• Nenhum resultado encontrado

Identidade categorial e função dos ideofones do changana

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Identidade categorial e função dos ideofones do changana"

Copied!
347
0
0

Texto

(1)

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA

Tese de Doutorado

IDENTIDADE CATEGORIAL E FUNÇÃO DOS IDEOFONES DO CHANGANA

EZRA ALBERTO CHAMBAL NHAMPOCA

(2)
(3)

IDENTIDADE CATEGORIAL E FUNÇÃO DOS IDEOFONES DO CHANGANA

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito para obtenção do grau de Doutora em Linguística.

Orientador: Heronides Maurílio de Melo Moura

(4)

Nhampoca, Ezra Alberto Chambal

Identidade categorial e função dos Ideofones do Changana / Ezra Alberto Chambal Nhampoca ;

orientador, Heronides Maurílio de Melo Moura, 2018. 347 p.

Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Programa de Pós-Graduação em Linguística, Florianópolis, 2018.

Inclui referências.

1. Linguística. 2. Ideofones do changana. 3. categoria gramatical. 4. Semântica de Frames. 5. função, marcação. I. Moura, Heronides Maurílio de Melo . II. Universidade Federal de Santa Catarina.

(5)
(6)
(7)

Ao meu esposo, irmão no amor e na academia;

Às minhas filhas, a sempre minha tripla imbatível;

Aos meus pais, que me mostraram o caminho da escola,

(8)
(9)

Primeiro a Deus e a todo o meu Sistema Familiar por permitirem que eu seja o que fui, o que sou e o que serei.

Ao CNPq pela concessão da bolsa de estudos para a realização da presente pesquisa.

À Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), esta outra, agora também minha casa, por me ter acolhido e me tornado parte de sua história. Voltarei sempre.

Ao meu orientador, Heronides Maurílio de Melo Moura, por ter aceite o desafio de trabalhar comigo ainda em Moçambique, sem nem sequer me conhecer; pela boa convivência ao longo dos quatro anos do Doutorado; pela sábia orientação e pelo muito interesse que demonstrou pelo meu objeto de estudo. – Gratidão eterna, Professor.

Às professoras que compuseram a minha Banca de defesa, Ana Lívia dos Santos Agostinho, Ana Paula Brandão, Carla Regina Martins Valle, Edair Maria Görski e Maria Leonor Maia Santos, muito obrigada pelo aprendizado.

Ao meu pai acadêmico, o meu orientador de graduação, mestrado e, como sempre reitero, meu orientador da e na vida, Bento Sitoe. Prof., palavras me faltam para expressar o meu eterno Khanimambu.

Ao amor da minha vida, Joaquim Nhampoca pelo apoio e amor de sempre em todas as situações, momentos e condições, com apenas uma condição, o amor.

À minha tripla imbatível, minhas três meninas, Ndawina, Maya Luna e Dominique Joaquina, por compreenderem sempre esta minha condição de mãe-pesquisadora-mãe e pelo amor, mimos e embalos principalmente durante os quatro anos em que moramos no Brasil. E como sempre digo, nos nossos chás: meninas, se não seguirem o exemplo de mãe e pai, não será por falta de referência. – Amo-vocês!

Aos meus pais, Amélia Tavares Cuinica (em memória) e Alberto Chambal, pelo amor e pela sabedoria - meus mentores, meus primeiros mestres, que contrariando toda a ordem social vigente na época, em que o destino de muitas meninas na aldeia onde cresci, era o casamento, muitas vezes prematuro, sempre permitiram, apoiaram as minhas escolhas e incentivaram-me a lutar pelos meus sonhos. Pai você é tão sábio que soube tanto esperar o meu regresso sem reclamar e dando graças em tudo, tua recompensa chegou – tua primogênita é a primeira PhD da família, viu!

Aos meus irmãos: Sandra, Filipe, Mavone, Salomão, Titos, Daniel, Lázaro, Alex, Helton, pelo amor, mesmo à longa distância.

(10)

A toda minha família alargada, primos, tios, sobrinhos, afilhados, etc. que entenderam o meu afastamento durante os quatro anos do doutorado. Com destaque para a minha avó, Rafina Ngovene – obrigada vó, por ser essa pessoa serena e maravilhosa e, ainda passar o teu testemunho para nós.

À Tina, minha irmã de alma que tanto se doa para cuidar e amar a mim e a minha família. Amiga, o meu eterno obrigada por tudo.

Ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina e às professoras e professores do mesmo, em particular os que foram diretamente meus professores, ao longo dos quatro anos: Ana Paula Brandão, Carlos Alberto Antunes Maciel (PPGET), Cristine Görski Severo, Edair Görski, Fábio Luiz Lopes da Silva, Gilvan Muller de Oliveira, Heronides Maurílio de Melo Moura, Isabel de Oliveira e Silva Monguilhott, Izete Lehmkuhl Coelho, Leandra Cristina de Oliveira, Maria Inez Probst Lucena, Sandra Quarezemin e Tarcísio de Arantes Leite. Obrigada, professoras e professores.

A todos os colegas do Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina, pelo acolhimento, convivência e apoio durante o tempo de formação.

Aos colegas do NES, Daiana do Amaral Jeremias, Dorival Gonçalves Santos Filho, Giovana Reis Lunardi, Giuseppe Freitas da Cunha Varaschin, Guilherme Ribeiro Colaço Mäder, Helen Petry, Lucas Mário Dacuña Badaracco, Rafaela Miliorini Alves De Brito e Valéria Cunha Dos Santos, pelo acolhimento e lições apre(e)ndidas.

Às colegas e aos colegas do grupo de Pesquisa em Políticas

Linguísticas Críticas da Universidade Federal de Santa Catarina. - Só

tenho a agradecer por tudo que aprendi com vocês e pelo imenso amor! À Evelise Santos Sousa e ao Lucas, Rovaris Cidade, pelo carinho e pela eficiência no atendimento durante o Doutorado.

A todos os colegas e professores da UEM – Moçambique, minha universidade de proveniência, em especial a : Abudo Machude, Aurélio Cuna, Camilo Manusse, Crisófia Langa, Davety Mpiúka, David Langa, Etelvino Guila, Félix Tembe, Gervásio Chambo, Henrique Mateus, Inês Machungo, Joaquim Razão, Julieta Langa, Lucílio Manjate, Lurdes Balbina, Manuel Guissemo, Marcos Nhapulo, Mariamo Aly, Maurício Bernardo, Narciso Gastene, Nataniel Ngomane, Nelsa Nhantumbo, Óscar Fumo, Pércida Langa, Rosa Mitelela, Quiraque, Samima Patel, Vasco Magona, Víctor Justino, Zacarias Simango, pela força que sempre me deram, mesmo à distância.

Aos queridos Roselete Fagundes Aviz (Rose) e Jô pelo acolhimento, amor e carinho durante minha estadia no Brasil.

(11)

da Silva Domingos, Manuel Guissemo, Nsimba José e Raul Balate Júnior por todas as dicas fornecidas durante o doutorado. Ainda mais pela parceria acadêmica fortalecida entre nós. – Vocês foram e serão fundamentais sempre.

À Comunidade moçambicana em Florianópolis (MozForipa), uma verdadeira família na diáspora – vocês serão sempre a minha família. Especialmente ao meu grande amigo, companheiro de trincheira durante os quatro anos de formação, Policarpo Matiquite, aos meus mupfanas Domingos Lusitâneo Pier Macuvele (meu irmão “colaço”), Hélder Pires Amâncio, Hélio Maúngue, Jonas Valente Matsinhe e, às minhas caçulas: Joana Beira, Liendina Chirindza, Marta Maputere, Valentina Alfredo e Virgínia Muchanga. – Obrigada por tudo, vocês me ensinaram que quando cuidamos uns dos outros, é mais fácil caminhar.

A todos os irmãos e irmãs da comunidade africana em Florianópolis, pela boa convivência, respeito e amor! UBUNTU sempre! Às irmãs e irmãos da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPT + IPA), o meu muito obrigada pelo acolhimento e amor. – vocês me ensinaram que o amor em Cristo quando é verdadeiro, é universal.

