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Abolicionismo animal: aspectos éticos sob uma perspectiva ambiental e social

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Academic year: 2021

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GRANDE DO SUL

ELISIANE AZAMBUJA CORÁ

ABOLICIONISMO ANIMAL: ASPECTOS ÉTICOS SOB UMA PERSPECTIVA AMBIENTAL E SOCIAL

Ijuí (RS) 2019

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ELISIANE AZAMBUJA CORÁ

ABOLICIONISMO ANIMAL: ASPECTOS ÉTICOS SOB UMA

PERSPECTIVA AMBIENTAL E SOCIAL

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: Dra. Anna Paula Bagetti Zeifert

Ijuí (RS) 2019

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Dedico este trabalho para todas as espécies que eu não consegui, não consigo e não conseguirei salvar.

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AGRADECIMENTOS

À minha família que sempre se disponibilizou a enfrentar qualquer dificuldade que surgiu durante o trajeto da minha graduação e que me incentivaram com seu apoio financeiro e psicológico.

Aos meus amigos que entenderam meus momentos de ausência e que de alguma forma buscaram a compreensão da minha proposta em busca de uma ampla consciência neste trabalho, e em minhas mudanças pessoais.

À minha orientadora que aceitou embarcar no desenvolvimento deste tortuoso tema, que teve paciência com minhas dificuldades e falhas, compreendendo empaticamente a imensa importância deste movimento.

Em especial ao meu grande amigo e companheiro de causa, Fábio Israel Butignol Mariani, que não mediu esforços para me auxiliar em todos os momentos, com tamanha boa vontade e generosidade, que me orienta cada dia mais em meio as minhas fraquezas dentro do movimento, que enriquece boa parte da minha força para continuarmos essa luta e que inclusive disponibilizou seu acervo bibliográfico para a produção desta escrita. A quem tenho uma grande admiração e carinho e agradeço por ter entrado em meu caminho.

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“Os animais do mundo existem para seus próprios propósitos. Não foram feitos para os seres humanos, do mesmo modo que os negros não foram feitos para os brancos, nem as mulheres para os homens.” Alice Walker

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RESUMO

A fim de percorrer uma realidade exploratória, este trabalho busca a compreensão de um dever ético com o intuito de inclusão de outras espécies como seres de direito. O caminho que segue uma sociedade de consumo esconde fatores morais e emocionais aos quais os seres humanos mascaram para não abrir mão de seus prazeres pessoais. Além disso, desconhecem os impactos ambientais que a indústria de produtividade acarreta ao meio ambiente e o comprometimento individual da nossa saúde que está ligado diretamente ao consumo da carne, que passa por inúmeros processos até chegar a nossa mesa. Ademais, o compromisso desta escrita não é desmerecer outras lutas, tão pouco outras minorias que lutaram e ainda lutam por seus espaços, mas a inclusão desta causa como um compromisso ético que merece o conhecimento da realidade de animais não humanos e por conseqüência que possamos desenvolver a empatia necessária para que não ocorra mais a condenação de seres inocentes.

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ABSTRACT

In order to explore an exploratory reality this work seeks the understanding of an ethical duty with the intention of including other species as beings of right. The path that follows a consumer society hides moral and emotional factors to which human beings mask to not give up their personal pleasures. In addition, they are unaware of the environmental impacts that the productivity industry entails on the environment and the individual commitment of our health that is directly linked to the consumption of meat, which goes through many processes until we reach our table. Moreover, the commitment of this writing is not to disparage other struggles, so few other minorities that have fought and still fight for their spaces, but the inclusion of this cause as an ethical commitment that deserves the knowledge of the reality of nonhuman animals and as a consequence to develop the empathy that is needed so that innocent people will no longer be condemned.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...08

1 A TRAJETÓRIA CULTURAL EM RELAÇÃO AO CONSUMO DE ANIMAIS ...11

1.1 Animais não-humanos como mera mercadoria: a lógica exploratória da sociedade de consumo...12

1.2 O carnismo e a esquizofrenia moral humana...16

1.3 O mito do bem-estar animal e a lógica da produtividade...19

1.3.1 Carne de Vitela...21

1.3.2 Carne de porco...22

1.3.3 Carne de gado e a indústria dos laticínios...24

1.3.4 Carne de frango e a indústria de ovos...26

2 PELO FORTALECIMENTO DE UMA ÉTICA ABOLICIONISTA: VIDA DIGNA PARA TODOS OS SERES...29

3 O MOVIMENTO ABOLICIONISTA ANIMAL E SUA RELAÇÃO COM OUTROS MOVIMENTOS SOCIAIS: A FILOSOFIA FEMINISTA VEGETARIANA...36

CONCLUSÃO...44

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INTRODUÇÃO

Muitas são as teorias que nós humanos desenvolvemos sobre ética, moral e direito, inclusive no que tange a novas perspectivas de relações na contemporaneidade. Estamos sempre em movimento para tentar abarcar todas as relações em sociedade, porém, dentro dessas tentativas de evolução, continuamos a falhar na compreensão do que significa viver e conviver em um mundo complexo e composto por muitas espécies.

Culturalmente fomos ensinados que animais são inferiores a seres humanos e nosso apreço não pode ultrapassar a regra de que estamos no topo da cadeia alimentar. Nesse sentido, a pesquisa parte do pressuposto de que devemos romper a barreira construída a partir de uma lógica exploratória, fortalecendo as bases para uma ética abolicionista, tanto em âmbito social quanto ambiental.

Considerando tais análises, questionamos: Quais os caminhos para fortalecer uma ética abolicionista e defender a libertação das demais espécies? Por que enxergarmos os animais não humanos como mera mercadoria? Nossa saúde está sendo ameaçada pelos hábitos culturais? Como entender o contraponto de que o consumo de carne esta relacionado com uma cultura de homens? É possível um diálogo com outros movimentos a fim de fortalecer o discurso em torno de uma ética social mais inclusiva para animais humanos e não humanos?

A partir disso, identificar sob uma perspectiva ética e moral a trajetória cultural em relação ao consumo de animais, quais seus efeitos de violação de direito em relação as demais espécies, impacto ambiental em relação ao meio ambiente e a saúde humana e sua relação/diálogo com outros movimentos sociais.

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A escolha deste tema tem suma importância nas discussões contemporâneas, pois percebe-se continuamente o aumento do número de pessoas ligadas a causa animal, estes ativistas lutam pela conscientização de animais não humanos como seres de direito e buscam ainda, demonstrar que os animais não são as únicas vitimas do sistema de exploração e devastação ao qual as grandes empresas da carne estão submetendo o planeta. Ademais, este trabalho tem como objetivo demonstrar por meio de fatos e vias teóricas como funciona a exploração da pecuária e porque não conseguimos relacionar esta realidade com o mundo ao qual estamos acostumados a enxergar, além da necessidade de argumentos lógicos, irá demonstrar sob um aspecto emocional, sem a necessidade de um dever, bastando apenas à existência de empatia para com os nossos semelhantes.

A ética animal expõe argumentos suficientes para repensar o modo de como enxergamos animais não humanos, fugindo da ótica do especismo, que direciona quais podemos tratar de forma afetuosa e quais não conseguimos relacionar como seres de uma vida. A ética traz restrições à nossa liberdade e abre nossos olhos para o comprometimento moral para com outras espécies, buscando desenvolver formas para que animais humanos compreendam que prazeres pessoais não devem ser maiores que qualquer vida.

A indústria da carne, ovos e seus derivados continua a poluir os ecossistemas causando devastação tanto pela produção e matança de animais como pela queima de combustiveis fósseis. A temperatura da Terra já está mais elevada em 1,5º C por conta da emissão de gases de efeito estufa (FELIPE, 2018), parecendo um aumento insignificante, mas ocorre que para o planeta esse aumento pode acarretar diferenças catastróficas, ultrapassando seu equilibrio térmico, sendo a parcela mais significativa do aquecimento global a emissão de gás metano por conta da criação excessiva de bovinos e suínos em todo o planeta, a serviço do consumo humano.

