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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS, HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

SETOR DE CIÊNCIAS, HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

O ANTIFASCISMO NO BRASIL: A ATUAÇAO DO PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO E DA LIGA COMUNISTA INTERNACIONALISTA E SUAS

DIVERGÊNCIAS INTERNACIONAIS (1930-1935)

Marina de Godoy

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MARINA DE GODOY

O ANTIFASCISMO NO BRASIL: A ATUAÇAO DO PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO E DA LIGA COMUNISTA INTERNACIONALISTA E SUAS

DIVERGÊNCIAS INTERNACIONAIS (1930-1935)

CURITIBA 2006

Trabalho monográfico de conclusão do Curso de Graduação de História da Universidade Federal do Paraná Orientação: Roseli Boschilia

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Dedico este trabalho a todos os que lutaram e lutam contra o fascismo em todo o mundo.

Dedico também aos meus pais e irmãs, ao meu querido Ney, aos meus amigos e camaradas e aos colegas do CPT, enfim, todos que tanto contribuíram para minha formação acadêmica, política e humana.

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"Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar." Bertold Bretch

"É preciso sonhar mas com a condição de crer em nosso sonho, de observar com atenção a vida real, de confrontar a observação com nosso sonho, de realizar escrupulosamente nossas fantasias. Sonhos, acredite neles." Vladimir Lenin

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Sumário

Resumo...06

Introdução...07

1. O crescimento do fascismo...11

1.1 A ideologia fascista...11

1.2 A crise econômica: o fascismo emerge...12

1.3 Antecedentes históricos: o fascismo na Itália e a posição de Trotsky...15

1.4 A ascensão do nazismo e o papel do Partido Comunista alemão: as divergências de Trotsky com a Internacional Comunista ...18

1.5 O surgimento da Ação Integralista Brasileira no Brasil...19

2. O Partido Comunista Brasileiro e a Liga Comunista Internacionalista: Divergências...22

2.1 A “revolução de 1930” e os primeiros anos do Governo Vargas...22

2.2 O Partido Comunista Brasileiro...24

2.3 O fim do Bloco Operário Camponês ...28

2.4 As divergências entre Trotsky e Stálin... ...31

2.5 A Liga Comunista Internacionalista (LCI)...34

3. A NECESSIDADE DE UMA FRENTE ÚNICA...36

3.1 A Frente única: a luta contra o inimigo! ...37

3.2 Quem quer lutar contra o fascismo?...41

3.3 A ameaça integralista...42

3.4 A questão policial...43

3.5 As quatro horas de ditadura do proletariado...44

3.6 As divergências...45

3.7 O fim da Frente Única Antifascista...46

CONSIDERAÇÕES FINAIS...50

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RESUMO

Esta é uma monografia de conclusão de curso que tratará do combate ao fascismo no Brasil no início da década de1930. Durante a primeira década dos anos de 1930, principalmente após a ascensão de Hitler na Alemanha em 1933, o movimento fascista cresce no Brasil através da AIB (Ação Integralista Brasileira). Duas organizações operárias que se organizaram contra o integralismo, duas terão destaque na sua política antifascista e também nas suas divergências internacionais: O Partido Comunista Brasileiro e a Liga Comunista Internacionalista. Para a realização deste trabalho utilizamo-nos da documentação localizada no CEMAP (Centro de Estudos Mario Pedrosa) localizada em São Paulo sob custódia do CEDEM – UNESP, através da análise dos jornais encontrados destas duas organizações “ A classe operária” do PCB e “A luta de classes” da LCI e também de um jornal organizado por uma frente antifascista (Frente Única Antifascista) “O Homem Livre” podemos observar as divergências entre estas duas organizações e influência das divergências internacionais nesta análise. Também buscamos a análise de texto referentes à Internacional Comunista, à situação política do Brasil durante o primeiro Governo Vargas (1930-1937) e o troskismo. Seguindo a linha da III Internacional Comunista, o PCB irá relutar a aderir a FUA não realizando um combate de forma internacional contra ao fascismo. No Brasil a política de frente única de combate ao fascismo impulsionada pela LCI (órgão trotskista), e a adesão das massas a FUA, acabou por levar o PCB, por vezes, à aderir a FUA.

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INTRODUÇÃO

A década de 1930 se caracterizou, em diversos países do mundo, pela ascensão de regimes marcados pela ideologia fascista. Estes regimes encontraram na crise mundial do período entre guerras um terreno fértil para o crescimento de seus ideais.

No Brasil, o grupo que incorporou esta ideologia foi a Ação Integralista Brasileira (AIB). O movimento operário, frente à ameaça da ascensão do fascismo e a experiência deste regime na Itália e na Alemanha - onde as conseqüências para a classe operária foram desastrosas - se organizaram em sua defesa e em defesa de suas organizações.

