• Nenhum resultado encontrado

O Pronome se: uma palavra oblíqua e dissimulada

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O Pronome se: uma palavra oblíqua e dissimulada"

Copied!
380
0
0

Texto

(1)

O PRONOME SE: UMA PALAVRA OBLÍQUA E DISSIMULADA

po_r.

CASTELAR DE CARVALHO

Macroárea de Letras Vernáculas

Tese de Doutnrado em Língua Por­ tuguesa apres�Atada·� Co6rde�a­ ção. dos Programas de Pós-Gradua­ ção· da FacuJl..dade de Letras da Universidad� Federal;dÓ Rio de Janeiro Orientador acadêmico: .Professor Doutor Wilton Cardoso 'de'-Sousa.

Rio de Janeiro 19 semestre de 1990

(2)

CARVALHO, CastelaT· d�. Q pronome�: uma pala-vra oblíqua� dissimulada. Tese de Doutora-do em Língua Portuguesa apresentada a Coorde nação dos Programas de Pôs-Graduação da Fa-culdade de Letras da UFRJ. Rio de Janeiro , 1990. x, 373 fls.

BANCA EXAMINADORA

.f/(n'

�./�CV--�-

.

--e�/

'

.

Prof. Dr. Wil to�e so de Sousa _ (Orientador)

.

-Prof. Dr.

Prof. Dr. Anto�io Martins de Araujo Pro��) Dra .. Ângela T. Vaz Leão

S9uza

Dr. Helênio Fonseca de, Oliveira ( s u p 1 e n t_ e ) Examinada a Tese ,, . '1 conceito: 'tYCELf}JTF..-Em:

__oll_/ _ 0!1_/ __g_fr

(3)

1 .

--,

iii

I N M:EIM!@R IAM

(4)

AGRADECIMENTOS

Agradecemos aos colegas CUJOS nomes vão relacionados em ordem alfabética.

Companheiros de jornada, amigos de sempre, sua soli­ dariedade contribuiu para levarmos a cabo esta empresa.

A todos, nossa gratidão.

À

Antonio Martins de Araujo Helênio Fonseca de Oliveira Horácio Rolim de Freitas Jayr Calhau

José Darcy de Carvalho Sílvio Elia

Dona Angela Escobar, responsável pe]a datilografia , profissional competente e séria, também deixamos consigna­ dos os nossos agradecimentos._

(5)

o

AGRAVECIMENTO ESPECIAL

AO

PROF. VR. WILTON CARVOSO VE SOUSA

amigo Qe.hto e.m hoha inQe.hta, amigo -0e.m­ phe.,

(6)

o

SIN1€lPSE

Levantamento conceitual. Detecção de tendências. ApTeciações críti­ cas e reflexões pessoais sobre o assunto no âmbito da Gramática,Fi lologia Românica e Portuguesa e LingUÍstica. A evolução do pron� me se: no latim clássico, latim vulgar e portu&uês. Estudo dia­ crônico e sincF©lmico das funções e atribuições $:ii.mtáticas do prono me se. Análise @o corpus repre­ sentado por te..KttcrYs de escritores brasileiros e -pm,rtugueses, da im­ prensa escrita e pelos-inquéritos do Projeto NURC ..

(7)

F E C I Q U OV P O TU I ,

..,

FACIANT MELIORA

POTENTES.

(8)

�) tJ SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 2 . DA DESCRIÇÃO GRAMATICAL 2 .1. Sintaxe do pronome se 2.1 .1. funções a) se-OD b) se-OI e) se-SI 2.1.2. atribuições a) se-PIV b) se-PR c) se-IIS d) se-PA 3. DA EVOLUÇÃO DO PRONOME SE 3.1. No Latim Clássico 3.1.1. se reflexivo 3.1.2. a indeterminação do sujeito 3.1.2.1. com a voz ativa 3.1.2.2. com a voz passiva

a) origem da passiva b) a voz medial

(9)

Q Resumo c) a passiva impessoal - sintética· - analítica 3. 2. No Latim Vulgar 3. 2. 1. a racionalização analítica 3. 2. 1. 1. a passiva analÍti0cra 3. 2. 1. 2. a medial analítica 1§!) · dinâmica 2ê-) apassivante Resumo 3. 3. No Português 3. 3. 1. Medial Analítica Resumo

3. 3. 1. 1. reflexiva stricto $ensu a) objeto b) sujeito de inflJIDitivo 3. 3. 1. 2. dinâmica a) se-PIV b) se-PR c) se-IIS 3. 3. 1.3. pa$siva: se'-PA 3. 3. 1. 3. 1. a passiwa pronominal a) origens b) desàkomramentos c) críticas/tend�ncias lX

(10)

4. DAS LIÇÕES DO CORPUS 4 .1. Funções sintáticas a) se-OD b) se-OI c) se-SI 4. 2. Atribuições sintáticas a) se-PIV b) se-PR c) se-IIS 4. 3. Fronteiras ambíguas Resumo 5. CONCLUSÕES 5.1. Relativas ao latim 5.2. Relativas ao português 5.3. Reflexões finais 6. BIBLIOGRAFIA 7. APÊNDICE

(11)

1 - INTRODUÇÃO

(12)

1. INTRODUÇAO

Esta tese de doutorado em língua portuguesa tem como titulo-tema

Q

pronome "se": uma palavra oblíqua e dissimu­ lada. A par da pesquisa lingüístico-filológica sobre o tema em questão, que por si mesma já justificaria um trabalho des­ ta natureza, esta tese se propõe atingir três objetivos: o acadêmico, o didático e o recuperador.

O objetivo acadêmico visa a atender um rito de passa­ gem na minha vida profissional. Em outras palavras, busca preencher um requisito acadêmico, qual seja, a obtenção do grB;u de doutor. Para tal, exige-se a elaboração e a defesa de uma tese. Aqui está ela. Trata-se, portanto, de um obje-tivo imediato, direto, urgente e inadiável.

lar, a missão está cumprida.

Nesse

particu-Com relação ao tema escolhido, este Fecebeu tratamento teórico e prático. Para atingir o objetiw� proposto, rastre� mos na tradição gramatical e filológica bit'\ol.sileira a teoria disponível sobre o assunto. Desse modo,-0peramos uma especie

-

. de síntese do que já se escreveu de relevamrte sobre o pronome se no âmbito da filologia portuguesa, com destaque para os a� tores brasileiros. Recorremos também à bilb>liogra�ia

estran-geira citada, e, nesse particular, os aut0res espanhóis foram valiosos. A par da pesquisa bibliográfica� reflexões pesso­ ais e apreciações críticas nortearam todo� trabalho, espe­ cialmente nos capítulos referentes aos verfuos pronominais e à

(13)

ô

chamada passiva pronominal.

Quanto à parte prática, utilizamos como corpus textos da literatura brasileira e portuguesa, da imprensa escrita (principais jornais e revistas do eixo Rio-São Paulo) e dos inquéritos do Projeto NURC da Faculdade de Letras da UFRJ.

3

Na �erdade, o espírito crítico presente em cada capít� lo deste trabalho está a serviço da �enovação do ensino de língua portuguesa no Brasil, nosso segundo objetivo. Nessa tensão dialética entre a pesquisa bibliográfica, a manipula­ ção de dados e a apreciação crítica perseguimos, em cada eta­ pa da tese, o equilíbrio, a síntese entre a informação e a in terpretação, desafio maior para quem se abalança a escrever um trabalho desta natureza. Nesse sentido, ficaríamos feliz se o nosso esforço pudesse converter-se em um convite à refl� xao sobre as funções e as atribuições sintáticas do pronome se, principalmente o se-PA.(pronome apassivador) na questão polêmica da chamada passiva pronominal.

o· segundo objetivo� o didático, é indireto e só será atingido a longo prazo. Explico-me. É que tenciono publicar este trabalho após a sua defesa, o que justifica um certo tom didático que permeia toda a obra. Neste sentido, o meu obje­ tivo com esta pesquisa sobre o pronome se é servir ao ensino

de português no Brasil, especificamente na área da sintaxe.

