entre os anos relativamente às tarefas que envolviam a consciência fonémica. As crianças do jardim-de-infância obtiveram percentagem de acertos de 35%, 12.5% e 11.7%, para a síntese, segmentação e inversão fonémica, respectivamente, enquanto as crianças do primeiro ano obtiveram 88.9%, 89.1% e 70.8%, respectivamente nas mesmas tarefas. Estes resultados demonstram um aumento brusco na capacidade para manipular intencionalmente os fonemas, que coincide com o início da instrução formal da leitura e da escrita.

Num outro estudo longitudinal, de Muter et al. (1998), foi aplicada uma bateria de testes de capacidades fonológicas em crianças quando ainda eram pré-leitoras. Os resultados

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indicaram uma progressão desenvolvimental entre as idades de 4 e 6 anos, uma vez que os resultados em todas as provas metafonológicas melhoraram ao longo dos três anos de estudo. Os resultados relevaram, ainda, que as fases mais adiantadas da consciência fonológica (segmentação e manipulação fonémica) só foram atingidas pela maioria das crianças quando elas foram expostas a uma instrução formal em leitura.

Os resultados destes estudos corroboram uma emergência brusca das capacidades de consciência fonémica por volta do primeiro ano de escolaridade, que se relaciona com o facto de as crianças iniciarem a aprendizagem da leitura e da escrita e de receberem instrução explícita acerca das correspondências fonema-grafema (e vice-versa), permitindo a aquisição e compreensão do princípio alfabético.

Os estudos com adultos iletrados confirmam a perspectiva de que a consciência fonológica não se desenvolve pela maturação, e que requer uma instrução explícita. Num estudo de Lukatela et al. (1995) foram avaliados adultos iletrados e semiletrados, falantes de Servo-Croata, em tarefas de leitura, escrita, de consciência fonológica e de controlo. Os participantes foram divididos em três grupos: grupo de reconhecimento pobre de letras (7 sujeitos reconheciam menos de 50% das letras), grupo de reconhecimento médio (9 participantes que reconheciam até 95% das letras) e o grupo de reconhecimento bom (7 participantes que reconheciam qualquer letra). Os resultados indicaram que os grupos diferiram apenas para as tarefas de contagem de fonemas e de supressão de fonemas tendo os grupos com maiores conhecimentos de letras obtido melhores resultados, o que não se verificou para a contagem das sílabas.

Adrián et al. (1995) avaliaram as capacidades metafonológicas em adultos iletrados falantes do espanhol. Foi pedido aos sujeitos que realizassem diferentes tarefas: discriminar pares de sílabas que tinham diferenças mínimas em termos de características fonéticas, julgar se um fonema ou sílaba em particular estava presente ou não e onde numa palavra, e suprimir ou reverter fonemas e sílabas. Os resultados demonstraram que os iletrados são pouco eficazes na discriminação fonológica. Além disso, quase metade dos iletrados eram capazes de fazer apreciação da rima, mas nas tarefas de sílaba e mais marcadamente nas tarefas de fonema, eram muito pouco eficazes. Este estudo confirmou que a consciência fonémica não se desenvolve como consequência de uma maturação cognitiva ou linguística.

Estes resultados têm sido verificados em várias línguas, nomeadamente para a língua Portuguesa. Num estudo de Morais et al. (1979) com adultos iletrados e ex-iletrados

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portugueses verificou-se que os primeiros tinham desempenhos muito inferiores, em tarefas de supressão fonémica, aos de outros adultos, com ambiente e experiências infantis semelhantes mas que tinham aprendido a ler já em adultos. Estes autores concluíram que a consciência fonémica não se adquire espontaneamente no decorrer do desenvolvimento cognitivo, mas antes exigem um treino específico, que provavelmente, para a maioria das pessoas, seria fornecido pela aprendizagem da leitura num sistema alfabético. Outros estudos têm apontado resultados semelhantes para o português do Brasil (e.g., Loureiro et al., 2004; Mota & Castro, 2007).

