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Efeitos potenciais de mudanças climáticas no padrão de atividades do macaco-prego-galego, Sapajus flavius (Mammalia: Cebidae)

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE BIOCIÊNCIAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA ANIMAL

ANTONIO ROBÉRIO GOMES FREIRE FILHO

EFEITOS POTENCIAIS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO PADRÃO DE ATIVIDADES DO MACACO-PREGO-GALEGO, SAPAJUS FLAVIUS (MAMMALIA:

CEBIDAE)

Recife 2018

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ANTONIO ROBÉRIO GOMES FREIRE FILHO

EFEITOS POTENCIAIS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO PADRÃO DE ATIVIDADES DO MACACO-PREGO-GALEGO, SAPAJUS FLAVIUS (MAMMALIA:

CEBIDAE)

Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Biologia Animal, do Departamento de Zoologia, da Universidade Federal de Pernambuco, para obtenção do título de Mestre em Biologia Animal.

Área de concentração: Biologia Animal

Orientadora: Profª. Drª. Bruna M. Bezerra

Recife 2018

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Catalogação na fonte Elaine C Barroso (CRB4/1728) Freire Filho, Antônio Robério Gomes

Efeitos potenciais de mudanças climáticas no padrão de atividades do macaco-prego-galego, Sapajus Flavius (Mammalia: Cebidae) / Antônio Robério Gomes Freire Filho- 2018.

83 folhas: il., fig., tab.

Orientadora: Bruna M. Bezerra

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. Centro de Biociências. Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal. Recife, 2018.

Inclui referências

1. Macaco-prego-galego 2. Mudanças climáticas 3. Conservação I. Bezerra, Bruna M. (orient.) II. Título

599.85 CDD (22.ed.) UFPE/CB-2018-501

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ATIVIDADES DO MACACO-PREGO-GALEGO, SAPAJUS FLAVIUS (MAMMALIA: CEBIDAE)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal, do Departamento de Zoologia, da Universidade Federal de Pernambuco, para obtenção do título de Mestre em Biologia Animal

Aprovado em: 30 / 10 / 2018

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________________________ Dr. Diego Astúa de Moraes (Membro titular interno)

Universidade Federal de Pernambuco

_____________________________________________________ Dr. João Lucas Leão Feitosa (Membro titular interno)

Universidade Federal de Pernambuco

_____________________________________________________ Dra Maria Wilhelmina Barbosa de Oliveira Pil ( Membro titular externo)

Universidade Federal de Pernambuco

_____________________________________________________ Dr. João Pedro Souza-Alves (Membro suplente interno)

Universidade Federal de Pernambuco

_____________________________________________________ Dra. Monique Bastos de Araújo (Membro suplente externo)

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como biólogo. Aos meus amigos, principalmente, Igor Inforzato pela crença quase incondicional de acreditar que as coisas que eu ando fazendo vão dar certo. Gabi, Tuts e Vinícius pelo apoio no início dessa caminhada. Um agradecimento especial a Bárbara Pires (Babi) pelo o apoio nos momentos mais complicados da elaboração de tudo isso. Agradeço a todos os alunos e professores contemporâneos do PPGBA que de alguma forma me ajudaram a analisar e a pensar melhor sobre os resultados que obtive neste estudo. Lais Vieira, Camila Luna e Anna Virgina pelas muitas conversas e tira dúvidas no whatsapp. Agradeço a Laís Morais pelas trocas de ideias e pela amizade. De um modo geral, gostaria de agradecer as amizades construídas em Recife que me ajudaram a conhecer a cidade e todas as festas. Sou grato aos assistentes de campo e de logística, Antonio Pedro (Peixe), Cristiano (Arroz), Fabiano, João Maria, Birino e Rodrigo. Agradecimento especial vai para Antonio Pedro (Peixe) pela dedicação, quase religiosa, ao trabalho de campo, pelas trocas de ideias, pela ajuda na identificação das plantas, por não demonstrar cansaço, pela disponibilidade, pela troca de aprendizado pelo aprendizado multo e constante. AgradeciBruna Bezerra, ela foi fundamental para a elaboração e construção de todo esse trabalho. Muito obrigado pelas dicas, pelo apoio e por acreditar que eu poderia executar tudo isso. Agradeço a todos que compõem o LabEt pelas ajudas pontuais e pelas conversas/discussões, muitas vezes polemicas, que geramos no laboratório. Isso é muito importante para a construção científica. Continuando no tema construção científica, agradeço o João Pedro pelas inúmeras conversas e debates relacionados a diversos temas da primatologia. Bruna Teixeira pela amizade, ajuda em campo e na triagem do material coletado, ela foi uma peça fundamental para concluir todo esse trabalho. Agradeço Luiza, Dinho e Breno pelo trabalho de campo e triagem. Agradeço a FACEPE pela bolsa de estudos, foi fundamental para a construção deste trabalho. A Rufford Foundation pelo financiamento total do trabalho de campo e por ser uma fundação primordial para a conservação das espécies ameaçadas de extinção em todo o mundo. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiemento 001. Agradeço a Cristal Mineração do Brasil, na figura de Geraldo e Virgílio, pelo apoio logístico, alojamento e alimentação durante as etapas de campo. Aos funcionários da Florativa pela ajuda em campo e retirada de dúvidas ao longo do período de trabalho.

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precipitação no Nordeste do Brasil. Tais variações climáticas podem afetar fortemente aspectos ecológicos e comportamentais dos animais, sendo importante entender o impacto de tais mudanças. Portanto, neste estudo almejamos compreender como que o Criticamente Ameaçado macaco-prego-galego (Sapajus flavius) ajusta seu orçamento comportamental e padrão ecológico ao longo do dia para estimar como as mudanças climáticas previstas para o futuro irão influenciar tais mecanismos. Além disso, avaliamos a influência dos principais itens alimentares no tamanho da área de vida e dos subgrupos. Assim, propomos medidas efetivas para o plano de ação nacional de conservação da espécie. O estudo foi desenvolvido em fragmento de Mata Atlântica no estado da Paraíba-BR por meio de monitoramentos mensais em expedições com duração de dez dias durante 12 meses. Usamos método de varredura instantânea para a coleta de dados comportamentais e ecológicos dos animais. Realizamos uma modelagem de equação estrutural para estimar as relações entre aspectos comportamentais e ecológicos e variáveis abióticas de temperatura e pluviosidade. Nossos resultados mostram que durante o período mais quente do dia os animais tendem a usar os estratos mais baixos da floresta, diminuir a frequência relativa de alimentação e aumentar a socialização entre eles. 53,03% da frequência relativa dos registro de alimentação correspondem a plantas exóticas e 80,36% registros representam apenas cinco espécies de vegetais, três são exóticas e duas nativas. O consumo de Cupiúba (Tapirira

guianensis), um dos principais itens alimentares, tem uma relação negativa com o tamanho da

área de uso e uma relação positiva com o tamanho dos subgrupos. Concluímos que os macacos-prego-galego ajustam seu orçamento comportamental consoante a variação na temperatura. Para o futuro, o nosso modelo demonstrou que o aumento em um grau da temperatura aumentaria a frequência de uso do chão e de socialização em 3,37 e 1,10 vezes, respectivamente. Apesar da temperatura afetar o orçamento comportamental do macaco-prego-galego, sua plasticidade alimentar parece conferir atualmente um poder de adaptação em áreas fragmentadas, tendo as plantas exóticas um papel importante na sua dieta. Contudo, o tamanho dos subgrupos e da área de uso são influenciados pela produção de plantas nativas, com a Cupiúba.

Palavras-chave: Primata ameaçado. Modelagem de equação estrutural. Conservação. Mudanças de clima. Mata Atlântica.