Ademais, a ética animalistica tem uma forte teoria dentro do movimento feminista sendo Carol Adams, uma das percussoras desta linha de pensamento estabelecendo que a carne historicamente está ligada a uma cultura de homens, pois as pessoas que tem poder sempre comem carne. A opressão que se entrelassa entre animais e mulheres é a objetivação de ver o outro como objeto, por isso, por mais que pareça serem causas distintas a causa

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animal está ligada mesmo que inconscientemente ao feminismo, pois são da mesma forma, referentes ausentes.

Quanto aos objetivos gerais, a pesquisa será do tipo exploratória. Utiliza no seu delineamento a coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede de computadores.

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1 A TRAJETÓRIA CULTURAL EM RELAÇÃO AO CONSUMO DE ANIMAIS

Não há como não encarar uma cultura profundamente arraigada em torno do consumo de animais, inclusive são várias as justificativas para a continuidade dessa prática sem qualquer sentimento de culpa. Existem os que justificam em torno da superioridade humana, sendo humanos os que se encontram no topo da cadeia alimentar, podendo assim, se apropriar das demais espécies quando e como quiserem. Existem também aqueles que amparam suas práticas em teorias religiosas e assim traçam o destino de animais não humanos baseando-se em uma vontade divina e existem aqueles que simplesmente não se importam em explicar o motivo além de uma satisfação pessoal. Não importam quais são as justificativas, a conclusão a qual destinamos esse modo de pensar se dá como uma verdade inquestionável e isso começou no início dos tempos.

Falando propriamente da cultura ocidental existem duas raízes que sempre explicaram as atitudes com os animais: o judaísmo e antiguidade grega. São essas raízes que dão o pressuposto fundamental para o cristianismo e durante muito tempo esse fundamento teve grande influência no pensamento humano. A partir de uma certa independência do pensamento da igreja, pensadores começaram a enxergar com mais clareza as relações com os animais sob aspectos básicos, trazendo outras alegações para a continuidade da prática além daquelas que já se podem chamar de obsoletas. No período iluminista e o período seguinte (FRANCIONE, 2013) se desenvolveu uma nova moda: a experimentação animal. Anteriormente não se considerava que animais sentiam dor ou satisfação, comparavam-nos com máquinas e qualquer manifestação de sensações eram consideradas tradicionais do mecanismo do animal. Por outro lado, esse novo período revelou uma semelhança fisiológica entre os seres humanos e outros animais, o que autorizou a prática da experimentação, não que anteriormente já não houvesse essa prática, porém, a partir deste tempo que se evidenciou que os animais serviam para algum propósito e assim seu tratamento deveria ser melhorado.

Mesmo em uma época a qual não se questionava eticamente sobre os direitos dos animais e na qual já havia justificativas prontas e moralmente suficientes para determinar certas práticas, o princípio do tratamento humanitário se originou nas teorias de Jeremy Bentham (1748-1832) onde argumentava que embora haja diferenças entre os humanos e os animais, há uma importante semelhança (FRANCIONE, 2013). Bentham ainda ressalta que tudo que se requer para que os animais sejam considerados moralmente não é a sua

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capacidade para a fala, tampouco para a razão, mas sim a sua capacidade de sofrer, o que nos remete a termos obrigações morais diretamente para com eles. Partindo deste pressuposto teórico é onde vamos começar a desenvolver a ideia de ética animal, sendo animais humanos e não humanos da mesma forma sujeitos de direito, com suas peculiaridades e semelhanças. Além de observar a forma de como falamos e agimos diante de animais de outras espécies, percorreremos a realidade da indústria exploratória e como funcionam as fazendas de confinamento intensivo buscando demonstrar a realidade que submetemos bilhões de animais anualmente para satisfazer necessidades humanas que ao final podemos considerar levianas.

Na nossa cultura o que conseguimos enxergar é que os animais são seres que existem

para nós, não tendo outro propósito para estar no mundo senão para atender as necessidades

humanas. Essa é a verdade em que acreditamos nas poucas vezes que nos questionamos com tais hábitos, pois passamos a maior parte da vida em um paradigma cultural no qual não se faz questionamentos sobre práticas naturais. A partir do desenvolvimento de uma consciência animal busca-se ultrapassar a barreira entre animais domésticos e animais de produção e assim se inicia a percepção de que tanto um quanto o outro são seres de uma vida. Acontece que sempre relutamos ao máximo para não abrir mão dos nossos prazeres pessoais, precisamos de provas racionais, demonstrações lógicas e mesmo assim não estamos convencidos de que essa prática é violenta e condenatória, entretanto, se os abatedouros tivessem paredes de vidro quem sabe todos realmente seriam vegetarianos (MCCARTNEY, 2009). É a partir desta lógica que vamos demonstrar a realidade da indústria da carne e seu confinamento intensivo e explicitar o que nossos olhos não alcançam.

1.1 Animais não-humanos como mera mercadoria: a lógica exploratória da sociedade de consumo

Quando nos deparamos com um pedaço de carne numa refeição normalmente não assimilamos que aquela carne um dia foi um animal vivo, geralmente pulamos a parte em que faz essa conexão mental relacionando que, por exemplo, um bife seja um animal, ao menos naquele momento tornar-se-ia um pensamento desagradável. Existe incoerência com aquilo que boa parte das pessoas prega dizendo que se importa com os animais porque ao mesmo tempo em que nos importamos, nós os comemos, existindo incoerência nos nossos valores e em nossos comportamentos. O sistema construído em torno do carnismo nos direciona a uma

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zona de conforto onde existem defesas e invisibilidades para que a prática continue e que possamos nos sentir suficientemente à vontade para comermos animais.

Segundo explica Joy (2014, p. 35):

Embora seja difícil, se não impossível, questionar uma ideologia que nem sabemos que existe, isso se torna ainda mais difícil quando a ideologia trabalha ativamente para se manter oculta. É esse o caso da ideologia como o carnismo. Classifico esse tipo particular de ideologia como ideologia violenta, porque está literalmente organizada em torno da violência física. Em outras palavras, se eliminássemos a violência do sistema – parássemos de comer animais – o sistema deixaria de existir. A carne não pode ser obtida sem o abate.

Conforme dados fornecidos pela ONU, são abatidos 70 bilhões de animais terrestres no período de um ano em todo o mundo, para o consumo de carne, laticínios e ovos, sendo o Brasil o terceiro maior produtor de carne do mundo, perdendo apenas para a China e os Estados Unidos. Isso quer dizer que 10 mil animais são abatidos a cada minuto apenas no Brasil, para suprir a produção dessa demanda. (NACONECY, 2015)

A maior parte destes animais são criados em sistemas industriais, ou seja, são submetidos a confinamento intensivo, cada fazenda mecanizada é especializada em uma espécie e abriga milhares de animais por vez. A ideia da indústria é produzir cada vez mais no menor espaço possível e com o menor gasto financeiro a que se puder chegar. Essas fazendas industriais normalmente pertencem a grandes corporações e são operadas em economia de escala.

Com a evolução da tecnologia a indústria da carne também se beneficia, sofisticando assim as práticas na criação intensiva. Fazendo uso da reprodução seletiva, de hormônios de crescimento, de aditivos alimentares, da engenharia genética, forçando que animais cresçam com mais rapidez. Atualmente essa indústria também pode contar com a clonagem que em muitas vezes produz animais deformados. (FRANCIONE, 2013)

Claro que a indústria agropecuária tenta mascarar ou esconder seus segredos, mas nós tornamos este trabalho simples quando negamos ou evitamos saber deste trabalho sujo. A objetivação da linguagem é o processo onde se encara um ser vivo como objeto e por mais que de alguma forma sabemos que se trata de um ser vivo, negamos a todo custo ou então justificamos por alguma razão, mas também alteramos a forma de enxergar, tratando este ser

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vivo como um objeto e objetos não são sencientes. Melanie Joy (2014) entrevistou alguns trabalhadores de frigoríficos e um cortador de carne explicou “Quanto mais você vê esses pedaços de corpo sem nenhuma cabeça em cima, mais você deixa de pensar neles como animais e passa a vê-los como um produto com que está trabalhando”.