A todos os amigos brasileiros, moçambicanos e no mundo todo e suas famílias, especialmente à: Adja Durão, Adriana de Souza Broering, Aduzindro Almeida, Alexandre Cohn da Silveira, Aline Vasconcelos Marques, Álvaro de Azevedo Diaz, Ana Paula Costa, Benigno Lopes, Bianca Campos, Carlos Borges Júnior, Charlott Eloize Leviski, Cristiane Morales Pereira, Daiana Jeremias, Daniela Brito, Diana Azeredo, Dona Amélia Malhanguana, Dona Zenaíde, Éderson Silveira, Edite Guila, Florência Nhanengue, Heloísa Tramontim de Oliveira, Ilka Boaventura Leite, Ivon Cuervo, João Chivale, Josiane Gonçalves, Kaionara Santos, Karla Gripp Couto de Mello, Luísa Filho, Luísa Matine, Márcia Regina Toledo, Maria Cristina Macedo Alencar, Maria da Penha Ferreira Ângelo, Nadir Mahomed, Neusa Coutinho, Poliana Wodzik Haubert, Roberta Lira, Sara Farias da Silva, Sil-Lena Oliveira, Solita Almeida, Sónia Samuel Sitoe, Thelmely Torres, Tiago Cardoso, Valéria Cunha dos Santos, Vera Fátima Gasparreto, Vinícius Marcelo Pedreira da Silva, Wagner Ângelo, e Yéo N’gana. – Obrigada por cuidarem tanto de mim e de minha família, espero um dia poder retribuir tamanho amor!

Ao Colégio Beatriz de Souza Brito, pelo acolhimento que deram a mim e as minhas filhas, melhor colégio! – Obrigada por tudo.

(12)

Às Creches Anjinho da Guarda e Nossa Senhora Aparecida, dois lugares que participaram ativamente na criação e aprendizado da Dominique durante nossa estadia no Brasil.

A todos os meus estudantes do passado, presente e futuro, espalhados pelo mundo, por serem eternamente parte da minha grande motivação para seguir sempre!

A Todos que de alguma forma, participaram deste processo e que porventura, não tenham sido citados nestas páginas, vai o meu grande

Khanimambu! Com certeza, seus nomes estão escritos nas páginas do meu

(13)

“Se você falar com um homem numa linguagem que ele compreende, isso entra na cabeça dele. Se você falar com ele em sua própria linguagem, você atinge seu coração.”

(14)
(15)

No presente trabalho nos debruçamos sobre ideofones do changana, uma língua bantu falada em Moçambique. Nosso objetivo principal era analisar e discutir a identidade categorial e função dos ideofones do changana. E como objetivos específicos: 1) apresentamos o funcionamento básico da língua changana, recorrendo a autores da linguística bantu africana. 2) analisamos o funcionamento dos ideofones de acordo com teorias da marcação, em virtude de ideofones serem unidades lexicais marcadas. Para tal, analisamos os ideofones de acordo com o Princípio da Marcação de Givón (1995 e 2001) e, também de acordo com a teoria da Marcação Tipológica desenvolvida por Croft (2000 e 2001), na sua Gramática de Construções Radical. 3) analisamos o significado dos ideofones de acordo com a Semântica de Frames, desenvolvida por Fillmore (1982) e colaboradores. Os dados foram coletados a partir de dois instrumentos lexicográficos, uma base de dados de ideofones do changana (Nhampoca, 2010) e o dicionário Changana-Português (Sitoe, 2011) de onde selecionamos 10 ideofones. Em termos metodológicos, recorremos ao método bibliográfico, à introspecção, às metodologias usadas na Gramática de Construções Radical, no Princípio da Marcação e na Marcação Tipológica e, para analisar os frames ideofônicos, recorremos à plataforma FrameNet. Tomamos como referenciais teóricos, estudiosos como Sitoe (1991, 1996 e 2011); Ngunga (2004); Nhampoca (2009, 2010 e 2016); Ribeiro (2010); Langa (2013); Júnior (2016); Croft (2000 e 2001); Silva e Batoréo (2010); Gabas Jr. e Auwera (2004); Givón (1995 e 2001); Bybee (2010); Fillmore (1982 e 1988); Salomão (2009a e 2009b); Pires (2010) Moura (2012 e 2015); Ferrari (2014;); entre outros. Os resultados mostraram que, ideofones do changana são palavras marcadas. Mostraram também que, ideofones centralizam os elementos de frames tidos como não nucleares/centrais na plataforma FrameNet, fazendo com que esses elementos não nucleares se tornem centrais para a análise do o seu significado. Concluímos igualmente, que ideofones, além de predicadores, constituem uma classe de expressão de modo no changana. E, verificamos, também, que, na língua changana, ideofones constituem uma categoria gramatical que se enquadra na classe nominal 15, juntamente com os verbos. Quanto à sua função, verificamos que ideofones desempenham a função predicadora, assim como os verbos, predicam ações de entidades, embora ambos o façam de formas diferentes. Palavras-chave: Ideofones do changana, categoria gramatical,Semântica de Frames, função, marcação.

(16)
(17)

The present work deals with ideophones of the changana language, a language of the bantu group, spoken in Mozambique. The aim of the study was to analyze and discuss the categorical identity and function of the changana ideophones as well as analyze their meanings according to Frame Semantics. The main discussion is based on theories of Cognitive Linguistics, basically, the Radical Grammar of Constructions and Frames Semantic. A long with we analysed questions concerning to marking because ideophones are marked lexical units. We used secondary data from two lexicographic instruments - a database of changana ideophones (NHAMPOCA 2010) and the Changana-Portuguese dictionary (Sitoe 2011) – where we extracted a sample of 10 ideophones for analysis using the theories of the principle of marking typology. To analyze the ideophonic frames we used the the FrameNet platform and, as theoretical references we based on the studies of Croft, 2000 and 2001; Fillmore 1982 and 1988; Salomão 2009a and 2009b; Pires 2010; Moura 2012 and 2015; Givón 1995 and 2001; Silva and Batoréo, 2010; Ferrari 2014; Bybee, 2010. The result as shown that changana ideophones are marked words that describe events/actions which are specific to the language. Onother conclusion is that in changana, ideophones form a grammatical category which belongs to the nominal class 15, along with the verbs. To what concern to the function, we noted that ideophones perform the preaching function, just as verbs, however, both verbs and ideophones, preach in different ways. Ideophones centralize the elements seen as not nuclear in the characterization of the frames connected to them, making these elements become nuclear for the analysis of their meanings. As the Mode element is the most highlighted we concluded that ideophones are not only marked preachers but also mode expression class in changana language. Key words: Changana ideophones, grammatical category, function, Frames Semantic, markedness.

(18)
(19)

Figuras 1 - Mapa, hino nacional, bandeira e emblema da República de Moçambique ... 41 Figura 2 - Mapa linguístico de Moçambique ... 42 Figura 3 - Esquematização da estrutura do significado do ideofone ... 260 Figura 4 - Esquematização da estrutura do significado do verbo ... 261

(20)
(21)

Quadro 1 - Posição de vários autores sobre o número de línguas bantu

faladas em Moçambique ... 43

Quadro 2 - Vogais do changana ... 77

Quadro 3 - Consoantes do changana ... 83

Quadro 4 - Alfabeto do changana... 87

Quadro 5 - Grupos consonânticos ... 89

Quadro 6 - distinção entre acento e tom ... 93

Quadro 7 - Classes nominais do changana ... 97

Quadro 8 - Marcas de concordância no changana ... 112

Quadro 9 - Extensões verbais do changana ... 116

Quadro 10 - Evolução das principais classes de palavras ... 178

Quadro 11 - Ideofones selecionados ... 212

Quadro 12 - Elementos de frames não nucleares ... 262

Quadro 13 - Espaço conceitual para as partes do discurso ... 270

Quadro 14 - Espaço conceitual para as partes do discurso do changana ... 271

Quadro 15 - Tabela comparativa das características de Nomes, Verbos, ... 279

(22)
(23)

Gráfico 1 - Frames nucleares e não nucleares ... 264 Gráfico 2 - Elementos de frames não nucleares ... 265 Gráfico 3 - Distribuição dos 38 elementos frames não nucleares ... 266

(24)
(25)

Adj. Adjetivo

Adv. Advérbio

APL. Extensão aplicativa

ASS. Partícula associativa

CAUS. Extensão causativa

ChaPort Dicionário Changana - Português

COND. Condicional

Conj. Conjunção

CONT.FUT. Futuro contínuo

DICH Dicionário de ideofones do changana

DIM. Extensão diminuta

Ex. Exemplo

EXCL Partícula/morfema de exclusividade

FREQ. Extensão frequentativa

FUT. Futuro

FUT.EXCL. Futuro exclusivo

Id. Ideofone de ou ideofone com o significado de ID. Ideofone de ou ideofone com o significado de

Idfzdor ideofonizador

IdN Ideofone nominalizado

IMP. Marca de imperfectivo

INE Instituto Nacional de Estatística

INT. Extensão intensiva

Int. de Interjeição de

LOC. Locativo

MEXOR. Modo exortativo

MIMP. Modo imperativo

MO Marca de objeto

MP Marca de passado

MPOT. Modo potencial

MPPC. Marca de passado perfectivo complexo

MS Marca de sujeito

(26)

NELIMO Núcleo de estudos de Línguas moçambicanas

NEU Extensão neutra

PAC. Passado anterior complexo

PACIC. Passado anterior complexo imperfectivo complexo

PACIE. Passado anterior complexo imperfectivo exclusivo

PAbs. Pronome absoluto

PAgt. Partícula agentiva

PASS. Extensão passiva

PDem. Pronome demonstrativo

PERF. Extensão perfectiva

PER. Extensão persistiva

PF Partícula de frequência

PGen. Partícula genetiva

PIMP. Passado imperfeito

Pmci Partícula modal, causal e instrumental

PRel. Pronome relativo

PREP. Preposição

PRES. Presente

PRES.CONT Presente contínuo PRES. EXCL. Presente exclusivo PRES.FAT. Presente factual PRES.HAB. Presente habitual

PT Partícula temporal

REC. Extensão recíproca

Singular Singular

SUBj Subjuntivo

V. Verbo

VAdj. Verbo adjetival

VDef. Verbo defectivo

VF Vogal final

v.i. Verbo intransitivo

(27)

funciona aos pares. As classes sao: 1-2 (mu-va). 3-4 (mu-mi). 5-6 (ri|li-ma). 7-8 (xi-svi). 9-10 (yi-ti).