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Predictive models estimated an increase in temperature and a decrease in precipitation in Northeast Brazil. Such climatic variations can strongly affect the ecological and behavioral aspects of animals, and it is important to understand the impact of such changes. Therefore, in this study we aim to understand how the Critically Endangered Blonde capuchin (Sapajus flavius) adjusts its behavioral activity budget and ecological patterns throughout the day to estimate how future climate changes will influence such mechanisms. In addition, we evaluated the influence of the main food items on home range size and subgroups size. Thus, we propose effective measures for the national conservation plan of the species. The study was carried out in a fragment of the Atlantic Forest in the state of Paraíba, Brazil, through monthly monitoring in expeditions lasting ten days for 12 months. We used a scan sampling method to collect behavioral and ecological data from the study animals. We performed structural equation modeling to estimate the relationships between behavioral and ecological aspects and temperature and rainfall. Our results show that during the hottest period of the day the animals tend to use the lower strata of the forest, decrease the relative frequency of locomotion and increase the socialization between them. 53.03% of the relative frequency of feeding records correspond to exotic plants and 80.36% records represent only five plant species, three are exotic and two natives. The consumption of Cupiúba (Tapirira guianensis), one of the main food items, has a negative relationship with the home range size and a positive relation with the subgroups size. We concluded that Blonde capuchin adjusts their behavioral budget according to the variation in the temperature. For the future, our model demonstrated that increasing one degree in temperature would increase the frequency of the use of the ground and socialization by 3.37 and 1.10 times, respectively. Although the temperature affects the behavioral activity budget of Blonde capuchin, their diet plasticity seems to allow adaptation in fragmented areas, where exotic plants have an important role. Nevertheless, subgroup and home range sizes are also influenced by the production of native plants such as Cupiúba.

Keywords: Endangered primate. Structural equation modeling. Conservation. Climate change. Atlantic forest.

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REFERENCIAL TEÓRICO

Figura 1 – Fragmentação da Mata Atlântica resultante do cultivo histórico de cana-de-açúcar no nordeste do Brasil. ... 21 Figura 2 – Macho jovem de macaco-prego (Sapajus libidinosus) mantido em cativeiro por agricultores do município de Massapê-CE. ... 21 Figura 3 – Macho adulto, ilustrando o dimorfismo sexual presente na espécie (seta vermelha chama atenção para a barbela) (A) e fêmea adulta carregando um filhote sem a presença da barbela (B). ... 25

Artigo 1

Figura 1 – Mapa de localização da área de estudo, indicando sua posição no Brasil, e identificando a sua localização mais detalhada do fragmento de Mata Atlântica pertencente ao município de na costa do estado da Paraíba-Brasil. ... 32 Figura 2 – Diagrama detalhando a classificação utilizada para identificar (à direita) o uso do estrato relativo da paisagem (i.e., chão, sub-copa, copa média e copa alta), e (à esquerda) o uso do estrato vertical real (i.e., altura estimada) em que o animal se encontrava. ... 35 Figura 3 – Matriz de correlações Pearson, enfatizamos o tipo (os círculos vermelhos e azuis representam correlações negativas e positivas, respectivamente) e a intensidade das relações entre as variáveis estudadas. O asterisco (*) no gráfico representam correlações com p-value ≤ 0,05. . 38 Figura 4 – Relações entre variação da temperatura e as categorias comportamentais descanso, socialização e forragear ao longo do dia (a). Variação da temperatura e das categorias comportamentais alimentação e locomoção ao longo do dia durante ao longo do peírodo de estudo (b). ... 39 Figura 5 – Variação do uso do estrato ao longo do dia pela população de macaco-prego-galego investigada no fragmento de Mata Atlântica no NE do Brasil durante ao longo do período de estudo, o uso do estrato reslativo (a) e o uso dos estratos reais (b) consoante a variação de temperatura ao longo do dia. ... 40

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Figura 7 – Diagrama de caminhos produzido com os dados resultantes do modelo construído. As setas verdes representam valores de relações positivas e vermelho valores de relações negativas para as constantes das regressões realizadas pela modelagem. Frequência de Uso do chão (Cha) e de Socialização (Soc) são as variáveis resposta e Temperatura (Temp) é uma das variáveis explicativas usadas no modelo. Alimentação (Ali) tanto foi usada como variável resposta como variável explicativa. ... 42 Figura 8 – Cenários esperados com base nos dados do IPCC. O gráfico mostra o aumento da frequência relativa de uso do chão (a) e da frequência relativa de socialização (b); e diminuição da frequência relativa de alimentação (c) com o aumento de 1, 3 ou 5°C. O aumento da temperatura projetado pelo IPCC pode aumentar a frequência relativa de uso do chão e a frequência relativa de descanso em até 16,8 e 5,5 unidades, respectivamente. Além disso, o aumento da temperatura pode diminuir a frequência relativa de alimentação em até 7,45 unidades. ... 43

Artigo 2

Figura 1 – Mapa de localização da área de estudo, indicando sua posição no Brasil, e identificando a sua localização mais detalhada do fragmento de Mata Atlântica pertencente ao município de na costa do estado da Paraíba-Brasil. ... 60 Figura 2 – Matriz de correlações de Spearman, enfatizamos o tipo e a intensidade das relações entre as variáveis estudadas. Os asteriscos (*) nos gráficos representam correlações com p-value < 0,05. ... 66 Figura 3 – Representação da oscilação do consumo somado de Cana-de-açúcar, Dendê e Oliveira (plantas exóticas) e o consumo total ao longo do ano de Cajú e Cupiúba (plantas nativas). ... 67

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Artigo 1

Tabela 1 – Descrição das categorias comportamentais consideradas nas observações de varredura dos macacos-prego-galegos observados no fragmento de Mata Atlântica em Mataraca, Paraíba, Brasil. ... 34 Tabela 2 – Modelo que melhor explica as relações entre variáveis resposta (primeira linha) e explicativas (primeira coluna). As constantes resultantes das regressões realizadas pelo MEE demonstram as relações de cada variável resposta e suas variáveis explicativas. Os valores de P (P-value) e o valor de EMQ são itens que indicam a qualidade do modelo. O valor não significativo do valor de P (>0,05) é um critério importante para determinar um bom modelo. ... 43

Artigo 2

Tabela 1 – Lista dos itens alimentares consumidos por macaco-prego-galego durante o período de estudo em um fragmento de Mata Atlântica no NE do Brasil. Os asteriscos (*) representam espécies que foram consumidas, mas não foram registradas nas amostragens de varredura. ... 65

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ... 12 1.1 OBJETIVOS ... 15 1.1.1 Objetivo geral ... 15 1.1.1 Objetivo específicos ... 15 2 REFERENCIAL TEÓRICO ... 15

2.1 IMPACTOS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS ... 15

2.2 CONSERVAÇÃO ... 18

2.3 PRINCIPAIS AMEAÇAS AOS PRIMATAS ... 20

2.4 MACACO-PREGO-GALEGO, Sapajus flavius ... 23

3 MÉTODOS ... 26

3.1 ÁREA DE ESTUDO ... 26

3.2 ANIMAIS ... 26

3.3 COLETA DE DADOS ... 27

4 EFEITOS POTENCIAIS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO PADRÃO DE ATIVIDADES E NO USO DO ESPAÇO EM SAPAJUS FLAVIUS (PRIMATA: CEBIDAE) ... 28

5 ECOLOGIA ALIMENTAR DO MACACO-PREGO-GALEGO (SAPAJUS FLAVIUS - PRIMATA: CEBIDAE) ... 57

CONCLUSÕES GERAIS ... 75

SUGESTÕES PARA CONSERVAÇÃO ... 76

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1 INTRODUÇÃO

O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (Intergovernmental Panel on

Climate Change - IPCC) previu um aumento da temperatura para todo o continente sul-americano

e uma diminuição da precipitação no Nordeste brasileiro para o final deste século (PBMC 2013). De acordo com o IPCC, pode haver uma diminuição entre 5% e 20% na precipitação e um aumento da temperatura entre 1ºC e 5ºC. Os cenários climáticos futuros sugerem um aumento das secas extremas (PBMC 2013), aumentando os processos de desertificação do meio e final do século XXI. Contudo, tal processo pode ser acelerado consoante o uso excessivo e insustentável dos recursos naturais, afetando diretamente a distribuição e a existência da biodiversidade local (de Oliveira et al. 2012).

Vários modelos preditivos estão sendo desenvolvidos e utilizados para compreender como que a mudanças climáticas afetarão a distribuição e/ou aspectos ecológicos e comportamentais das espécies em todo o mundo, sendo um dos principais focos da biologia da conservação (Pearson & Dawson, 2003; Dunbar et al., 2009; Lehmann et al., 2010; Sinclair et al., 2010; Carne et al 2012). Tais modelos se baseiam em informações atuais sobre estes organismos para, assim, projetar cenários futuros. Um desses métodos é a Modelagem de Equações Estruturais (MEE, ou em inglês Structural Equation Modeling – SEM), um conjunto de técnicas e procedimentos que usam uma extensão de outras técnicas multivariadas, avaliando relações de dependência e independência entre uma ou mais variáveis (Pereira 2013). Esta modelagem é um conjunto equações de regressões multivariadas analisadas simultaneamente, uma variável resposta em uma equação pode ser preditora em outra, assim, as variáveis podem influenciar uma na outra reciprocamente, diretamente ou por meio de outras variáveis (Hair et al 2009). Além disso, estima separadamente um conjunto de equações de regressão múltiplas, mas interdependentes, simultaneamente (Hair et al 2009).