É nas granjas industriais onde são criados os animais para consumo, cada granja com a sua espécie em massa. Quando o animal alcança a idade ou a postura deseja ele é transportado em direção ao abatedouro para seu devido destino. Acontece que no momento que o animal é encaminhado para o transporte muitos deles já se encontram em situação enferma devido às condições precárias de sua criação nas fazendas industriais, muito não chegam com vida aos frigoríficos, outros chegam em estado lamentável porque foram amontoados um em cima do outro, causando sufocamento ou esmagamento, alguns chegam quebrados ou extremamente machucados. No inverno morrem congelados e no verão morrem de sede ou exaustão, alguns chegam nos abatedouros extremamente estressados pela experiência, o que remete logo em seguida ao seu óbito. (SINGER, 2010)

Todo sofrimento ao qual o animal é submetido é resultado do ritmo frenético que a linha de produção exige para funcionar, essas mortes sempre fizeram parte do processo que abastece carne nos mercados e é dessa forma que essa carne chega a nossas mesas, por mais que todo marketing do agronegócio e o mascaramento da realidade de produção demonstrem que animais vivem livres e felizes até o momento do seu abate “humanitário”.

Os animais são nossa propriedade, são explicitamente considerados coisas que possuímos, cujo único valor é de cunho econômico. Essa condição não é nenhuma novidade, estando conosco por milhares de anos. A evidência histórica indica que a domesticação e a posse de animais estão fortemente relacionadas com o desenvolvimento da propriedade e dinheiro. Inclusive se relaciona dentro da linguagem, como a palavra cattle (gado) que vem da mesma raiz da palavra capital e as duas são sinônimos em muitas línguas européias, a palavra espanhola para propriedade é ganadería e a palavra para gado é ganado, já a palavra latina para dinheiro é pecúnia, que deriva de pecus, que quer dizer “gado”. (FRANCIONE, 2013)

Atualmente evidenciamos que o valor axiológico ao qual é destinada a vida de animais são para a produção de comida, vestimenta, entretenimento, remédios e avanços na indústria farmacêutica (que está ligada ao agronegócio). Isso, de todo modo, é fácil de

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observar, conseguimos ter essa percepção assim que nos perguntamos de onde vem determinada produção, mas essa percepção é observada de fora, o que nos remete a uma falsa realidade.

Segundo Regan (2006, p. 106):

A verdade nua e crua é que a grande maioria desses animais, literalmente bilhões deles, sofrem cada um dos minutos em que estão vivos. Fisicamente, estão debilitados por epidemias e enfermidades crônicas. Psicologicamente, estão massacrados pelos efeitos cumulativos da desorientação e da depressão. Vistos à distância, podem parecer os animais sobre os quais todos lemos nos livros ilustrados da nossa infância. Vistos do lado de dentro, nas presentes circunstâncias, são sombras trágicas e patéticas de seus robustos antepassados.

O status moral dos animais como propriedade impede que seus interesses sejam supridos corretamente, o que os torna inferiores na escala moral entre humanos e não humanos. Existem duas teorias jurídico-filosóficas que norteiam até hoje o entendimento deste status legal em relação a animais não humanos. A primeira teoria se desenvolve com o pensamento de Kant, onde expõe que animais não são nada além de simples mercadorias dos seres humanos, na outra teoria é abordado por Locke que animais são seres criados e ofertados por Deus aos homens, não diferindo de qualquer outro recurso à disposição da humanidade. (TRINDADE, 2014)

A teoria kantiana traça as origens de um estado de direito racional, onde abrange uma proteção universal de direitos individuais em um âmbito legal. Ele define a criação da propriedade puramente através da razão, sendo nada mais que necessário dentro das reflexões humanas racionais numa perspectiva social. Logo, animais não humanos e plantas são carentes de tal racionalidade, considera-os como produto humano, onde se utiliza, se consome e se destrói a bel da necessidade humana. Locke que teve grande influência na teoria da propriedade da Common Law, apesar de ter pensamentos correlacionados com Kant, remete o direito de propriedade aos tempos bíblicos onde possibilita uma relação entre o conceito legal e a doutrina religiosa cristã (TRINDADE, 2014) ele afirma que Deus garantiu aos humanos a posse de tudo que existe na terra e ainda os presenteou com o dom da razão, assim sendo capazes de usufruir de tudo da melhor maneira possível. No tocante aos animais, os não humanos fazem parte das dádivas da terra e sua utilização é como simples recurso para fins lucrativos e econômicos, a ideia de apropriação é tão natural quanto usufruir outros recursos que a terra proporciona assim como plantas e grãos. A apropriação do animal se limite ao seu

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dono, sendo ele o portador do direito de utilizá-lo com mão de obra ou criá-lo para depois consumi-lo. Locke consegue influenciar até hoje o pensamento sobre mercadoria animal, pois já que tratamos animais como propriedade porque não utilizaríamos com a intenção de obter a maior vantagem possível?

A questão da propriedade é um dos maiores obstáculos para inclusão de animais não humanos na comunidade moral, a discussão acerca desta exploração ainda é muito recente e deve ser analisada não apenas sob o aspecto de exploração institucionalizada, mas também em como se deu o desenvolvimento do status de outras espécies como mera forma de apropriação humana. De todo modo, a humanidade acredita que evoluiu no momento em que incluiu limitações ao tratamento cruel aos animais ou então quando impôs a proibição do sofrimento desnecessário aos animais. Acontece que, tais princípios minimamente moralizados de forma alguma podem atrapalhar as necessidades humanas ou então os interesses econômicos que giram em torno destas necessidades o que nos remete a uma falsa moralidade e∕ou um desrespeito à vida das demais espécies.

1.2 O carnismo e a esquizofrenia moral humana

O carnismo é um sistema de crenças invisível porque naturalmente não questiona o motivo de comermos animais, este comportamento está enraizado em nossa cultura, por isso, não existe a percepção de que optamos por comer carne, simplesmente comemos por fazer parte de um mundo industrializado. Uma pessoa que come carne é equivocadamente chamada de carnívora, pois carnívoros por definição, são animais que dependem da carne para sobreviver, o que não acontece com animais humanos. O carnismo como sendo um conjunto de crenças desenvolve uma ideologia particular, essa ideologia é defendida por sua comunidade de forma resistente porque se acredita no funcionamento natural do sistema. Assim como o carnismo, outro exemplo de uma ideologia invisível é o patriarcado, onde homens exercem o maior papel de poder social diante de mulheres e outras minorias. O patriarcado muitas vezes é condicionado implicitamente na cultura, vivemos o machismo sem saber que é machismo, fizemos escolhas que refletem valores patriarcais sem perceber, pois a ideologia nos ensina a pensar e a agir dessa maneira. Para que essas ideologias permaneçam arraigadas é necessário que permaneçam invisíveis e para permanecerem invisíveis devem existir sem uma denominação, porque quando não damos um nome, não podemos falar sobre elas e sem falar sobre elas não há como questioná-las. (JOY, 2014)

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A ideologia do carnismo é definida como uma ideologia violenta (JOY, 2014) porque se organiza literalmente por meio de violência física e torna-se difícil questionar tal ideologia quando o sistema trabalha ativamente para se manter oculto. Essa violência é tão brutal que a grande maioria das pessoas não estão dispostas a testemunhá-la, porque não gostamos de assistir nossos semelhantes em situação de sofrimento intenso e desnecessário, sendo por essa razão que a ideologia reúne um conjunto de defesas que possibilita que pessoas sensíveis ao sofrimento alheio apoiem práticas cruéis sem perceber o que estão fazendo.

Melanie Joy explica (2014, p. 41):

O modo mais eficiente de distorcer a realidade é negá-la; se dizemos a nós mesmos que um problema não existe, jamais teremos de nos preocupar com o que fazer acerca dele. E o modo mais eficiente de negar uma realidade é torná-la invisível, a invisibilidade é o bastião de defesa do sistema carnista [...] Evitamos a verdade quando nos abstemos de dar nome ao sistema, o que, por sua vez, nos impede de perceber até mesmo que há um sistema.