Há vinte e três anos dentro da sala de aula, tanto no nível médio como no superior, estamos bem consciente da carên eia de estudos e de pesRuisas sobre a língua portuguesa que

(14)

sejam acessíveis aos professores de português em geral. Digo acessível no sentido de leitura, compreensão e assimilação

por parte do profissional médio de língua portuguesa. Penso naquele.professor não familiarizado com o jargão e os tecni­ cismos da chamada "lingl!Ística moderna", mas interessado em ler e em se atualizar sobre a sua ferramenta de trabalho: a língua portuguesa. Esse profissional esbarra muitas vezes na algaravia esotérica de certos textos-absolutamente ininteligf veis, impenetráveis até mesmo para nós outros que vivemos o dia-a-dia do ensino universitário. Certos manuais de lingt.IÍ� tica antes parecem tratados de mecânica. Nesse sentido, pro-curamos ser o mais claro e didático possível, sem perder de vista, contudo, o rigor e a coerência inerentes a um texto científico. Procuramos ser exaustivo, e não ser cansativo. Trata-se de uma contribuição pessoal à renovaçao do ensino de português, à revisão doutrinária dos postulados gramaticais

-vigentes, no que diz respeito especificamente a sintaxe evolu tiva e sincrônica do pronome se.

Ainda uma palavra a respeito do didatismo da tese. Num momento em que a sociedade brasileira, através da imprensa e de outros organismos representativos, cobra da universidade a contrapartida em termos de produção docente e de prestação de serviços pelo que a universidade recebe dos cofres públicos isto é, da. sociedade, um trabalho como o nosso pode ser a re� posta a essa cobrança, uma vez que ele faz a ligação entre universidade e sociedade. No nosso caso específico, na área de Letras, pensillnos que cabe à universidade a tarefa de reali

(15)

ô

ó

5 zar pesquisas que busquem a renovaçao da doutrina gramatical e do ensino de português. Esta tarefa não cabe ao professor

de ensino médio, pois este não tem treinamento nem tempo para isso. f nesse contexto, portanto, que se insere a nossa te­ se, escrita para ser lida dentro da universidade e, principal mente, fora dela.

O terceiro e Último objetivo do nosso trabalho também é indireto. É que pretendemos com esta tese resgatar a velha e boa tradição filológica brasileira, tão esquecida nesses tempos de transformacionalismos e gerativismos. Não que ne­ guemos à lingüística moderna a importância de sua contribui­ çao teórica e prática para a renovação dos estudos lingüísti­ cos e literários em nosso país e no mundo. O resgate do ve­

lho não implica a negação do novo. Mas o.resgate da história num país como o nosso, tido como sem mem6ria, é tarefa da maior importância, a. nosso ver, pelas lições de sabedoria e pelas advertências que a história - magistra vitae, como di­ ziam os romanos - sempre nos oferece ..

No caso da filologia brasileira, pensamos nas sementes generosas lançadas no passado por semeadores pioneiros, cujos nomes merecem ser lembrados, como Sotero dos Reis, Said Ali, Mário Barreto, Cândido Jucá (filho), Augusto Magne, Serafim da Silva Neto, José Oiticica, Sousa da Silveira, dentre ou­ tros.

Infelizmente, alguns são nomes praticamente desconheci .dos das gerações mais recentes de estudantes de Letras, até

(16)

con-õ

ta-se o caso de um certo candidato a uma vaga no curso de doutorado em língua portuguesa, o qual, após a entrega da prova, teria perguntado, perplexo, ao professor encarregado do concurso: "Quem é.esse tal de Sousa da Silveira?"

Esse desditoso candidato, no entanto, provavelmente c� nhece na ponta da língua os nomes dos lingüistas americanos ingleses, frinceses mais incensados do momento, alguns deles a nos impingir coisas velhas como novidades e a rimar algara­ via com sensaboria;_ outros, ainda, o que dizem de bom nem sem

-

-pre e novo, e o que dizem de novo nem sem-pre e bom.

O terceiro objetivo deste nosso trabalho e, portanto ,

recuperador, no sentido de justiça e no sentido de síntese. Justiça e, de certa forma, homenagem _- em relação aos

nossos mestres do passado, sem os quais ainda estaríamos na idade da pedra em matéria de conhecimento lingüístico. E sín­ tese no sentido de integração entre o que se produziu de me­ lhor ontem e hoje no campo da filologia e da lingüística rela tivo à língua portuguesa, no caso específico desta tese, no

âmbito da sintaxe do proDome se. Lembremos, a propósito, que, em termos dialéticos, síntese não implica destruição,

mas renovaçao. In medio vi.rtus. Ou, em termos machadianos

Nem tudo tinham os antigos, nem tudo tem os modernos; com os haveres de uns e

ou-- . - . 1

tros e que se enriquece o pecul10 comum. l MACHADO DE ASSIS. "Instinto de nacionalidade", in Ob1ta

(17)

õ

7

Uma palavra especial merece o nosso Mattoso Câmara Jr. Maior lingüista brasileiro em seu tempo, igualmente pioneiro, reconhecido como o introdutor e o divulgador da lingüística em nosso país, Mattoso nos deixou obras fundamentais e ainda

insuperadas. Foi lendo avidamente as páginas do seu

Princí-pios de lingüística geral, espécie de Bíblia para a minha ge­ ração, que dei os primeiros passos nas árduas sendas do estu-do científico da linguagem. Neste trabalho, meu velho

exem-plar dos Princípios, assim como o do Dicionário de lingüísti­ ca e gramática revelaram-se insubstituíveis. Mais· uma vez e ainda, pois a v�talidade do pensamento mattosiano parece es­ tar sempre renascendo e, com o correr do tempo, só tem feito renovar a sua atualidade.

Outro lingüista brasileiro que merece referência espe­ cial neste trabalho é o Prof. Sílvio Elia, amigo e mestre, c�

jas lições tivemos o privilégio de haurir. De suas aulas de lingüística no curso de Mestrado da Universidade Federal Flu­ minense guardamos agradáveis recordações de convívio cordial, a par de ensinamentos que mui to nos têm a"j-mlado ao longo de nossa vida profissional. De sua extensa e importante obra destaca-se o livro Orientações da lingüística moderna, manual básico para o estudo científico da linguagem. À leitura de suas páginas devemos muito de nosso adensa:mrr�nto profissional e de nossa formação lingüística. Neste trabalho, revelou-se mais uma vez, à semelhança do Autor, amigo e mestre.

Quanto à metodologia empregada, ousaríamos afirmar que

(18)

amento da teoria gramatical vigente sobre o pronome se, opera uma retrospectiva do passado, espécie de insight filológico , e volta ao presente como que numa tentativa machadiano-filol�

...

.

gica de atar as duas pontas da lingua portuguesa. Possui

es-te trabalho, portanto, uma estrutura circular, em coerência com o espírito de síntese pancrônica que o norteia.

Trilhamos o caminho da articulação pancrônica, mas sem perder de vista, contudo, a lição saussuriana, segundo a qual, diacronia é meio e não fim, e como tal é que ela foi usada neste trabalho. Não se fez diacronia pela diacronia. Mas também não se caiu no extremo oposto, a sincronia pela sincro nia. Coerente com a nossa formação filológica, escolhemos possivelmente o caminho ma.Lo a.I'u.uO, ..; r-, � .ri,, o da história, mas, a no�

so ver, o mais seguro. Nes�e ponto, fomos radicais no sehti� do etimológico do· termo, isto e, procuramos ir à raiz do pro-·blema no que diz respeito ao pronome se, essa palavra oblíqua

e dissimulada.

,.