Diferentes aspectos da biologia dos primatas podem ser afetados por mudanças no clima, gerando respostas comportamentais e ecológicas que podem aumentar o risco de extinção das espécies (Wiederholt & Post 2010; Graham et al. 2016; Korstjens & Hillyer 2016). Portanto, as mudanças das variáveis climáticas podem afetar a capacidade de termorregulação (Mitchell et al. 2009), aumentar a frequência de descanso (Koshelef & Anderson 2009; Korstjens et al. 2010; González-Zamora et al. 2011), alterar a proporção sexual (Wiederholt & Post 2011), diminuir a

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taxa de reprodução e/ou sobrevivência de filhotes (Dunham et al. 2010; Wiederholt & Post 2011), aumentar a mortalidade (Milton & Giacalone 2014), aumentar o isolamento de subpopulações (Dunbar 1998), aumentar a transmissão de doenças e a taxa de parasitismo (Barrett et al. 2013). Contudo, tais alterações climáticas podem ameaçar mais ou menos uma determinada espécie consoante suas características biológicas e capacidade de adaptação (Korstjens & Hillyer 2016). Por exemplo, primatas menos especialistas, que vivem em grupos grandes, com ampla distribuição e com cérebros maiores seriam menos suscetíveis as mudanças climáticas (Korstjens & Hillyer 2016). Para compreender as possíveis repostas de uma espécie às mudanças climáticas previstas pelo IPCC, é necessário o conhecimento sobre as compensações comportamentais e ecológicas dos animais que ocorrem por meio das variações naturais do ambiente. Dessa forma, interpretar e mensurar as mudanças comportamentais e ecológicas atuais é uma ferramenta importante para estimar o impacto das mudanças climáticas futuras em primatas (Korstjens & Hillyer 2016).

Além disso, a abundância, distribuição no tempo e no espaço de recursos alimentares chaves podem limitar o orçamento de atividades, afetando diretamente a ecologia das espécies em resposta a variação desses recursos. Nesse sentido, variações climáticas e modificações ambientais podem afetar a disponibilidade de determinados alimentos. A variação na precipitação, nas regiões tropicais, afeta fortemente os padrões fenológicos das espécies de vegetais (Leighton & Leighton 1983). Tais alterações fenológicas resultam na variação sazonal da disponibilidade de recursos alimentares forçando as espécies de animais a consumir itens alternativos, menos favoritos, e/ou buscar habitats mais favoráveis (Galetti & Pedroni 1994; Fleagle 1999; Wright et al 2009). Portanto, nos primatas, as variações temporais e espaciais dos recursos alimentares não afetam apenas a dieta das espécies, aspectos ecológicos como as distâncias percorridas diariamente, os padrões de utilização de habitats, os tamanhos dos subgrupos e coesão entres animais também podem ser afetados (Clutton-Brock & Harvey 1977; Strier 1987; Zhang 1995; Cowlishaw & Dunbar 2000; Zhang & Wang 2000; Pruetz 2006).

A escassez de recursos alimentares importantes para a espécie pode aumentar a área de uso utilizada e a frequência de alimentação, resultando em uma estratégia de “maximização de energia”, ou diminuir, restringindo o tamanho da área de uso e a frequência de alimentação em uma estratégia de “minimização de energia” (Beston 2006). Tais estratégias são embasadas na Teória do Forrageamento Ótimo, no qual, considera o custo e benefício para se obter o máximo

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de energia (Beston 2006). Dentro destas estratégias, existem itens alimentares preferidos, aqueles que são proporcionalmente mais escolhidos do que o esperado, fontes de fácil consumo e rápido ganho calórico, e reservas, tendem a ser itens com relativa baixa qualidade nutricional e alta abundância (Marshall & Wrangham 2007).

Os macacos-pregos são primatas do novo mundo generalistas e flexíveis no uso de recursos alimentares em diversos habitats, possuindo uma ampla distribuição em todo brasileiro e em diversos biomas (Fragaszy et al 2004). Atualmente, são divididos em dois gêneros, Cebus e Sapajus, devido a variações fenotípicas e genotípicas (Alfaro et al 2012). As espécies do Sapajus apresentam são classificadas como frugíveras/insetívoras, mas mantêm uma dieta bem diversificada, podendo variar entre população consoante as características ambientais (Fragaszy et al 2004). Devido a buscar por recursos alimentares, os macacos-pregos utilizam todo o espaço do seu habitat, do chão à copa das árvores mais altas (Fragaszy et al 2004). Além disso, conseguem desenvolver ferramentas e métodos para a obtenção dos recursos alimentares de difícil acesso (Fragaszy et al 2004).

O macaco-prego-galego (Sapajus flavius) foi oficialmente redescoberto há 12 anos (Oliveira & Langguth 2006; Mendes Pontes et al. 2006) e já foi listado entre os 25 primatas mais ameaçados do planeta (Mittermeier et al. 2012). Atualmente, é considerado “Em Perigo” pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) (Valença-Montenegro et al. 2015) e “Criticamente Ameaçado” de extinção pela The International Union for Conservation of Nature (IUCN) (de Oliveira et al. 2015). As principais ameaças para a espécie são a perda e a fragmentação do habitat. O macaco-prego-galego é endêmico da Mata Atlântica nordestina, sendo conhecidas 29 populações com distribuição restrita aos estados brasileiros do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas (Fialho et al. 2014; Valença-Montenegro et al. 2015). O macaco-prego-galego fez parte do primeiro ciclo e agora continua fazendo parte do segundo ciclo do Plano de Ação Nacional de Proteção dos Primatas do Nordeste (PANPriNE) (Portaria nº 242, de 26 de março de 2018). A elaboração do PANPriNE iniciou em 2010, e teve como objetivo geral de garantir pelo menos cinco populações viáveis para cada espécie-alvo (guariba-de-mãos-ruivas (Alouatta belzebul), guigó-da-caatinga (Callicebus barbarabrownae), guigó-de-Coimbra-Filho (Callicebus coimbrai), macaco-prego-do-peito-amarelo (Sapajus xanthosternos) e macaco-prego-galego em diferentes ecossistemas até 2016. O segundo ciclo do PANPriNE, incluiu mais uma espécie (i.e., guariba-da-Caatinga (Alouatta ululata) e possui ações para

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garantir populações viáveis das espécies-alvo do plano, por meio de monitoramento de populações, elucidação de respostas comportamentais das espécies às alterações climáticas futuras e definição de áreas prioritárias para a conservação.

1.1 OBJETIVOS

1.1.1 Objetivo geral

O presente estudo visou estimar os efeitos potenciais de mudanças climáticas futuras sobre o comportamento e ecologia do macaco-prego-galego. Além disso, iremos compreender como que os principais itens alimentares da dieta do macaco-prego-galego podem afetar importantes aspectos ecológicos.

1.1.1 Objetivo específicos

- Averiguar a influência das variações de temperatura e umidade ao longo do dia sobre o orçamento comportamental (diário e total) e sobre o uso do espaço (vertical/estratificação).

- Construir um modelo que pudesse prever alterações potenciais no comportamento e na ecologia do macaco-prego-galego em função de projeções futuras do IPCC sobre mudanças climáticas de temperatura na área de endemismo da espécie.

- Identificar os itens alimentares chaves para a espécie, identificando a influencia das plantas exóticas na sua composição alimentar.

- Investigar como que a dieta do macaco-prego-galego pode influenciar a estrutura grupal (coesão e tamanho) e o uso do espaço (horizontal/área de vida).