Como visto anteriormente, vários estudos (Carroll et al., 2003; Høien et al., 1995; Muter et al., 1998) têm apontado a consciência fonológica como multidimensional, sendo a consciência fonémica apontada como uma componente distinta, e independente. Os resultados destes estudos evidenciam que as tarefas que envolvem a consciência do fonema utilizam diferentes processos quando comparados com as tarefas que envolvem a consciência dos segmentos com tamanhos maiores.

A questão da organização estrutural da consciência fonológica tem diversas implicações teóricas e práticas. Ao nível teórico este é um tema fundamental no debate acerca de como se processa o desenvolvimento da consciência fonológica: é uma capacidade única que se vai especificando e aprimorando com o desenvolvimento da criança? Ou ao longo do crescimento e com as diferentes experiências, a criança vai adquirindo diferentes capacidades? Qual a unidade fonológica fundamental para a aprendizagem da leitura e da escrita?

Estas questões são fundamentais para perceber quais os níveis de consciência fonológica mais relevantes na identificação precoce das crianças em risco de virem a manifestar dificuldades de aprendizagem da leitura e da escrita, assim como perceber quais os componentes da consciência fonológica que devem ser prioritárias nos programas de intervenção com essas crianças. Estas questões têm ainda implicações sobre qual ou quais as unidades linguísticas que devem ter primazia no ensino da leitura e da escrita.

3. A relação entre a consciência fonológica e a aprendizagem da leitura e da escrita Parece já não ser questionável a existência de uma relação entre o desempenho em tarefas de consciência fonológica e a aprendizagem da leitura e da escrita. Um grande número

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de estudos (e.g., Hulme et al., 2002; Muter et al., 2004; Teixeira, 2005; Vale, 2000) tem evidenciado que quanto mais eficazes são as crianças a identificar e manipular intencionalmente os sons que constituem as palavras, melhores são os seus desempenhos em leitura e escrita, e inversamente, quanto mais baixos os seus desempenhos em tarefas de consciência fonológica, piores são as suas performances na leitura e na escrita.

O estudo relativamente à relação entre a capacidade de manipular e julgar conscientemente as diferentes unidades fonológicas e as aprendizagens alfabéticas tem sido realizado através de diferentes tipos e metodologias de investigação.

Os estudos longitudinais têm mostrado que variações no nível da consciência fonológica em crianças pré-leitoras estão correlacionadas positivamente com o desempenho ulterior em leitura e escrita. Um estudo realizado por Muter et al. (2004) é um bom exemplo da aplicação desta metodologia de investigação no estudo da relação entre a consciência fonológica e a aprendizagem, neste caso, da leitura. Esta investigação foi conduzida com 90 crianças britânicas, tendo a primeira testagem ocorrido logo após a entrada na escola (cerca dos 5 anos de idade) e as seguintes testagens um e dois anos após a primeira avaliação. Na primeira fase as crianças foram avaliadas com um conjunto de testes relativos às capacidades de manipulação de rimas e fonemas, assim como testes de conhecimentos de letras, capacidades gramaticais e conhecimento de vocabulário. As capacidades referentes à rima foram testadas com três tarefas diferentes, a detecção de rima (escolher entre três palavras aquela que rima com a palavra alvo), produção de rima (dizer uma palavra que rime com a palavra alvo) e detecção de intruso (de entre três palavras escolher a palavra que não rima com as restantes); as capacidades relacionadas com os fonemas foram avaliadas através de duas tarefas, supressão do fonema (é pedido à criança para dizer uma determinada palavra retirando o fonema indicado) e completamento com fonema (é mostrada uma imagem à criança e é dito o início da palavra, que a criança tem que completar dizendo o som que falta). Na segunda e terceira fases de testagem foram avaliados o reconhecimento de palavras e a compreensão de leitura. Os resultados do estudo demonstraram consistentemente que as capacidades de descodificação foram preditas pelo desempenho nas tarefas de conhecimento de letras e na tarefa de sensibilidade fonémica, enquanto as restantes variáveis não produziram associações significativas.