11-10 (ri|li-ti) – assim como a classe 9, a classe 11 faz plural com a classe 10.

14 (vu|wu ) – é a classe dos nomes abstratos - não possui plural. 15 (ku) – é a classe dos predicadores: classe dos verbos e ideofones. 16, 17 e 18 (ha, ku e mu) – são as classes locativas.

21 (ji) – é a classe dos aumentativos pejorativos - muitas vezes sem plural. Em algumas exceções pode fazer plural com a classe 6 (ma).

Nota 2: Para evitar sobrecarregar a lista das abreviaturas, não apresentamos separadamente, na lista de abreviaturas, aquelas compostas por abreviaturas já contidas na mesma lista. Por exemplo, se em algum exemplo ocorrer: VDef./EXCL., isso significa que o morfema em causa representa, simultaneamente o verbo defectivo (VDef.) e a partícula de exclusividade (EXCL.), pelo que não apresentaremos a abreviatura VDef./EXCL.

(28)
(29)

CAPÍTULO I ... 33 1 INTRODUÇÃO ... 33 1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA DE PESQUISA ... 33 1.2 JUSTIFICATIVA ... 35 1.3 OBJETIVOS ... 37 1.4 PROBLEMATIZAÇÃO ... 37 1.5 HIPÓTESES ... 39 1.6 MOÇAMBIQUE ... 40 1.6.1 As línguas bantu de Moçambique ... 41 1.6.2 A língua changana em Moçambique e na África ... 44 CAPÍTULO II ... 47 2. IDEOFONES EM ALGUMAS LÍNGUAS DO MUNDO E NO

CHANGANA: TENTATIVAS DE DEFINIÇÃO E

CLASSIFICAÇÃO ... 47 2.1 TENTATIVAS DE DEFINIÇÃO DE IDEOFONES ... 47 2.2 IDEOFONES EM ALGUMAS LÍNGUAS DO MUNDO ... 50 2.3 IDEOFONES DO CHANGANA ... 53 2.3.1 Aspectos de morfologia dos ideofones do changana ... 55 2.3.1.1 Estrutura dos ideofones do changana ... 55 2.3.1.2 Ideofones simples e complexos ... 63 2.3.1.3 Ideofones derivados de verbos ... 66 2.3.1.4 Nomes e verbos derivados de ideofones ... 68 2.3.2 Tipologia dos ideofones do changana ... 71 CAPÍTULO III ... 77 3 ASPECTOS BÁSICOS DO FUNCIONAMENTO DA LÍNGUA CHANGANA ... 77 3.1 ASPECTOS DE FONÉTICA E FONOLOGIA ... 77 3.1.1 O sistema vocálico ... 77 3.1.2 O Sistema consonântico ... 82 3.1.3 O alfabeto ... 86 3.1.3.1 Vogais e consoantes ... 87 3.1.3.2 Grupos consonânticos ... 88

(30)

3.1.4 O tom e o acento ... 90 3.1.4.1 O tom ... 90 3.1.4.1.1 O tom lexical ... 90 3.1.4.1.2 O tom gramatical ou sintático ... 91 3.1.4.2 O acento ... 92 3.1.4.3 Distinção entre tom e acento ... 92 3.2 PARTES DO DISCURSO EM CHANGANA E ASPECTOS DE MORFOLOGIA ... 94 3.2.1 O nome, classes nominais e concordância no changana ... 94 3.2.1.1 O nome ... 94 3.2.1.2 Classes nominais no changana ... 95 3.2.1.3 Concordância no changana ... 111 3.2.2 O verbo no changana ... 114 3.2.2.1 Extensões verbais do changana ... 115 3.2.2.2 Tempo Aspecto e Modo ... 129 3.2.2.2.1 Tempo e Aspecto ... 129 3.2.2.2.2. Modos verbais ... 140 3.2.3 O adjetivo no changana ... 144 3.2.4 O advérbio no changana ... 147 CAPÍTULO IV ... 153 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 153 4.1 IDEOFONES DO CHANGANA E MARCAÇÃO ... 153 4.2 LINGUÍSTICA COGNITIVA: BREVE HISTÓRIA E SEU(S) CAMPO(S) DE ATUAÇÃO ... 156 4.2.1 Gramática Cognitiva ... 160 4.2.1.1 Gramática de Construções Radical ... 162 4.2.2 Semântica Cognitiva ... 163 4.2.2.1 Semântica de Frames e frames ... 165 4.2.2.1.1 Elementos de frame ... 170 4.3 SOBRE CATEGORIAS GRAMATICAIS ... 172 4.3.1 Nomes, verbos, adjetivos, advérbios na visão tradicional e descritiva e definição das classes de palavras ... 180

(31)

William Croft ... 183 CAPÍTULO V ... 187 5. METODOLOGIAS ... 187 5.1 METODOLOGIAS DE COLETA DE DADOS ... 187 5.1.1 Para o estabelecimento do corpus do DICH ... 187 5.1.1.1 Coleta de contos e histórias de vida ... 187 5.1.2 O ChaPort 1 e ChaPort 2 ... 189 5.1.2.1 O ChaPort 1 ... 189 5.1.2.2 O ChaPort 2 ... 192 5.1.2.3 Seleção do material e estabelecimento do corpus para o ChaPort

1 ... 193

5.1.3 Pesquisa bibliográfica ... 194 5.1.4 Introspecção ... 194 5.2 METODOLOGIA DE ANÁLISE DE DADOS ... 195 CAPÍTULO VI ... 203 6 ANÁLISE DE DADOS ... 203 6.1 ANÁLISE DOS IDEOFONES DO CHANGANA DE ACORDO COM O PRINCÍPIO DE MARCAÇÃO E MARCAÇÃO TIPOLÓGICA E MARCAÇÃO ... 203 6.2 ANÁLISE DOS IDEOFONES DO CHANGANA COM BASE EM SEMÂNTICA DE ... 211 6.2.1 Os ideofones selecionados ... 211 6.2.2 Frames ideofônicos ... 214 6.2.2.1 Análise do ideofones –bùtà ... 214 6.2.2.2 Análise do ideofone –cambùcambù... 218 6.2.2.3 Análise do ideofene –cèdu ... 227 6.2.2.4 Análise do ideofone –dèke ... 230 6.2.2.5 Análise do ideofone -foo ... 236 6.3.2.6 Análise do ideofone –gàbi-gàbi ... 239 6.2.2.7 Análise do ideofone –gidigidi ... 242 6.2.2.8 Análise do ideofone -khèhlè ... 245 6.2.2.9 Análise do ideofone –pshandlá ... 249

(32)

6.2.2.10 Análise do ideofone –wàà ... 257 6.3 IDENTIDADE CATEGORIAL E FUNÇÃO DOS IDEOFONES DO CHANGANA ... 269 6.3.1 Ideofones e a função predicadora na língua changana ... 272 6.3.2 Ideofones nominalizados ... 276 6.3.3 Ideofones adjetivais ... 276 6.3.3 Ideofones adverbiais ... 277 6.3.4 Ideofones interjetivos ... 277 6.4 CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICOS E SINTÁTICAS DE NOMES, VERBOS, ADVÉRBIOS, ADJETIVOS E IDEOFONES. .. 279 6.5 PROPRIEDADES SEMÂNTICAS E PRAGMÁTICAS DOS IDEOFONES DO CHANGANA ... 280 CAPÍTULO VII ... 283 7.CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 283 7.1 LIMITAÇÕES DO ESTUDO E RECOMENDAÇÕES ... 285 REFERÊNCIAS ... 287 ANEXO 1 - AMOSTRA DO DICH ... 297

(33)

CAPÍTULO I 1 INTRODUÇÃO

1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA DE PESQUISA

O presente trabalho debruça-se sobre ideofones da língua changana. O changana é uma língua pertencente ao grupo bantu1, falada em quatro países no Continente Africano, incluindo Moçambique, onde é uma das três línguas bantu2 mais faladas. Os ideofones são um conjunto de palavras, pouco conhecidas, os ideofones e neste caso, os ideofones da língua changana. Os ideofones foram definidos pela primeira vez por Doke (1935) como sendo a associação entre um determinado som, cor, estado, dor, intensidade, etc. e a consequente reação na mente do indivíduo.