A abordagem diacrônica do assunto, indo à raiz do pro­ blema no latim clássico (onde estudamoq as @rigens da voz me­ dial e do pronome reflexivo se, assim _comOJ a questão da impe� soalidade verbal), passando pelo latim vu.11..�ar e pelo portu­ guês arcaico, até chegar aos nossos dias, JP)]f'Opiciou uma in­ trospecção ( insight) filológica que cobre mia.is de vinte

sécu-los. E filológica stricto sensu, já que es:;te trabalho está

todo ele calcado sobre textos, seja em lat:iim, seja em língua portuguesa (à exceção dos Inquéritos NURCv"

(19)

ü

9

tureza nos pareceria superficial e periférica, para nao dizer cômoda ou simplista. É que a intrincada questão do pronome ��' com suas diversas atribuições e funções sintáticas em po� tuguês, ·sempre nos espicaçou a curiosidade. Uma tese sobre o assunto que ficasse limitada à descrição sincrônica seria cho ver no molhado, seria repetir, em Última análise, o que já se escreveu sobre o assunto. Escassa perspectiva de originalid� de teria a nossa tese. E o que e pior, nao satisfaria, de

-

. forma alguma, o nosso espírito, tamanha era a determinação de mergulharmos profundamente no assunto· já há muito tempo. Des

sa forma, acabamos por conciliar aqui o Útil com o agradável, por isso as canseiras e as preocupações naturais num trabalho desta natureza não nos pesaram absolutamente.

Não se pense, entretanto, que a sincronia está ausente - .

destas paginas. Ela se encontra presente na bibliografia e-xaustivamente consultada, assim como no corpus utilizado, a saber, os inquéritos do Projeto NURC e os textos representati vos da sintaxe viva do português do Brasil, encontrada na no� sa literátura modernista e na melhor imprensa escrita do país. Para não sobrecarregar o desenvolvimento do texto teórico

parte desse corpus consta de um apêndice no final da tese. Pensamos que em língua nada surge por geraçao espontâ-nea. O flagrante registrado pela descriç�o �incr5nica sera

sempre o resultado de um longo processo de maturação e de a­ profundamento da deriva da língua, de continuidade e de ten­ são dialética entre conservação e renovação, entre inovação e

-

.

(20)

as palavras do Prof. Sílvio Elia: As línguas

nas isso.

sao estruturas, sim, mas nao ap� Pois as estruturas não surgiràm do nada; ao contrário, brotaram das virtua­ lidades psicofÍ�icas do ser humano, hist5ri ca e geograficamente condicionado e inseri­ do em determinado contexto social. 2

Em coerência com o espírito que orienta este trabalho, baseamos o nosso estudo do pronome se no tripé lati� clássi­ co/latim vulgar/português, já que o objetivo, intencional e deliberado, era ir à raiz do problema, metodologia adotada co mo uma questão de opção pessoal.

Partindo-se da descrição apresentada pelas principais gramáticas de português, as chamadas gramáticas tradicionais (GT), tentou-se demonstrar as origens e as causas das atuais funções e atribuições do pronome se, a saber: funções sintáti cas: obje.to direto (�-OD), objeto indireto (se-OI) e sujeito de infin1tivo (se-SI); atribuições sintáticas: parte integra� te do verbo (se-PIV), partícula ou pronome de realce (se-PR), símbolo ou Índice de indeterm1nação do sujeito (se:-IIS) e pa� tícula ou pronome apassivador (se-PA). A terminologia empre­ gada foi, sempre que possível, a mesma adotada pelas nossas gramáticas, na esteira da Nomenclatura Gramatical Brasileira

(NGB). Fizemo-lo até por coerência com o espírito didático

que norteia este trabalho.

(21)

Q

11

Já que falamos em gramática tradicional, aproveitemos para deixar clara a nossa posição em relação a essa Velha

Se-nhora. Como calejado professor de português, temos

consciên-eia de que os nossos alunos, mormente no ensino médio, se sen tem desestimulados, se desencantam enfim com um ensino que lhes mete na cabeça uma série de afirmações e de regras gram� ticais aparentemente gratuitas, já que algumas delas não gua� ,dam nenhuma relação com os fatos lingüísticos observados e

vividos pelos estudantes no seu dia-a-dia. Tal situação, en-tretanto, nao autoriza ninguém de bom senso, e muito menos o professor de português, a fustigar a gramática como um todo e

até, como querem espíritos mais extremados, a pedir a sua

eliminação do ensino escolar. Neste ponto, louvamo-nos nas palavras· prudentes do Prof. SÍlv io Elia, o qual faz a seguin­ te advertência:

Antes, ( ... ), de invectivar a Velha Senho­ ra, cumpre conhecê-la para melhor

avaliã-3 la.

fo que tentamos fazer neste nosso trabalho. Evitamos posições radicais, av.essas ao nosso temperamento. Desse mo­ do, não nos referimos, em nossas críticas, à chamada gramáti­ ca tradicional, mas sim à doutrina gramatical específica so­ bre o pronome se e, em particular, sobre o se-PA na chamada

3 ELIA, Sílvio. "Em defesa da Velha Senhora", 1.n L1.ngu.a C.

(22)

passiva pronominal. Nosso objetivo não é a crítica demolido-ra, indiscriminada e geral contra a GT, a crítica pela críti­ ca, mas ·sim a reavaliação daquelas posições doutrinárias sabi damente �ltrapassadas em relação aos estudos lingUÍsticos con temporâneos, e até mesmo em relação à própria realidade lin-gilística vivida pelos falantes. Como educadores que somos ,

nosso compromisso é com o ensino de língua portuguesa, por is so as nossas críticas visam antes à renovaçao e à permanência, e nunca à demolição. Nesse particular, seguimos o espírito cristão, que manda condenar o pecado, mas salvar o pecador.

Mas voltemos ao nosso pronome. A essa altura,

poder-se-ia indagar a razão do título desta tese. Por que o se uma palavra oblíqua e dissimulada? Pensamos que a resposta a esta pergunta se encontra na própria leitúra do trabalho, e só uma visão de conjunto poderá satisfazer a curiosidade do leitor. Nesse sentido, o nosso título deve ser entendido co-mo um convite, coco-mo uma espécie de aperitivo, de prelibação, que será tanto melhor quanto maior for o interesse e a boa vontade do leitor.

Antecipemos, entretanto, que o pronome se, como refle­

xivo, espelha, mais talvez do que qualquer outra palavra, o espírito humano, com toda a sua complexidade, com as suas con tradições e tensões dialéticas, próprias do ·homem:

razão/emo-ção, objetividade/subjetividade, lógica/intuirazão/emo-ção, etc. Neste trabalho, o tratamento introspectivo, no sentido histórico-fi lolÓgico, dado ao tema permitiu, em grande medida, desvendar as causas da dissimulação e da obliqilidade do nosso se, repr�

(23)

..,..

13

sentadas, por exemplo, pelas fronteiras ambíguas existentes entre o se-PIV e o se-OD, o se-PIV e O· se-PR e, principalmen­ te, entre o se-IIS e o se-PA, esta a fronteira mais intrigan­ te e mais polêmica e que, por isso, recebeu maior atenção de nossa parte.

Serviu-nos de ponto de partida o excelente texto de Said Ali intitulado "O pronome se", um dos capítulos do seu livro Dificuldades da língua portuguesa, cuja 5§. edição (1957) foi utilizada em nossa pesquisa. Também revelou-se de inesti mável valia o capítulo XII do livro clássico de Mattoso

Câma-ra, o Princípios de lingtiÍstica geral (4� ed. , 1972) . Este

capítulo trata da frase e de sua estrutura e contém valiosas informações sintáticas, principalmente sobre a categoria da voz verbal. Dentre os autores estrangeiros, merece referên­ cia o importante ·artigo "The passive voice in vulgar latin" , · de H. F. Muller, publicado no volume XV da The romanic review

(1924) da Universidade de Colúmbia, Estados Unidos. Não dis-ponível nas bibliotecas especializadas em'lingtiÍstica e filo­ logia do Rio de Janeiro, nós o obtivemos mediante contato di­ reto com a referida Universidade.