Este modelo de investigação tem sido utilizado em diversos estudos e em diferentes línguas, com resultados a confirmarem a relação significativa entre a consciência fonológica e

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a aprendizagem ulterior da leitura e da escrita: Inglês (Burgess & Lonigan, 1998; Caravolas et al., 2001; Caravolas et al., 2005; Hulme et al., 2002; Linklater et al., 2009; Muter et al., 2004; Stanovich, Cunningham, & Cramer, 1984), Grego (Nikolopoulos et al., 2006), Espanhol (Carrillo, 1994), Norueguês (Høien et al., 1995), Checo (Caravolas et al., 2005), Francês (Casalis & Louis-Alexandre, 2000) e Português do Brasil (Barrera & Maluf, 2003; Capovilla et al., 2004; Pestun, 2005) e Europeu (Santos, 2005; Teixeira, 2005; Vale, 2000). Estes estudos demonstram que a sensibilidade fonológica avaliada antes ou nos primeiros momentos da iniciação à leitura reflecte diferenças individuais muito estáveis e tem um poder preditivo muito forte relativamente ao desenvolvimento posterior em leitura/escrita (Vale, 2000; Wagner et al., 1997).

Outro dos resultados que tem sido consistentemente apontado nos estudos longitudinais é que as tarefas que envolvem consciência fonémica e conhecimento de letras são as que melhor predizem a aprendizagem ulterior da leitura e da escrita (Caravolas et al., 2001; Caravolas et al., 2005; Capovilla et al., 2004; Hulme et al., 2002; Linklater et al., 2009; Muter et al., 2004; Nikolopoulos et al., 2006; Høien et al., 1995; Vale, 2000), evidenciando que a consciência fonémica e o conhecimento sobre as letras agem em conjunto na potenciação das capacidades implicadas no processo de aprendizagem da leitura/escrita (Share, 1995).

Os estudos comparativos (Capovilla, Capovilla, & Suiter, 2004; Fawcett & Nicolson, 1995; Guimarães, 2003; McBride-Chang & Manis, 1996; Pennington, Cardoso-Martins, Green, & Lefly, 2001; Shaywitz et al., 1999) têm demonstrado, também, que a consciência fonológica, mais especificamente a consciência fonémica, é um dos factores que melhor discrimina entre bons e maus leitores. Num desses estudos, realizado por Pennington et al. (2001), foi comparado o desempenho de crianças (N= 35; idade entre os 7 e 11.9 anos) e adolescentes (N= 36; idade entre os 12 e 18 anos) com dislexia com o de um grupo de controlo cronológico e um grupo de controlo de leitura, em tarefas de percepção da fala, consciência fonémica, recuperação lexical (serial e discreta), velocidade de articulação e memória verbal de curto prazo. Os resultados indicaram que, em ambas as idades, os grupos de crianças e adolescentes com dislexia tiveram desempenhos significativamente inferiores nas tarefas de consciência fonémica quando comparados com o dos seus grupos de controlo de leitura e cronológico. A consciência fonémica foi a variável com maior potencial discriminativo, apesar de se terem verificado diferenças significativas também na nomeação rápida serial. Estes resultados em conjunto com as conclusões dos estudos longitudinais,

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indicam que falhas ao nível da consciência fonémica têm um impacto negativo na aprendizagem da leitura e da escrita (Bradley & Shankweiler, 1991), pelo que avaliar as capacidades metafonológicas é uma das estratégias mais eficazes para identificar crianças em risco de insucesso na aquisição da leitura e da escrita (Wagner, Torgesen, Laughon, Simmons, & Rashotte, 1993).