Duas organizações operárias tiveram um papel fundamental na organização da luta contra o fascismo no Brasil: o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e a Liga Comunista Internacionalista (LCI). Estas duas organizações obtiveram destaque por suas relações com a Internacional Comunista.

A escolha de 1930 como data inicial da análise se justifica pelo surgimento da LCI, que coincide com a ascensão de Vargas ao poder. Este início do governo Vargas apresentou o papel de desagregador político da classe operária, reprimindo suas vanguardas e organizações, estabelecendo um “novo” tipo de relação: o atrelamento das organizações operárias ao Estado. As incertezas deste período contribuíram para a formação da Ação Integralista Brasileira (AIB), organização de inspiração fascista, criada em 1932. A resposta do movimento operário, diante da ameaça fascista, foi a sua organização para o combate desta ideologia e a defesa de suas organizações e de sua classe. Procurando desenvolver mecanismos para a organização da classe, uma parcela do movimento operárias, apoiadas pela LCI, criou a Frente Única Antifascista (FUA), cujo desenvolvimento se deu entre os anos 1933 e 1934. A baliza final da nossa periodização – 1935 – está vinculada à formação da Aliança Nacional Libertadora (ANL), responsável pela derrota política da FUA, extinta em 1934.

Desde o início da sua formação, a FUA conviveu com as divergências políticas existentes entre a LCI e o PCB, decorrentes, principalmente, das orientações da Internacional Comunista. São estas divergências que procuramos analisar neste trabalho, apresentando os fatores internacionais e a sua influência nestas organizações no combate ao fascismo.

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Um dos principais pontos de divergência residia na recusa do PCB, ligado à Internacional Comunista, em participar da constituição de uma frente única operária para formar uma “frente popular”.

Para a compreensão do conteúdo e a análise das fontes se fez necessário à definição de alguns conceitos que permeiam o trabalho.

Nos apropriamos do conceito utilizado por Edda Saccomani1 sobre o fascismo, que se constituiria num sistema autoritário de dominação caracterizado por um partido único de massa, organizado hierarquicamente, em oposição frontal com o comunismo, que tem como objetivo a expansão imperialista, caracterizado pelo uso do terror e pela tentativa de integrar nas estruturas de controle do partido ou do Estado, de acordo com uma lógica totalitária, as relações econômicas, sociais, políticas e culturais.

Nos aliamos à teoria defendida pela corrente analítica que compreende o fascismo como dimensão internacional, fruto das contradições do sistema capitalista frente aos confrontos de classe e da crise do sistema capitalista, no seu estágio final, o imperialismo.

Ao tratarmos das duas organizações operárias que se propõem a combater o fascismo cabe a apropriação da discussão de vanguarda realizada por Florestan Fernandes. Este autor aponta que no estudo da história e da “revolução” não é pertinente a análise dos “heróis” ou “mitos” de um processo histórico, é necessário sim entender o processo enquanto fenômeno sociológico de classe, tendo como base a consciência operária no processo revolucionário. Apontando que a vanguarda é uma conquista ideológica da classe, mas não é substitutiva desta. Com esta análise é possível notarmos a disputa da vanguarda e da inserção no movimento operário no interior das duas organizações, questão essa muito presente nos jornais por elas produzidos

Em todo o trabalho tratamos das relações envolvendo a IC e as duas organizações no Brasil. Para melhor análise destas relações utilizamos o conceito de Thompson sobre experiência. Neste trabalho relacionamos a experiência da classe operária alemã com o fascismo e o papel do Partido Comunista Alemão (PCA) através das análises da “Oposição de Esquerda”. Também como a LCI utilizou esta experiência para organizar a luta antifascista no Brasil.

Thompson aponta que a experiência surge do pensamento de homens e mulheres, não apenas de filósofos. Para este autor:

1 SACCOMANI, Edda. Fascismo. In: BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política. São Paulo: Imprensa Oficial,

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Ocorrem mudanças no ser social que dão origem à experiência modificada; e essa experiência é determinante, no sentido de que exerce pressões sobre a consciência social existente, propõe novas questões e proporciona grande parte do material sobre o qual se desenvolvem os exercícios intelectuais mais elaborados. A experiência, ao que se supõe, constitui uma matéria prima oferecida aos processos do discurso científico da demonstração. E mesmo alguns intelectuais atuantes, sofreram eles próprios a experiência. 2

Thompson também irá apontar não apenas para a experiência acumulativa e sim para a qualitativa, conceito apropriado neste trabalho. A experiência internacional do fascismo trouxe para o contexto operário brasileiro os ataques do fascismo sobre a classe operária e a necessidade de organização contra o movimento. Ou seja, a posição adotada pela IC e pelo PCA não servia ao movimento operário brasileiro, sendo necessário uma mudança de ação, de direção política, e é essa mudança foi expressa pela construção de uma Frente única contra o fascismo, a FUA.