Dentre as atribuições sintáticas do pronome reflexivo mereceu destaque neste estudo a de se-IIS, empregado na estru tura sintática impessoal [suj. 0 + vb. 3� pes. sing. + se­ IIS], seguida ou não de nome: vive-se, aluga-se (casa) ,

pre-Outra

cisa-se (de empregadas) , �-se / está-se feliz, etc.

atribuição que recebeu cuidado especial foi a d� s�-PA na cha mada passiva pronominal, um dos pontos mais. polêmicos no âmbi

(24)

to da sintaxe portuguesa. Procuramos fazer um confronto en-tre as duas atribuições, a de se-IIS e.a de se-PA, rasen-trean­ do-lhes as origens e as tendências atuais no português do Brasil.

Aliás, a questão específica da chamada passiva pronomi_ nal acaba remetendo a uma outra qüestão maior, mais geral, e que tem preocupado lingilistas e professores de português nos Últimos tempos: que modalidade de língua deve servir de base, de modelo ou referência para a descrição gramatical? A lite­ rária, coroo tem sido até aqui? Ou o português-padrão médio empregado na língua escrita, e em certa medida na língua oral, pelas camadas sociais urbanas consideradas cultas do ponto de vista lingliÍstico? Perini, sem desfazer da importância do es tudo da literatura, prefere esta Última opção. Diz esse Au­ tor:

( ... ) gostaria de sugerir que a gramitica seja (pelo menos em um vrimeiro momento) uma descrição do português-padrão tal como se manifesta na literatura técnica e jorn� 1 � 1. s t 1.ca. . 4

O conceito de norma culta ideal de Perini contém em si traços de dinamismo e �e contemporaneidade, o que o aproxima do ponto de vista de Celso Cunha e Lindley Cintra, para os

4 PERINI, Mário A. p. 88.

(25)

15

quais, nesta questão de correto e incorreto em linguagem, o que deve prevalecer é o critério da aceitabilidade social, co mo afirmam:

Com efeito, por cima de todos os crit�rios de correção - aplicáveis nuns casos, ina­ plicâveis noutros - paira o da aceitabili dade social, a consuetudo de Varrão , o Único válido em qualquer circunstância.5

(grifo do Autor)

Essas considerações vêm a propósito dos conceitos de sintaxe culta formal e de sintaxe viva, empregados neste

tra-balho. A semelhança de Antenor Nascentes, que estabeleceu

u-ma diferença entre a regência clássica e a regência v_iva, tr� balhamos aqui com os conceitos de sintaxe culta e de sintaxe viva. Entendemos a primeira como aquela de origem clássica, baseada na língua literária e preconizada pela norma gramati­ cal em vigor; a segunda, a sintaxe viva, n�s a concebemos co­ mo a modalidade praticada pelos falantes pe1Ptencentes às cam� das sociais urbanas cultas, objeto das pes�uisas do nosso Pr� jeto NURC, as quais refletem justamente o JPlOrtuguês-padrão mé dio a que se refere Perini.

Sem desfazer da língua clássica� entendemos que esse português-padrão, por servir às comUIIIIlicações mais elabo radas da vida social, é língua funcional e de cultura,

sintó-5 CUNHA, Celso & CINTRA, Lindley. Nova gl.l1ll.má.t,Lc..a do pohtu-gu�� c..ontempohaneo, p. 8.

(26)

pica e sinstrática e, ipso facto, corrente e coerente do pon­ to de vista sintático, sem afetações literárias e, ao mesmo tempo, isento de certos preciosismos gramaticais desnecessá­ rios à intercomunicação social. Além disso, por estar mais consentâneo dom a deriva da lingua portuguesa no Brasil, pre­ enche o critério de aceitabilidade social a que se referem Cunha e Cintra.

Para o estudo dessas tendências atuais do português do Brasil foram de grande importância os textos dos inquéritos do Projeto NURC, gentilmente cedidos pela Prof� Dinah Callou, a quem deixamos consignados os nossos agradecimentos .. A par dos inquéritos NURC também nos serviram de corpus textos da imprensa escrita. publicados nos principais jornais e revistas do pais. Utilizamos também· as obras liter,árias do nosso Mo­ dernismo. Esses três componentes do corpus revelaram-se re­ presentativos das tendências atu�is de emprego do pronome se, principalmente no confronto entre o se-IIS e o se-PA.

·Encerrando, gostaríamos de lembrar .que em .ciência nao existem verdades definitivas. Mesmo no âmbito das ciências da natureza - as chamadas ciências exatas - qualquer verdade será sempre provisória e relativa. O que se dirá então das ciências humanas, dentre as quais se destaca a nossa lingüí� tica?

Tal advertência vem a propósito do seguinte: fornos à raiz do problema e procuramos escrever obra de fôlego; ad­ vertimos, entretanto, que esta nossa tese Jill.ão tem a

(27)

preten-a

17

são de eliminar ou de desfazer as ambigüidades e ambivalên­ cias da língua, especificamente no que tange a essa catego­ ria verbal semovente chamada voz medial, objeto de nossas elucubrações. Que nao cause estranheza, portanto, a referên

eia neste trabalho a certas fronteitas ambíguas, espécie de esfinge algo zombeteira em que se transmuda por vezes o nos­ so pronome se. Nessas horas, mais do que nunca, uma palavra oblíqua e dissimulada.

Isto posto, esperamos, ao fim e ao cabo, os objet�vos propostos.

(28)

2. DA DESCRIÇÃO GRAMATICAL 2�1. Sintaxe do pronome se 2.1.1. funções a) se-OD b) se-OI e) se-SI 2 .1. 2. atribuições a) se-PIV b) se-PR ô e) se-IIS d) se-PA

o

(29)

ô

19

2. 1. Sintaxe do pronome "se"

A sintaxe do pronome se apresentada pela descrição gr� matical sugere o desempenho de funções e de atribuições sin­

táticas diversas.

De um modo geral, as nossas gramáticas não fazem essa diferença entre função e atribuição sintática no que tange ao pronome se. Fomos encontrá-la no Método moderno � simples de análise sintática (1980, pp. 4-6/50), de Walm>Írio Macedo, e _ nós a adotamos aqui não só por conveniência metodológica, mas

principalmente porque ela se presta a uma �escrição mais rig� rosa do comportamento sintático do nosso FOnome reflexivo. Embora Macedo não explicite a diferença �:ii.stente entre fun­ çao e atribuição sintática, nós procuramos fazê-lo aqui, se­ gundo o nosso entendimento.

Por função sintática entendemos o J;D:IB.wel que os elemen­ tos gramaticais desempenham num enunciado RingliÍstico, tal como, por exemplo, as funções sintáticas &e sujeito ou de

ob-jeto. Trata-se de relações sintáticas nc1.DllllPais, próprias da

sintaxe de uma língua, e que as palavras oo:,rotraem entre si na frase, no eixo sintagmático, portanto. No �aso do pronome se,· servem de exemplo as funções sintáticas; de objeto direto

-Cse-OD), objeto indireto (se-OI) e sujeit0 file infinitivo (se­ SI).

Por atribuição sintática, no caso es,FecÍfico do prono­ me se, entendemos o papel que eventualmen�� lhe é conferido

(30)

a

õ

o

pela convenção gramatical, fora das funções sintáticas acima mencionadas. Trata-se de desempenho que, embora realizado no nível da frase, à semelhança da. função sintática, desta se distingue pelo seu caráter eventual, assim como pela sua esp� cificidade, uma vez que o referido desempenho não consta das chamadas funções sintáticas próprias da sintaxe de uma língua como, por exemplo, as de sujeito, objeto, adjunto, etc. No caso do pronome se, temos as seguintes atribuições sintáti­ cas: parte integrante do·verbo (�-PIV), partícula expletiva ou pronom� de realce (se-PR) , Índice de indeterminação do su­ jeito (se-I;[S) e partícula apassivadora ou pronome apassiva­ dor ( se-PA) .

Adotamos esta distinção porque nao podemos aceitar que algo como "partícula de realce", ou "parte integrante do ver­ bo'', por exemplo; seja tratado como função sintática, em p� · de igualdade com a função (esta sim) de sujeito ou de objeto.