Os resultados de estudos sobre os efeitos do treino da consciência fonológica têm, também, contribuído para comprovar a influência das capacidades metafonológicas na aprendizagem da leitura e da escrita (Alexander, Andersen, Heilman, Voetler, & Torgesen, 1991; Bernhardt & Major, 2005; Coutinho, Vale, & Bertelli, 2003; Hatcher & Hulme, 1999; Schneider, Küspert, Roth, Vise, & Marx, 1997; Kjeldsen, Niemi, & Olofsson, 2003; Kozminsky & Kozminsky, 1995; Paula, Mota, & Keske-Soares, 2005). Os resultados indicam que as capacidades de consciência fonológica, nomeadamente a consciência fonémica, podem ser desenvolvidas e potenciadas através do treino, e que esses ganhos têm um efeito facilitador na aprendizagem da leitura e da escrita. As crianças que no Jardim-de-Infância receberam treino de consciência fonémica apresentam desempenhos superiores em leitura e escrita comparativamente com os grupos de controlo que não receberam nenhum treino específico em consciência fonológica (Kjeldsen et al., 2003; Kozminsky & Kozminsky, 1995; Schneider et al., 1997). O treino das capacidades de consciência fonológica tem-se mostrado, ainda, um método eficaz de intervenção junto de crianças com dificuldades de aprendizagem da leitura e da escrita (Alexander et al., 1991).

Estes resultados permitem afirmar que existe uma relação de interacção entre a consciência fonológica e a aprendizagem da leitura/escrita. A consciência fonológica é um bom preditor dos desempenhos ulteriores em leitura e escrita, mas também um facilitador da sua aprendizagem.

Aprender a ler e a escrever parece ter uma influência determinante sobre a consciência fonológica, especificamente a consciência fonémica. Como demonstrado anteriormente (Muter et al., 1998; Vanasse et al., 2005), com o início da instrução alfabética há um aumento brusco nas capacidades para manipular intencionalmente os segmentos fonémicos, traduzindo-se num aumento acentuado da eficácia das crianças nas tarefas que envolvem capacidades de consciência fonémica. Estudos realizados com adultos iletrados também têm permitido verificar que a consciência das unidades fonológicas mais abstractas (os fonemas) dificilmente é atingida pelas pessoas que não aprenderam a ler nem a escrever, corroborando

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que a aprendizagem alfabética é essencial para a aquisição da consciência fonémica (Adrián et al., 1995; Loureiro et al., 2004; Lukatela et al., 1995; Morais et al., 1979).

Assim, é possível concluir que a consciência fonológica é um co-requisito da aprendizagem da leitura/escrita, uma vez que, por um lado, é um dos seus melhores preditores, exercendo um papel facilitador na sua aprendizagem, por outro esta aprendizagem permite atingir níveis mais especializados da consciência fonológica (a consciência fonémica).

3.1. Unidade fonológica precursora da aprendizagem da leitura/escrita

Nos últimos anos tem-se assistido a um intenso debate entre duas correntes de investigação que se opõem quanto às unidades fonológicas que consideram suportes para a aprendizagem da leitura/escrita. Uma das abordagens defende a primazia das unidades ataque e rima, tendo estas um papel de mediação entre a consciência fonémica e a aprendizagem da leitura/escrita. De acordo com Goswami (2002) e Bryant (1998; 2002) as crianças quando iniciam o processo de aprendizagem da leitura e da escrita são sensíveis ao ataque e à rima, mas não ao fonema. Isto é, à medida que as crianças vão ganhando experiência com o ataque e rima, vão desenvolvendo a capacidade para dividi-los em fonemas. Neste sentido a sensibilidade ao ataque e à rima tem um efeito facilitador indirecto sobre a aquisição da leitura e da escrita. Quanto mais desenvolvida for a sensibilidade da criança ao ataque e à rima na fase pré-escolar, mais facilmente a criança aprende a detectar os fonemas e por conseguinte, as correspondências grafema-fonema (vice-versa), o que vai afectar o progresso da aprendizagem da leitura e da escrita.