As fontes utilizadas neste trabalho foram os jornais operários produzidos pelas duas organizações analisadas, o PCB e a LCI e também o jornal que foi utilizado como veículo de propagação política da FUA. Além disso, nos utilizamos de alguns textos escritos por Leon Trotsky e Lênin para melhor compreender as divergências dentro da IC e a posição adotada por esta organização frente ao avanço do fascismo.

Os jornais “A Classe Operária”, do PCB, e a “Luta de Classes”, da LCI, foram todos mapeados pelo conteúdo de matérias, data, local e o número da edição. Foram analisadas todas as reportagens sobre fascismo, integralismo e organizações operárias. Do jornal vinculado a FUA, “O Homem Livre”, foram analisadas as reportagens sobre as atividades, comícios e anticomícios, de caráter antifascista. Estas fontes, digitalizadas, foram encontradas no arquivo do Centro de Estudos Mario Pedrosa (CEMAP), sob custódia do CEDEM da UNESP, localizado na Praça da Sé em São Paulo.

O Caderno CEMAP contém um relato de Fúlvio Abramo, militante da LCI e um dos impulsionadores da FUA, em comemoração aos 50 anos do anticomício realizado no dia 07 de outubro. Seu conteúdo traz informações sobre a formação da FUA e as divergências políticas que contribuíram para a sua extinção.

Os textos de Trotsky falam sobre a ascensão do fascismo na Europa, são críticas ao papel da IC neste processo. O texto de Lênin trata das divergências dentro da IC que levaram Stálin a dirigir a IC e expulsar Trotsky. Estes textos foram publicados por diversas editoras.

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O trabalho está dividido em três capítulos. Por se tratar de uma análise que tende buscar no quadro internacional aspectos e divergências apresentadas pelo PCB e pela LCI no Brasil, foi necessário estabelecer uma contextualização internacional. Esta contextualização foi contemplada no primeiro capítulo, quando apontamos o nascimento da ideologia fascista na Itália, Alemanha e Brasil. A Itália e Alemanha foram analisadas por serem os países onde surgiram as principais divergências das organizações propostas.

O segundo capítulo foi elaborado com o objetivo de apresentar a formação das duas organizações e as divergências entre Stálin e Trotsky, buscando as diferenças políticas existentes entre estas duas organizações.

No último capítulo tratamos da luta antifascista no Brasil, da organização e da atuação da FUA, com ênfase nas principais divergências entre a LCI e o PCB, no que diz respeito à ação política vinculada ao projeto de luta antifascista, até a extinção da FUA.

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1. O CRESCIMENTO DO FASCISMO 1.1. IDEOLOGIA FASCISTA

As décadas de 1920 e 1930 foram marcadas pelo crescimento da ideologia fascista e a ascensão desta ideologia, enquanto regime político em vários países do mundo ocidental. Para a compreensão desta ideologia nos apropriaremos da definição de Edda Saccomani sobre o fascismo:

um sistema autoritário de dominação que é caracterizado: pela monopolização da representação política por parte de um partido único de massa, hierarquicamente organizado; por uma ideologia fundada no culto do chefe na exaltação da coletividade nacional, no desprezo dos valores do individualismo liberal e no ideal da colaboração de classes, em oposição frontal ao comunismo, dentro de um sistema de tipo corporativo; por objetivos de expansão imperialista, a alcançar em nome da luta das nações pobres contra potências plurocráticas; pela mobilização das massas e pelo seu enquadramento nas organizações tendente a uma socialização política planificada, funcional ao regime; pelo aniquilamento das oposições, mediante o uso da violência e do terror; por um aparelho de propaganda baseado no controle das informações e dos meios de comunicação de massa; por um crescente dirigismo estatal no âmbito de uma economia que continua a ser, fundamentalmente, de tipo privado; pela tentativa de integrar nas estruturas de controle do partido ou do Estado, de acordo com uma lógica totalitária, a totalidade das relações econômicas, sociais, políticas e culturais.3

Desde os anos 20, o fascismo é discutido de diversas formas, a partir de teorias diferenciadas. E. Notl, conforme nos cita Saccomani4, divide as abordagens sobre fascismos em duas categorias distintas: singularizante e generalizante.

A abordagem singularizante considera o fascismo como um produto, uma ideologia específica da sociedade italiana, fruto de características próprias daquele país. A abordagem generalizante, que está presente na maior parte das reflexões de estudiosos contemporâneos, busca analisar, salvo as diferenças específicas entre o fascismo italiano e o nazismo alemão, o fascismo enquanto modelo de dominação essencialmente único.

Portanto, essas duas abordagens fornecem diversas formas explicativas que dependerão do nível de análise, dos fatores preferidos e a diversidade de paradigmas de cada teoria e de cada autor.