Com o trabalho objetivamos analisar e discutir a identidade a categorial e função dos ideofones do changana. Para tal, antes discutimos questões relacionadas aos nossos objetivos específicos, tais como, o funcionamento básico da língua changana. Discutimos os ideofones de acordo com teorias da marcação desenvolvidas por Giivón (1995 e 2001) e Croft (2000 e 2001). A nossa hipótese em relação a marcação é a de que na língua changana, os ideofones são palavras/predicadores marcados em relação aos verbos, que são predicadores básicos, portanto, não marcados. Outro objetivo específico é descrever o significado dos ideofones do changana com o auxílio da Semântica de Frames, ou seja, investigar e identificar que elementos de frame são evocados pelos ideofones do changana e como isso pode auxiliar na interpretação de seus significados

1 Grupo bantu é um conjunto de línguas que possuem características comuns.

Defende-se que essas línguas teriam derivado de um antepassado comum, uma língua mãe, o proto-bantu. Atualmente as línguas bantu formam um ramo do grupo benue-congolês da família linguística nigero-congolesa, com mais de 600 línguas. São faladas sobretudo nos países africanos que se localizam desde a região central até ao sul do continente africano, por cerca de 300 milhões de pessoas (NGUNGA, 2004; UEM-SLB, 2014).

2 No português do Brasil tende-se a usar a forma flexionada línguas bantas. Neste

trabalho, usamos bantu pelo fato de a palavra bantas não carregar consigo o significado e o simbolismo que a palavra bantu possui. Bantu é uma palavra composta por dois elementos ba- (prefixo nominal da classe 2, plural da classe 1 – classes geralmente de seres humanos em várias línguas bantu) e –ntu (raiz que significa pessoa). Portanto, o termo bantu significa pessoas, humanos. Este significado não se acha no termo bantas.

(34)

e/ou das construções envolvendo ideofones nessa língua. Recorremos à Semântica de Frames como parte da análise, pois ela fornece um modo particular de olhar para o significado das palavras, tendo como característica principal a observação e análise das experiências que resultam da contínua interação entre os elementos linguísticos com o meio ambiente (FILLMORE, 1982). Para identificação dos frames correspondentes aos ideofones selecionados, utilizamos a plataforma

FrameNet. Disponível em:

<https://framenet.icsi.berkeley.edu/fndrupal/FrameNet_search>. Disponível para consulta e pesquisa livres.

Para a análise da categoria gramatical, o que corresponde ao nosso objetivo maior, estabelecemos uma hipótese segundo a qual ideofones do changana constituem, sim, uma categoria gramatical (DOKE, 1935, NHAMPOCA, 2010 e 2016) e também que eles desempenham a função predicadora, pois assim como os verbos os ideofones predicam ações de entidades, embora o façam de modos diferentes.

Em termos de referenciais teóricos, para discutir o funcionamento básico da língua changana, apoiámo-nos basicamente em autores que trabalham com a linguística bantu, sobretudo africanos (Sitoe, 1991, 1996, 2011, etc.; Ngunga, 2004, 2009; Langa, 2004, 2013, Nhampoca, 2009, 2010; Júnior, 2016; entre outros), com o intuito de mostrar que linguistas africanos também, estudam, pesquisam e publicam sobre suas línguas. No que diz respeito à marcação, tomamos como referencial teórico os textos de Givón (1995 e 2001), Croft (2000 e 2001) e Bybee (2010). Para a Semântica de Frames, Fillmore (1982, 1988), Salomão (2009a e 2009b), Pires (2010), Moura (2012), Chishman (2013), Ferrari (2014), entre outros. E, para discutir a categoria gramatical dos ideofones tomamos como referencial a Gramática de Construções Radical de Croft (2000 e 2001) e o texto de Silva e Batoréo (2010). Esse conjunto de análises permitiram que elaborássemos uma proposta de definição que distinga claramente os ideofones de outras classes gramaticais no changana e, quiçá, em outras línguas que possuam ideofones.

Os dados usados foram extraídos de uma base de dados de ideofones do changana por nós elaborada no âmbito da pesquisa de Mestrado (NHAMPOCA 2010) e do dicionário Changana-Português, Sitoe (2011), este último elaborado com a nossa colaboração na seção de ideofones. Destes instrumentos selecionamos os 10 ideofones analisados. O critério de seleção não foi aleatório. Selecionamos aqueles ideofones que possuem um verbo mais ou menos equivalente na língua, para permitir a comparação entre os dos predicadores, ideofones e verbos.

(35)

O trabalho organiza-se desta forma: no capítulo I apresentamos a introdução que contempla a apresentação do tema, a justificativa, objetivos, problematização, hipóteses, dados sobre Moçambique e sobre a língua changana no país e na África. O capítulo II integra a apresentação do nosso objeto de estudo, os ideofones do changana, portanto, abordamos os ideofones do changana e em outras línguas do mundo, dando enfoque para as várias tentativas de sua definição e classificação. No capítulo III, apresentamos os aspectos básicos do funcionamento da língua changana, em que se destaca a discussão sobre classes nominais, as extensões verbais, o tom, entre outros. O capítulo IV destina-se à fundamentação teórica, portanto, abordagens sobre marcação, Linguística Cognitiva e categorias gramaticais de palavras. No capítulo V apresentamos as metodologias de coleta e análise de dados. O capítulo VI é referente à análise de dados; nesta parte, analisamos os dados na seguinte ordem: 1) analisamos os ideofones de acordo com o Princípio da Marcação e Marcação Tipológica, 2) efetuamos a análise dos ideofones com base em Semântica de Frames e 3) discutimos a identidade categorial dos ideofones e sua função no changana. No último capítulo, o VII, apresentamos as considerações finais e limitações do estudo. Na sequência seguem-se a bibliografia e em anexo vai uma amostra do DICH. 1.2 JUSTIFICATIVA

Desde 2005, ano de nossa formação ao nível de licenciatura, temos vindo a trabalhar e a desenvolver pesquisas diversas sobre o changana, nossa língua materna e de primeira alfabetização3. O nosso trabalho final de graduação foi sobre Orações relativas diretas e indiretas no changana e no Mestrado, o tema da nossa dissertação foi: Uma proposta metodológica para a elaboração de um dicionário de ideofones do changana. Para a realização dos estudos aqui mencionados e outros na língua changana, incluindo esta tese, temos como grande motivação pessoal o desejo de trazer, de alguma forma, o changana ao centro de discussões, visto que, em geral, pesquisas sobre as línguas bantu, das quais o changana faz parte, são relativamente recentes comparando com as das línguas tradicionalmente estudadas, tais como: inglês, francês, espanhol, alemão, português, entre outras. Portanto, estudar a nossa língua, tem sido para nós um ato, um posicionamento político, nesse sentido. Ademais, como

3 A autora deste trabalho foi alfabetizada na língua changana, pelo pai, na

infância, antes de ingressar à escola formal do ensino exclusivamente em língua portuguesa, em Moçambique, seu país natal.

(36)

iremos mostrar neste trabalho, ideofones são unidades lexicais que foram marginalizadas durante muito tempo, no seio dos estudos linguísticos em geral e até particularmente em estudos de linguística bantu, por isso, estudar ideofones é também e, ainda mais, um ato político.

Outra grande motivação para analisar os ideofones de acordo com a Gramática de Construções Radical (CROFT, 2000 e 2001), Princípio da Marcação (GIVON, 1995 e 200) e Marcação Tipológica (CROFT, 2000 e 2001) e a Semântica de Frames (FILLMORE, 1982), é o fato de termos verificado que estas teorias se mostram relevantes e abrangentes para a sua classificação como categoria gramatical, sua função na língua e para a descrição do significado dos ideofones, pois, muitas vezes, teorias ditas universais são excludentes em relação às línguas africanas das quais o changana faz parte. Por isso pensamos que este trabalho revela-se importante para os estudos da língua changana em geral e em particular para o estudo dos ideofones do changana, assim como de outras línguas em que ocorrem ideofones, sejam elas de origem bantu ou não.