Num estudo longitudinal, Bryant, MacLean, Bradley e Crossland (1990), testaram 3 hipóteses diferentes acerca da relação entre a consciência das diferentes unidades fonológicas e a leitura: (a) a experiência de aprendizagem da leitura conduz à consciência dos fonemas e nenhum destes está relacionado com consciência da rima do ataque; (b) a sensibilidade à rima e ao ataque conduz à consciência dos fonemas, que por sua vez afectam a leitura; e (c) a rima e o ataque têm um efeito directo sobre a leitura, que é independente da ligação entre a leitura e a consciência fonémica. Neste estudo foram monitorizadas várias formas de consciência fonológica (detecção da rima, aliteração e detecção de fonemas) e os progressos em escrita e leitura, junto de 65 crianças com idades compreendidas entre os 4 anos e 7 meses e os 6 e sete meses. Os resultados produziram um forte suporte para a combinação entre o segundo e o terceiro modelos e não corroborou o primeiro modelo. Assim, segundo estes autores a consciência do ataque e da rima afectam a aprendizagem da leitura e da escrita de duas

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formas. A primeira é por uma via indirecta, em que a sensibilidade ao ataque e à rima são precursores do desenvolvimento da detecção de fonemas, que por sua vez tem um papel importante na aprendizagem da leitura. A segunda forma é por uma via directa, em que a sensibilidade ao ataque e à rima tem um efeito positivo sobre a aprendizagem da leitura e da escrita que não é mediado pela consciência fonémica.

Neste sentido esta corrente defende que o ensino deve seguir o desenvolvimento fonológico do ser humano, ou seja, iniciando-se nas unidades fonológicas a que as crianças têm acesso quando iniciam a aprendizagem, ou seja a rima e o ataque, passando depois para unidades cada vez mais pequenas até conseguirem dominar o fonema.

Para Goswami (2002) as diferenças individuais na sensibilidade fonológica podem ser medidas numa variedade de formas nas crianças que já conseguem ler, no entanto, nas crianças pré-leitoras, estas diferenças apenas podem ser avaliadas em termos de unidades fonológicas maiores – sílabas, ataques e rimas. Os defensores desta perspectiva argumentam que, como demonstram os estudos em adultos iletrados (Adrián et al., 1995; Lukatela et al., 1995; Morais et al., 1979; Mota & Castro, 2007), os pré-leitores não conseguem realizar a maioria das tarefas de consciência fonémica antes de serem instruídos na leitura e na escrita. Neste sentido a aprendizagem das primeiras capacidades de leitura e escrita dependem das capacidades fonológicas ao nível ataque-rima, uma vez que a consciência fonémica apenas se torna importante mais tarde, e possivelmente como consequência da aprendizagem da leitura nos sistemas alfabéticos.

Vários estudos têm, no entanto, testado estas hipóteses e têm concluído a favor de uma visão alternativa que defende que as capacidades de segmentação da rima e do fonema são relativamente independentes e que a segmentação do fonema é a capacidade que melhor prediz o progresso subsequente das crianças na aprendizagem da leitura (Hulme et al., 2002; Muter et al., 2004; Muter et al., 1998).

Muter et al. (1998) realizaram um estudo longitudinal no qual compararam o papel da segmentação fonémica e da consciência da rima como preditores do progresso das crianças nos primeiros dois anos de aprendizagem da leitura e da escrita. Os resultados indicaram que a segmentação fonémica, avaliada através de tarefas de identificação fonémica e de supressão fonémica, foi o melhor preditor dos progressos nos dois primeiros anos aprendizagem da leitura e da escrita. De igual forma Hulme et al. (2002) comprovaram que as capacidades metafonológicas ao nível fonémico são melhores preditoras da aprendizagem da leitura do

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que as capacidades ao nível do ataque-rima, mesmo quando os efeitos da idade, vocabulário, e leitura da palavra inicial foram controlados. Os resultados destes estudos vão ao encontro dos resultados de outros estudos realizados em diferentes línguas (Caravolas et al., 2001; Caravolas et al., 2005; Capovilla et al., 2004; Hulme et al., 2002; Linklater et al., 2009; Muter et al., 2004; Nikolopoulos et al, 2006; Høien et al., 1995; Teixeira, 2005; Vale, 2000; Vanasse et al., 2005).

