PSICOLOGIA DE GRUPOS, FAMÍLIA, EDUCAÇÃO DE FILHOS E SEXUALIDADE¹ Roso, A.
²;
Bernardy, B.³; Cantele, J.,Alves. A. P
5¹Projeto de Extensão - UFSM
2 Programa de Pós-Graduação em Psicologia – Ênfase em Psicologia da Saúde, Universidade Federal de Santa Maria -UFSM 3 Curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM
4 Curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM 5 Curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM E-mail:psicologia.ufsm@gmail.com
RESUMO
Este estudo apresenta alguns dos resultados do Projeto de Extensão intitulado “Direitos sexuais e reprodutivos: conversando sobre saúde”. O objetivo geral do projeto é possibilitar um espaço de discussão e reflexão acerca de temas relativos aos direitos sexuais e reprodutivos de mulheres atendidas na Clínica de Estudos e Intervenções em Psicologia (CEIP) do Curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM e da comunidade santamariense em geral, através de encontros temáticos (oficinas). A metodologia do trabalho grupal e as reflexões teórico-práticas amparam-se na psicologia social crítica, a qual eleva a consciência como categoria central de análise. A partir das ações desenvolvidas nas oficinas, espera-se que esse projeto sirva de alavanca para um projeto mais amplo, dando conta de atender a demanda advinda da CEIP e das comunidades da cidade de Santa Maria.
Palavras-chave: Psicologia de Grupos; Família; Educação; Sexualidade
1. INTRODUÇÃO
O presente relato refere-se às atividades proposta no Projeto de Extensão intitulado “Direitos sexuais e reprodutivos: conversando sobre saúde”, que se efetiva na Clínica de Estudos e
Intervenções em Psicologia (CEIP), do Curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM.
A metodologia de trabalho de grupo e as reflexões teórico-práticas sustentam-se na psicologia social crítica, a qual eleva a consciência como categoria central de análise, e tenta desvelar o aparente e o oculto, sempre percebendo a incompletude e a contradição dos fenômenos sociais (GUARESCHI; BIZ, 2005), históricos e biopsiquícos. Procura-se incentivar a conscientização (no sentido Freiriano) das pessoas – especialmente das minorias sociais - para que elas batalhem pelos seus direitos e pela sua dignidade.
Os direitos e a saúde sexual e reprodutiva são conceitos desenvolvidos recentemente e representam uma conquista histórica, fruto da luta pela cidadania e pelos direitos humanos e ambientais. Os direitos reprodutivos se opõem, por um lado, a qualquer tipo de controle coercitivo da natalidade e, por outro, a qualquer tipo de imposição natalista que implique a proibição de uso de métodos contraceptivos. Assim, os direitos reprodutivos implicam que toda pessoa tenha a liberdade de escolha para definir como, quando e quantos filhos quer ter (incluindo não ter filho algum, isto é, o direito “não-reprodutivo”), além de poder contrair matrimônio de maneira livre e com o pleno consentimento de ambas as pessoas. Os direitos reprodutivos não se restringem às mulheres, incluindo claramente os homens e suas responsabilidades no processo de reprodução e de regulação da fecundidade (CORRÊA; JANNUZZI; ALVES, 2003).
O conceito de direitos sexuais é complexo e de desenvolvimento recente. Existem as questões sexuais que estão intrinsecamente ligadas às questões reprodutivas. E outras que por sua própria natureza não-reprodutiva, devem ser tratadas de forma separada. O tema dos direitos sexuais
traz à cena as questões da sexualidade e abre a possibilidade de separar sexo de reprodução. Além disto, traz à tona, além da sexualidade individual, as possibilidades da sexualidade não-heterossexual (IBID).
Vivemos tempos paradoxais que combinam o deslocamento e reconstrução de práticas e significados sexuais e franco recrudescimento das forças do conservadorismo moral. Em anos recentes, estas forças se tornaram cada vez mais articuladas entre si e passaram a contar com volumosos recursos financeiros, para além da tradicional capilaridade institucional de que podem lançar mão. Sobretudo, contam hoje com o apoio aberto de uma nova política internacional americana para o HIV/AIDS, que preconiza sistematicamente abstinência, adiamento do sexo, fidelidade e monogamia como estratégias preferenciais de prevenção.
No Brasil, os esforços intelectuais e políticos continuam dispersos e fragmentados. Pensadores e ativistas de direitos humanos não debatem, em geral temas que envolvem sexualidade e reprodução, como HIV/AIDS, homossexualidade e aborto. Precisamos ser capazes de construir uma grande coalizão em favor dos direitos sexuais e reprodutivos na sua expressão plena, podemos ser tragados pelos ventos sombrios que sopram neste começo de milênio (CORREA, 2003).