Nos apropriaremos da teoria defendida pela corrente de estudo que compreende o fascismo como dimensão internacional, fruto das contradições do sistema capitalista frente aos confrontos de classe e da crise do sistema capitalista, no seu estágio final, o imperialismo, como nos aponta ainda Saccomani: “E com a necessidade que a burguesia tem, em face ao agravamento

3 SACCOMANI, Edda. Fascismo. In: BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política. São Paulo: Imprensa Oficial,

2000, p. 466

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das crises econômicas e da exacerbação do conflito de classes, de manter o seu domínio intensificando a exploração das classes subalternas e, em primeiro lugar, da classe operária.”5

A partir desta definição podemos perceber o quão nocivo o fascismo foi para a classe trabalhadora, trabalhando para o desmantelamento de seus direitos e pelo seu enfraquecimento enquanto classe organizada, com o fim dos sindicatos e dos partidos políticos.

1.2 A CRISE ECONÔMICA: O FASCISMO EMERGE

Para a realização deste trabalho é necessário compreendermos o processo histórico internacional onde esta ideologia aflorou. Quais foram as condições políticas e sociais que levaram à ascensão de regimes fascistas na Europa e o crescimento deste sistema de dominação em vários países do mundo, inclusive no Brasil, que será o foco de nosso estudo.

Estas ideologias encontrarão um terreno fértil no período entre as duas guerras mundiais, principalmente com a crise econômica de 1929. A Primeira Guerra Mundial devastou a Europa e teve como conseqüência um “impulso à revolução mundial” sendo o epicentro a Revolução Russa de 1917 e as lutas de libertação colonial “do México à China, do Magreb à Indonésia”6. Neste quadro os EUA tinham uma situação aparentemente estável: fortaleceram sua indústria e agricultura, com aumento da produção, passaram a financiar empréstimos externos para as economias arruinadas da Europa. Não sofreram perdas com a Primeira Guerra, nem passaram pelas lutas de libertação colonial. No entanto, os EUA se tornaram o epicentro da maior crise econômica do capitalismo: a Grande Depressão de 1929.

Logo após a Primeira Guerra Mundial ocorreu um “boom na economia”, que teve como pano de fundo a destruição em massa das forças produtivas, e parecia um alento no pós-guerra. Foi um curto período na qual a situação da classe trabalhadora pareceu melhorar. O índice de desemprego diminuiu, fruto das obras de reconstrução do pós- guerra, e os trabalhadores tiveram alguns de seus direitos garantidos e os sindicatos foram fortalecidos. Esta situação preocupou bastante os governos e donos de empresa que viam uma classe operária fortalecida, tendo como conseqüência para a burguesia o “aumento dos custos de produção”, vale dizer, salários maiores e redução das horas de trabalho. O comércio mundial recuperou-se das perturbações da guerra e da

5 SACCOMANI, Edda. Op Cit, 2000. p. 470

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crise do pós-guerra se elevando a índices superiores a 1913, no fim da década de 1920.7 No entanto, o capitalismo foi atingido por uma grave crise, entrando em colapso. Nos interessa saber quais foram os fatores responsáveis por essa crise.

Para Hobsbawm, dois fatores foram importantes para essa derrocada. Primeiramente, ele lembra que, a maior das economias do mundo, os EUA, haviam se tornado praticamente auto-suficientes na área econômica. Outro aspecto é o fato de que cada Estado fazia o possível para proteger suas economias de ameaças externas, fechando suas economias para o mercado externo, dado a instabilidade financeiras de outros países, ocasionando o desmantelamento do mercado mundial.

Neste cenário, o poder de compra da classe operária diminuiu e a resposta da indústria a isso foi a redução, dos custos de produção. Como conseqüência desse processo, o desemprego aumentou, os sindicatos perderam metade dos seus membros, fazendo a balança pender para o lado dos governos e donos de empresas.

A Europa conheceu um colapso do sistema monetário, com a desvalorização das moedas e a inflação galopante. A Alemanha foi palco, em 1923, do caso mais extremo: a unidade monetária foi reduzida a um milionésimo de milhão de seu valor de 1913. As poupanças privadas desapareceram, criando um vácuo completo de capital ativo nas empresas, o que vem explicar a dependência massiva de empréstimos externos para se financiar a reconstrução da economia alemã. Em 1928, a Alemanha recebia metade de todas as exportações de capital do mundo, cerca de 20 a 30 trilhões de marcos, levando o país à uma grave crise com a Grande Depressão de 1929, devido a redução dos financiamentos externos, oriundos, principalmente de capital estadunidense e judeu.

