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Prevalência de deficiência entre indígenas e não indígenas no Brasil

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Academic year: 2021

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XXI Encontro Nacional de Estudos Populacionais

Poços de Caldas, 22 a 28 de setembro de 2018.

Prevalência de deficiência entre indígenas e não indígenas no Brasil

RESUMO

Ao contrário de países como Austrália e Canadá, a prevalência de deficiência entre a população indígena ainda é muito pouco estudada no Brasil. Buscando contribuir para o avanço do conhecimento sobre a saúde indígena, este trabalho descreve e compara a prevalência de deficiência entre indígenas e não indígenas no Brasil. Os dados utilizados para a realização deste trabalho foram retirados do Censo Demográfico de 2010. Os resultados mostraram que a prevalência de deficiência é maior entre a população indígena. Ao separar segundo sexo, observou-se que entre as mulheres a prevalência é maior, independentemente se indígena ou não. Ao desagregar os dados segundo grupos etários, constatou-se que nas idades mais jovens, até 30 anos, a prevalência foi maior entre os não indígenas. Estes resultados contribuem para um melhor entendimento sobre a saúde indígena no Brasil e ao mesmo tempo levantam inúmeras possibilidades de pesquisas, como por exemplo análises focadas na prevalência segundo o tipo de deficiência, bem como a influência dos aspectos culturais na percepção da deficiência e seu impacto na vida diária dos indígenas, principalmente nos que residem em aldeias.

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Introdução

As condições de saúde da população indígena no Brasil tem sido objeto de diversas análises, sendo que a maioria delas é focada nas doenças infecto-parasitárias1,2, doenças crônicas3,4, questões nutricionais5,6, saúde bucal7,8, uso de álcool e drogas9,10, suicídio11, e recentemente na mortalidade12. De uma maneira geral, a situação das condições de saúde dos povos indígenas em relação à população não indígena é extremamente desfavorável no Brasil12, 13.

É importante destacar que estes estudos têm tido um papel fundamental para delinear o perfil epidemiológico dos povos indígenas no Brasil, e evidenciar as demandas de uma parcela da população que historicamente tem tido dificuldades de acesso aos bens e serviços disponibilizados pelo Estado brasileiro.

Apesar do grande esforço dos pesquisadores brasileiros, algumas lacunas podem ser observadas na literatura corrente sobre a saúde dos povos indígenas. Diferentemente de alguns países, como a Austrália14 e Canadá15, é evidente a falta de estudos relacionados à prevalência das deficiências. Nesse sentido, o presente trabalho busca descrever e comparar a prevalência de deficiências entre a população indígena e não indígena no Brasil, a partir das informações presentes no Censo Demográfico de 2010. Busca-se, assim, incentivar novas pesquisas sobre este tema, até então pouco explorado pela literatura sobre as populações indígenas no Brasil.

Material e Métodos

Para a realização deste estudo foram utilizados os dados do Censo Demográfico de 2010, conduzido pelo IBGE. A população total foi dividida entre indígenas (N≈822 mil) e não indígenas (N≈190 milhões). Os indivíduos com presença de qualquer tipo de deficiência (visual, auditiva, motora ou mental), independentemente do grau de severidade, foram classificados como deficientes.

Análises descritivas foram realizadas para caracterizar a prevalência de deficiência entre indígenas e não indígenas segundo sexo e grupo etário. Para a comparação entre as prevalências de deficiência entre indígenas e não indígenas foi utilizada a padronização direta, considerando a estrutura etária da população não indígena como padrão. Este procedimento foi necessário porque a estrutura etária da população indígena é mais jovem que a da não indígena, e como a prevalência de deficiências tende a aumentar com a idade, a comparação entre os grupos ficaria

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comprometida, não refletindo a real diferença entre eles. Também foram geradas razões de deficiência entre homens e mulheres, comparando indígenas e não indígenas, segundo grupos etários.

Resultados

A prevalência de deficiência na população total não indígena em 2010 foi de 23,9% e prevalência para a população total indígena foi de 24,9%, sendo que antes da padronização a prevalência entre os indígenas foi de 20,1%.

O Gráfico 1 mostra que após a padronização, a prevalência de deficiência na população indígena é superior à observada entre a população não indígena. Mesmo estratificando por sexo, a prevalência entre os indígenas continua superior, tanto para homens como para mulheres.

GRÁFICO 1 – Prevalência de deficiências entre indígenas e não indígenas. Brasil, 2010.

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010.

Nota: Os resultados da população indígena foram padronizados pela estrutura etária da população não indígena.

A Tabela 1 mostra que a prevalência de deficiência na população indígena é menor que a observada na população não indígena, mas até o grupo etário de 25 a 29 anos. Ela torna-se maior entre os indígenas do grupo de 30 a 34 até o de 75 a 79 anos, voltando, então, a ser menor a partir dos 80 anos.