Segundo Hulme e colegas (Hulme, 2002; Hulme et al., 2002) a superioridade da consciência fonémica em predizer os progressos na aprendizagem da leitura e da escrita deve-se ao facto de nos sistemas alfabéticos a escrita deve-se fazer através do mapeamento entre os fonemas e as letras (grafemas). Para a criança aprender a ler tem que compreender as regras que governam as relações entre os grafemas e os fonemas, isto é, tem que compreender as correspondências grafema-fonema (e inversamente, fonema-grafema). Neste sentido, tendo em conta os processos de leitura e escrita nos sistemas alfabéticos é inevitável que a consciência fonémica seja melhor preditor das primeiras capacidades de leitura e escrita. Outro dos argumentos destes autores é que o desempenho das crianças nas tarefas de consciência fonémica permite perceber a natureza das representações fonológicas que a criança possui. O desempenho da criança nas tarefas de consciência fonémica depende do grau de especificação das suas representações fonológicas em termos fonémicos. Por outro lado, a capacidade para ler eficazmente depende da criação de mapas entre as representações ortográficas grafémicas e as representações fonológicas organizadas em fonemas. Assim, um bom desempenho nas tarefas de consciência fonémica é um bom indicador de que as representações fonológicas estão suficientemente organizadas de forma que permitem a criação eficaz de mapas entre a ortografia (grafemas) e a fonologia (fonemas). De acordo com estes autores as apreciações do ataque e da rima são tarefas mais fáceis do que apreciações acerca do fonema, pelo que são indicadores menos eficazes do nível de organização das representações fonémicas, e por conseguinte não conseguem predizer tão eficazmente os progressos ulteriores na aprendizagem da leitura/escrita.

4. Tarefas de consciência fonológica

Como foi referido ao longo do trabalho o nível de dificuldade que as tarefas metafonológicas colocam às crianças depende da unidade fonológica que está a ser avaliada. As unidades fonológicas maiores, como a sílaba ou a rima, tendem a ser mais facilmente

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detectáveis do que as unidades mais abstractas, os fonemas. Do mesmo modo, o tipo de tarefa usado para avaliar as capacidades de consciência fonológica também têm uma grande influência. Os estudos que avaliam as mesmas unidades fonológicas com tarefas diferentes comprovam que as tarefas colocam mais ou menos dificuldades dependendo do esforço cognitivo exigido (e.g., Anthony et al., 2003; Graaff, Hasselman, Verhoeven, & Bosman, 2010; Muter et al., 1998; Hulme et al., 2002; Vale, 2000; Vanesse et al., 2005).

As investigações acerca da consciência fonológica assentam num grande número de tarefas, por vezes muito diferentes. Segundo Stanovich et al. (1984) todas as tarefas usadas envolvem muitos processos cognitivos que não se restringem à capacidade de análise fonológica que é foco de interesse desses testes (e.g., memória de curto prazo, comparação de estímulos, processamento das instruções da tarefa). Um dos factores importantes que pode influenciar o desempenho nas tarefas metafonológicas é a memória de trabalho exigida. Um estudo de Oakhill e Kyle (2000) testou o nível de memória de trabalho associado a duas tarefas de consciência fonológica (tarefa de supressão do fonema inicial e uma tarefa de detecção do intruso, na qual a criança tinha que escolher de entre quatro palavras aquela que não tinha o mesmo som que as restantes). Os resultados indicaram que a tarefa de detecção do intruso estava significativamente associada à memória de trabalho o que não se verificou na tarefa de supressão fonémica.

Vários estudos têm comprovado que diferentes tarefas colocam dificuldades diferentes às crianças pré-leitoras, leitoras iniciantes e leitoras experientes. Vanesse et al. (2005) estudou os desempenhos de crianças francesas em diferentes tarefas metafonológicas: reconhecimento de rima, produção de rima, segmentação das palavras em fonemas e sílabas, síntese fonémica e silábica, inversão de fonemas e sílabas. Os resultados indicaram que a partir do segundo ano de escolaridade a dificuldade que as tarefas colocam às crianças é praticamente a mesma independentemente da unidade fonológica alvo, ou da natureza da tarefa. No entanto, para as crianças do jardim-de-infância denota-se um claro efeito destas duas variáveis. Os resultados indicaram que a tarefa claramente mais fácil foi a que envolvia o reconhecimento da rima, enquanto as mais difíceis foram as que envolviam a manipulação de fonemas, tais como inversão e a segmentação fonémica. Nesta idade verificou-se claramente o efeito do tamanho da unidade fonológica em análise, e por outro lado a natureza da tarefa também teve influência sobre as dificuldades que a mesma proporciona às crianças. O reconhecimento da rima obteve uma percentagem de sucesso muito superior à verificada na produção da rima, o que é demonstrativo da influência do tipo de tarefa na performance da criança.