Quando analisamos nossas atitudes em relação aos animais evidenciamos que são no mínimo esquizofrênicas, pois por um lado estamos de acordo que é moralmente errado impor sofrimento desnecessário aos animais, porém, todo sofrimento no qual as demais espécies são submetidas são para realizar satisfações humanas. O conceito de esquizofrenia moral nada mais é do que uma negação da condição dos animais como coisas em um primeiro nível, e a aceitação de seu status de mero recurso econômico em um segundo nível. Por um lado o ser humano acredita que animais não são coisas, mas por outro lado entende-se que as necessidades humanas estão a frente, podendo ser infringida tal afirmação quando necessário para a humanidade. A esquizofrenia moral humana nada mais é do que uma relação moralmente inconsciente entre animais humanos e não humanos, mais propriamente no tratamento que humanos submetem outros animais. (TRINDADE, 2014)

Por outro lado, seres humanos incorporaram em seu conceito família os animais de estimação, esses são considerados membros da família, a ponto de sofrerem demasiadamente com sua perda ou por motivo de alguma doença causada ao animal. Essas mesmas pessoas consomem produtos oriundos de animais que foram mortos em meio a um enorme sofrimento. Por isso, além de encarar essa esquizofrenia percebemos que a comunidade humana desenvolveu o chamado especismo. (TRINDADE, 2014).

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O conceito de especismo foi desenvolvido na década de 70 pelo psicólogo e cientista Richard Ryder, com a intenção de denunciar os hábitos cruéis em que humanos sujeitavam animais de outras espécies, no que tange a práticas cientificas ou no senso comum culturalmente embasado. (TRINDADE, 2014)

De acordo com Ryder (apud TRINDADE, 2014, p. 43) ele define o termo especismo com a seguinte função:

Descrever a discriminação generalizada praticada pelo homem contra outras espécies, e para estabelecer um paralelo com o racismo. Especismo e racismo são formas de preconceito que se baseiam em aparências – se o outro individuo aparenta ser diferente, é considerado como estando fora do âmbito moral. O racismo é hoje condenado pela maioria das pessoas inteligentes e compassivas, e parece simplesmente lógico que tais pessoas estendam também para outras espécies a inquietação que sentem por outras raças. Especismo, racismo (e até mesmo sexismo) não levam em conta ou menosprezam as semelhanças entre discriminador e discrminados, e ambas as formas de preconceito expressam um desprezo egoísta pelos interesses de outros e por seu sofrimento.

Outrossim, essa discriminação é lançada para determinadas espécies, enquanto outras são reconhecidas como seres sencientes. Os seres sencientes reconhecidos na esfera moral são os animais domésticos, enquanto expressamos respeito, exigimos direitos e repudiamos qualquer maldade para com eles, percebemos que tais direitos animais não são estendidos aos animais que ingerimos pela dada distância que temos com eles, podendo passar uma vida sem revisar ou entender qual é a realidade que os cerca.

O especismo entre animais significa que elegemos culturalmente algumas poucas espécies para denominá-las como domésticas e ignoramos o fato de que as demais espécies também são seres de uma vida, mas com seus destinos já traçados e com denominações gastronômicas para que ao final cheguem em nossa mesa. A maioria das pessoas encara a carne de cachorro, por exemplo, sendo uma refeição, completamente diferente de como encara a carne de vaca. A percepção que temos quando é evocado usar um cachorro como comida é porque vemos cachorros e vacas de forma muito distinta, refletir sobre a carne de cachorro nos remete a emoções, questionamentos e até mesmo repugnância que a carne bovina não nos direciona. A razão para termos essa percepção tão diferente é porque consideramos cachorros praticamente da mesma forma que consideramos pessoas, nós o chamamos pelo nome, nos despedimos quando saímos, compramos presentes para eles,

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cuidamos e levamos ao veterinário quando estão doentes, sentimos saudade quando estamos distantes, o consideramos da família porque o amamos. Amamos cachorros e comemos vacas não porque eles são diferentes, mas sim porque nossa percepção deles que é distinta. (JOY, 2014) se tratando de carne temos um esquema que classifica os animais como comestíveis e não comestíveis.

Esse esquema é classificado da seguinte forma (JOY, 2014, p. 18):

Diferentes seres humanos podem encarar a mesma carne de modo distinto. Por exemplo, um hindu pode reagir à carne de vaca da mesma forma que um cristão americano reagiria á carne de cachorro. Essas variações em nossa percepção se devem a nosso esquema. Um esquema é uma estrutura psicológica a – e é formada por – nossas crenças, idéias, percepções, experiências e que organiza e interpreta automaticamente a informação que recebemos [...] O modo como classificamos um animal determina, por sua vez, como nos relacionamos com ele – se o caçamos, fugimos dele, se o exterminamos, amamos ou comemos. Pode ocorrer uma sobreposição entre as categorias (um animal pode ser presa e alimento), mas quando se trata de carne é comida ou não comida.

Se tratando de carne comum, normalmente, não assimilamos que essa carne veio de um animal vivo ou se assim o fazemos acreditamos na normalidade dessa prática, pois fomos ensinados que comer vaca é adequado, mas comer carne de cachorro é repugnante. O que deve ser entendido é que nossas percepções estão equivocadas, pois os interesses de animais domésticos e animais para criação são os mesmos, assim como a sua senciência, mesmo que cada um com a sua particularidade.

1.3 O mito do bem-estar animal e a lógica da produtividade

Quando reconhecemos que é moralmente errado o tratamento ao qual destinamos aos animais, buscamos expor essa realidade para que então a sociedade possa enxergar as atrocidades cometidas por traz de hábitos culturais. As grandes indústrias da carne exploram bilhões de animais anualmente, cujos corpos são usados e feridos e cuja liberdade é negada desde o momento de seu nascimento. Anualmente, o número estimado de animais mortos para consumo humano é de 56 bilhões, sem contar os coletados para pesca, pois torna-se um número incontável, no Brasil são mortos 5 bilhões de animais por ano, em média 14 milhões por dia, no mundo a soma ultrapassada 153 milhões de animais por dia. (FELIPE, 2014)

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Para além do consumo humano, os testes em animais são um doloroso e continuo método ao qual a humanidade insiste em desenvolver, no momento em que foi descoberto que a fisiologia de outras espécies são semelhantes à fisiologia humana, passou-se a olhar os animais de outra forma e assim se modelou ao longo dos anos a experimentação animal. Para atender os propósitos humanos de bem-estar, esses animais são submetidos a inúmeras formas de sofrimento e, além disso, o tratamento esmaga seu psicológico, assim como atrofia seus corpos, mas não elimina sua sensibilidade, nem mesmo sua consciência emocional, fazendo com que todo o processo seja dolorosamente sentido em todas as etapas. A questão da experimentação animal nos direciona a questões morais relevantes, no sentido de que privamos seres conscientes de uma vida digna e os aprisionamos em uma vida de tortura e sofrimento.

No Brasil, a cada dia, milhares de animais são submetidos a procedimentos horripilantes que estão relacionados à vivissecção (operação em vida, que se usa ou não anestesia, para estudos anatômicos ou fisiológicos) e a experimentação (testes diversos) seja dentro de laboratórios, nas universidades ou em porões clandestinos.

Segundo Tréz (2008, p. 53):

Sob a justificativa de buscar o progresso da ciência, o pesquisador prende, fere, quebra, escalpela, penetra, queima, secciona, mutila e mata. Em suas mãos o animal vitima torna-se apenas a coisa, a matéria orgânica, enfim, a máquina-viva. Essa triste fauna de laboratório – ratos (utilizados geralmente para se investigar o sistema imunológico), coelhos (submetidos a testes cutâneos e oculares, além de outros atrozes procedimentos), gatos (que servem, sobretudo, às experiências cerebrais), cães (normalmente destinados ao treinamento de cirurgias), rãs (usadas para testes de reação muscular e, principalmente, na observação didática escolar), macacos (para análises comportamentais, dente outras coisas), porcos (cuja pele frequentemente serve de modelo para o estudo da cicatrização), cavalos (muito utilizados no campo da sorologia), pombos e peixes (que se destinam, em regra, aos estudos toxicológicos), dentre outras várias espécies -, torna-se simples cobaia nas mãos do pesquisador, transformando-se, equivocadamente, em modelo experimental do homem.