Motiva-nos, também, o fato de a área de Linguística Cognitiva ser ainda pouco conhecida e explorada no país e na universidade de nossa proveniência4, não havendo por isso, trabalhos desenvolvidos na mesma, em Moçambique e mais em particular nas línguas bantu de Moçambique, então, este trabalho pode vir a ser pioneiro na análise linguística em Moçambique, o que seria bastante salutar, pois levaríamos para a Universidade e para o país, uma nova teoria que seria muito fundamental para vários estudos na área de Linguística.

Acreditarmos também que o trabalho irá melhorar a análise do significado dos ideofones e consequentemente o nosso desempenho no trabalho de descrição lexicográfica que temos estado a desenvolver sobre os ideofones da língua changana, como por exemplo os de Nhampoca (2009, 2010, 2015, 2016 e 2017) e Sitoe (2011), em que colaboramos com a análise lexicográfica dos ideofones, uma vez que a análise baseada nas teorias da Linguística Cognitiva podem permitir uma descrição enciclopédica dos ideofones, pois como

Diz Ferrari (2014), a Linguística Cognitiva adota uma visão enciclopédica do significado das palavras, ao adotar uma perspectiva de análise baseada no uso, defendendo que o contexto orienta a construção do significado. As razões mencionadas nos motivaram a realizar o

4 A autora desta tese é moçambicana, dai que chamamos atenção ao fato de, apesar

de termos feito bastante esforço para redigir o texto no português do Brasil e de acordo com nas normas brasileiras de elaboração de textos acadêmicos, ainda é possível detectar alguns resquícios do Português de Moçambique.

(37)

presente trabalho, tendo como objetivos os que seguem na próxima subseção.

1.3 OBJETIVOS

O trabalho tem como objetivos os seguintes: Geral:

 Analisar a identidade categorial dos ideofones do changana e sua função;

Específicos:

 Discutir o funcionamento básico da língua changana  Analisar os ideofones à luz da teoria da Marcação;

 Analisar o significado dos ideofones do changana com base em Semântica de Frames.

 Propor uma definição para os ideofones do changana. 1.4 PROBLEMATIZAÇÃO

Moçambique é um país multilíngue, pois nele coexistem línguas de origem africana, sobretudo as do grupo bantu, europeia e asiática. Ngunga (2009) afirma que, por ser um país multicultural e multilíngue, possui uma grande diversidade linguística que tem sido de difícil gestão. Ainda segundo Ngunga, isso se agravou pelo fato de durante o tempo colonial não se terem desenvolvido ações visando a uma discussão sobre as línguas bantu, as faladas pela maioria de moçambicanos, muito menos sobre a sua promoção. O autor afirma que existem alguns estudos sobre línguas bantu de Moçambique, mas segundo ele, esses estudos só surgiram depois da independência nacional, contudo, contribuíram bastante para o conhecimento da situação linguística de Moçambique, tendo por isso, diz Ngunga, jogado um papel crucial no desenvolvimento geral do conhecimento de vários aspectos sobre línguas bantu de Moçambique. Mas o mesmo autor aponta ainda que “apesar da valiosa contribuição dos referidos trabalhos para a promoção das línguas moçambicanas, há uma área importante que permaneceu ignorada, a do estudo da gramática das línguas moçambicanas” (NGUNGA, 2009, p. 64). Concordamos com Ngunga, pois é fato que durante muito tempo estudos da gramática das línguas bantu de Moçambique foram relegados ao segundo plano, foram

(38)

pouquíssimos os estudos gramaticais desenvolvidos no período pós-independência, com destaque aos de Bento Sitoe (1991, 1996, 2001 e 2011), David Langa (2004, 2013) e Armindo Ngunga (2000, 2004, 2009), entre outros. O estudo dos ideofones do changana e das outras línguas bantu de Moçambique também foram ‘vítimas’ desse ‘esquecimento’.

Nos últimos anos esta situação tem mudado, verifica-se ultimamente, um grande interesse em analisar questões gramaticais das línguas bantu em Moçambique. No respeitante aos ideofones do changana, verificamos que alguns estudiosos (nacionais) já se debruçaram sobre eles, como por exemplo: Langa (2004) – descreveu aspectos gerais dos ideofones na língua changana; Maholela (2008) – fez um estudo sobre a derivação a partir de ideofones na língua changana; Nhampoca (2009) – fez uma análise preliminar sobre a estrutura, função e aspectos de significado dos ideofones; Nhampoca (2010) – no âmbito da pesquisa de Mestrado, desenvolveu uma estratégia metodológica para a compilação de um dicionário de ideofones da língua changana, porém, baseada na análise componencial; Nhampoca (2015) – debruçou-se sobre aspectos da morfologia dos ideofones do changana, entre outros.

A maior parte dos estudos acima mencionados abordam os ideofones de uma forma geral. Isto reforça a nossa motivação e/ou justificativa em desenvolver um estudo que se debruça sobre a identidade categorial, função na língua e descrição semântica dos ideofones. E como tal, surgem várias questões sobre os ideofones. A nossa primeira questão é: ideofones são ou não palavras específicas, portanto, marcadas, na

língua changana?

Indo para a segunda questão, verificamos que no exemplo do café da manhã, um dos seus exemplos clássicos do que é um frame, Fillmore (1982) explica que: entender o significado de café da manhã é entender primeiro uma prática de uma dada cultura de ter refeições diárias, em horários do dia que são estabelecidos de forma convencional, consequentemente, entender que o café da manhã é uma dessas refeições, a que se faz no início do dia, após o período de descanso/sono (noite), sendo que essa refeição apresenta um menu típico reconhecido como tal pelas pessoas que compartilham essa cultura (Fillmore, 1982). E acrescenta que o acesso do significado de café de manhã, não obedece a um critério rígido e único, pode apresentar várias nuances e, por isso, fornecer-nos uma categoria que pode ser usada em contextos diferentes e tais contextos são determinados pelos múltiplos aspectos do seu uso prototípico - o uso que ele possui quando as condições da situação de fundo coincidem mais ou menos exatamente com o protótipo que define. Com esta colocação, Fillmore mostra que o frame de café da manhã, para

(39)

além da simples informação linguística, carrega uma complexidade de informações referentes aos elementos que compõem esse cenário do café da manhã e aos contextos que sustentam sua ocorrência. E, de acordo com Chishman et al. (2014), “compreender ‘café da manhã’ significa compreender o papel dessa refeição na nossa sociedade”. Partindo destes desenvolvimentos e raciocínios, pretendemos projetar esta análise para os ideofones do changana, ou seja, descrever o significado dos ideofones do changana, tendo em conta os frames e/ou cenas que eles evocam e que podem ser invocados pelos falantes a partir deles. Para isso, estabelecemos como nossa segunda questão, a seguinte: A teoria da

Semântica de Frames pode auxiliar na descrição do significado dos ideofones do changana e de que forma?

Na sua Gramática de Construções Radical, Croft (2000 e 2001) desenvolve uma discussão sobre categorias de palavras. O autor defende que categorias gramaticais são definidas dentro de línguas particulares, logo suas funções também. Os ideofones por não existirem nas línguas indo-europeias, foram sempre de difícil enquadramento em termos de categoria gramatical. Sobre isso Macaba (1996) vai nos explicar que durante muito tempo, as línguas africanas foram sujeitas a análises que não condiziam com as suas reais estruturas, uma vez que grande parte dos primeiros estudiosos dessas línguas, na maioria europeus, analisavam e descreviam essas línguas com base na lógica das gramáticas de línguas europeias. Isso se verificou com os ideofones, basta pensar que estas palavras já foram rotuladas como verbos, advérbios, interjeições, adjetivos, entre outras designações. Perante estas discrepâncias, estabelecemos como a terceira questão de partida a seguinte: Qual é a

identidade categorial e função dos ideofones da língua changana?

A seguir, na tentativa de estabelecer respostas prévias para as nossas questões, avançamos com as hipóteses que seguem na próxima seção.

1.5 HIPÓTESES

Tendo em conta as questões introduzidas na problematização acima, estabelecemos como hipóteses as seguintes: 1) Em relação a marcação, nossa hipótese é de que na língua changana, os ideofones são palavras/predicadores marcada/os em relação aos verbos que são predicadores básicos, portanto, não marcados. 2) Quanto à teoria da Semântica de Frames, estabelecemos que esta teoria irá ajudar na descrição e definição dos ideofones do changana, pois os ideofones evocam frames específicos, ressaltando aspectos classicamente

(40)

considerados não nucleares mas que são fundamentais para a acessar o seu significado, fazendo com que os elementos de frames tidos como não nucleares se tornem elementos centrais para a análise dos ideofones. 3) E para a questão 3 avançamos uma hipótese que considera que ideofones do changana são uma categoria gramatical, pois tal como as outras categorias da língua, ideofones possuem propriedades específicas de natureza fonética, fonológica, morfológica, sintática, semântica, pragmática, etc. E que desempenha a função é predicadora, tal como os verbos, sendo que ideofones predicam de forma marcada e verbos de forma básica.