Em 1922-23, com o objetivo de garantir a margem de lucro das empresas, o governo alemão reduziu a inflação, na tentativa de reduzir os preços. A redução da impressão de papel moeda e a própria troca da moeda trouxeram conseqüências como a pauperização das classes médias, uma vez que as economias das pessoas que dependiam de rendas fixas e poupanças foram aniquiladas. Para Hobsbawm, essa situação “deixou a Europa Central pronta para o fascismo”.8

7 HOBSBAWM, Eric. Op Cit, 2005. p. 93 8 HOBSBAWM, Eric. Op Cit, 2005. p. 95

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O índice de desemprego era elevado, mesmo nos anos de “boom” do início dos anos 1920: ficava entre 10% e 12% na Alemanha e Grã-Bretanha, 17% a 18% na Dinamarca e Noruega9. Com relação ao período da Grande Depressão (1932-33), as taxas de desemprego se elevaram a 44% na Alemanha, 23% na Grã-Bretanha, 27% nos EUA, 29% na Áustria, 31% na Noruega e 24% na Suécia. 10

A queda dos preços dos produtos primários foi fruto do descompasso entre a demanda (consumo) e a super-produção. A solução parcial encontrada pela burguesia foi promover o estoque de produtos. Mas, não foi possível evitar a queda livre dos preços:

O preço do chá e do trigo caiu dois terços, o da seda bruta três quartos. Isso deixou prostrados... Argentina, Austrália, países balcânicos, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Egito, Equador, Finlândia, Hungria, Índia, Malásia, México, Indonésia, Nova Zelândia, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela, cujo comércio internacional dependia em peso de uns poucos produtos primários. Em sua tornou-se a Depressão global, no sentido literal.11

Segundo Hobsbawm, sem a presença dos EUA não há explicação para a crise econômica mundial a partir de 1929. Fortalecendo sua economia, aumentando seus investimentos os EUA, que tinham começado a guerra como devedor a terminaram como credor, se transformando, assim, no primeiro país importador e exportador. O crescente desequilíbrio na economia internacional do pós-guerra entre os estadunidenses e o resto do mundo fez com que os EUA importassem menos e exportassem mais (capital e mercadorias). O arrocho dos salários, após os anos iniciais de “boom” no início dos anos 1920, fez com que os lucros crescessem desproporcionalmente. Como a demanda em massa não podia acompanhar o rápido crescimento “do sistema industrial de Henry Ford”, o resultado foi a superprodução e a especulação. O crack da Bolsa fez com que os países dependentes dos empréstimos externos estadunidenses (como a Alemanha) entrassem numa crise sem fim.

A classe trabalhadora foi afetada, não só pela perda do emprego, mas também da sua seguridade social. Para Hobsbawm, a situação de desemprego foi vista como uma ferida profunda e potencialmente mortal para o corpo político. Muitos governos adotaram a política do “pleno emprego”, que consistia na eliminação do desemprego em massa, adotando sob base de um

9

HOBSBAWM, Eric. Op. Cit, 2005. p. 95

10

HOBSBAWM, Eric. Op Cit, 2005. p. 97

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argumento econômico e político. Econômico, pois o pleno emprego teria um efeito estimulante nas economias em recessão e político já que o desemprego em massa poderia ser uma bomba relógio no movimento operário.

A situação de crise econômica mundial levou a Internacional Comunista a prever um levante dos trabalhadores. Mas, isso não aconteceu. Ao contrário, as conseqüências desta crise acabaram provocando em vários países a ascensão e o fortalecimento de governos fascistas, chamado por Hobsbawm de direita radical:

O fortalecimento da direita radical foi reforçado, pelo menos durante o período da Depressão, pelos espetaculares reveses da esquerda revolucionária. Assim, longe de iniciar outra rodada de revoluções socias, como esperava a Internacional Comunista, a Depressão reduziu o movimento comunista fora da União Soviética a um estado de fraqueza sem precedentes. Isso se deveu, em certa medida, à política suicida do Comintern, que não apenas subestimou grandemente o perigo do nacional-socialismo na Alemanha, como seguiu uma linha de isolamento sectário que parece incrível em retrospecto, decidindo que seu inimigo principal era o trabalhismo de massa organizado dos partidos social democratas e trabalhistas (descritos como “social-fascistas”).”12

Segundo Hobsbawm, frente à crise mundial existiam três opções políticas que competiam: o comunismo marxista, o capitalismo privado e o fascismo, que a crise de 1929 transformou em uma movimento mundial.

Dada estas opções, o fascismo foi a regime que teve maior destaque no cenário mundial na década de 1930. Vejamos os seus antecedentes políticos

1.3. ANTECEDENTES HISTÓRICOS: O FASCISMO NA ITÁLIA E A POSIÇÃO DE TROTSKY

Na Itália o fascismo chegou ao poder em 1922 através de Mussolini. A ascensão de Mussolini ao poder foi antecedida por uma vaga de greves e ocupações de fábrica em 1919 e 1920. Desde 1906 existiam na Itália conselhos de fábricas, ou seja, todos os trabalhadores se auto-organizavam, elegendo seus representantes, exigindo seus direitos no interior do próprio local de trabalho (melhores condições de trabalho, participação nos lucros, etc). Estes conselhos só seriam reconhecidos pelos patrões em 1919.