Ademais, as indústrias farmacêuticas também são responsáveis por grande parte da destinação de animais para serem usados como cobaias, pois além dos inúmeros testes já realizados antes do fornecimento do produto, posteriormente, em muitos casos, pode-se provar que vários destes produtos são recolhidos novamente, pois se revelam ineficientes, tóxicos ou até mesmo mortais para o ser humano. O que se evidencia que animais possuem realidade orgânica diversa, apesar de serem semelhantes em sua morfologia, ou seja, além

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desses testes não se mostrarem completamente seguros, eles causam uma vida de extrema tortura aos animais utilizados, o que nos direciona a uma estupidez viciosa.

Como evoluímos extensamente ao longo dos anos, se desenvolveram métodos alternativos aos testes em animais sejam eles os sistemas biológicos in vitro (cultura de células, tecidos e órgãos), cromatografia e espectrometria de massa (técnica que permite identificar compostos químicos e como atuam no organismo), farmacologia e mecânica quântica (avaliam o metabolismo de drogas no corpo), estudos epistemológicos (desenvolve medicina preventiva baseando-se em dados comparativos e no desenvolver da doença), estudos clínicos (analise estatística), necropsias e biopsias (ação das doenças no organismo humano), simulações computadorizadas (sistemas virtuais que substituem o animal na ciência biomédica), modelos matemáticos (traduzem os processos nos organismos vivos), cultura de bactérias e protozoários (testes cancerígenos e preparo de antibióticos, uso da placenta e cordão umbilical (treinamento cirúrgico e testes toxicológicos, membrana corialantóide (se utiliza da membrana do ovo da galinha para avaliar a toxicidade de substâncias). (TRÉZ, 2008)

Existem inúmeras formas de fazer uma revolução dentro da ciência, em relação aos testes em animais, inclusive, evidencia-se que os testes são métodos ultrapassados, o que nos direciona a um abolicionismo em relação a esse paradigma, pois já se violou demais em relação a imensuráveis vidas.

1.3.1 Carne de Vitela

A famosa e refinada carne de vitela é conhecida por ser tão macia e rosada, não possuir nenhuma cartilagem, nem músculos, é conhecida por ser servida em restaurantes considerados de grande qualidade e preparada pelos melhores chefs. Porém, são poucas as pessoas que tem o conhecido do que é a carne de vitela e qual o procedimento em que o animal passa para alcançar o fim desejado. Os bezerros machos destinados a este fim são aqueles rejeitados pela indústria de laticínios, pois para esta indústria são simplesmente insignificantes, logo, são descartados. Em torno de alguns dias ou até mesmo no dia de seu nascimento, esses novilhos são separados da mãe e amontoados dentro de um caminhão para serem vendidos na indústria da vitela por valores consideráveis. Esses bezerros são

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alimentados por uma dieta carente de ferro e passam a viver de uma maneira especifica para que seja alcançado o resultado desejado.

Assim como explica Joy (2014, p. 62):

Por toda a duração de suas curtas vidas (embora alguns sejam mortos em questão de dias, a maioria dos novilhos vive de 16 a 18 semanas) são acorrentados ou amarrados pelo pescoço e confinados a baias tão minúsculas que não podem sequer se virar ou deitar normalmente. E para produzir a cor clara pela qual a carne de vitela é conhecida, os animais são regularmente alimentados com uma dieta não natural carente de ferro, de modo que ficam cronicamente no limite da anemia. Os novilhos passam a vida imobilizados, num estado enfermiço e, como era de se esperar, tem se observado que exibem alguns dos mesmos comportamentos neuróticos que outros animais sob forte estresse: sacudindo anormalmente a cabeça, cavando, dando coices, coçando-se e mascando.

Como sua alimentação é diferenciada e carente de ferro, os vitelos são alimentados duas vezes ao dia por meio de um liquido (uma combinação de leite em pó sem gordura, vitaminas, minerais, açúcar, antibióticos e drogas para promover crescimento rápido) que contém o mínimo de ferro para se manterem vivos, mas não para avermelhar sua carne. (REGAN, 2006). Ocorre, que estes animais estão sempre imobilizados, seja por meio de amarras ou por sua baia ser insuficientemente espaçosa para conseguirem se virar ou se mover. Esse procedimento é o correto para a produção da carne de vitela, pois é necessário que o filhote permaneça com os músculos moles e fracos para que sua carne alcance a maciez exigida. Esses bezerros são privados de tudo que responda à sua natureza, eles não estão bem nem fisicamente, nem psicologicamente, por isso no momento em que são destinados ao abate notoriamente se encontram em situação enferma, diferente do que se associa a bezerros saudáveis.

1.3.2 Carne de porco

O porco é considerado um dos animais mais inteligentes, superando até mesmo o cachorro, ele pode facilmente entender a comandos de treinamento e pode ser criado como um animal doméstico exatamente como criamos cachorros e gatos. Além de serem inteligentes, os porcos são animais higiênicos e não usam o mesmo lugar que descansam para fazer suas necessidades fisiológicas, porém, na realidade em que vivem são tratados com extrema negligência o que remete a serem animais imundos.

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Segundo Naconecy, os porcos são (2015, p. 12):

Sujeitos a um crescimento acelerado e a procedimentos mutilatórios dolorosos como o corte de cauda, corte dos dentes e castração sem anestésicos, os porcos consomem grandes quantidades de antibióticos diariamente para evitar o desenvolvimento de doenças decorrentes da baixa imunidade própria do confinamento intensivo.

Eles são submetidos a viverem em espaços minúsculos e sujos o que aumenta seus níveis de estresse, inclusive, existe uma doença denominada síndrome do estresse suíno ao qual os criadores desta espécie se atentam em especial, pois causa a morte precoce de muitos do seu produto por motivo de confinamento. A maioria dos suínos passa a vida em ambientes fechados o que ocasiona problemas psicológicos, mas também físicos, pois acarreta em doenças que desenvolvem no decorrer de suas curtas vidas, eles são enviados para o abate quando tem em torno de 5 a 6 meses pesando aproximadamente 100 quilos. Os porcos recém nascidos mamam entre duas a três semanas e fazem isso através de barras que separam eles de sua mãe, muitos não sobrevivem até o desmame por inanição ou diarréia e aqueles que ultrapassam o limite para alcançar sua mãe, podem ser esmagados acidentalmente por ela, pela falta de espaço que ela possui. (JOY, 2014)

Como esses porcos vivem em pequenos espaços onde mal conseguem se mexer, eles não se exercitam de forma alguma, o que contribui para que seu peso aumente constantemente, esse tipo de confinamento em que são submetidos direciona os suínos a comportamento neurótico e pode levar até mesmo ao canibalismo entre eles, por isso suas caudas são cortadas (sem anestesia), para que não possam morder uns aos outros. Além de enlouquecerem com o estresse e o tédio, o ar onde vivem é de puro amoníaco e destrói o pulmão dos animais, onde os produtores buscam um tratamento com tetraciclina para que não ocorra o óbito antes do tempo desejado. (SINGER, 2010) Também é constatado que o piso onde esses animais são mantidos não é de forma alguma pensado em seu conforto, ainda segundo Singer (2010, p. 183) “O piso é ripado ou concretado, nenhum é satisfatório; ambos machucam os cascos e as patas dos porcos. Estudos mostram índices extraordinariamente altos de ferimento nos cascos”. Após o confinamento intensivo quando estão prontos para o abate, são aglomerados excessivamente em caminhões que seguem para o abatedouro, sem qualquer comida ou água e aqueles que sobrevivem e chegam ao destino, relutam até o fim para não morrer e se desesperam assim que estão um atrás do outro e ouvem os gritos dos que já estão dentro do processo.