24,9 22,6 27,0 23,9 21,2 26,5

Total Homem Mulher Total Homem Mulher

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Ao analisar a distribuição da prevalência de deficiência entre homens indígenas e não indígenas e entre mulheres indígenas e não indígenas, segundo os grupos etários, tem-se o mesmo movimento. Entre os homens indígenas, a prevalência é menor até o grupo etário de 20 a 24 anos e entre as mulheres indígenas, até o grupo de 25 a 29 anos. Para homens e mulheres indígenas, a prevalência de deficiência torna-se menor apenas a partir dos 80 anos.

Tabela 1 – Prevalência de deficiências entre indígenas e não indígenas, segundo sexo e grupo etário, Brasil, 2010.

Grupo etário População Indígena População não indígena Homem indígena Homem não indígena Mulher indígena Mulher não indígena 0-4 2,61 2,81 2,59 2,92 2,63 2,68 5-9 5,40 7,70 5,39 7,71 5,40 7,68 10-14 7,83 11,26 7,42 10,41 8,26 12,14 15-19 8,88 11,91 8,24 10,35 9,53 13,49 20-24 10,71 12,90 10,22 11,39 11,23 14,41 25-29 13,63 13,94 13,18 12,47 14,09 15,39 30-34 16,59 15,58 15,97 13,99 17,20 17,11 35-39 21,56 18,67 19,44 16,30 23,73 20,92 40-44 33,87 29,20 29,26 24,71 38,33 33,44 45-49 45,95 40,25 42,30 36,05 49,52 44,14 50-54 53,97 46,42 50,47 42,98 57,50 49,55 55-59 56,51 50,33 54,64 47,10 58,27 53,22 60-64 60,24 54,19 58,27 50,82 61,88 57,13 65-69 62,60 59,65 57,47 56,46 66,60 62,36 70-74 66,07 65,47 64,95 62,46 67,08 67,92 75-79 73,63 71,57 73,44 69,40 73,79 73,16 80-84 77,17 77,64 77,82 76,12 76,72 78,66 85+ 78,02 84,59 76,35 83,31 79,22 85,33

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010.

O Gráfico 2 representa a razão de deficiência segundo sexo, entre indígenas e não indígenas. Esta razão é a divisão entre o número de deficientes do sexo masculino pelo número de deficientes do sexo feminino, em cada grupo etário. Com

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exceção dos dois primeiros grupos etários, a deficiência é mais comum entre as mulheres, independente se indígena ou não. Outro resultado importante é que, em quase todos os grupos etários, a desigualdade na prevalência de deficiência entre homens e mulheres é menor na população indígena. As exceções ocorrem no grupo de 0 a 4 anos e no de 65 a 69.

Gráfico 2 – Razão de deficiência entre homens e mulheres, para a população indígena e não indígena, segundo grupo etário, Brasil, 2010

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010.

Discussão

Usando a estrutura etária da população não indígena como padrão, este estudo demonstrou que no Brasil a prevalência de deficiência é maior entre a população indígena do que na população não indígena, como observado em estudos internacionais. As mulheres apresentaram uma prevalência maior de deficiência, não importando se são indígenas ou não, embora entre as primeiras a prevalência seja maior16.

Outro resultado importante deste estudo é a menor prevalência de deficiências entre os indígenas nas idades mais jovens (até 30 anos) e nas idades acima de 80 anos. Assumindo que as deficiências são mais leves entre os jovens, a população indígena pode ter mais dificuldades para reconhecê-las quando

0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 1,00 1,20 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85+

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comparada à população não indígena. Além disso, a população não indígena pode estar mais exposta a fatores externos que podem causar algum tipo de deficiência, como acidentes de trânsito e acidentes de trabalho. Já a menor prevalência de deficiência entre os indígenas nas idades mais avançadas (85 anos e mais) pode ser explicada pela seletividade. Indígenas que alcançam estas idades provavelmente são mais saudáveis do que os não indígenas.

Um aspecto importante a se destacar é a impossibilidade de acessar as informações sobre Terras Indígenas, língua falada e etnias, presentes no censo demográfico de 2010. Tal impedimento empobrece as análises e impossibilita possíveis associações entre aspectos culturais e deficiências, tão reclamados pela literatura internacional16,17, mesmo com a utilização de conceitos ocidentais de deficiência17.

Apesar destas limitações, estes primeiros resultados, por si, já apontam para diversas possibilidades de pesquisa, seja utilizando o próprio Censo Demográfico, seja incentivando pesquisas de campo para compreender melhor os sentidos e significados das deficiências entre os povos indígenas. Além disso, reforça as desigualdades entre indígenas e não indígenas no Brasil, fato também observado mesmo em países desenvolvidos, como Estados Unidos, Austrália, Canadá, Nova Zelândia16.

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Bibliografia

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Referências

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