Antônio Gramsci, à época membro da fração esquerda do Partido Socialista Italiano, era o principal teórico incentivador desses Conselhos pois os via como um embrião de um “modelo do Estado Proletário” na qual se procuraria “elevar o operário de assalariado à condição de

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produtor”. Em 1919, 50.000 operários, de cerca de 30 empresas, já estavam organizados em Conselhos. Mas a reação negativa da direção reformista dos sindicatos e do PSI acusou Gramsci e seus partidários de serem “anarco-sindicalistas” e partidários do enfraquecimento do Sindicato.

Em abril de 1920, eclodiu uma greve em Turim, que foi derrotada e isolada pela direção reformista dos sindicatos vinculados à social democracia (PSI). Mesmo assim, até setembro de 1920 o movimento operário conquistou importantes vitórias frente à crise, obtendo êxito e crescimento. Mas a Social-democracia recuou e o movimento fascista cresceu, obtendo em sua primeira manifestação uma grande vitória: a tomada de Bolonha.

Depois de dois anos do seu nascimento na Itália, o fascismo ascendeu ao poder, em outubro de 1922, com uma coligação de membros da direita que desembocou no totalitarismo fascista. Em 1923, o partido fascista obteve a maioria no parlamento. Em 1926 todos os partidos foram considerados ilegais e, em 1928, as eleições ao parlamento ficaram restritas apenas aos candidatos aprovados pelos fascistas, consolidando, desta forma, o regime fascista na Itália.

Leon Trotsky fez uma análise sobre a ascensão do fascismo e atribuiu, além da traição política da social democracia, à política do PC italiano, fundado em 1920:

O Partido Comunista da Itália nasceu quase ao mesmo tempo que o fascismo (...). O Partido Comunista não tinha uma noção exata do perigo fascista, embalava-se com ilusões revolucionárias, foi irremediavelmente hostil à política da frente única, foi atingido, em suma, por todas as doenças infantis (...) Só via no fascismo uma “reação capitalista”. O Partido Comunista não discernia os traços particulares do fascismo, que a mobilização da pequena burguesia contra o proletariado representava (...) exceto Gramsci, o Partido Comunista nem mesmo admitia a possibilidade da tomada do poder pelos fascistas. Uma vez que a revolução proletária tinha sofrido uma derrota, que o capitalismo tinha sabido resistir e a contra revolução triunfar, como poderia advir ainda um golpe de Estado contra revolucionário? É em qualquer caso, impossível a burguesia insurgir contra si mesma. Foi esta a essência da orientação do Partido Comunista Italiano. 13

Além disso, Trotsky desenvolveu uma analogia entre o papel do PCI e do Partido Comunista Alemão apontando que:

A direção do Partido Comunista alemão repete hoje, quase literalmente a posição inicial do comunismo italiano: o fascismo não é nada mais do que uma reação capitalista; a distinção entre as diferentes formas de reação capitalista não tem importância do ponto de vista proletário.14

O “radicalismo vulgar” (expressão de Trotsky) dos PC’s, ou seja, afirmar que não haveria diferença entre a democracia parlamentar e o fascismo, pois ambos seriam regimes burgueses, servia de justificativa teórica para se negar a frente única entre as organizações comunistas e as

13 TROTSKY, Leon. Revolução e Contra-revolução na Alemanha. São Paulo. Editora Ciências Humanas, 1979. p.

196.

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sociais-democratas, política essa que teve como conseqüência a adjetivação da social democracia de “sociais-fascistas” pelos PC’s.

Segundo Leon Trotsky, o fascismo é uma variação do bonapartismo:

Qual é então a natureza da besta (o fascismo)? (...) é um fenômeno familiar do bonapartismo, no qual uma camarilha se mantém no poder enfrentando uma classe com a outra, dando assim um caráter autônomo temporal ao poder do Estado. Mas estes regimes totalitários modernos não são assuntos temporais (...) A burocracia nazi é uma nova classe dirigente, e o fascismo uma nova forma de sociedade comparável ao capitalismo? Também isso não parece correto (...)15

Ou seja, de acordo com Trotsky, o regime totalitário fascista só poderia ser transitório, temporário, pois: “na história uma ditadura pura geralmente foi o produto e o sinal de alguma crise social, especialmente séria, e de forma alguma, de um regime estável”.16

Trotsky fez a seguinte análise sobre o fascismo:

“1-O elemento que o fascismo tem com o bonapartismo, é que usa os antagonismos entre as classes para dar ao poder de Estado a maior independência possível. Mas sempre sublinhamos que o velho bonapartismo se deu no tempo de uma ascendente sociedade burguesa, enquanto que o fascismo é um poder de Estado da decadente sociedade burguesa.

2-Que o fascismo é uma tentativa da classe burguesa de superar, de ultrapassar a contradição entre a nova técnica e a propriedade privada, sem eliminar a propriedade privada. É a “economia planificada” do fascismo. É uma tentativa de salvar a propriedade privada e, ao mesmo tempo, de controlar a propriedade privada.