Aliás, no caso do se-PIV, as próprias gramáticas se encarre­ gam de advertir que o pronome não desempenha nenhwna função sintática, uma vez que, integrado ao verbo, apresenta-se fos­ silizado. A nosso ver, falar em f�nçã6 sintática neste caso, como nos outros acima mencionados, implica incoerência. Por uma questão de conveniência (e de convicção) metodológica e de rigor descritivo, preferimos não misturar alhos com buga­

lhos.

Isto posto, façamos uma síntese da descrição apresenta da pelas nossas gramáticas a respeito da sintaxe do pronome se.

(31)

ô

21

2 . 1. 1. funções

As funções sintáticas de objeto direto, objeto indire­ to e sujeito de infinitivo exercidas pelo pronome $e sao con­ seqüência natural do seu valor historicamente reflexivo e segundo velha lição gramatical de base lógica, só pode haver voz reflexiva

com sujeito animado. Esta afirmação é encontrada com freqüê� eia em nossos manuais de sintaxe. Por exemplo, em trabalho

escrito com finalidades didáticas, afirmam Dinamérico Pereira Pombo & Antonio Martins de Araujo:

-Na voz reflexiva, o sujeito e sempre um

. d 1 ser, um ente anima o.

Esta é uma afirmação_ que será analisada criticamente

ao longo da tese. Por ora, atenhamo-nos à descrição gramati-cal, objeto deste capitulo. Rocha Lima, por exemplo, assim descreve o comportame�to sintático do pronome reflexivo:

Sio reflexivos os pronomes pessoais atones (objeto direto e indireto) quando pertencem � mesma pessoa do sujejto da oraçio: o age� te e o paciente sio um s6, porque o sujeito executa um ato reversivo sobre si mesmo:

Os empregados� despediram.

Eles se arrogam o direito de vetar. 2

l ARAUJO, A. Martins de & POMBO , Dinamêrico P. p. 59.

Po�tu.g u. ê.;.. 2 , 2 ROCHA LIMA,

e.

Henrique da. G�amãtiQa no�mativa da lZngu.a

(32)

ô

õ

Comecemos pela função de objeto direto. a) se-OD

Segundo Bechara, o se-OD ocorre

( ... ) com verbo transitivo direto na voz re­ flexiva:

Ele se feriu.

Eles se cumprimentam. . 3

No segundo exemplo apresentado por Bechara, trata-se de se-OD com idéia de reciprocidade.·

Em WalmÍrio Macedo, encontra-se idêntica lição, tendo este Autor o cuidado de explicitar que o sujeito do verbo na voz reflexiva deve ser um ente animado.

nome como "partícula", diz Macedo:

Referindo-se ao

pro-Para que a partícula "se" seja objeto, dir� to ou indireto, e preciso que o sujeito do verbo seja animado, isto

-

-

e,

capaz de prati-car a açao verbal da oraçao.

Exs. : Ele se feriu.

. 4

Maria penteou-�.

3 BECHARA, Evanildo. · Modenna gnamãti�a pantugue�a, p. 255.

4 MACEDO, WalmÍrio.

(33)

o

ô

ª

23

b) se-OI

O se como objeto indireto ocorre, segundo Bechara,

c) se-SI

( ... ) com verbo transitivo indireto na voz reflexiva, ou com verbo acompanhado de dois complementos:

Eles se correspondem freqUentemente. Ele se arroga esta libeFdade. 5

O se·pode desempenhar a função de Sl1D.j:eito de infiniti­ vo quando, segundo Bechara, for usado

5 6 7

( ... ) com auxiliares cam$ativos, mormente deixar:

• • - • 11 6

Deixou-se ficar a Jane�a.

Macedo apresenta descrição um pouc� mais ampliada:

BECHARA, E. Op. Idem, ibidem, p.

MACEDO,

w.

Op.

Ocorre com os verbos ."deixar, mandar, �­ z er, ver, ouvir, sentirn e seus sinônimos

seguidos de ·infinitivo.

Ex.: Sofia deixou-se e$trar à janela. (Quincas Borba, M. de Assis) 7

cit., p • 255. 255.

(34)

6

2.1 . 2. atribuições a) se--PIV

O se como parte integrante do verbo ocorre junto aos chamados verbos pronominais. Segundo a descrição de Rocha Li

ma,

H ã verbos a que se ligam pronomes atonos inseparáveis, que se tornam parte integra� te deles, como suicidar-se, condoer-� , apiedar-�, ufanar-� ; queixar-�, vanglo­ riar-se, etc. s ão pronomes sem função , �i�z ados. 8 (grifos d o Autor)

Chamamos a atenção para o fato de o Autor explicitar que o se-PIV é um pronome "sem função" (sintática) , já que fossilizado. Tal circunstância confirma o acerto de nossa distinção terminológica entre função e atribuição sintática, no que diz respeito ao pronome se. Nos casos acima, por e-xemplo, afigura-se-nos como portador de maior rigor descriti­ vo o termo atribuição sintática, como parece sugerir implici­ tamente a descrição de Rocha �ima.

Macedo apresenta a seguinte descrição:

Hã verbos que so se empregam com o pronome

ã tono correspondente . São os pronominais

(35)

ô

2 5

essenc 1.a1.s. A p artí cul a "se" neste caso é parte integrante do verbo, não podendo , di� sociar-se dele, nem s equer na conj ugaçao. Ex. O aluno se que i xou ao prof essor . 9

Em seguida, Macedo oferece uma pequena lista dos cham� dos verbos pronominais, junto aos quais ocorre o se-PIV:

b) se-PR

" Se" e tamb ém p arte integrante, quando o verb o indica sentimento, estado de espírito, como indignar-�, ufanar-�, atrev er- se , lemb rar-�, esquecer-�, arrepender-�, or­ gulh ar-�, ab orrecer-�, enfadar-�, can­ sar-�, fatig ar-�, ch ocar-�, derreter-�,

1 0

congelar-�, etc. ( grifos nossos )

O se como partícula expletiva ou pronome de realce ocorre, segundo Macedo,

9 1 0 1 1

( . .. ) j unto a verbos intransitivos que te­ nham sujeito .

Ex . : O padre riu-se da ingenuidade da moça. "Vai- ll a prim eira pomba despertada. "

(Raimundo Correia)1 1

MACEDO ,

w.

Op. c i t. , P P • 4 8 - 4 9 .

Idem , ibidem, p. 4 9 .

(36)

ô

Celso Cunha descreve o se-PR como

( . . . ) palavra ex pletiva ( para real çar, com verbos intrans itivoi , a e s pontaneidade de uma atitude ou de um movimento do s ujeito) "Carlos Maria cons ultou o relÔgio ; eram

duas h oras ,. ia-� embora. " OC , I, 5 7 9 ) 1 2

(M. de As s is

Bechara descreve 1ue o se-PR aparece junto a verbos que indicam

c ) se-IIS ·

( • • . ) movimento ou atitudes da pessoa em r� lação ao seu prÔ prio corpo : i�, parti

r-• ]! 3

� ' s en t ar- s e, s orrir-s e .

O pronome se recebe a atribuição de s.Ímbolo ou Índice de indeterminação do sujei to quando usado j'j-wmto a verbos im­ pessoais na 3� pessoa do singular, nas oraç©es de sujeito in­ determinado nos seguintes casos :

1 2 CUNHA, Celso.

1 3 BECHARA, E .

O pronome " s e" s e r v e t am b é-m par a i n d i c ar que o s ujeito da oração é indeterminado. Ocorre com verbos intran�i tivos e trans iti

G.1tamâ.t-lc.a da ll.ng u.a po1t:t.1..q:g;u. e..ti a , p . 3 0 4 .

(37)

ô

vos indiretos .

Exs . : Dorme-se. Vive - se . Acorda-se. 1 4 27

Macedo inclui neste caso também os verbos de ligação, além dos transitivos usados intransitivamente:

Encontr a -se também essa atribuiç ão da pa rti cula "se" com ver bos transitivos diretos to mados intr ansitivamen te .

Ex.: Estuda-� muito aqui .

Junto aos ver bos "��" ou "estar", a pa rti -... cula "se" e Í ndice de indetermina ção do

su-. su-. 1 5 J e ito.