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Além dos porcos mantidos em confinamento e criados para engorda e produção de carne, existem as porcas reprodutoras, essas fêmeas sofrem tortuosamente muito mais, pois são mantidas constantemente em gestação. Conforme Regan explica (2006, p. 112) “As porcas reprodutoras pesam até 180 quilos, ficam confinadas em baias de 61 cm de largura durante a maior parte de sua vida de sucessivas gestações que pode chegar a quatro anos”. A porca é considerada uma máquina de produção de leitões e seu confinamento se dá em um espaço mínimo seja para emprenhar ou para parir.

Como escreve Singer (2010, p. 186):

Quando prenhes, são em geral, trancadas em celas individuais de metal de 60 centímetros de largura por 180 centímetros de comprimento, pouco maiores que o próprio corpo; ou podem ser presas por uma corrente em volta do pescoço; ou, ainda, podem ser mantidas nas celas e, ao mesmo tempo, acorrentadas. Ali vivem por dois ou três meses. Durante esse tempo todo não podem caminhar mais do que um único passo para frente e outro para trás; não conseguem se virar nem se exercitar. Novamente, a economia em alimento e em mão de obra é o motivo para essa forma brutal de confinamento solitário.

Como as porcas vivem dentro de um minúsculo espaço, elas mal conseguem se mover e muito menos virar de um lado para o outro, sendo o espaço todo coberto por fezes e urina, podendo causar várias doenças e infecções, principalmente de trato urinário, Joy (2014, p. 48) explica que “As porcas afundam em dejetos cheios de bactérias, que se introduzem no trato urinário. Uma porca será engravidada à força em rápidos ciclos de cinco ou seis meses, até não ser mais capaz de reproduzir”. Quando exceder o prazo em que pode engravidar elas são encaminhadas ao abatedouro junto aos demais.

1.3.3 Carne de gado e a indústria dos laticínios

Os bovinos até completarem seis meses, vivem ao ar livre, conforme expõe Joy (2014, p 50) “a indústria de carne bovina mantém os animais ao ar livre durante os primeiros seis meses de vida, pois é mais barato contratar fazendeiros independentes, que possuem pastagens, para administrar essa parte do processo”. Após o período dos seis meses, eles são separados da mãe e desmamados, o que desencadeia um trauma tanto no bezerro quanto na mãe, podendo o filhote vir a adoecer. No momento em que o bezerro é separado da mãe e ocorre este momento traumático e de extremo estresse, torna-se sempre recomendado que as instalações que separam um do outro sejam fortes o suficiente para que nenhum consiga

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romper, as vacas berram durante dias a falta do filhote e os bezerros desenvolvem o primeiro trauma.

A indústria da carne de gado denomina seu produto como gado de corte, esses animais são marcados a ferro quente, seus chifres são cortados e se forem machos, serão castrados sem anestesia. A maior parte da sua vida é resumida em currais de engorda, onde são alimentados por grãos e suplementos de crescimento, esses currais não possuem nenhum tipo de conforto para o animal, nenhuma proteção e ficam imersos entre a sujeira. Os currais de engorda são meios lucrativos para os produtores, pois o gado ganha peso mais facilmente comendo grãos do que pasto, em 14 meses ele passa a pesar até 450 quilos, onde permanece até o momento do abate. (REGAN, 2006)

No momento em que são levados ao frigorífico são encaminhados da mesma forma que os porcos, ainda, conforme elucida Joy (2014, p. 52):

Uma vez na linha de montagem, o gado é atordoado, preso a correntes, sangrado, estripado e esfolado. Como acontece com os porcos, a falta de trabalhadores experientes e a velocidade vertiginosa da esteira transportadora impedem a precisão no atordoamento e muitos bois acabam seguindo enquanto ainda estão conscientes. Bois conscientes na fileira são particularmente perigosos para os trabalhadores, pois, com meia tonelada, ao se debaterem e escoicearem, podem se soltar das correntes e cair de cabeça sobre os empregados de uma altura de quase cinco metros. Mesmo quando o animal é corretamente atordoado, são ás vezes necessários muitos golpes para deixá-lo inconsciente.

Ademais, dentro da indústria de gado existem outras formas de violação, destinadas ao gado leiteiro, violações muito mais extremas do que com o gado de corte, diferente do que a maioria das pessoas acredita, a indústria de laticínios é uma das mais tortuosas dentro da exploração animal. As vacas leiteiras são submetidas a ficarem sempre em estado prenhe, para que constantemente esteja produzindo leite, algumas vivem acorrentadas em confinamentos dentro de baias pequenas e sujas, e outras vivem em áreas ao ar livre, mas superlotadas. Elas recebem constantemente injeções de hormônios reprodutivos para que se altere seu processo hormonal e assim produza mais leite do que naturalmente produziria, assim como explica Singer (2010, p. 203) “As vacas que recebem injeções diárias de hormônio produzem cerca de 20 por cento a mais de leite” e além da necessidade diária de ingestão induzida de hormônios, essas fêmeas são obrigadas a engravidarem em média, uma vez por ano, para que se produza leite e carne.

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Joy (2014, p. 60) explica:

As vacas são ordenhadas por máquinas durante dez meses por ano, o que inclui o período de sete meses durante o qual estão prenhes. Esse processo de inseminação e lactação contínuas estressa de tal maneira seus corpos que, em muitas vacas, surgem defeitos físicos e mastite, uma infecção e às vezes gravíssima inflamação no úbere. O sistema da vaca é tão sobrecarregado que o processo metabólico normal pode ser insuficiente para acompanhar o desgaste físico e, por isso, sua dieta natural, herbívora, de capim e pastos é suplementada com grãos e raçãocarnívora, com alto teor de proteína, feita de carne e farinha de ossos.

Ainda, Felipe (2018) explica que na indústria de laticínios 22 milhões de vacas dão a luz por ano no Brasil e para a produção de carne se exige que mais 15 milhões tenham filhotes. Antes de serem enviadas para o matadouro, elas tem utilidade durante aproximadamente quatro anos e quando já se evidencia que sua produção decaiu, elas ainda são estupradas uma ultima vez para serem encaminhadas grávidas ao abate, conforme demonstra a referida autora (2018, p. 115) “[...] o coração ainda vivo de seus fetos é punçado para retirada do plasma. Os produtos feitos com o plasma desses pequenos corações requerem que estejam pulsando durante o procedimento, levado a efeito brutalmente”.

1.3.4 Carne de frango e a indústria de ovos

Essa indústria utiliza o animal para obter dois tipos de produtos: carne de frango e ovos. Os frangos criados para consumo ultrapassam cinco bilhões anualmente apenas no Brasil, e são confinados em granjas industriais onde se amontoam milhares de galinhas vivendo em situação precária onde estão sempre propensas a doenças. Assim como os demais animais criados para consumo de carne, as galinhas também passam pelo procedimento de crescimento acelerado em tempo reduzido, conforme relata Naconecy (2015, p. 09) “Hoje em dia, “o frango de corte”, atinge o peso considerado satisfatório para abate em um terço do tempo em que demorava décadas atrás, dentro de cerca de 40 dias, o animal (em estágio ainda infantil) já tem um peso de 2 kg ou mais, e então, segue para o abate”. Esse crescimento precoce se dá por meio de suplementos, hormônios e medicamentos que se misturam com a ração que é fornecida para sua alimentação, essa alteração física acelerada causa várias deformidades físicas e dificuldades de mobilidade, pois o crescimento do esqueleto não consegue acompanhar o crescimento demasiado do corpo. (NACONECY, 2015) Essas deformidades que consequentemente desenvolvem por meio de sua dieta faz com que

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excedam absurdamente um peso ao qual não conseguem suportar, suas patas são torcidas ou quebradas e acabam ocasionando dores crônicas nas articulações.