3-Para superar a contradição entre a técnica nova, moderna, das forças produtivas nas limitadas fronteiras do Estado nacional. Esta nova técnica não pode ser limitada pelas fronteiras do velho Estado nacional e o fascismo tenta superar essa contradição. O resultado é a guerra”17.

1.4 A ASCENSÃO DO NAZISMO E O PAPEL DO PARTIDO COMUNISTA ALEMÃO: AS DIVERGÊNCIAS DE TROTSKY COM A INTERNACIONAL COMUNISTA

A ascensão de Hitler na Alemanha foi um elemento crucial para entendermos o processo ocorrido no Brasil durante o começo da década de 1930 entre as duas organizações temas de nosso trabalho: a trotskista Liga Comunista Internacionalista (LCI) e o stalinista Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Trotsky, em 1931, quando organizou e dirigiu a “Oposição de Esquerda”, escreveu a respeito do crescimento da ideologia fascista na Alemanha, as diferenças entre democracia e burguesia-social, democracia e fascismo e o papel do Partido Comunista Alemão frente a esta situação.

15 TROTSKY, Leon. Em defesa do Marxismo. In: Sobre o Partido Operário. 1940. P. 208 16 TROTSKY, Leon. Op. Cit, 1940. P. 28

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Sem deixar de responsabilizar a social democracia por abandonar a luta pela revolução, Trotsky afirma que entre a social democracia e o fascismo há uma contradição:

A social democracia que, hoje, é o representante principal do regime parlamentar burguês, apoia-se nos operários. O fascismo porém apóia-se na pequena burguesia. A social democracia não pode ter influência, sem as organizações operárias de massa. O fascismo porém, não pode consolidar seu poder de outra forma senão destruindo as organizações operárias. A arena principal da social democracia é o parlamento. O sistema do fascismo é baseado na destruição do parlamentarismo.18

Para Trotsky a chave da situação mundial estava na Alemanha, para ele a Internacional Comunista e o PC Alemão tinham uma responsabilidade frente ao avanço do fascismo, já que se propunham como único partido proletário e tinham um papel significativo na vida política alemã. Para Trotsky, o PC deveria ter unificado a classe operária em combate ao fascismo. Porém o PC optou por medidas que impediram o combate ao fascismo. Entre elas, podemos destacar:

1-A recusa a Frente Única (eleitoral, sindical, e política) entre as organizações operárias com a denominação da social democracia pelos PC’s de “sociais fascistas”,

2-O “plebiscito vermelho” (de 21/07/1931) na qual o PC apresentava uma série de reivindicações ao governo social democrata e, caso houvesse recusa, o PC tomaria em suas mãos a organização de um plebiscito pela deposição do governo, na qual tiveram o apoio dos fascistas.

3- A recusa da IC em agir frente ao crescimento do fascismo.

Por isso Trotsky passou a fazer da defesa da Frente Única a sua principal proposição:

O fascismo cairia, de fato, em pedaços, se o PC fosse capaz de fazer a união da classe operária, transformando-a em poderoso pólo de atração de todas as massas oprimidas da população. Mas a política do PC, desde as eleições de setembro, só tem feito agravar a sua inconsistência: frases declamatórias sobre o “social fascismo”, namoro com o chauvinismo, imitação do fascismo autêntico com o objetivo de fazer-lhe concorrência no mesmo mercado, e essa aventura criminosa do “referendum vermelho”, tudo isso impede que o PC se torne um ou guia do proletariado e do povo.

Para Trotsky o combate ao fascismo esteve nas mãos do PC, organizando a classe trabalhadora. E apenas a unidade das organizações da classe trabalhadora poderia abrir a via para a revolução proletária. Para Trotsky, isso significava que:

o ponto de partida da luta contra o fascismo não [era] a abstração do Estado democrático, mas as organizações vivas do próprio proletariado, nas quais esta[va] concentrada toda a sua experiência e que prepara[va]m o seu futuro. 19

Trotsky propõe a política de Frente Única, pois para ele é uma questão de sobrevivência da classe operária e de suas organizações. Esta frente única consistia em uma unidade operária

18 TROTSKY, Leon. Op. Cit., 1979.

(19)

entre os sociais-democratas, anarquistas e comunistas pelo combate ao fascismo. Para Trotsky a defesa do proletariado alemão esteve na mão do PC.

Esta análise de Trotsky teve repercussão direta na construção da Frente Única Antifascista no Brasil (FUA) e na Liga Comunista Internacional (LCI). Foi com base nos textos de Trotsky que a LCI embasou a discussão a respeito da FUA e também será a partir desta análise que analisaremos o crescimento e o combate ao fascismo no Brasil entre 1930 e 1935.