Celso Cunha, por sua vez, nao menciona o emprego dos verbos transitivos indiretos nem dos verbos de ligação com o se-IIS, que, aliás, o Autor chama de

( . . . ) símbolo de indete�min a ç ão do sujeito (junto ã 3� pessoa do singular de verbos in tr ansitivos, ou de tr ansitivos tomados in­ tr ansitivamente) :

"Discutia-se, gri.tava -se, acenava -se." (A .

-1 6

Arinos, OC, 5 10)

14 MACEDO, W. Op. cit., p. 4 8 .

1 5 Idem, i bidera, p. 4 8 ,

(38)

o

ô

Bechara não faz qualquer referência à predicação do verbo empregado na estrutura sint�tic� impessoal a que se re­ fere Celso Cunha, ou seja, [ suj. 0 + vb. 3� p. s. + se-rrs] . O Autor menciona apenas que o se-IIS ocorre

( . . . ) junto a verbo d e mod o que a oração passe a equivaler a outra que tem por sujei to algué m, � �nte ou expressão sinônima:

Vive-� bem aqui.

Precisa-se d e bons empregados.

O pronome se nesta aplicação recebe o nome d e f nd ice d e ind etermi nação d o sujeita. 1 7

Atente-se para a vacilação terminológica acima, devido a uma omissão da NGB. Alguns gramáticos chamam a este se de Índice de indeterminação do sujeito; outros o classificam co­ mo símbolo de indeterminação do sujeito. Lembremos, a propó­ sito, que na época da elaboração da Nomenc1atura Gramatical Brasileira, tal questão foi levantada por _ instituições de en­ sino interessadas. fo que se lê, por exelllllplo, na correspon­ dência enviada em 16/5/58 pelo Prof .. Aibino de Bem Veiga, ti­ tular de língua portuguesa da Universidade do Rio Grande do Sul, � Comissão designada pelo Ministério da Educação para elaborar a referida Nomenclatura. O Prof . Bem Veiga indaga que termo deveria ser usado no caso:

ll BECHARA, E.

( . . . ) sí mbolo, Í nd ice, sinal ou partf cula

(39)

ô

ô

ô

29

de indeterminação do sujeito?1 8

Neste trabalho, preferimos o termo " Índice de indeter­ minação do sujeito", por nos parecer o mais usual no ensino de português.

d) se-PA

O se recebe a atribuição sintática de partícula apass� vadora ou pronome apassivador qu.ando usado na chamada passiva pronominal ou sintética, sempre com verbo transitivo direto. _ Segundo a descrição de Macedo,

1 8

1 9

O pronome ". se " pode indicar simple sme nte

voz passiva a chamada passiva sintética

ou pronominal quando o suje ito da

ora-ção for inanimado ou não praticar a aora-ção verbàl na f rase.

Exs . : Alugam-� casas .

Consertam-� relógi os . Vendem-se livros usados . P reveem-se muitas co i sas . � . . 1 9 Em Rocha Lima lê-se o seguinte :

Quando, ( . . . ) , o ato nao emana do sujeito ,

CHEDIAK, Antonio J . (organizador) . NGB e �ua �labo�ação ,

p . 2 1 5 .

(40)

o

que

e

apenas o paciente, ternos, no pronome que o representa, a partícula apass ivadora:

Despedi ram-� os empregados faltosos e admitiram-se alguns dos antigos

candida-2 0 -tos.

Dinamérico Pepeira & Antonio Martins acrescentam ou­ tras informações sintáticas:

2 0

A pass iva com o pronome � ' passiva pronomi nal ou sintética:

a ) limita-se a 3� pessoa :

"Tirou-se a panela do fogo"

"Tiraram-se as panelas do fogo"; b ) s6 admite agente indeterminado:

"Al uga-� esta casa • . 11 2 1

Para Celso Cunha, a passiva pronominal ocorre

( ... ) com pronome apass i vador se .e uma ter­ ce ira pessoa verbal, singular ou plural, em concordância com o suj e i to:

ROCHA LIMA, A. H.

Não se vê (=

e

vista) urna nuvem no ceu. Não se veem (= são v istas)

Op. cit., p. 2 86 .

- 22 nuvens no ceu.

2 1 ARAUJO, A. Martins de & POMBO, Dinarnerico P. - Op. cit., 22

p. 5 7.

(41)

ô

ô

31

Como se vê pela descrição de Celso Cunha (e de outros gramáticos ) , a chamada passiva pronominal é considerada como equivalente à passiva analítica . Nesse sentido, sua frase-símbolo, aluga-se esta casa, é tida pela tradição gramatical como sucedâneo sintético da passiva analítica esta casa é alugada. Existe, entretanto, outra possibilidade de análise da referida frase-símbolo, qual seja a de ver em aluga-se es­ ta casa, como em outras frases semelhantes, valor ativo e im­ pessoal, recebendo, o pronome, neste caso, a atribuição de se-IIS.

Constitui a questão acima assunto polêmico, do qual se têm ocupado os estudiosos brasileiros e po�tugueses . Nesta

tese dedicaremos atenção especial a este p0>IDto. Quanto

classificação do pronome se nesses torneios7 lembremos que já em 18/4/58 o Instituto de Educação de Port0> Alegre apresentava à · Comissão encarregada de elaborar a NGB a seguinte sugestão:

Sugeririam

i

Comissão que firmasse criti­ rio para designaç ão deste � · que uns con­ sideram como partí cula apassivadora, e ou­ tros ch amam part í cul a � 1ndeterminação do

. . d d . 2 3

s u J e 1-to , · a ti o a v o z c o m® a t 1 v a .

E com clarividência magistral, a re.fe:rida instituição de ensino gaúcha fez uma espécie de cobran�a-profecia:

(42)

õ

E parec e que seria esta a oportunidade Úni­ ca de urna definiç ão dec isiv a da gramátic a

. 2 4 nesse senti.do .

Enquanto cobrança, a observação dos professores sulis-tas continua até hoje sem resposta. E enquanto profecia, aca bou virando realidade, no sentido de oportunidade perdida. In felizmente, para . o ensino de português.

Passemos agora ao estudo da evolução histórica do

nos-so pronome se. Quanto à apreciação crítica das descrições gramaticais aqui apresentadas, riÓs a faremos na parte refere� te ao estudo da língua portuguesa. Por ora , e para ir à raiz

da questão, comecemos pelo latim clássico, em coerência com o espírito de introspecção diacrônica que orienta esta tese.

(43)

ô

3 - DA EVOLUÇÃO DO PRONOME SE

(44)

3.1 - No Latim Clássico

Resumo

3.1.1 - SE reflexivo

3.1 . 2 - A indeterminação do sujeito 3.1.2.1 - Com a voz ativa 3.l.2.2 . - Com a voz passiva

a) origem da passiva b) a voz medial

e) a passiva impessoal - sintética

(45)

3 5

3. 1 - No Latim Clássico 3. 1.1 - SE reflexivo

O latim clássico dispunha dos seguintes pronomes refle xivos de 3ê- pessoa: em função substantiva, s:ui (genitivo) sibi (dativo) e se (acusativo) ; em função adjetiva, emprega­ va-se suus, acumulando os valores reflexivo e possessivo . Es te Último perdeu sua força reflexiva no la�im vulgar, sobrevi

vendo apenas como possessivo.

O pronome reflexivo se em latim era reservado � 3ê- pe� soa e remetia sempre ao sujeito. Diz Madvig:

1

Le pronom re fle chi � ( soi ) se rapporte à la troisieme personne, c� est-ã-dire ã la

1 personne ou ã la chose de qui l' on parle. Mattoso Câmara, mais explícito, afi1rma :

MADV I G , J . R.

A lí ngua latina levava e� conta a expressao por um pronome pessoal, �� um possesivo, de

uma 3 � pessoa que, como ��mplemento, era a

mesma que o suj eito. Ou, em outros termos, possuí a um sistema de pr(ll)111lOmes "reflexivos" de 3 � pessoa ; assi m, tem(ll)S o acusativo re­ flexivo se em - se quisqmue: di lig it " cada um" ( quis que ) " ama s � a prwpria pe s soa ; - l i

G�ammai�e la�ine, p. 85.