Essas aves vivem dentro de confinamento intensivo, de forma tão superlotada que se torna quase impossível qualquer tipo de mobilidade, Melanie Joy expõe (2014, p. 55):

Nessas condições, as aves são incapazes de exibir qualquer um de seus comportamentos naturais, como ciscar ou ficar no poleiro, e desenvolvem comportamentos psicóticos, induzidos pelo estresse, como a bicada nas penas e o canibalismo. Frequentemente, para impedir que as aves matem de bicadas uma às outras, é usada, assim que elas nascem, uma lâmina quente para amputar parte da frente dos bicos, sem anestesia. Esse procedimento, conhecido como desbicagem, pode levar à infecção, ao desenvolvimento de tumores neurológicos ou à morte, se a ave fica sem sobra de bico suficiente para beber ou comer.

Aquelas aves que sobrevivem ao confinamento são enviadas ao abate ainda filhotes em torno de sete a dezesseis semanas, sendo aglomeradas em esteiras transportadoras onde são penduradas em argolas de cabeça para baixo e muitas ainda conscientes no momento em que suas gargantas são cortadas ou jogadas dentro de água fervente para retirada das penas. (JOY, 2014)

As galinhas poedeiras são as destinadas à produção de ovos, no Brasil, essa criação é aproximada em torno de 100 milhões de galinhas que são criadas na maior parte em gaiolas de bateria, e sua média de vida é mais longa, mas menos vantajosa. No momento do seu nascimento, em incubadoras industriais são separados os machos das fêmeas, os machos são possuem valor econômico para esta indústria, então logo são descartados, e as fêmeas são direcionadas as gaiolas de produção.(NACONECY, 2015)

Conforme explica Joy (2014, p. 58):

Os galos não tem valor econômico e são, portanto, descartados logo após seu nascimento. Podem ser despejados num gigantesco moedor e triturados vivos, envenenados com gases ou jogados em recipientes de lixo, onde morrem de sufocamento ou desidratação. As galinhas são espremidas em gaiolas de bateria [...] são feitas de arame e alojam uma média de seis aves.

Essas gaiolas fornecem o único espaço disponível para as aves, onde elas comem, bebem, defecam e vivem dolorosamente, pois além de ficarem espremidas, essas gaiolas machucam frequentemente as aves. Na produção de ovos as galinhas desenvolvem comportamento de estresse, sendo a desbicagem também um procedimento comum para estes

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animais. Como essas aves são manipuladas para produzirem dez vezes mais ovos do que seu corpo normalmente suporta, muitas vezes seus ossos se quebram devido ao cálcio desproporcional para a formação da casca dos ovos ou ocorre o prolapso uterino quando o útero pode sair junto com o ovo, isso pode fazer com que a galinha venha a óbito por sangramento ou infecção. Após não serem mais lucrativas o suficiente, essas aves são encaminhadas ao abate em punhados, onde seus corpos já estão extremamente enfraquecidos e mutilados, se dilaceram. (JOY, 2014)

Por meio deste capitulo, conseguimos evidenciar, brevemente, todo o procedimento de criação e manipulação de animais mantidos em confinamento intensivo, onde são mortos no processo de produção, para no fim se transformarem em objetos consumíveis. A distância cultural que afasta essa tradição do conceito de ética em relação a uma vida, e como estes animais tornam-se invisíveis aos olhos humanos quando não enxergamos o que acontece dentro dos matadouros. Além de teorizar a veracidade da realidade exploratória, fica demonstrado que existe um aspecto emocional quando abrimos os olhos para tamanha crueldade, esse aspecto se desdobra dentro de um dever moral ao qual grita pela necessidade de uma ética animal em relação a nossos semelhantes.

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2 PELO FORTALECIMENTO DE UMA ÉTICA ABOLICIONISTA: VIDA DIGNA PARA TODOS OS SERES1

Além de descrever um pouco sobre os animais não humanos, que são as vitimas diretas de uma cultura carnista, também evidenciamos que essa cultura não só traz dor e sofrimento como também afeta animais humanos, estes são as vitimas invisíveis dessa cultura e seus efeitos colaterais evaporam conforme a industria agropecuária movimenta seu comércio. (JOY, 2014)

Nós humanos, somos as vitimas invisíveis da produção de carne, invisíveis porque o sistema trabalha incessantemente para que o mínimo de pessoas possível consiga enxergar esse efeito colateral para que assim não abale todo o esquema de produção, invisíveis porque não nos consideramos vitimas o suficiente para diminuir o consumo ou mesmo extingui-lo. Pagamos um preço alto para nos mantermos dentro desse sistema e ajudamos indiretamente para que ele não desmorone, ajudamos quando nos esforçamos para não enxergar tamanha devastação em que a pecuária está direcionando o nosso planeta e destruindo nosso meio ambiente, ajudamos quando não reconhecemos que o aumento de problemas de saúde em muitas vezes está ligado a nossa alimentação e nossos hábitos.

A maioria de nós não costuma fazer a ligação entre alimentação e ética, tampouco identificar as transformações que ocorrem dentro de certo culturalismo alimentar, o que ocorre é que com o passar dos anos, nossos hábitos alimentares tomaram proporções exorbitantes em relação à economia, o que desencadeou cada vez mais o numero de medidas catastróficas, mas nem sempre foi assim.

Há cerca de 10 mil anos, dois milhões de pessoas sobreviviam de caça, se deslocando em grupos pequenos em busca de alimento, todavia, foi nesta época que se aprendeu a cultivar plantas e domesticar animais, o que resultou na fixação de grupos dentro de um determinado lugar favorável para a criação e plantio de alimentos, sendo que com o passar dos anos tais práticas agrícolas foram se aprimorando e se tornando mais complexas. Atualmente pode-se dizer que cerca de 40% da superfície da Terra está sendo usada na agricultura e 70% tem de alguma forma alterações pelo ser humano, e isso veio com mais força a partir da revolução

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industrial, onde se assumiu que as atividades humanas direcionariam as mudanças globais e ambientais. (SCHUCK; RIBEIRO, 2018)

Ainda, na linha de pensamento de Schuck e Ribeiro (2018, p. 6):

Somos sete bilhões de seres humanos, mas todos os anos criamos e abatemos mais de setenta bilhões de animais terrestres e uma quantidade muito maior de animais aquáticos para nosso consumo5. Somente no Brasil, são quase seis bilhões de animais terrestres abatidos por ano. Cada um desses animais precisa de determinada quantidade de terra, água, alimento e energia, produz quantidade expressiva de dejetos e emite, direta e indiretamente, poluentes que serão dispersados pelo solo, ar e água. Além disso, a criação de animais para consumo é um sistema extremamente ineficiente de produção de alimentos: em média, para alimentar os animais criados para consumo são usadas aproximadamente dez vezes mais calorias do que as contidas em sua carne.

Além do custo ético que é submetida à exploração animal existe o custo ambiental para tamanha produção mundial, as imensas extensões de áreas destinadas à pecuária exigem um enorme número de recursos naturais e energéticos, o que acarreta, negativamente, em quantidades absurdas de resíduos sólidos, líquidos e gasosos. Dentro das várias formas de impactos ambientais estão: destruição de florestas, escassez de água doce, poluição dos mares, desertificação, erosão dos solos, perda de biodiversidade, aquecimento global.

O maior aliado da degradação ambiental são os confinamentos intensivos, o grande número de animais armazenados dentro de um ambiente insalubre causa não só problemas para os trabalhadores diretos dos frigoríficos, mas também, todo o lixo químico e os restos mortais dos animais são descartados de forma irregular e com descaso, fazendo com que toda a substância tóxica dessas instalações seja transmitida pelo ar, pela terra e inclusive pela água. Contudo, a indústria da carne mantém as mesmas práticas, conforme explica Joy (2014, p. 85) “Embora esteja destruindo de forma sistemática o meio ambiente e as pessoas que vivem nele, a indústria pecuarista não está violando qualquer lei”. Ou seja, o sistema legal regulamenta a fiscalização dessas instalações – mesmo que de forma ineficiente e com descaso – mas existem leis para regulamentar as práticas, como no Brasil uma das regulamentações mais recentes foi a portaria nº 304 de 22 de Abril de 1996, onde se instaurou legalmente a necessidade de mudanças dentro dos abatedouros, mas na prática não é assim que acontece, o descaso de higiene anda lado a lado com a prática de sofrimento animal.