Para nos proteger dos ventos sombrios e contribuir com a problematização desse campo, propomos um trabalho com grupos de mulheres advindas de diferentes comunidades da cidade de Santa Maria com o objetivo de ampliar as possibilidades de conscientização sobre os direitos sexuais e reprodutivos das mesmas. O estímulo à busca da conscientização se efetuará a partir dos encontros de grupo, orientados por oficinas temáticas.
2. METODOLOGIA
O projeto se desenvolve com atividades em dois níveis. No primeiro, estão sendo realizadas oficinas com as mulheres e, no segundo, serão delineadas possíveis projetos de ação articulados à comunidade e à CEIP.
Oficinas (workshops) são caracterizadas como uma prática de intervenção psicossocial seja em contexto pedagógico, clínico comunitário ou de política social. Referem-se a um processo estruturado com grupos, independente do número de encontros, sendo focalizado em torno de uma questão central que o grupo se propõe a elaborar, em um contexto social. A elaboração que se busca na oficina não se restringe a uma reflexão racional, mas envolve os sujeitos de maneira integral, formas de pensar, sentir e agir (AFONSO, 2002). Elas possibilitam uma relação horizontal entre técnicos e população, considerando que o espaço de discussão tem como objetivo resgatar os conhecimentos existentes, permitir a manifestação de sentimentos relativos à vivência, facilitar a expressão e comunicação intergrupal e motivar a discussão de conteúdos (CHIESA; WESTPHAL, 1995). Nesse sentido são solos férteis para explorar o desenvolvimento da consciência; podem ser instrumentos de conscientização. Oficina traz ainda a possibilidade do lúdico, promove a descontração e a criação de elos entre os participantes do grupo de uma forma crescente, desde que as atividades propostas ocorram em clima acolhedor e de respeito.
As oficinas estão sendo facilitadas por duas facilitadoras e uma observadora, com a supervisão da coordenadora do projeto. A responsabilidade dos facilitadores é de favorecer a expressão dos sentimentos e pensamentos por parte dos membros do grupo, com ênfase no processo e na dinâmica das interações pessoais imediatas (ROGERS, 1974).
Foram realizadas entrevista de triagem para selecionar as participantes, com base nos seguintes critérios: ser mulher, em idade reprodutiva ou ter filhos, atendida na CEIP ou moradora da cidade de Santa Maria, disposta a participar de atividades em grupo, e que dê o consentimento informado.
Nas oficinas estão sendo utilizadas metodologias participativas e ativas que facilitam os questionamentos e a reflexão, que incluem diversas técnicas de dinâmica de grupo, jogos didáticos,
dramatização, simulações do uso de métodos contraceptivos e estratégias de intervenção a partir de auto-retrato, desenhos da figura feminina, colagem, pintura, vídeos e textos.
Cada oficina tem a duração de 60 minutos e os encontros são realizados uma vez por semana, com o horário combinado com as participantes, nas dependências da CEIP, na UFSM. Os encontros são gravados com a autorização de todas as integrantes do grupo.
Os seguintes eixos estão servindo de norte para o andamento dos grupos, contudo as temáticas são levantadas e definidas com o grupo:
a) Corpo e saúde
a. Doenças Sexualmente transmissíveis b. HIV/Aids,
c. Relação com o SUS d. Tratamentos alternativos b) Direitos reprodutivos e sexuais:
a. Conceito de direitos b. Métodos Contraceptivos c. Aborto d. Menstruação e. Menopausa c) Família: a. O conceito de família. b. Expectativas sobre a família.
c. Formas de organização familiares e os possíveis preconceitos que existem em relação a estes arranjos.
d. Relação mãe-filhos (impacto da gravidez na adolescência, violência doméstica, uso/abuso de drogas).
e. Divisão de tarefas.
f. Relação com o Parceiro (diferenças e semelhanças entre homens e mulheres/ diferenças que se transformam em desigualdades; violência conjugal; uso/abuso de drogas; prazer sexual e amor.
d) Projeto de vida (escola, trabalho e vida afetiva). 3. RESULTADOS
Foram triadas 18 mulheres. Destas, duas não preencheram os critérios de inclusão. As demais foram divididas em dois grupos: Grupo 1, composto por sete mulheres, com escolaridade ensino médio completo ou superior, e Grupo 2, composto por nove mulheres, como ensino
fundamental incompleto ou completo. Os encontros com o grupo 1 iniciaram em junho de 2009. Para o Grupo 2 nova chamada está sendo feita, com o intuito de incluir mais participantes, visto que algumas das selecionadas começaram a trabalhar e não têm disponibilidade de horário.