1.6 MOÇAMBIQUE

A República de Moçambique situa-se na África Austral. Está dividida administrativamente em 11 províncias e 128 distritos. O último censo populacional oficial, realizado em 2007, apurou que Moçambique possuía 20.632.434 habitantes (6.269.621 na zona urbana e 14.362.813 na zona rural) (INE, 2010 apud NGUNGA e FAQUIR, 2011). Projeções posteriores à data do último censo apontam para cerca de 22.000.000 habitantes em 2014 (TIMBANE, 2014) e 26.423.623 habitantes em 2016 (INE, 2016).

É um país multilíngue, multiétnico e multicultural como sucede com a maioria dos países africanos. E a maioria da sua população pertence aos povos bantu. “A maioria dos moçambicanos habita nas zonas rurais e preserva a sua cultura, hábitos, costumes e as suas línguas locais, sempre respeitando a tradição oral. Aliás, este é um fenômeno característico dos povos bantu” (TIMBANE, 2014, p.1). As características acima descritas conferem ao país uma diversidade cultural e linguística, sendo a diversidade linguística de Moçambique uma das suas principais características socioculturais. Segundo indica a constituição da

República de Moçambique, o português é a única língua oficial (MOÇAMBIQUE/ Novembro de 2004, Art. 10), apesar de várias sinalizações de introdução das línguas bantu moçambicanas em espaços formais e públicos e com a introdução do ensino bilíngue desde 2002/2003.

Moçambique é banhado pelo Oceano Índico, a Leste; a Norte pela Tanzânia; a Noroeste pelo Malawi e Zâmbia; a Oeste pelo Zimbabwe e a Sudoeste pela Swazilândia e pela África do Sul. A capital e a maior cidade do país é Maputo, situada na zona sul do país, junto à fronteira com a África do Sul e Swazilândia. A seguir alguns símbolos importantes do país.

(41)

Figuras 1 - Mapa, hino nacional, bandeira e emblema da República de Moçambique

Fonte: GOOGLE

1.6.1 As línguas bantu de Moçambique

No que respeita ao número de línguas bantu faladas em Moçambique, não há consenso. Algumas fontes, como por exemplo, o site Ethnologue <acesso em 14 de março de 2017>) e Kröger (2005) consideram que há cerca de 40 línguas, como se pode verificar no link <https://www.ethnologue.com/country/MZ>. Acesso em 14 de março de 2017>), para o caso da Ethnologue e no mapa linguístico abaixo, para o caso de Kröger.

(42)

Figura 2 - Mapa linguístico de Moçambique

Fonte: KRÖGER (2005).

Chamamos a atenção ao fato de o autor do mapa acima, se referir ao changana como tsonga. Às vezes o termo tsonga é usado como sinônimo de changana, como ocorre veste caso.

De Paula e Duarte (s.d.), disponível em: <http://www.letras.ufmg.br/fbonfim/pdf/diversidade_linguistica_mo%C 3%A7ambique.pdf >) <acesso em: 31 de janeiro de 2018, também apresentam dados que denotam a variação na definição do número de línguas bantu moçambicanas, como se pode verificar no quadro 1, abaixo.

(43)

Quadro 1 - Posição de vários autores sobre o número de línguas bantu faladas em Moçambique

Autor Ano Número de línguas moçambicanas sugerido

Cabral 1975 15 línguas CCR5 1983 16 línguas Yai 1983 13 línguas Ngunga 1987 33 línguas Katupha 1988 13 línguas NELIMO 1989 20 línguas Ngunga 1992 21 línguas Lopes 1999 20 línguas Firmino 2000 24 línguas Cardoso 2005 25 línguas Liphola 2009 41 línguas INE 2010 21 línguas

Adaptado a partir de De Paula e Duarte (2016)

Sobre esta visível falta de consenso sobre o número de línguas bantu moçambicanas, Sitoe (2014, p. 40-41) afirma que, em Moçambique Na ausência de um atlas linguístico, o Relatório do “I Seminário sobre Padronização da Ortografia de Línguas Moçambicanas” (NELIMO, 1989), vem sendo tomado como a principal obra de referência sobre esta matéria [...] O mapa linguístico apresentado neste documento identifica 20 línguas moçambicanas. Contudo, este mesmo documento refere claramente que as línguas tratadas não constituem a totalidade das línguas faladas em Moçambique. O mapa não menciona o Cibalke e trata como uma mesma língua três variedades do grupo Shona, nomeadamente Cimanyika, Cindau e Ciutee. Adicionado a isto, para além das 17 línguas tratadas no II Seminário (Sitoe & Ngunga, 2000), o mapa apresentado no relatório deste seminário indica ainda as línguas Kiswahili, Ekoti, isiSwazi e isZulu. Se se adicionar o Cibalke e as línguas do grupo Shona, teremos um total de 23 línguas moçambicanas mencionadas nos dois relatórios. Já o folheto de apresentação da Seção de Línguas bantu da Universidade Eduardo Mondlane (UEM - SLB) apresenta 20 línguas bantu moçambicanas, que afirma serem faladas por 80% da população,

(44)

quer como língua materna quer como língua segunda (UEM - SLB, 2014). Destas, 19 línguas são atualmente ensinadas pela UEM - SLB, são elas: cibalke, cicopi, cindau, cimanyika, cinyanja, cinyungwe, cisena, citshwa, ciutee, ciyaawo, echuwabo, ekoti, elomwe, emakhuwa gitonga, kimwani, shimakonde xichangana6 e xirhonga. A maior parte destas 19 línguas, incluindo o changana, está presente no âmbito do ensino bilíngue, introduzido em 2002/2003 no país (NHAMPOCA, 2015). Talvez seja por essa falta de consenso que Ngunga ([s.d] apud LABORATORIO DE

LÍNGUAS AFRICANAS - UFMG. Disponível em:

<http://www.letras.ufmg.br/laliafro/projeto.html> Acesso 23 fev. 2016, defende que, dependendo dos vários pontos de vista, o número das línguas bantu moçambicanas pode variar de 9 a 43.

Para efeitos deste trabalho, optamos pela perspectiva da SLB da Universidade Eduardo Mondlane, por termos verificado, por um lado, que os que apontam para a existência de cerca de 40 línguas, na maioria dos casos, consideram variedades de uma mesma língua como língua, o que contribui para o aumento desse número e, por outro lado, as 23 línguas apresentadas por Sitoe (2014) incluem o kiswahili, o isiSwazi e o isZulu. Apesar de estarmos cientes da circulação dessas línguas no território moçambicano, optamos por não as contabilizar como línguas bantu moçambicanas, por considerarmos que advêm de forte influência de países vizinhos como África do Sul para o caso do isZulu, Tanzânia para o kiswahili e Swazilândia para o isiSwazi (NHAMPOCA, 2017).

Para além do português e das línguas bantu, outras línguas são faladas no território, embora em pequena escala, como por exemplo, as de origem europeia: francês, espanhol, inglês, alemão; as de origem asiática e/ou línguas do Médio Oriente: mandarim, urdu, gujurati, hindi e memane (SITOE, 2014; PATEL, 2006).

1.6.2 A língua changana em Moçambique e na África

O changana, também designado tsonga na África do Sul, possui o código S.53, na classificação de Guthrie (1967/71). De acordo com Sitoe (1996), esta língua pertence ao grupo Tswa-Ronga, com código S.50, na classificação de Guthrie (1967-71). Doke (apud SITOE, 1996) designa este grupo pelo termo tsonga. Para além do changana, fazem ainda parte deste grupo as línguas tshwa (S.51) e ronga (S.54). Os falantes das línguas

6 O termo xichangana é usado como sinônimo do termo changana. Nele, o prefixo xi- é referente a classe a que pertencem as línguas na língua changana.

(45)

ronga e tshwa conseguem comunicar-se com os falantes do changana o que significa que são línguas inteligíveis.