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Começando com uma das mais importantes degradações ambientais que se caracteriza, foi confirmado que a Terra já elevou sua temperatura em 1,5º C por conta dos gases do efeito estufa (FILIPE, 2018) o que parece irrelevante em quantidade numérica, porém, para o planeta acarreta em grandes impactos. De acordo com GUNTHER (2015) o aquecimento global nada mais é que uma conseqüência das atividades humanas, ou seja, as atividades pecuaristas são as que mais ensejam nos danos ambientais seja na produção de gases dentro dos confinamentos ou as áreas desmatadas para a criação de gado ou produção de grãos, o que acarreta em grandes quantidades de CO² e outros gases formadores do efeito estufa.

Ainda, no tocante a emissão de gases do efeito estufa, conforme expõe Pedreira e Primavesi (2006, p. 498):

A fase de terminação dos animais em confinamentos também gera impacto ambiental significativo oriundo da concentração animal. O principal refere-se ao grande volume de fezes que necessitam ser tratadas e descartadas. Essas concentrações de fezes com urina geram emissões apreciáveis de gás metano (com potencial de retenção de calor 25 vezes mais potente que o gás carbônico, gerado durante degradação de material celulósico em ambiente deficiente em oxigênio) ou produzem efluentes que acabam lagoas de decantação, que também são fontes de gás metano e nitrato para o solo.

Tanto a queima de combustíveis fosseis quanto a devastação das florestas estão ligados diretamente a industrialização da exploração animal, seja para a produção de carne, ovos ou laticínios. A devastação das florestas se dá exclusivamente para o cultivo de grãos e cereais ao qual alimentam os grandes números de animais confinados. (FELIPE, 2018)

Ainda, conforme as palavras de Sônia Felipe (2018, p. 129):

Os rebanhos bovino e bubalino ocupam o primeiro lugar em emissão de gás metano no planeta, com 1,3 bilhão de cabeças ao redor do mundo, emitindo cada individuo pelo menos 140 g de metano, num total estimado de 182 mil toneladas ao dia, ou 66 milhões de toneladas ao ano. Nessas emissões não estão incluídos os gases liberados por um bilhão de suínos e 25 bilhões de aves, somente o gás metano emitido por bovinos e bubalinos.

A agropecuária já transformou grande parte dos campos, pradarias, florestas temperadas e florestas tropicais, além da perda de habitats e perda da biodiversidade, sendo o impacto da pecuária um grande problema para as terras do planeta, conforme exemplifica Schuck e Ribeiro (2018, p. 12) “Atualmente, quase 30% das áreas terrestres do globo são

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usados como pastagem [...] cerca de um terço dos três bilhões de hectares de todas as terras aráveis se destina ao cultivo de grãos para alimentar animais criados para o consumo”.

Outro grande impacto ambiental está na escassez e poluição das águas, onde direciona cada vez mais a uma calamidade global, pois em decorrência das mudanças ambientais e do uso extensivo deste recurso, há muito tempo já podemos evidenciar que tal exploração está nos afundando cada vez mais em um impacto sem volta. De todos os setores de consumo, a pecuária é a que mais faz uso deste recurso hídrico, cerca de 90% do consumo global é destinado ao agronegócio e um terço disto é destinado à irrigação e ao cultivo de grãos para a produção de ração.

A respeito disso, se destaca o comentário de Schuck e Ribeiro (2018, p. 19):

Para um quilo de carne se chega a gastar vinte vezes mais água do que na produção de um quilo de alimento vegetal. São necessários dez a vinte mil litros de água para produzir apenas um quilo de carne bovina em sistema de criação intensiva, sendo a maior parte dessa água usada para o crescimento dos cultivos destinados à alimentação do gado. Outros alimentos de origem animal também requerem um aporte de água muito superior ao de alimentos vegetais.

O Brasil, indiretamente é um país exportador de água, pois utilizada seus recursos hídricos exportando produtos como soja e carne, no manejo dessa comercialização acaba-se por utilizar esse recurso principalmente nas áreas de irrigação e nos cuidados com os animais de abate. Toda água exportada que não se contabiliza junto à economia de nossos produtos nos direciona a um risco ambiental em escala global, que ano após ano se aproxima de uma degradação emergente, não só na questão ambiental, mas como hoje o Brasil está em uma posição estratégica dentro da economia internacional por ser possuidor de uma das maiores reservas de água doce do mundo, quanto maior a escassez mundial, essa abundância pode se tornar alvo de grandes conflitos externos. (CARMO, 2007)

Ainda, conforme elucida a linha de pensamento de Schuck e Ribeiro (2018, p. 20- 21):

No Brasil, maior potência hídrica mundial, concentrando cerca de 12% do estoque global de água em seus rios e reservatórios subterrâneos, o setor pecuário é responsável por uma parcela substancial do consumo de água, devido ao grande volume de exportações do setor (entre carnes e cultivos destinados à ração). Somos hoje o quarto país do mundo em consumo de água, perdendo apenas para China, Estados Unidos e Índia, países cuja população é substancialmente maior. A exportação de produtos agropecuários ainda nos torna o quarto maior exportador de água virtual do mundo, com um total de 112 trilhões de litros exportados por ano, o

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que equivale a mais de cem vezes o volume máximo do sistema de represas Cantareira. Exportar grãos ou carne significa, em última instância, exportar água – a um custo muito baixo.

Além dos impactos causados ao meio ambiente fica cada vez mais claro que o consumo de animais afeta nosso bem-estar e nossa saúde, todavia, é o risco que mais a humanidade reluta em aceitar, para que assim, não necessite abrir mão da comilança cultural. Todo esse impacto é direcionado não apenas aos trabalhadores de frigoríficos, que lidam diariamente com condições insalubres, mas implica em grandes mudanças negativas para os comedores de animais e até mesmo para aqueles que aboliram essa dieta.

No que tange a indústria de frangos, em meados de 2005 as Nações Unidas constatou que a epidemia da gripe aviaria que havia se alastrado ao redor do mundo e que poderia se estender ao seres humanos tinha como fato gerador o confinamento intensivo, ou seja, manter um grande numero de aves dentro de um pequeno espaço, onde se amontoam uns por cima de outros impulsionava o desenvolvimento do vírus. Atualmente, a gripe aviária (H5N1) não oferece um grande risco a população, exceto para quem teve algum contato direto com aves infectadas, mas isso não descarta a possibilidade de o vírus sofrer uma mutação, onde pode se transmitir aos seres humanos, causando uma grande epidemia (SINGER; MASON, 2007).

Tanto as aves de corte quanto as galinhas poedeiras comem ração, bebem água e produzem toneladas de excreta e os aviários onde elas são armazenadas exalam gás amônia e outros inúmeros gases ácidos para toda atmosfera.

Sobre o impacto do frango de corte, conforme Felipe (2018, p. 162-163):

No processo de abate gastam-se 30 litros por ave, logo para abater 5,79 bilhões de frango foram gastos 173,70 milhões de m³ de água. Somados ao 28,95 milhões de m³ para hidratá-los, foram devastados 202,65 milhões de m³ de água em 2015. Isso equivale a 1.000 litros de água per capita humana brasileira, o suficiente para suprir as necessidades de hidratação de toda a população brasileira por 500 dias a um consumo de dois litros por pessoa por dia. Só a água do abate de frangos. Cada ave condenada a nascer para o abate consome, em média, de 160 ml (machos) a 180 ml (fêmeas) de água por dia.

O impacto das galinhas criadas para produção de ovos, segundo Felipe (2018, p. 164):

Para coletar 3,70 bilhões de dúzias de ovos ou 44,81 bilhões de ovos em um ano, foram gastos 4,48 milhões de toneladas de ração (100 g de ração por ovo) e 11,20

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