- Contribuir de forma efetiva com propostas para o plano de ação nacional de conservação do macaco-prego-galego.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 IMPACTOS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS

O clima no nosso planeta é regulado pelo balanço entre a quantidade de radiação eletromagnética emitida pelo sol que é absorvida pela Terra e a quantidade de radiação que é emitida para o espaço pela Terra e atmosfera (Shine et al. 1990). Qualquer fator que interfira nesse balanço pode alterar o clima no planeta, ou seja, seriam os agentes de interferência

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radioativa (Shine et al. 1990; Watson et al. 1990). Dentre esses agentes estão os gases do efeito estufa (CO2, CH4, N2O e O3), as nuvens e aerossóis. Contudo, as atividades antrópicas vêem

aumentando as concentrações, principalmente, dos gases do efeito estufa no planeta. As concentrações de CO2 na atmosfera são as mais afetadas pelas atividades humanas, seguido pelos

clorofluorcarboneto produzido pela indústria (CFCs), CH4, O3 e N2O (Watson et al. 1990). Estas

alterações começaram a ocorrer nas últimas décadas e os gases do efeito estufa são caracterizados por permanecer muito tempo na atmosfera (Watson et al. 1990). Portanto, depois de inseridos na atmosfera demoram entre décadas e séculos para sair do planeta, resultando em respostas lentas nas concentrações atmosféricas (Watson et al. 1990).

A produção de gases do efeito estufa se intensificou após a revolução industrial e atualmente as principais atividades humanas que contribuem para o aumento destes gases são o consumo de combustíveis fósseis e o uso da terra (Watson et al. 1990). Tais atividades têm uma grande influência nas mudanças climáticas globais, causando um aumento médio da temperatura e dos níveis dos oceanos em todo o planeta (Mitchell et al. 1995).

O Intergovernamental Panel on Climate Changes (IPCC) é reconhecido internacionalmente como a principal fonte de informações sobre as mudanças climáticas por meio de modelos que abordam diversos cenários. O IPCC foi estabelecido pela World Meteorological

Organisation (WMO) e pela United Nations Environment Programme (UNEP) no ano de 1988

(Griggs & Noguer, 2002). O IPCC trabalha com dois termos de referência i) buscar obter informações científicas e socioeconômicas sobre as mudanças climáticas e seus impactos, propondo medidas mitigatórias as mudanças climáticas e formas de se adaptar a tais alterações; ii) quando solicitada, fornece assessoria científica/técnica/socioeconômica à Conference of the

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Parties to the United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC) (Griggs &

Noguer 2002).

Com base nos modelos preditivos utilizados pelos IPCC para realizar projeções climáticas futuras para o planeta, as alterações climáticas irão depender das emissões passadas e futuras dos gases do efeito estufa pela atividade antrópica, bem como pela variação natural do clima (Pachauri et al. 2014). Dependendo do cenário adotado, a temperatura da superfície terrestre pode aumentar em níveis distintos. Quando são considerados dados de 1986-2005 para estimativas de 2016-2035 o aumento de temperatura pode variar entre 0,3°C e 0,7°C (Pachauri et al. 2014). As projeções para o final do século 21 (2085-2100) usando dados de 1850-1900 indicam que pode ocorrer um aumento na temperatura entre 1,5°C e 2,0°C (Pachauri et al. 2014). Quando os modelos são projetados com base nos dados de 1986-2005 pode haver um aumento de 0,3°C até 4,8°C. As mudanças na precipitação não serão uniformes em todo o globo, áreas em grandes latitudes e o Pacífico equatorial apresentarão índices mais elevados de precipitação, já regiões sub-tropicais secas e latitudes medianas sofrerão com uma diminuição da precipitação (Pachauri et al. 2014). No Brasil, com base nos modelos traçados para o futuro, os valores das precipitações diminuirão entre ~5% e ~20% e a temperatura aumentará entre ~1°C e ~5°C. As projeções indicam uma significativa redução na precipitação em grande parte do centro, norte e nordeste do Brasil (PBMC 2013). Além disso, um aumento nas secas extremas nos biomas da Amazônia, Cerrado e Caatinga, tais mudanças são esperadas para o meio e final do século 21 (PBMC 2013).

Após as descobertas sobre mudanças climáticas, muitas pesquisas vêm sendo desenvolvidas com diversos grupos de seres vivos nos últimos anos. Essas pesquisas visam compreender como e/ou se os seres vivos irão se adaptar às alterações climáticas previstas para o futuro aceleradas e/ou alteradas devido a ação antrópica (Peñuelas & Filella 2001; Walther et al. 2002; Root et al. 2003; Berteaux et al. 2006). Pesquisadores prevêem mudanças na temperatura e/ou na pluviosidade em várias regiões do planeta (Pachauri et al. 2014). Tais variações podem alterar padrões de distribuição (Araújo et al. 2006), fisiológicos (Pörtner & Farrel 2008), comportamentais (Post et al. 1999), ecológico (Milton & Giacalone 2014) e populacionais (Derocher et al. 2004) de diversas espécies, afetando, por exemplo, a taxa de reprodução, probabilidade de sobrevivência, disponibilidade de recursos, taxa de predação e infanticídio, taxa de natalidade, termorregulação, crescimento populacional, transmissão de doenças, competição entre os indivíduos e a variabilidade genética (Root et al. 2003; Parmesan 2006; Ledig 2012). A

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fragmentação e a destruição da cobertura vegetal são fatores que aceleram o impacto ambiental causado pelas mudanças climáticas por aumentar a produção de gases do efeito estufa. Além disso, tais atividades podem provocar alterações irreversíveis na paisagem (e.g., desertificação) que ameaçam diretamente a sobrevivência de muitas espécies, inclusive os seres humanos (Opdam & Wascher 2004).

As mudanças climáticas juntamente com as atividades antrópicas são fortes ameaças a distribuição das espécies e a biodiversidade em todo o planeta (Bakkenes et al. 2002). Contudo, espécies atualmente ameaçadas de extinção estão mais suscetíveis a tais mudanças ambientais (Thomas et al. 2004; Thuiller et al. 2005). Estas, na sua maioria, são endêmicas, apresentam distribuição limitada, poucos indivíduos e baixa variabilidade genética, fatores que as tornam menos flexíveis a mudanças climáticas (IUCN, 2001). Portanto, diante das mudanças climáticas projetadas para o futuro, estas espécies devem ter uma atenção especial para não serem extintas do planeta (Thuiller et al. 2005). Com base em modelos preditivos, até o ano de 2050 o aquecimento global poderá causar uma diminuição entre 15% e 37%, no número de espécies existentes no planeta, os valores podem ser maiores ou menores consoante a região do globo e ao táxon que a espécie pertence (Thomas et al. 2004). Diante disso, os autores chamam a atenção para a importância de se desenvolver políticas e estratégias rápidas e eficientes para a diminuição da emissão dos gases do efeito estufa e sequestro de carbono (Thomas et al. 2004).

2.2 CONSERVAÇÃO

Apesar das atividades de conservação estarem presentes na humanidade a centenas de anos, nos últimos 150 anos o conceito de conservação passou por mudanças éticas e em termos de valores para o mundo ocidental (Callicott 1990). Em termos éticos, a humanidade começou a pensar que não tinha o direito de destruir o meio ambiente deliberadamente já que este sistema é compartilhado com outras espécies (Callicott 1990). Recentemente, tem aumentado a preocupação da humanidade sobre a importância de se manter as funções e a integridade dos processos e sistemas naturais, que os componentes naturais têm valores intrínsecos para a nossa sobrevivência (Fazey et al. 2005). O pensamento ético da conservação dos recursos naturais esteve atrelado a filosofia social democrática progressista da época (Callicott 1990).

Junto ao desenvolvimento do pensamento voltado a conservação dos recursos naturais surgiu a biologia da conservação. Inicialmente, a biologia da conservação foi definida como uma

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ciência que não é restritamente “pura”, mas que também não pode ser puramente aplicada (Soulé & Wilcox 1980). Também foi reconhecida como uma ciência “prescritiva”, algo entre a “ciência pura” e a “ciência aplicada” (Norton 1988). Contudo, Murphy (1990) propôs que a biologia da conservação é a aplicação do método científico clássico para a conservação da biodiversidade. A biologia da conservação utiliza rigorosos métodos científicos para gerar hipóteses, testar estas hipóteses e aplicar os resultados aos problemas específicos de conservação (Murphy 1990). Uma importante característica da biologia da conservação é a aplicação direta dos resultados da pesquisa científica para a conservação de uma espécie ameaçada de extinção, por exemplo (Murphy 1990).

Com o surgimento e crescimento do pensamento ético de conservação da natureza foram se formando instituições que visam a conservação ambiental e/ou de espécies. Em 1948, foi criada International Union for the Protection of Nature (atualmente conhecida como IUCN

World Conservation Union) (Fazey et al. 2005), atualmente a maior organização do mundo

dedicada a conservação da natureza. Décadas depois, surgiram The International Biological

Program (1968–1974) e a revista Biological Conservation (primeira publicação foi em 1968)

(Fazey et al. 2005).