O changana, para além de Moçambique, é falado na África do Sul, Swazilândia e Zimbabwe (SITOE e NGUNGA 2000; SITOE, 1996). Portanto, consideramos que, pelo fato de ser falado nos quatro países, o changana se revela como um importante veículo de comunicação formal e/ou informal para e entre comunidades dos quatro países onde é falado. Em Moçambique, o changana é falado nas províncias de Maputo, Gaza, Inhambane e na zona meridional das províncias de Manica e Sofala (SITOE e NGUNGA, 2000). De acordo com Ngunga e Faquir (2011), com base no Censo Populacional de 2007, o changana “é falado por cerca de 1.660.319 habitantes em Moçambique”. É a 2ª língua bantu mais falada no país, com cerca de 10.5% de falantes, depois do Emakhuwa com cerca de 26.1% de falantes, segundo Ngunga e Faquir (2011). De acordo com Sitoe (1996), o changana apresenta as seguintes variedades: 1) Xihlanganu, falada a sudoeste de Moçambique, nos Montes Libombos, abrangendo parte dos distritos de Namaacha, Moamba e Magude. 2) Xidzonga ou Xitsonga, falada nos distritos de Magude, Bilene e parte de Massingir. 3) Xin’walungu, variante falada no distrito de Massingir. 4) Xibila, falada no distrito de Limpopo e parte do distrito de Chibuto. 5) Xihlengwe, falada nos distritos de Xai-Xai, Manjacaze, Chibuto, Guijá, Chicualacuala, Panda, Morrumbene, Massinga, Vilanculo e Govuro. Sitoe (1996) afirma que, devido a grandes e frequentes movimentações das populações, torna-se cada vez mais difícil a localização precisa destas variedades. Para este trabalho tomamos como referência a variante xidzonga, uma vez que os dados analisados foram recolhidos num local onde esta variante prevalece.

O changana faz parte da Academia Africana de Línguas (ACALAN), uma organização Pan-Africana fundada em 2001, pelo então presidente do Mali, Alpha Oumar Konaré, sob os auspícios da União Africana e visa à promoção e harmonização das muitas línguas africanas. Apesar de o changana não ser uma das línguas com o maior número de falantes em África no contexto da ACALAN, é inegável a importância desta língua, como veículo de comunicação formal e informal para e entre comunidades dos quatro países onde é falada (NHAMPOCA, 2015). E, a nosso ver, pelo fato de ser falada e constar do conjunto das línguas oficiais da África do Sul, uma das grandes economias do continente africano, se não a maior, pode ser uma grande contribuição para a geopolítica desta língua na região.

É ainda usada, embora com menor densidade, em programas de rádio. Possui três dicionários (SITOE, 1996; NGUNGA, 2011 e SITOE,

(46)

2011), os quais já ostentam a ortografia padronizada conjuntamente com os outros três países falantes da língua. Os dicionários de Sitoe são bilíngues (changana-português) e o de Ngunga é monolíngue. Sitoe tem em prelo o dicionário português-changana que sairá em breve. Além disso, o changana possui duas gramáticas, uma elaborada por Ribeiro (1965). Está na ortografia não padronizada. E a segunda gramática foi elaborada por Ngunga e Simbine em 2012. Há também vários aspectos de gramática do changana compilados em muitos materiais didáticos, como é o caso dos apêndices sobre elementos de gramática nos Dicionários Changana-Português da autoria de Bento Sitoe, publicados em 1996 e reeditado, revisto e aumentado em 2011, com a nossa colaboração na seção dos ideofones.

O changana é largamente usado na Bíblia, em cultos e em hinários de forma ampla, sobretudo na religião reformada. O changana é uma das línguas abrangidas pelo ensino bilíngue em Moçambique, portanto é ensinado neste âmbito no nível primário e faz parte das 19 línguas bantu moçambicanas ensinadas na Secção de Línguas bantu da Universidade Eduardo Mondlane, a maior e mais antiga universidade do país.

Na sequência, o capítulo II, em que apresentamos o nosso objeto de estudo, os ideofones do changana.

(47)

“Ideofones são fáceis de identificar, mas difíceis de definir”.

(Dingmanse, 2011) CAPÍTULO II

2. IDEOFONES EM ALGUMAS LÍNGUAS DO MUNDO E NO

CHANGANA: TENTATIVAS DE DEFINIÇÃO E

CLASSIFICAÇÃO

2.1 TENTATIVAS DE DEFINIÇÃO DE IDEOFONES

Os ideofones nem sempre foram conhecidos como ideofones. De acordo com Dingmanse (2011), antes da década de 1930, os ideofones foram, recorrentemente, discutidos sob diversos rótulos, com mais destaque para o fato de terem sido definidos, com mais frequência, como advérbios específicos ou peculiares.

Ultrapassada essa fase, ideofones passaram a ser comumente definidos como uma representação viva de uma ideia num som; uma palavra, muitas vezes onomatopaica, que descreve um predicado, é qualificativa ou funciona como advérbio em relação à forma, cor, som, cheiro, ação, estado ou intensidade (DOKE, 1935). Esta é uma das definições mais citadas até agora. Outra definição semelhante porque inspirada na de Doke (1935), é a de Ngunga (2004, p.195) que considera ideofone como “a associação entre um determinado som, cor, estado, dor, intensidade, etc., e a consequente reação ou construção psíquica dos mesmos na mente do indivíduo/falante”. Já Beck (2005) defende que ideofones são expressões sinestésicas que se distinguem, como classe, através das suas propriedades sintáticas, morfológicas e fonológicas; este autor afirma igualmente que ideofones tendem a ter uma função emotiva e de estarem associados à fala e a registos dramáticos da fala, ou seja, ideofone é uma representação viva de uma ideia, num som (KIMENYI: [s.d]). Para Slobin (2004), os ideofones constituem um recurso para a expressão de Modo de ação em várias línguas. Concordamos com o autor, porém salientamos a multifuncionalidade dos ideofones, pois entendemos que eles, para além de expressar Modo, desempenham outras funções, como mostramos ao longo deste trabalho.

Embora haja pequenas diferenças de abordagens, na definição do ideofone, pensamos que todas as posições aqui apresentadas se assemelham e defendem que um ideofone é o fenómeno através do qual alguns sons da linguagem humana podem, do ponto de vista semântico combinar a figura mental com os sons da fala (SITOE, 1996; LANGA,

(48)

2004). O que temos notado é que estas definições são gerais e não distinguem claramente os ideofones de palavras de outras categorias na língua, uma vez que a maior parte dos elementos definidores usados podem se aplicar a qualquer signo, por isso, nossa intenção é partir dessas definições e buscar uma definição mais precisa, com base em teorias como Princípio da Marcação, Gramática de Construções Radical e Semântica de Frames.

Enquanto, por um lado, alguns autores restringem a ocorrência de ideofones a certas línguas do mundo, por exemplo, Doke (1935) restringe sua ocorrência às línguas bantu apenas; Kulemeka (1995) realça a existência de ideofones em dois grupos de línguas do mundo: as africanas e as asiáticas; Epps e Salanova (2012) destacam a ocorrência de ideofones nas línguas indígenas da Amazônia. Já Slobin (2004), colocando em jeito de meio, afirma que os ideofones ocorrem de forma ampla nas línguas do mundo, especialmente em línguas da África Ocidental, Ásia Oriental e Ásia do sudeste.

Por outro lado, alguns afirmam a ocorrência dos ideofones em todas as línguas do mundo. Ferreira (2011), por exemplo, defende que: “ideofones são atestados em todas as línguas do mundo, porém, as línguas diferem na extensão em que os empregam”. Contundo a autora não mostra nem faz referência à respectiva extensão do emprego dos ideofones nas diferentes línguas do mundo. A ocorrência de ideofones como categoria universal, ou seja, em todas as línguas do mundo, é também defendida por Voltz e Killiam-Hatz’s (2001 apud GABAS JR. & AUWERA, 2004), na sua proposta de classificação, ao afirmar que os ideofones são uma categoria gramatical e universal. Para Biriate (2014), embora os ideofones não se manifestem na mesma medida em todas as línguas do mundo, eles são uma característica universal ou quase universal da linguagem humana.

Outra discussão que se tem travado sobre os ideofones é se eles constituem ou não uma categoria gramatical (GABAS JR. & AUWERA, 2004; KULEMEKA, 1995; NGUNGA, 2004). Este é um aspecto que também é discutido neste trabalho, no capítulo da análise.

Apesar de durante muito tempo o estudo de ideofones ter sido limitado a tópicos como fonologia, simbolismo, som e morfossintaxe, atualmente começa a se perceber que para se desenvolver uma compreensão completa dessas palavras precisa-se tomar em conta, também, os seus significados sensoriais, seus usos interacionais, e seu lugar na mais ampla ecologia linguística e cultural (BIRIATE, 2014). Outra particularidade, não menos citada pelos autores, é que os ideofones são palavras marcadas (SLOBIN, 2004; BIRIATE, 2014; NHAMPOCA, 2017; MOURA e NHAMPOCA, 2017; entre outros). Biriate (2014)

(49)

afirma que essa marcação se dá de diferentes formas, destacando duas: COMPLEXIDADE – trata-se de complexidade semântica e estrutural e ICONICIDADE ideofônicas. Ressaltamos que esta visão de Biriate (2014) está de acordo com a que adotamos nesta tese. Sobre a marcação o autor acrescenta que “em geral, podemos distinguir ideofones de palavras comuns por causa de seu uso de material verbal (formas marcadas em relação às palavras comuns) e por causa do seu primeiro plano performativo (colocando-os para além do envolvente material de fala descritiva)”.