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Anthony et al. (2003) estudaram a aquisição das capacidades de sensibilidade fonológica em 947 crianças pré-leitoras falantes da língua inglesa, tendo os resultados apontado que quanto mais velhas as crianças, mais facilidade tinham na resolução das tarefas com estruturas fonológicas mais pequenas, e pelo contrário quanto mais novas as crianças mais dificuldades apresentavam. Por outro lado, as crianças conseguiam detectar as semelhanças, ou não, dos sons das palavras antes de conseguirem manipular esses sons. Estes resultados indicam que as crianças são capazes de detectar a informação fonológica antes de conseguirem manipular a informação fonológica similar (e.g., tarefas de síntese e supressão).

Um estudo recente de Graaff, Hasselman, Verhoeven, e Bosman (2010) avaliou o efeito da tarefa e da posição do fonema no desempenho de 141 crianças alemãs do Jardim-de-Infância em testes metafonológicos. Os resultados demonstraram a existência de um efeito da tarefa em ambas as posições (fonema inicial e final), uma vez que as crianças obtiveram desempenhos superiores nas tarefas de síntese fonémica (dizer qual a palavra que se forma se se juntar um determinado som com o resto da palavra incompleta) e análise fonémica (dizer qual o primeiro ou o último som de uma palavra) comparativamente com as tarefas de segmentação fonémica (dizer a palavra se separasse o primeiro o som indicado pelo experimentador da palavra fornecida) e supressão fonémica (dizer a palavra se se apagasse o primeiro ou o último som da palavra fornecida).

O efeito da tarefa sobre os desempenhos das crianças nos testes de consciência fonológica também já foi verificado para o português Europeu por Vale (2000). Nesta investigação foram comparados dois testes metafonológicos relativamente ao grau de dificuldade que colocam às crianças e ao seu potencial para predizer os progressos nas aprendizagens alfabéticas. Este estudo utilizou um teste de análise fonológica, no qual a criança tinha que dizer qual o “bocadinho de som” que era partilhado por um par de palavras, e um teste de detecção fonológica, em que a criança tinha que referir se o par de palavras tinha ou não o mesmo “bocadinho de som”. As palavras eram as mesmas nos dois tipos de tarefa. Cada um dos testes tinha cinco condições diferentes: rima, coda, núcleo, corpo da sílaba, e ataque. Os resultados do estudo indicaram que as representações fonológicas das crianças pré-leitoras não estavam suficientemente elaboradas para realizar operações de análise explícita tendo sido a detecção das diferenças/semelhanças das unidades fonológicas mais fácil do que manipular essas unidades. As tarefas de detecção que envolviam unidades fonológicas maiores (rima e corpo da sílaba) foram mais fáceis do que aquelas que exigiam a identificação de unidades fonológicas mais abstractas (fonemas). Relativamente ao potencial

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dos testes para predizer as aprendizagens alfabéticas, os resultados indicaram que no momento inicial da aprendizagem da leitura e da escrita, a detecção do ataque, isto é, a sensibilidade à consoante inicial foi a tarefa que melhor explicou o desempenho ulterior em leitura e na escrita. Neste sentido os resultados sugeriam que as tarefas de detecção têm um maior potencial para diferenciar as crianças pré-leitoras, e consequentemente predizer o desempenho posterior na escrita e na leitura, do que as tarefas que envolviam uma consciência explícita das diferenças que as palavras têm ao nível fonémico.

Figura 1

Dificuldade das tarefas de consciência fonológica (adaptado pelo autor a partir de McBride-Chang, 2004).