A conservação de espécies ameaçadas de extinção são uma das principais preocupações da biologia da conservação. Atualmente, existem várias instituições governamentais ou não em todo o mundo que dedicam grande parte do seu tempo, trabalho, recursos financeiros e logísticos, para a preservação destas espécies. Muitos desses seres vivos são carismáticos e funcionam como “espécies bandeira” para angariar financiamento para a conservação delas e do ambiente onde vivem, promovendo assim, a conservação de outras espécies que habitam a mesma região (Walpole & Leader-Williams 2002). Primatas são frequentemente usados como espécie bandeira em várias partes do mundo. Por exemplo, no Brasil temos o mico-leão-dourado (Leontopithecus

rosalia) (Kierulff et al. 2012), o bugio-ruivo (Alouatta guariba clamitans) (Jerusalinsky et al.

2010) e o muriqui (Brachyteles hypoxanthus) (Chaves et al. 2011), em Madagascar temos o lêmure-preto-e-branco-de-colar (Varecia variegata) (King et al. 2013) e na Indonésia temos o orangotango (Pongo spp.) (Supriatna et al. 2014). O uso de uma espécie emblemática traz pelo menos duas vantagens para as instituições dedicadas a conservação de espécies (Home et al. 2009). Primeiro, é mais fácil apresentar a instituição como uma organização especializada e coerente. Em segundo lugar, gera menos barreiras mentais ao realizar atividades de angariação de

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fundos, pois os doadores podem anexar seu apoio a um assunto tangível que promove substancial conceito de conservação; quanto mais simples a mensagem, maior a vontade de doar (Leader-Willliams & Dublin 2000). No entanto, a identificação de uma “espécie bandeira” ideal pode ser difícil e várias potenciais questões devem ser considerados (Home et al. 2009). Contudo, a principal característica de uma “espécie bandeira” é o carisma. Esse é o principal fator para gerar empatia das pessoas e, assim, conseguir investimentos para a sua conservação. Outros fatores importantes na escolha de uma “espécie bandeira”, o grau de ameaça e o tamanho da área de vida (conservar animais com maiores áreas de vida possibilita proteger mais espécies) (Home et al. 2009).

2.3 PRINCIPAIS AMEAÇAS AOS PRIMATAS

Aproximadamente 54% das espécies de primatas existentes no planeta estão ameaçadas de extinção (IUCN, 2012) devido, principalmente, a perda e fragmentação de habitat, a caça (esportiva e de subsistência) e ao tráfico de animais silvestres (uso de primatas como animais de companhia) e pelas mudanças climáticas (Mittermeier et al. 1989; Chapman & Peres 2001; Chapman et al. 2006; Graham et al. 2016). Podemos dividir estas ameaças aos primatas em dois grupos: i) ameaças indiretas e ii) ameaças diretas. As ameaças indiretas são atividades antrópicas que causam a perda e/ou fragmentação de habitat, por exemplo, agricultura, criação de gado, uso de árvores como combustível ou carvão e hidroelétricas (Figura1) (Mittermeier et al. 1989). As ameaças diretas são atividades que afetam diretamente os animais, caça e o uso como animais domésticos (Figura2) (Mittermeier et al. 1989).

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Figura 1 Fragmentação da Mata Atlântica resultante do cultivo histórico de cana-de-açúcar no nordeste do Brasil.

Fonte: Bastos M (2018).

Figura 2 Macho jovem de macaco-prego (Sapajus libidinosus) mantido em cativeiro por agricultores do município de Massapê-CE.

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A crescente perda florestal causada pelo desmatamento, extração de madeira e incêndios transformam grandes áreas florestadas em pequenos e dispersos fragmentos florestais (Meyer 2017). Tal processo tem sérias consequências para a conservação das espécies de primatas, impactando diretamente estes animais, resultando em extinções locais e diminuição na distribuição geográfica destes (Meyer 2017). Como foi abordado acima, esta degradação ambiental influência diretamente na emissão dos gases do efeito estufa (Watson et al. 1990). O aumento da concentração desses gases na atmosfera acarreta um aumento da temperatura da superfície terrestre, diminuição na precipitação e elevação dos níveis dos oceanos (Watson et al. 1990).

As mudanças climáticas têm mostrado um impacto negativo sobre as espécies de primatas, tanto a nível de indivíduo como a nível de população (Graham et al. 2016). Os impactos são diversos, mas de um modo geral influenciam fortemente a ecologia, o comportamento e a distribuição das espécies de primatas. Estas mudanças tendem a diminuir a taxa de reprodução das espécies (Dunham et al. 2010), afetam a proporção sexual (Wiederholt & Post 2011), aumentam a taxa de infecção por parasitas e a taxa de transmissão de doenças (Chapman et al. 2010; Barrett et al. 2013), aumentam a mortalidade (Milton & Giacalone 2014) e aumentam o isolamento de subpopulações (Dunbar 1998). A proporção sexual de nascimentos foi afetada pelas condições climáticas em duas espécies da família Atelidae, macaco-barrigudo (Lagothrix

lagotricha) e muriqui-do-norte (Brachyteles hypoxanthus), mas de forma diferentes (Wiederholt

& Post 2011). O El niño aumenta o número de filhote machos de macacos-barrigudo e condições mais quentes e secas influenciam o número de nascimentos de machos de muriqui-do-norte (Wiederholt & Post 2011).

Bem como eventos de secas extremas e temperaturas elevadas afetam as populações de primatas (Graham et al. 2016), grandes tempestades influenciam a disponibilidade de recursos alimentares, causam destruição do habitat, podem alterar os padrões de atividade e a estrutura social (Pavelka et al. 2007). Devido ao aumento da pluviosidade média no mês de dezembro, resultando em uma diminuição da produção de artrópodes ricos em proteína no ano de estudo, ocorreu um aumento da mortalidade de macacos-prego-de-cara-branca (Cebus capucinus) (Milton & Giacalone 2014).

A diminuição de primatas pela caça vem ocorrendo na América do Sul, Ásia e África, afetando diretamente as populações desses animais (Peres & Dolman 2000; Effiom et al. 2013;

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Rimbach et al. 2013). Dois fatores são responsáveis pelo aumento da caça em todo o mundo. Primeiro, crescimento populacional dos trópicos, áreas urbanas e rurais, aumentam a demanda por carne. O segundo fator é a melhoria da infra-estrutura, em parte como consequência da extração de áreas florestais remotas e do transporte de produtos agrícolas para os mercados urbanos, facilitando o transporte de animais caçados da floresta para consumidores urbanos (Effiom et al. 2013). O uso de primatas como animais de estimação tanto por povos indígenas como por populações urbanas pode causar danos irreparáveis para as populações de primatas. É comum em tribos indígenas Amazônicas ver mulheres amamentando filhotes de primatas dos gêneros Lagothrix, Ateles, Cebus, Saimiri, Saguinus e Callithrix (Chapman & Peres 2001). O tráfico de animais de um modo geral causa grandes perdas no número de animais, onde muitos dos animais capturados morrem antes de chegar nas mãos dos compradores. Na Amazônia brasileira, estima-se que uma média de 10 fêmeas lactantes são mortas para se conseguir um filhote de primata (Peres 1990).