(46)

ô

m e s m a s o r t e , t emo s o po s s e s s i v o . r e f l e x i v o ,

n o f e m i n i n o ab l a t i v o , � e m - a g i t �

d omo s u a - '' a g e e m s e u p r ó p r i o p r ov e i t o " . 2

Como no latim clássico a voz reflexiva tinha unicamen­ te função reflexiva, o pronome se era usado apenas no caso acusativo como complemento do verbo e refletindo uma ação pr� ticada pelo sujeito.

O termo "reflexivo" origina-se de re- (movimento para trás) + flecto (curvo, volto, dirijo) e indica que a aç;o ver bal "volta para trás", isto é, repercute ou reflete sobre o próprio sujeito. Ex. : Puer se laudat; Agatlninum ad se vocat (Cic. , de jurisd. Siciliens. , 38, 92)3 ; Quam quisque norit artem, in hac se exerceat (Cic. , Tusc. , I � 41)4. Com verbos transitivos indiretos o reflexivo assumia a - forma sibi do dativo. Ex. : . Superbus sib i nocet.

O � podia ser usado também para eX)Plt'essar a idéia de reciprocidade. Ex. : Hostes se interficiumrtt; Inter se amant

5

(Ter. , Ad. , 5, 3, 41) ; nos Commentarii

a�

mello gallico, de Júlio César, encontramos o seguinte exemp�@: Hi omnes lingua,

2 C ÂMARA JR. , J. Ma t t o s o . Hl.6 tÓ4la e e.6 t':tWJl..tu4a da lZng u a po�

tug u e.6 a , p • 9 4 •

3 Ap u d MAGN E , A . G4am m atlea latlna , p . 453. ·

4 I d em , i b i d em , p . 4 6 9 .

5 MAG N E , A . O p . c i t . , p . 4 6 0 .

(47)

3 7

. 6

institutis, legibus inter se differunt. Podia o 'pronome se sofrer o redobro para sese com finalidade enfática, de real­ ce. Ex.: Furtim nonnunquam inter sese aspiciebant . (Cic. ,

7 Ca t. , 3 , 13) .

No latim clássico o pronome reflexivo podia ter um em­ prego direto, ou indireto.

O uso direto ocorre sempre nas oraçoes independentes, em que o pronome se reenvia a ação verbal para o sujeito da própria oração em que o pronome se encontPa. Diz Ernout:

Le réfléch i e s t dire c t quand le pronom � e t l ' adje c tif s uus renvoi e nt au s uje t de la propos ition oii ils s e trouv e nt: Cic·. , Tu. 4 , 7 9 : Alexande r, c um inte remis s e t Clitum, familiare m s uum, uix � s e manus abs tinuit. 8 Também sobre esse uso direto do se, ensina Bassols:

El re flexivo s e. us a para r eproduc ir e l s uj� to gramatical o lógic o de s u orac iô n (re fle xivo direto) : ius titia per s e colenda e s t. 9

6 Apud ALME IDA, Napoleão M. de . G�amátiQa �atina, p. 351 . 7 Apud ERNOUT, A. e t RIEMANN,

o .

S yntax e !ati n e , p . 3 1 .

8 ERNOUT, A . e t THOMAS, F . Syntaxe latine� p . 1 82.

9

(48)

Madvig nos oferece outro exemplo desse uso "direto do pronome se :

Le pronom re fle ch i et le pronom possessif suus, qui en est tire , se rapportent tou­ jours au sujet , comme en français soi , se. Ipse � quisque d iligit, ch acun s' aime

- . - 1 0 so1 -meme.

Curioso é o uso do se referindo-se a um sujeito indefi nido, nao expresso na oração, conforme ensina Ernout:

Le re fle ch i, d ' autre part, pouvait renvoy er ã un sujet inde fini non exprime : C ic. , Of. I, 1 3 7 : deforme et iam est . � � ips·o praedi care " il est laid de se v ant er11

1 1

Madvig também menciona esse. uso do pFonome se como ele menta de referência a um sujeito fictício o� hipotético. Ou, como diz Ernout, "indéfini non exprimé". Leiamos Madvig:

1 0 MADVIG, J. R .

SE , SUUS se trouvent quel�uefois d ans d es e nnonciations ge ne rale� , s ans se rapporter ã aucun sujet d e termine �®i pre ce d e , d ans le sens d e "sÕ i-même" : Neig ,l igere, quid de se quisque sentiat, non 5olum arrogantis est , sed etiam omnino d i5soluti , c ' est le

Op. cit ., p. 5 5 7 .

(49)

3 9

fait non-seulement d ' un arrogant, ma is meme d1un homme sans moeurs, de ne pas s ' inquie­ ter de ce qu I

on pense de lui (Cic., Of f . , 1 , 2 8 ) . 1 2

Esse uso indefinido do pronome reflexivo também pode ocorrer com verbos na voz passiva.

de Cícero, citado por Bassols:

-O exemplo mais uma vez e

A v ec e s e l r e f l e x i v o va r e f e r i d o a u n s u j e ­ t o i nd e f i n i d o ( = " u n o , s e " ) i m p l íci t o , p e r o n o e x p r e s o ; as í : qu o d s i b i p e t i tu r . . . " l o q u e u n o p i d e p ar a s í " ( C ic . ) . 1 3

·Nestes exemplos de Cícero citados por Ernout, Madvig e Bassols não se pode afirmar que o pronome ·reflexivo esteja sendo usado na função que nós,. em português, chamamos hoje de "símbolo de indeterminação do sujeito". Tal afirmação não procederia, uma vez que no latim clássico essa indefinição ou indeterminação do sujeito é expressa, no caso, por verbos na 3 � pessoà do singular (est, no ex. de Ernout; sentiat, no ex. de Madvig) e na voz médio-passiva (petitur, no. ex. de

Bas-sols) . Mas a própria possibilidade de o pronome reflexivo p� der se referir a um sujeito lógico indefinido e vago, sintati camente não expresso, não representaria uma _espécie de elo r� moto entre o nosso se, "símbolo de indeterminação do sujeito",

1 2 MADVIG , J . R. O p . e i t . , p . 5 6 1 .

(50)

ô

e um possível emprego impessoal da medial analítica no latim vulgar? Antecipemos aqui que a medial analítica vulgar viria a ter nas línguas românicas C port. , esp., ital.), como um dos seus empregos, a função de expressar a impessoalidade verbal, à semelhança da médio-passiva clássica. E que essa medial a-nalÍtica, na verdade, uma perífrase verbo-pronominal (verbo +

pron . reflexivo), desenvolveu-se no latim vulgar para reco­ brir algumas das funç6es da extinta passiva sintética (ou mé­ dio-passiva) clássica.

A indagação acima justifica-se: sabemos que muitas das tendências embrionárias e latentes no próprio latim clássico puderam mais tarde se expandir livremente , através das inova­ ç5es produzidas pelo latim vulgar, inovaç5es essas que tive­ ram ressonância decisiva nos destinos das línguas românicas.

Lembremos, a propósito, as palavras judiciosas de Sapir , para quem,

( . . • ) as mudanç as dos siculos pr6ximos

es-.tão em certo sentid� prefi g uradas em algu­

mas tendências obscuras �o presente, e que tais mudanç as , uma vez realiz adas, provarão ser apenas continuaç ;es de outras mudanç as

. - . h " f " dl 1 4 que Jª se tin am veri ica o.