McBride-Chang (2004) propõe que as tarefas de consciência fonológica podem ser classificadas, quanto ao nível de dificuldade, segundo dois eixos (Figura 2): o do nível da representação e o tipo de resposta exigido pela tarefa. Relativamente ao eixo do nível de representação, como mostram diversos estudos (Cardoso-Martins et al., 2002; Carroll, et al., 2003; Høien et al., 1995; Hulme et al., 2002; Treiman & Zukowski, 1991, 1996), as tarefas que envolvem unidades maiores, como as sílabas ou as rimas, são as que criam menores dificuldades às crianças. No extremo oposto do eixo estão as tarefas que têm como alvo os níveis fonológicos mais abstractos, os fonemas. Por outro lado, o eixo do tipo de resposta exigida, tem no extremo das tarefas mais difíceis, aquelas que exigem a manipulação da

Difícil (nível do fonema) Fácil (nível da sílaba) Difícil (manipulação da fala) Fácil (escolha forçada) Níve is d e r ep re se n taç ão Tipo de resposta Escolha múltipla: e.g. qual

palavra começa com o mesmo som de Faca? Vela ou Fita?

Consciência fonémica para pseudo-palavras: e.g. diz Vila sem o som /v/.

Percepção da fala: e.g. as palavras mota/bota são a mesma palavra ou palavras diferentes?

Manipular a fala para produzir uma resposta: e.g. diz combate, sem dizer com.

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estrutura fonológica da fala, enquanto no extremo oposto se localizam as tarefas que exigem uma escolha forçada.

Por outro lado Ball (1993) refere que as tarefas podem ser classificadas num contínuo de complexidade, em que no extremo das tarefas mais simples e menos exigentes se situam as tarefas que implicam somente uma sensibilidade global à estrutura fonológica da fala (e.g., jogos de sons, correcções de produções), no meio do contínuo situam-se tarefas de detecção do fonema inicial, de síntese e segmentação de fonemas, e no extremo das tarefas mais exigentes, são incluídas as tarefas que envolvem capacidades analíticas, conscientes e explícitas (e.g., substituição, supressão, e inversão de fonemas).

Como foi mencionado antes, as diferenças entre as provas podem influenciar os desempenhos das crianças nas tarefas metafonológicas. As diferentes exigências de cada tarefa podem também ter efeitos sobre o seu potencial para predizer os desempenhos alfabéticos. A supressão de fonemas, por exemplo, é uma das tarefas que se relaciona mais fortemente com a leitura (Hulme et al., 2002; Stanovich et al., 1984). Nas crianças pré-leitoras, como Vale (2002) demonstrou, as tarefas de detecção fonémica parecem ser as que melhor se relacionam com os desempenhos ulteriores em leitura e escrita.

Alguns estudos também têm verificado as propriedades psicométricas de diferentes tarefas metafonológicas. Hulme et al. (2002) avaliou o índice de fidelidade de três tarefas de consciência fonológica (detecção de semelhanças, detecção do intruso e supressão) através do alpha de Cronbach. Os resultados indicaram que os valores foram igualmente elevados e aceitáveis para todas as condições (ataque, rima, fonema inicial e fonema final) do teste de supressão. Para a tarefa detecção fonológica os valores de alpha de Cronbach foram menores, sendo no entanto na tarefa de detecção do intruso onde se verificam os valores mais baixos, principalmente nas condições que envolviam o fonema. Segundo os autores estes dados indicam que as tarefas de supressão, mais especificamente ao nível do fonema, parecem ser o método mais eficaz e preciso de avaliação das capacidades fonológicas nos primeiros anos de escolaridade.

Um outro estudo (Schaefer, Fricke, Szczerbinski, Fox-Boyer, Stackhouse, & Wells, 2009) realizado em crianças pré-leitoras, falantes do alemão, testou as propriedades psicométricas de uma bateria de consciência fonológica que incluía várias tarefas (segmentação, síntese, supressão, identificação, produção), que envolviam unidades fonológicas diferentes (sílaba, rima, ataque-rima, fonema) e que eram aplicadas com e sem

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