2.4 MACACO-PREGO-GALEGO, Sapajus flavius

Há 12 anos, dois grupos de cientistas encontraram exemplares de macaco-prego-galego em fragmentos de Mata Atlântica no nordeste do Brasil. Contudo, um deles achou que havia descoberto uma nova espécie de primata e, assim, descreveram os animais como holótipos da nova espécie (Mendes Pontes et al. 2006). Contudo, um outro grupo de cientistas identificaram os exemplares como Cebus flavius e, assim, redescobriram que havia sido dada como extinta (Oliveira & Laugguth 2006). Os primatas desse gênero, por sua vez, foram recentemente separados em dois gêneros, Sapajus e Cebus, com base em aspectos genéticos, tendo o macaco-prego-galego se encaixado como Sapajus (Alfaro et al. 2012). O gênero Sapajus é formado por primatas de médio porte, com o peso variando entre 1,4 kg - 4,8kg e comprimento total da cabeça e corpo varia entre 350 e 488 mm (Freese & Oppenheimer 1981; Groves 2001). Possuem uma forte mandíbula e dentes compactos e grandes para conseguir consumir recursos mais duros e/ou de difícil acesso (Fragaszy et al. 2004; Alfaro et al. 2012). Além disso, possuem polegares pseudo-oponíveis, que otimizam o forrageio extrativo e facilita o uso de ferramentas (Fragaszy et al. 2004; Alfaro et al. 2012). Os gêneros Cebus e Sapajus apresentam os primatas do Novo Mundo com maior relação entre o tamanho relativo do cérebro e o tamanho do corpo, resultando no segundo maior índice de capacidade craniana (ICC) (Bicca-Marques et al. 2006). Tais

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adaptações os permitem habitar todos os tipos de florestas neotropicais, resultando em uma distribuição em grande parte da America latina, de Honduras até Argentina (Fragaszy et al. 2004). O macaco-prego-galego vive em grupos grandes com mais de 90 animais, se mantendo em áreas de vida grandes (80-187 hectares) (Valença-Montenegro 2011). Eles possuem um sistema social complexo onde realizam fissão-fusão de subgrupos ao longo do dia para otimizar o processo de forrageio (Valença-Montenegro 2011; Bastos et al. 2015; Medeiros 2017). As fêmeas adultas desempenham um forte cuidado parental, enquanto machos adultos tendem ter prioridade na alimentação e mantêm a proteção do resto do grupo (Bezerra et al. 2014). Eles apresentam um amplo repertório vocal, tendo sido descritas até o momento 31 vocalizações, algumas com contexto comportamental e faixa etária específicas (Bastos et al. 2015; Bastos et al. 2018). Existe dimorfismo sexual acentuado nos macacos-prego-galego. O dimorfismo é representado pelo tamanho corporal (onde os machos adultos são maiores que as fêmeas) e também pela presença de uma “barbela” (i.e., pele estendida na região ventral do pescoço dos machos) ainda sem função conhecida (Figura 3) (Valença-Montenegro et al. 2015). A cauda é semi-preênsil utilizada durante o forrageamento para suspensão e equilíbrio (Souto et al. 2011; Freire Filho observação pessoal). O macaco-prego-galego é uma espécie relativamente pouco estudada, apesar de existirem pesquisas sobre a ecologia, distribuição e comportamento da espécie (Souto et al. 2011; Bezerra et al. 2014; Fialho et al. 2014; Bastos et al. 2015; Bastos et al. 2018). São conhecidas 29 populações com distribuição restrita aos estados brasileiros do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas (Fialho et al. 2014; Valença-Montenegro et al. 2015). Entretanto, em apenas cinco áreas são desenvolvidos estudos mais frequentes sobre esta espécie de primata criticamente ameaçada de extinção (Guedes 2017; Bastos 2018). Alguns estudos abordando ecologia, comportamento, distribuição e registros específicos do macaco-prego-galego já foram realizados, mas compreender como que as mudanças climáticas prevista podem influenciar a ecologia e o comportamento dessa espécie são informações fudamentais para tomada de estratégias de conservação (Souto et al. 2011; Valença-Montenegro 2011; Bezerra et al. 2014; Fialho et al. 2014; Bastos et al. 2015; Valença-Montenegro et al. 2015; Bastos et al. 2018). Diante disso, se faz necessário pesquisas diretamente direcionadas a conservação desta espécie de primata ameaçada de extinção.

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Figura 3 Macho adulto, ilustrando o dimorfismo sexual presente na espécie (seta vermelha chama atenção para a barbela) (A) e fêmea adulta carregando um filhote sem a presença da barbela (B).

Fonte: O Autor (2018).

O macaco-prego-galego entrou para a lista das 25 espécies de primatas mais ameaçados do planeta (Mittermieir et al. 2012) após ter sido redescoberto em fragmentos de Mata Atlântica no Nordeste do Brasil em 2006 (Oliveira & Laugguth 2006; Pontes et al. 2006). No momento, o macaco-prego-galego é considerado “Em Perigo” pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) (Valença-Montenegro et al. 2018) e “Criticamente Ameaçado” pela IUCN (de Oliveira et al. 2015). A perda e fragmentação do habitat é a principal ameaça para essa espécie de primata, uma vez que o macaco-prego-galego é endêmico da Mata Atlântica nordestina. O cultivo de cana-de-açúcar no nordeste do Brasil começou no início do século XVIII e foi associado ao desmatamento de grandes áreas de florestas primárias. Esta atividade é uma das principais causas dessa perda e fragmentação do habitat (Tabarelli et al. 2010). O macaco-prego-galego fez parte do primeiro ciclo e agora continua fazendo parte do segundo ciclo do Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Primatas do Nordeste (PANPriNE), o qual foi oficializado pela portaria nº 242, de 26 de março de 2018. O plano tem como objetivo geral garantir pelo menos cinco populações viáveis das espécies-alvo. Para tal, foram traçados objetivos específicos com o intuito de diminuir a perda e a fragmentação de habitat, diminuir a caça, estabelecer populações in situ e estimular ações de educação ambiental das espécies-alvo. Ainda pouco se sabe sobre a influencia das mudanças climáticas sobre as espécies-alvo do PANPriNE. Apesar de ser uma espécie

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plástica (i.e., consomem diversos itens aliementares e habitam ambientes distintos), compreender como que as mudanças climáticas poderão afetar o orçamento comportamental e ecológico de S.

flavius fornecerão informações importantes para a tomada de decisões efetivas para a

conservação da espécie, e assim, conseguir realizar o objetivo geral do PANPriNE.

3 MÉTODOS

3.1 ÁREA DE ESTUDO

Nós desenvolvemos o estudo em um fragmento inserido na unidade de paisagem Tabuleiro Costeiro (Dompieri et al. 2014). Este fragmento é classificado como um remanescente de Mata Atlântica (SOS Mata Atlântica 2018), pertencente à empresa de mineração Cristal Mineração do Brasil, localizada no município de Mataraca-PB, Nordeste do Brasil (6°29.902’S – 34º29.704’W) (Figura 1). O fragmento estudado tem aproximadamente 936 ha (Bastos et al. 2018) e faz parte das 20 áreas prioritárias para conservação de primatas do Centro de Endemismo Pernambuco (CEPE) (MMA 2007), onde uma população de macaco-prego-galego vem sendo investigada desde 2010. A Cristal Mineração do Brasil realiza atividades de mineração na área há mais 33 anos. Contudo, a companhia mantem atividades de restauração do habitat como medida compensatória aos danos causados pelas atividades de mineração (Cunha et al. 2003). Diante disso, a área de uso da população de macaco-prego-galego monitorado corresponde a um conjunto de: áreas de dunas reflorestadas (em diferentes períodos), manguezal, restinga aberta, restinga arbórea e floresta estacional decídua (Cunha et al. 2003; Pereira & da Nóbrega Alves 2006; SOS Mata Atlântica 2018; Bastos et al. 2018). Plantações de cana-de-açúcar (Saccharum sp.) cercam o fragmento estudado, e o grupo monitorado utiliza a cana-de-açúcar como fonte de alimento.

3.2 ANIMAIS

Nós monitoramos uma população de macaco-prego-galego com contagem máxima de 140 indivíduos no período de estudo (i.e., de setembro de 2017 até agosto de 2018), em expedições com duração de 10 dias em cada mês ao longo. Apesar de ser uma população habituada a presença do pesquisador e ser objeto de estudo do nosso grupo de pesquisa desde 2010, não

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sabemos a idade precisa dos indivíduos. Diante disso, classificamos os animais em diferentes classes etária com base no tamanho corporal e presença da barbela no caso dos machos adultos (Bezerra et al. 2014). Assim, durante as observações, os animais eram classificados em fêmea adulta (fêmeas com mamilos e/ou vulva desenvolvida), macho adulto (machos que apresentavam barbela), fêmea adulta carregando filhote, macho adulto carregando filhote, fêmea jovem (indivíduos que se locomovem de forma independente da mãe e não apresentam características sexuais secundárias desenvolvidas) e macho jovem (indivíduos que se locomovem de forma independente da mãe e não apresentam características sexuais secundárias desenvolvidas).