Quanto ao uso indireto do reflexivo , este ocorre no p� rÍodo composto por subordinação nos seguintes casos:

a) quando o pronome reflexivo, na ora�ão subordinada ,

(51)

õ

se refere ao sujeito da oração principal;

ex . : Misit qui vocarent Magium ad sese in castra. (Liv. , 2 3, 7, 7)1 5

41

Sentit animus se vi sua moveri. (Cic. , Tusc. , 1, 5 5)1 6

b) quando o pronome reflexivo pode se referir tanto ao sujeito da oração principal quanto ao sujeito da

oração subordinada. Neste· caso, pode ocorrer as ve

-zes uma certa ambigilidade de sentido, como no se­ guinte exemplo: Antonius amico persuadet ut .sibi defendat . 17 No caso, duas leituras são possíveis:

"Antonio persuade o amigo para que o defenda"; e "Antonio persuade o amigo para que se defenda". Pa ra desfazer a ambigilidade, os gramáticos latinos re comendavam, no caso, o uso de ipse j unto ao sujeito do verbo principal, reservando-se o reflexivo para o sujeito da oração subordinada.

Como se vê, o pronome reflexivo se era usado no latim clássico com função exclusivamente reflexiva ou medial. A esse respeito, diz Veikko Vaananen:

El valor medio era expresado, fuera de la

1 5 Apud MAGNE, A. Op. ci t. , p. 4 5 7 .

1 6 Apud MAGNE, A. Op. e i t. , p. 4 5 8.

(52)

ô.

pasiv a , po r la fo rma reflexiv a: � de dere " entregarse" , � exerc ere " ejerc itarse" , se

1 8 v ertere "vo lv erse" , etc .

Não tinha 6 pronome se, no latim clássico, função que pudesse aproximar-se daquilo que em português nós chamamos de "pronome apassivador". Na língua clássica não era sequer em-pregado na formação da voz passiva. O se só vai adquirir a chamada função apassivante mais tarde, nas línguas românicas, como veremos mais adiante. Tinha o se, entretanto, a possibi lidade de se referir a um sujeito vago e indefinido, conforme

já demonstraram Ernout, Madvig e Bassols com os exemplos de Cícero há pouco citados.

O _ que se entende por passiva sintética em latim é algo completamente diferente daquilo a que se referem as nossas gramáticas, a partir do século XVI, quando se referem à cham� da passiva pronominal ou sintética. A passiva sintética do latim clássico existia apenas nos tempos do infectum e atra­ vés do acréscimo de morfemas aditivos específicos aos verbos

- a .

da ativa, a saber, -ris e -mini a 2- pessoa do singular e do

. - a .

-plural respectivamente; -r a 1- pessoa do singular e -ur as demais pessoas .

A voz verbal .primitivamente existente em latim era a voz ativa. A propósito, diz Said Ali, referindo-se a Bréal :

(53)

o

4 3

Brê al exp li c a aquela p ri m i ti va fase, em que ai n d a se d esc onh ec i a a vo z p assi va , d este mod o: As línguas i nd o - europ é i as ap resen ta­ vam � frase sob � forma de um p equeno d rama

- 1 9

em que o sujei to e sempre agente.

Para poder �xpressar necessidades e situações novas foi que o latim desenvolveu a sua voz passiva. E desenvol-veu-a partindo da voz ativa, a qual, à semelhança do indo-eu­ ropeu, apresentava o processo verbal como algo em si mesmo , como uma atividade partida sempre de um.agente vivo e atuan­ te. Tinha o latim clássico a sua passiva sintética limitada aos tempos do infectum . Tomemos como exemplo o verbo amo e

conjuguêmo-lo na voz passiva, no presente do indicativo: amor = sou amado

amar1s - és amado amatur = é amado

amamur· = somos amados amamlllii = sois amados

-amantur = sao amados O latim clássico desenvolveu três vozes ou aspectos verbais: a ativa, em que o sujeito realiza a ação; a passiva, em que o sujeito sofre a açao; e a média, qme, como o próprio nome está dizendo, é um meio termo entre a ativa e a passiva, já que ela, a voz média (ou medial) , contéD em si, de certa forma, uma mistura das duas outras vozes. Ma voz medial, o

1 9 SAID ALI , M .

O li vro d e Bre al a que se refere Sai d Ali é o c lássi co S e.ma.nt.iq u. e. , c ap . "Ac q ui si t i a n s nouve 1 1 es'''.

ção d e p ági n a.

(54)

men-sujeito apresenta-se interessado e integrado na ação verbal , uma vez que esta parte do sujeito e para ele retorna ou refle te, daí o fato de a voz medial ser também chamada de reflexi­ va . Aliás? a nossa NGB não. �gasalhou � termo "voz medial" , preferindo a este o termo "voz reflexiva", por sinal, menos preciso, menos abrangente e, portanto, mais limitado, como de monstraremos ao longo deste trabalho.

É importante registrar que a passiva sintética clássi­ ca tinha, na verdade, um valor duplo: m�dial e passivo ao mes mo tempo . . Eis o que diz Vaananen:

En latín, la voz llamada pasiva es en reali dad medio- pasiva, ya que sirve para expre­ sar al mismo tiempo la pasiva propiamente dich a y la media : cingor significa "soy cenido" y "me .cino" ' moveor "soy movido" y "me muevo", vehor "soy llevado" y "me h ago llevar". 2 º

Esta passiva clássica conseguiu elaborar uma síntese (não fosse ela sintética) na qual se abstraíam valores diver­ sos, tais como :

a ) impessoal, com um matiz ativo e a mensagem centrada exclusivamente em. torno do verbo, a saber:

- intransitivos : Qua Romã itur? Sic petitur caelum .

(Ovídio )

(55)

ô

ô

- trans . indiretos : Parentibus paretur .

Parcitur pueris et senibus.

b) médio-passivo, a princípio com verbos - depoentes : lavor ; Castris effunduntur .

4 5

Este sentido médio e ao mesmo tempo passivo acabou por se generalizar a toda a categoria verbal da voz passiva sintf tica, de tal forma que verbos como amor ou laudor podiam se prestar a uma interpretação dupla, como menciona Vaananen:

"sou amado"/"eu me amo" e "sou louvado"/ "eu me louvo ". Trata remos deste ponto mais adiante .

c) passivo stricto sensu, com verbos

- trans . diretos : Dolor lenitur tempore .

Superbus movet\ll' tuis minis . · Boni libri legUJ!ltur in schola. Desconhecendo o latim clássico o challlilado se "apassiva­ dor", por ser o emprego deste pronome exclasivamente

reflexi-...

vo, algo como 0

Boni libri se legunt in scholâ soaria aos

ouvi-dos de um romano culto como um absurdo do ponto de vista rig� rosamente gramatical, isto é, o entendimen;to da oraçao seria literalmente "bons livros lêem a si próprios na escola ". Mas isto no latim clássico, porque no latim vu1gar a voz reflexi­ va ou medial acabou tomando o lugar dessa rnidio-passiva clás­ sica , subvertendo valores e referências , como veremos mais à

frente.

-

.

manica.

O se "pronome ap�ssivador " é, portami!:6, uma criação ro Merece reiteração, por outro lado� o uso do pronome

Referências

Documentos relacionados

Com o fomento de políticas voltadas o contexto da Língua de Sinais nos cursos de Ensino Superior tem como fator de observação a prática docente e o uso de

A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se baseia no fato de que uma

¢ll', ™pe• oÙ m£qon œrga qalassopÒrwn ¡li»wn ka• buq…hj oÙk o‧da dolorrafšoj dÒlon ¥grhj, Leukoqšhj œce dîma baqÚrroon, e„sÒke pÒntou ka• s ka•

No entanto, maiores lucros com publicidade e um crescimento no uso da plataforma em smartphones e tablets não serão suficientes para o mercado se a maior rede social do mundo

devidamente assinadas, não sendo aceito, em hipótese alguma, inscrições após o Congresso Técnico; b) os atestados médicos dos alunos participantes; c) uma lista geral

referencial serve de base para o desenvolvimento de um tópico, a presença de um tópico oferece tão somente as condições possibilitadoras e preservadoras da

Visto que o fator de rotatividade de funcionários no grupo de publicidade da IESol é prejudicial para a organização e sistematização das diferentes produções de comunicação,

A Seqüência de Três Níveis oferece um quadro mais amplo de uma situação e pode ser útil para fazer perguntas a respeito da situação de pessoas que não estão fisicamente