Com tudo que se discutiu acima acerca dos ideofones, podemos afirmar que a conceituação dos ideofones é diversificada (FERREIRA, 2011). Essa diversificação faz com que não poucas vezes, como indica Ferreira (2011), considere-se que a noção de ideofonia é enganosa, referindo-se a interpretações simplistas que se têm feito sobre o conceito. Araujo (2009) defende que o fato de não se oferecer uma definição clara ao termo ideofone faz com que sejam agrupados elementos de natureza diversa, na categoria. Um dos exemplos é o fato de por muito tempo os ideofones terem sido tratados como onomatopeias, quando estudos posteriores provaram que ideofones eram muito mais que onomatopeias (DOKE, 1968 apud NGUNGA, 2004). E mais, se provou que em algumas línguas, como o changana, língua objeto deste trabalho, as onomatopeias são uma subclasse de ideofones, constituindo os chamados ideofones onomatopaicos (NHAMPOCA, 2010). O próprio Doke notou a diferença entre onomatopeias e ideofones e, segundo Araujo (2009), apesar de Doke não apresentar uma definição formal para ideofones, ele deu uma guinada ao assunto ao estabelecer uma distinção entre ideofones, onomatopeias e sons imitativos e pelo fato de também ter proposto uma classe de palavras especial para agrupar ideofones. A definição de Doke foi e é de imensa importância na sistematização e unificação de pesquisas sobre ideofones, e continua sendo a definição mais citada (DINGMANSE, 2011).

De acordo com Araujo (2009), perante estas variações da definição do termo ideofone na literatura e, apesar disso, não haver uma que consiga abranger sua heterogeneidade, as tentativas mais bem sucedidas são as que conseguem enquadrar as múltiplas características dos ideofones em grupos prototípicos.

Identificamos três tentativas de definição que pensamos que se aproximam da hipótese que propomos neste trabalho, são as de Epps & Salanova (2012), Ferreira (2011) e Dingmanse (2011). Epps & Salanova (2012, p. 21) defendem que ideofone é “o sucedâneo linguístico mais próximo de um ato físico, não verbal”, ou seja, “os ideofones conferem uma concretude sensorial e emotiva à narrativa". Ferreira (2011) afirma

(50)

que quando se descreve uma ação, evento, estado, com recurso aos ideofones, eles invocam toda a imagem, toda a atitude narrada pelo falante. E por fim, temos a definição de ideofones apresentada por Dingmanse (2011), que refere que ideofones são palavras marcadas que retratam imagens sensoriais. O autor afirma que essa definição de ideofones é projetada para ser ampla o suficiente para servir como uma caracterização trans-linguística geral do ideofone, deixando espaço para que os detalhes sejam especificados em línguas particulares em que ocorrem ideofones. Das três propostas, consideramos esta de Dingmanse, a mais próxima da nossa hipótese de definição. Estas são as perspectivas que adotamos, apenas como ponto de partida para uma definição de ideofone e com esta pesquisa pretendemos apresentar uma definição mais completa e clara.

2.2 IDEOFONES EM ALGUMAS LÍNGUAS DO MUNDO

Os ideofones ocorrem também em várias línguas do mundo, por exemplo, nas línguas asiáticas. Estudos linguísticos em línguas asiáticas têm dado muita atenção à associação natural existente entre som e significado (KULEMEKA, 1995). Por isso há muito interesse nestas línguas pelo estudo dos ideofones. Kulemeka atesta que em línguas asiáticas os ideofones ocorrem mais como sons simbólicos que como categoria de palavras. O autor afirma que nas línguas asiáticas verifica-se uma relação estreita entre a forma como a palavra soa e o som feito pelo objeto no mundo real, daí considerar por icônico o tipo de relação que se dá nestas línguas.

Ao debruçarem-se sobre aspectos gramaticais das línguas indígenas brasileiras, em particular dos povos da Amazônia, (BEIER et al., 2000 apud EPPS & SALANOVA, 2012) “enumeram várias práticas discursivas amplamente difundidas entre os povos amazônicos que incluem o uso maciço do diálogo, desde a encenação de diálogos altamente ritualizados até o “eco” dos ouvintes que acompanham as narrativas: o choro ritual e certas formas especiais, ou rituais da língua”. Os autores defendem que a maior parte de tais práticas acaba obtendo uma dimensão cultural e influenciando elementos gramaticais, lexicais e discursivos das línguas em que elas ocorrem. Os ideofones são um exemplo disso. Epps & Salanova (2012, p. 21) referem que os ideofones são “um recurso linguístico que se encontra com frequência nas narrativas em línguas amazônicas”. Segundo os mesmos autores, em muitos casos os ideofones nas línguas indígenas amazônicas constituem uma categoria lexical que se distingue claramente das outras, como por exemplo,

(51)

apresentam suas próprias “estruturas silábicas ou segmentos fonéticos que não se encontram em outros lexemas, e com propriedades morfológicas diferentes. Os ideofones com frequência representam sons, mas podem também representar movimentos ou sensações”.

Outra língua indígena em que ocorrem ideofones é o parkatêjê, uma língua falada por uma comunidade com o mesmo nome. A comunidade parkatêjê localiza-se no sudeste do estado do Pará, próximo do município de Bom Jesus do Tocantins (FERREIRA, 2011). Ferreira, a partir de um estudo de contos orais do Parkatêjê, observa que nesta língua quando se descreve uma ação, evento, estado, o ideofone invoca toda a imagem, toda a atitude narrada pelo falante. Notamos que o que é descrito por Ferreira, ocorre com os ideofones do changana, pois ações descritas com recurso a ideofones, invocam cenas completas e vivas de uma forma mais intensa em relação às descritas por verbos (NHAMPOCA, 2010). Várias ocorrências de ideofones, na língua, foram também observadas na conversação diária na comunidade, durante as atividades cotidianas dos parkatêjê. A autora afirma que há várias outras palavras que, não sendo ideofones, são empregadas como ideofones, isto confirma a posição defendida por Araujo (2009), segundo a qual, a recorrente imprecisão no estudo e definição dos ideofones faz com que muitas vezes sejam incluídos elementos de outra natureza na categoria ideofone.

Gabas Jr. & Auwera (2004) descrevem os ideofones de uma língua indígena, Karo. Esta língua, conforme os autores, é falada também na região amazônica. É a única língua da família Ramarama do grupo Tupi. Embora a língua Karo viva em contato intenso com o português desde os anos 1950, a língua continua sendo falada na comunidade e sendo aprendida pelas crianças.

Para a comunidade, o português é usado apenas como língua de contato (GABAS JR. & AUWERA, 2004: 397). Os autores afirmam que existem ideofones na língua Karo, os quais exibem um comportamento gramatical diferente do dos outros elementos da gramática da língua. Como atestam Gabas Jr. & Auwera (2004, p. 401), os autores afirmam também que os ideofones nesta língua são semanticamente semelhantes aos verbos por seus significados transmitirem descrições de ações/estados, mas os ideofones não estão sujeitos aos mesmos processos de flexão e derivação. Nestes aspectos os ideofones são semelhantes aos ideofones do changana, pois como veremos mais abaixo, ideofones são diferentes dos outros elementos da gramática do changana e, também, eles assemelham-se aos verbos, por transmitir descrições ações /estados, apesar das diferenças de flexão e derivação existentes entre os verbos e ideofones do changana.

Referências

Documentos relacionados

Duas novas formulações foram elaboradas com extrato crioconcentrado de 3,1ºBrix até 19,1°Brix visando uma padronização do pH da emulsão e melhoria no sabor,

Nessa seara, o ato tem permitido, desde então, que a Câmara aprecie, sem bloqueio, propostas de emenda constitucional (PEC), projetos de lei complementar (PLC) e projetos de

Os peixes foram alojados em lotes homogêneos de 10 peixes por caixa, com duas refeições diárias (9hrs-17hrs) até saciedade aparente; Ao final dos 60 dias foram submetidos a

Basicamente, pelo estudo da casuística, destacam-se os seguintes principais pontos: 1 a condenação dos Estados Unidos à revisão e reconsideração das sentenças de morte; haja vista

*No mesmo dia, saindo da sala do segundo ano, fomos a sala do primeiro ano, quando entramos os alunos já estavam em sala, depois de nos acomodarmos a professora pediu que

A Escala de Práticas Docentes para a Criatividade na Educação Superior foi originalmente construído por Alencar e Fleith (2004a), em três versões: uma a ser

Os principais resultados mostram que, pela nova metodologia sugerida para distribuição da cota-parte dos 25% do ICMS, além de haver redução de critérios estabelecidos pela Lei

Neste trabalho, foram estudados a fenologia, a biologia floral e o sistema reprodutivo de duas espécies ornitófilas, Camptosema pedicellatum (Fabaceae) e