3.3 COLETA DE DADOS

Realizamos expedições mensais com duração de 10 dias para monitorar o grupo estudado, entre de setembro de 2017 até agosto de 2018, e entre 06:00 e 18:00 h. Para a recolha de dados, utilizamos o método de varredura instantânea (Altmann 1974), com intervalo de cinco minutos entre varreduras. Esta metodologia foi usada para registrar os dados comportamentais e ecológicos (i.e., uso do estrato relativo, estrato atual, vizinhança, item alimentar consumido (e.g., tipo de animal, planta, fungo ou minerais)) dos animais monitorados. Durante os dozes meses de estudo realizamos 2.752 varreduras e 17.645 registros comportamentais, havendo uma média de 6,41 indivíduos por varredura. A cada varredura registramos também o sexo e a faixa etária de cada indivíduo. O máximo de informações foram recolhidas para os itens alimentares registrados (e.g., parte do vegetal ou animal que foi consumida, estado de amadurecimento, ovo, ninho).

Os comportamentos observados fora do esperado pelas categorias comportamentais foram registrados por meio do método de Ad libitum (Altmann 1974). Encontros intra-grupais, cópulas, nascimentos (consideramos os filhotes carregados no ventre, estes estão nos primeiros dias de vida e quando maiores ficam no dorso da mãe), presença de indivíduos mortos e interações com outras espécies são exemplos de interações registradas por meio deste método.

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4 EFEITOS POTENCIAIS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO PADRÃO DE ATIVIDADES E NO USO DO ESPAÇO EM SAPAJUS FLAVIUS (PRIMATA: CEBIDAE)

4.1 INTRODUÇÃO

O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (Intergovernmental Panel on

Climate Change - IPCC) previu um aumento da temperatura para todo o continente sul-americano

e uma diminuição da precipitação no Nordeste brasileiro para o final deste século (PBMC 2013). De acordo com o IPCC, pode haver uma diminuição entre 5% e 20% na precipitação e um aumento da temperatura entre 1ºC e 5ºC. Os cenários climáticos futuros sugerem um aumento das secas extremas (PBMC 2013), aumentando os processos de desertificação do meio e final do século XXI. Contudo, tal processo pode ser acelerado consoante o uso excessivo e insustentável dos recursos naturais, afetando diretamente a distribuição e a existência da biodiversidade local (de Oliveira et al. 2012).

Vários modelos preditivos estão sendo desenvolvidos e utilizados para compreender como que a mudanças climáticas afetarão a distribuição e/ou aspectos ecológicos e comportamentais das espécies em todo o mundo, sendo um dos principais focos da biologia da conservação (Pearson & Dawson, 2003; Dunbar et al., 2009; Lehmann et al., 2010; Sinclair et al., 2010; Carne et al 2012). Tais modelos se baseiam em informações atuais sobre estes organismos para, assim, projetar cenários futuros. Um desses métodos é a Modelagem de Equações Estruturais (MEE, ou em inglês Structural Equation Modeling – SEM), um conjunto de técnicas e procedimentos que usam uma extensão de outras técnicas multivariadas, avaliando relações de dependência e independência entre uma ou mais variáveis (Pereira 2013). Esta modelagem é um conjunto equações de regressões multivariadas analisadas simultaneamente, uma variável resposta em uma equação pode ser preditora em outra, assim, as variáveis podem influenciar uma na outra reciprocamente, diretamente ou por meio de outras variáveis (Hair et al 2009). Além disso, estima separadamente um conjunto de equações de regressão múltiplas, mas interdependentes, simultaneamente (Hair et al 2009).

As mudanças climáticas terão um forte impacto sobre habitat ocupado por uma série de espécies de plantas arbóreas da Mata Atlântica. A diminuição na área potencial de ocorrência de espécies de planta da Mata Atlântica, por exemplo, pode variar entre 25% e 50% da atual (Colombo & Joly 2010). Nos fragmentos de Mata Atlântica do nordeste brasileiro, as mudanças

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climáticas e a forma como os recursos naturais são utilizados, serão fatores preponderantes para a manutenção do Centro de Endemismo de Pernambucano (CEPE). Apesar dos poucos fragmentos remanescentes que compõe o CEPE (menos do que 5% da cobertura original) (da Silva & Tabarelli 2000), esta é uma região muito importante para a riqueza de uma série de grupos de organismos (Uchoa Neto & Tabarelli 2002; Roda & Pereira 2006; Nemésio & Santos Junior 2014). Dentre esses grupos que habitam o CEPE, os grandes mamíferos frugívoros como os primatas estão fortemente expostos a extinções locais devido a perda e fragmentação da Mata Atlântica nordestina (da Silva & Tabarelli 2000). Portanto, medidas imediatas de conservação são necessárias para a preservação das espécies que habitam os fragmentos remanescentes do CEPE (da Silva & Tabarelli 2000).

Diferentes aspectos da biologia dos primatas podem ser afetados por mudanças no clima, gerando respostas comportamentais e ecológicas que podem aumentar o risco de extinção das espécies (Wiederholt & Post 2010; Graham et al. 2016; Korstjens & Hillyer 2016). Portanto, as mudanças das variáveis climáticas podem afetar a capacidade de termorregulação (Mitchell et al. 2009), aumentar a frequência de descanso (Koshelef & Anderson 2009; Korstjens et al. 2010; González-Zamora et al. 2011), alterar a proporção sexual (Wiederholt & Post 2011), diminuir a taxa de reprodução e/ou sobrevivência de filhotes (Dunham et al. 2010; Wiederholt & Post 2011), aumentar a mortalidade (Milton & Giacalone 2014), aumentar o isolamento de subpopulações (Dunbar 1998), aumentar a transmissão de doenças e a taxa de parasitismo (Barrett et al. 2013). Contudo, tais alterações climáticas podem ameaçar mais ou menos uma determinada espécie consoante suas características biológicas e capacidade de adaptação (Korstjens & Hillyer 2016). Por exemplo, primatas menos especialistas, que vivem em grupos grandes, com ampla distribuição e com cérebros maiores seriam menos suscetíveis as mudanças climáticas (Korstjens & Hillyer 2016). Para compreender as possíveis repostas de uma espécie às mudanças climáticas previstas pelo IPCC, é necessário o conhecimento sobre as compensações comportamentais e ecológicas dos animais que ocorrem por meio das variações naturais do ambiente. Dessa forma, interpretar e mensurar as mudanças comportamentais e ecológicas atuais é uma ferramenta importante para estimar o impacto das mudanças climáticas futuras em primatas (Korstjens & Hillyer 2016).

A variação da temperatura ambiental ao longo do dia e/ou ao longo do ano tem uma influência direta no padrão de atividades e na ecologia comportamental geral dos primatas em

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todo o mundo (Brent et al. 2003; Talebi & Lee 2010; Starr et al. 2012; McFarland et al. 2014; Lopes & Bicca-Marques 2017). De um modo geral, estima-se que o estresse climático causado pelas temperaturas elevadas diminuiria a frequência de locomoção dos primatas, devido ao alto custo energético que esta atividade requer e, aumentaria a frequência de descanso para evitar um superaquecimento corporal. Esse padrão já é observado em diversas espécies, tais como chimpanzé (Pan troglodytes) (Koshelef & Anderson 2009), muriqui-do-sul (Brachyteles

arachnoides) (Talebi & Lee 2010) e macaco-aranha (Ateles geoffroyi) (González-Zamora et al.

2011). Portanto, compreender a relação entre aspectos abióticos e a ecologia comportamental dos primatas que habitam o nordeste brasileiro é fundamental para a preservação das populações remanescentes.

O macaco-prego-galego (Sapajus flavius) foi oficialmente redescoberto há 12 anos (Oliveira & Langguth 2006; Mendes Pontes et al. 2006) e já foi listado entre os 25 primatas mais ameaçados do planeta (Mittermeier et al. 2012). Atualmente, é considerado “Em Perigo” pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) (Valença-Montenegro et al. 2015) e “Criticamente Ameaçado” de extinção pela The International Union for Conservation of Nature (IUCN) (de Oliveira et al. 2015). As principais ameaças para a espécie são a perda e a fragmentação do habitat. O macaco-prego-galego é endêmico da Mata Atlântica nordestina, sendo conhecidas 29 populações com distribuição restrita aos estados brasileiros do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas (Fialho et al. 2014; Valença-Montenegro et al. 2015). O macaco-prego-galego fez parte do primeiro ciclo e agora continua fazendo parte do segundo ciclo do Plano de Ação Nacional de Proteção dos Primatas do Nordeste (PANPriNE) (Portaria nº 242, de 26 de março de 2018). A elaboração do PANPriNE iniciou em 2010, e teve como objetivo geral de garantir pelo menos cinco populações viáveis para cada espécie-alvo (guariba-de-mãos-ruivas (Alouatta belzebul), guigó-da-caatinga (Callicebus barbarabrownae), guigó-de-Coimbra-Filho (Callicebus coimbrai), macaco-prego-do-peito-amarelo (Sapajus xanthosternos) e macaco-prego-galego em diferentes ecossistemas até 2016. O segundo ciclo do PANPriNE, incluiu mais uma espécie (i.e., guariba-da-Caatinga (Alouatta ululata) e possui ações para garantir populações viáveis das espécies-alvo do plano, por meio de monitoramento de populações, elucidação de respostas comportamentais das espécies às alterações climáticas futuras e definição de áreas prioritárias para a conservação.