Na figura 1, observa-se o resumo das atividades, além das temáticas vinculadas e trabalhadas até o momento nos grupos.
Figura 1: Encontro com Mulheres – Grupo 1 Encontro N°
Participantes
Proposta Técnica Temáticas
1º 1 --- ---
---2° 5 Apresentação
Entrosamento
3° 4 Fortalecimento das
relações intra-grupais CartazPrazer/Desprazer Desvalorização do trabalhodoméstico Educação filhos: mimo, dependência, culpa
Cuidados de Saúde de familiares – responsabilidade, peso, falta de reconhecimento.
4° 1 Continuar falando dos
cartazes.
Conversa sobre adoção
Diálogo Dificuldades no processo de adoção
Sentimentos em relação à escolha do sexo/idade
Presença/participação do marido
5° 3 Conversa sobre como
foi o período de “férias” (recesso escolar – Gripe H1N1); o que aconteceu nesse tempo e como se sentiram com essa situação.
Diálogo Desvalorização do trabalho doméstico
Educação filhos: mimo, dependência, culpa
Cuidados de Saúde de familiares – responsabilidade, peso, falta de reconhecimento.
Falta de cuidado de si Vergonha de estar doente “saudável”
Solidão, sem amizades Falta de perspectivas/prazer
6º 1 Conversa sobre a
família Diálogo responsabilidades, pesoCuidado de familiares – financeiro, afastamento familiar
7°o 4 Constituição familiar,
papéis na Família moldar umaBiscuit – família
Papéis na família
Observa-se que no primeiro encontro compareceu apenas uma mulher, o que gerou
muita ansiedade nas estagiárias e um reforço nas suas fantasias de que “grupo não dá certo”.
Todavia, a coordenadora do projeto trabalhou essas ansiedades e salientou que trabalho em
grupo “é assim mesmo; que custa para engrenar, mas que quando engrena realmente produz
sentidos”, o que foi comprovado nos encontros seguintes.
4. CONCLUSÕES
Até o presente momento pode-se considerar alguns resultados alcançados entre eles: a) Formação de um grupo contando com a participação de 4 mulheres;
b) Realização dos encontros todas as sexta-feira das 14:00 às 15:00 horas nas dependências da CEIP - UFSM;
c) Favorecimento da expressão dos sentimentos e pensamentos por parte dos membros do grupo;
d) Desenvolvimento do potencial dos alunos integrantes do grupo de pesquisa para a criação de estratégias de ação grupal;
e) Desenvolvimento nos alunos, da capacidade de reflexão sobre a comunidade a partir das discussões com as mulheres.
Cabe salientar que a proposta de trabalho com grupos é inédita na clínica. A clínica é, tradicionalmente, reconhecida como um local de atendimento individual. Apesar disso, considera-se que o trabalho com esse grupo de mulheres está tendo sucesso devido á procura. A clínica oferece, no momento, apenas atendimento em horário comercial. A maioria das mulheres que têm se interessado em participar do grupo, trabalha fora de sua residência. Nesse sentido, conclui-se que será preciso fazer um ajuste de horários, de modo que os grupos possam atender a demanda.
5. REFERÊNCIAS
AFONSO, L.. Oficinas em dinâmica de grupo: um método de intervenção psicossocial. Belo Horizonte: Edições do Campo Social, 2002. p. 11-59.
CHIESA A. M; WESTPHAL M. F. A sistematização de Oficinas Educativas problematizadoras no contexto dos serviços de saúde. Revista Saúde, São Paulo, n. 46, p.19-21.1995.
CORRÊA, S.. Direitos sexuais e reprodutivos: cenas paradoxais no limiar do milênio. Jornal Femea, Ano XI, Nº 126. Brasília/DF, Julho/2003.
CORRÊA, S.; JANNUZZI, P. de M.; ALVES, J. E. D. Direitos e saúde sexual e reprodutiva: Marco
teórico-conceitual e sistema de indicadores. Trabalho realizado com o apoio do UNFPA-Brasil, no
âmbito do Sub-programa de Saúde Sexual e Reprodutiva, Projeto “Sistema de Indicadores Municipais em Saúde Sexual e Reprodutiva”, coordenado pela ABEP e IBGE. Rio de Janeiro, setembro de 2003.