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O presente estudo visou estimar os efeitos potenciais de mudanças climáticas futuras sobre o comportamento e ecologia do macaco-prego-galego. Especificamente, averiguamos a influência das variações de temperatura e umidade ao longo do dia sobre o orçamento comportamental (diário e total) e sobre o uso do espaço (vertical/estratificação). Além disso, construímos um modelo que pudesse prever alterações potenciais no comportamento e na ecologia do macaco-prego-galego em função de projeções futuras do IPCC sobre mudanças climáticas de temperatura na área de endemismo da espécie. Com tais informações, pretendíamos propor medidas efetivas para contribuir para o plano de ação nacional de conservação do macaco-prego-galego.

4.2 METODOLOGIA

4.2.1 Área de estudo

Nós desenvolvemos o estudo em um fragmento inserido na unidade de paisagem Tabuleiro Costeiro (Dompieri et al. 2014). Este fragmento é classificado como um remanescente de Mata Atlântica (SOS Mata Atlântica 2018), pertencente à empresa de mineração Cristal Mineração do Brasil, localizada no município de Mataraca-PB, Nordeste do Brasil (6°29.902’S – 34º29.704’W) (Figura 1). O fragmento estudado tem aproximadamente 936 ha (Bastos et al. 2018) e faz parte das 20 áreas prioritárias para conservação de primatas do Centro de Endemismo Pernambuco (CEPE) (MMA 2007), onde uma população de macaco-prego-galego vem sendo investigada desde 2010. A Cristal Mineração do Brasil realiza atividades de mineração na área há mais 33 anos. Contudo, a companhia mantem atividades de restauração do habitat como medida compensatória aos danos causados pelas atividades de mineração (Cunha et al. 2003). Diante disso, a área de uso da população de macaco-prego-galego monitorado corresponde a um conjunto de: áreas de dunas reflorestadas (em diferentes períodos), manguezal, restinga aberta, restinga arbórea e floresta estacional decídua (Cunha et al. 2003; Pereira & da Nóbrega Alves 2006; SOS Mata Atlântica 2018; Bastos et al. 2018). Plantações de cana-de-açúcar (Saccharum sp.) cercam o fragmento estudado, e o grupo monitorado utiliza a cana-de-açúcar como fonte de alimento.

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Figura 1 Mapa de localização da área de estudo, indicando sua posição no Brasil, e identificando a sua localização mais detalhada do fragmento de Mata Atlântica pertencente ao município de na costa do estado da Paraíba-Brasil.

Fonte: O Autor (2018)

Com base na classificação de Köppen, o clima da região é do tipo As (Alvares et al. 2013), com precipitação média anual de 1,745 mm e temperatura média anual de 25,5ºC (Cunha et al. 2003). A estação seca inicia em setembro e vai até fevereiro, sendo outubro e novembro os meses mais secos, ocorrendo de até três graus na temperatura. Já a estação chuvosa inicia-se em março e vai até agosto na região, sendo os meses junho e julho os mais chuvosos (Pereira & da Nóbrega Alves 2006).

4.2.2 Animais

Nós monitoramos uma população de macaco-prego-galego com contagem máxima de 140 indivíduos no período de estudo (i.e., de setembro de 2017 até agosto de 2018), em expedições com duração de 10 dias em cada mês ao longo. Apesar de ser uma população habituada a presença do pesquisador e ser objeto de estudo do nosso grupo de pesquisa desde 2010, não sabemos a idade precisa dos indivíduos. Diante disso, classificamos os animais em diferentes

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classes etária com base no tamanho corporal e presença da barbela no caso dos machos adultos (Bezerra et al. 2014). Assim, durante as observações, os animais eram classificados em fêmea adulta (fêmeas com mamilos e/ou vulva desenvolvida), macho adulto (machos que apresentavam barbela), fêmea adulta carregando filhote, macho adulto carregando filhote, fêmea jovem (indivíduos que se locomovem de forma independente da mãe e não apresentam características sexuais secundárias desenvolvidas) e macho jovem (indivíduos que se locomovem de forma independente da mãe e não apresentam características sexuais secundárias desenvolvidas).

4.2.3 Coleta de dados

Realizamos expedições mensais com duração de 10 dias para monitorar o grupo estudado, entre de setembro de 2017 até agosto de 2018, e entre 06:00 e 18:00 h. Para a recolha de dados, utilizamos o método de varredura instantânea (Altmann 1974), com intervalo de cinco minutos entre varreduras. Esta metodologia foi usada para registrar os dados comportamentais (ver Tabela 1) e ecológicos (i.e., uso do estrato relativo, estrato atual, vizinhança, item alimentar consumido (e.g., tipo de animal, planta, fungo ou minerais)) dos animais monitorados. Durante os dozes meses de estudo realizamos 2.752 varreduras e 17.645 registros comportamentais, havendo uma média de 6,41 indivíduos por varredura. A cada varredura registramos também o sexo e a faixa etária de cada indivíduo. O máximo de informações foram recolhidas para os itens alimentares registrados (e.g., parte do vegetal ou animal que foi consumida, estado de amadurecimento, ovo, ninho).

Os comportamentos observados fora do esperado pelas categorias comportamentais foram registrados por meio do método de Ad libitum (Altmann 1974). Encontros intra-grupais, cópulas, nascimentos (consideramos os filhotes carregados no ventre, estes estão nos primeiros dias de vida e quando maiores ficam no dorso da mãe), presença de indivíduos mortos e interações com outras espécies são exemplos de interações registradas por meio deste método.

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Tabela 1 Descrição das categorias comportamentais consideradas nas observações de varredura dos macacos-prego-galegos observados no fragmento de Mata Atlântica em Mataraca, Paraíba, Brasil.

Categorias

comportamentais

Descrição

Descanso O animal se encontrava temporariamente inativo/imóvel, em posição de descanso, deitado de bruços em um galho acordado ou dormindo, ou sentando também acordado ou dormindo.

Locomoção O indivíduo locomovia de um ponto para outro, sem ligação com forrageio, podendo a locomoção ser na vertical ou na horizontal em uma mesma árvore ou entre árvores ou no chão. Tal locomoção se dava de maneira quadrupede, bípede, suspenso pela cauda ou saltando.

Alimentação O indivíduo ingeria itens alimentares diversos.

Forrageamento O indivíduo procurava, coletava e/ou manipulava um alimento. A manipulação, nesse caso, consistia em quebrar o item alimentar ou abri-lo (no caso de um caramujo ou fruto seco, por exemplo). A procura por alimentos poderia ser através da quebra de troncos, inspeção de folhas, cupinzeiros e buracos ocos de árvores.

Socialização Interações entre pelo menos dois indivíduos podendo ser afiliativas ou agonística. As interações afiliativas consistem em brincadeiras ou abraços entre os indivíduos. Já as interações agonísticas estão relacionadas perseguição e agressão física através de mordidas, espancamento ou beliscar.

Bebendo O ato de beber água com a boca direto de algum reservatório (i.e., rio, água acumulada em folhas, superfícies de troncos, etc) ou através do uso da mão para coletar a água em buracos ocos de árvores (coletando água na palma ou nos pelos da mão) e levando a mão até a boca para ingestão.

Vigilante Quando o indivíduo está parado sentado de maneira alerta com a cabeça e olhos direcionados de maneira fixa para um ponto específico.

Fonte: O Autor (2018).

Nós classificamos o uso do estrato de duas formas: i) pelo uso do estrato relativo da paisagem (Figura 2), o qual leva em consideração a porção do estrato em que o animal se encontra, ou seja copa alta (nesta classe os animais estão mais expostos a radiação emitida pelo

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