1.5 O SURGIMENTO DA AÇÃO INTEGRALISTA BRASILEIRA NO BRASIL

A ideologia fascista ocupou um papel de destaque no cenário político brasileiro na primeira metade da década de 1930. Segundo Marcos Chor Maio:

O período entre 1930 e 1937 se caracteriza por um quadro de imprevisibilidades no terreno político. O ambiente de indefinições que compreendeu o intervalo entre a crise de hegemonia das oligarquias de República Velha e o fechamento político que culmina no Estado Novo favoreceu o surgimento de projetos radicais e mobilizantes que tentaram galvanizar a sociedade com a idéia de mudança.20

Este primeiro momento do Governo Vargas (1930- 1937) será detalhado no segundo capítulo. Mas cabe notar, como o próprio Maio aponta, as indefinições deste período contribuíram para o surgimento de políticas radicais como a criação da Ação Integralista Brasileira, organização fundada em 1932, através do“Manifesto de Outubro”. A AIB foi formada com base em pequenos grupos e partidos de extrema direita como: Ação Social Brasileira, Legião Cearense do Trabalho, Partido Nacional Sindicalista e a Ação Imperial Pátrio-novista (de cunho monarquista). Estes partidos ou grupos organizavam-se de modo independente antes da formação da AIB, tendo alguma aproximação com a ideologia fascista. A AIB representou a ideologia, a organização e a ação política dos movimentos e partidos fascistas surgidos entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Para Maio, mesmo que a AIB tenha durado apenas seis anos ela foi “a mais importante organização fascista da história do Brasil”.

Cabe apontarmos a origem social dos militantes da AIB. Hélgio Trindade21, quando escreve a respeito das origens sociais dos simpatizantes do integralismo, divide-os em: dirigentes nacionais/ regionais e dirigentes/ militantes locais. Ele encontrou nos dirigentes nacionais e regionais da AIB sujeitos oriundos das classes médias urbanas em ascensão, representados por

20 FERREIRA, Jorge. O Brasil Republicano 2. In: MAIO, Marcos Chor. Ação Integralista Brasileira: um movimento

fascista no Brasil (1932-1938). Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2003. p. 41

(20)

uma pequena burguesia intelectual formada por profissionais liberais ideologicamente voltados para a direita e uma pequena porção de jovens oficiais das forças armadas, motivados pelo tenentismo.

A criação da câmara dos quarenta e, posteriormente, a câmara dos quatrocentos introduzirá uma mudança sócio-profissional na direção da AIB. As eleições presidenciais ocasionaram uma mudança na AIB, que procurou conquistar maior credibilidade junto à burguesia, tornando-se menos sindicalista e revolucionária para se adaptar às vias eleitorais liberais.

A classe média urbana intelectual possuía 57,1% dos cargos das direções nacionais e regionais, a burguesia 13,3% e os oficiais 8,7%. Restando à pequena burguesia não intelectual uma participação de 15,2% dos dirigentes.

O Grupo de dirigentes militantes locais apresentava uma composição mais diversa. Mas majoritariamente o grupo da pequena burguesia, formado por burocratas de setores públicos e privado, compunha 40% dos dirigentes e militantes locais. Desta forma Trindade conclui

Portanto, o conjunto da estrutura social da AIB pode ser sintetizado por uma pirâmide formada de três camadas conforme o grau de participação nacional, regional ou local. A camada superior, constituída pelos dirigentes nacionais é integrada exclusivamente por membros da burguesia e média burguesia, sob a supremacia das elites intelectuais. A camada média dos dirigentes regionais encontra-se ainda sob a prepoderância da média burguesia intelectual que, com a burguesia e média burguesia dos oficiais, ocupa quase os três quartos dos postos da direção. A participação neste nível de integralistas oriundos da pequena burguesia e das camadas populares não ultrapassam a um quarto do total. Na camada inferior, a pequena burguesia e as camadas populares foram globalmente aos três quartos do total de militantes locais. E essa estratificação social é análoga à estrutura paramilitar da organização da milícia: as elites intelectuais detêm o “comando” e as camadas médias e populares não intelectualizadas constituem a “tropa”.22

Hélgio Trindade também apontou o fato da estrutura social integralista ser correspondente aos modelos fascistas europeus. Entretanto, a situação da classe média européia e da brasileira se distinguiam. Na Europa, a classe média se sentia ameaçada no seu status pela crise econômica ou pela “agressividade da luta operária”. Enquanto no Brasil a classe média se encontrava em rápida ascensão social e à procura do poder.

Com esta situação a classe média brasileira via a ausência de um projeto político que tirasse o poder das classes dominantes e se questionam sobre qual posição seguir: o fascismo ou o comunismo. Parte do grupo inclinou-se para a AIB e parte para a Ação Nacional Libertadora (ANL)23.

22 TRINDADE, HÉLGIO. Op. Cit. 1974. p. 145. 23 Aliança Nacional Libertadora

(21)

Outro aspecto importante da pesquisa de Trindade a respeito do integralismo, e relevante para o nosso trabalho, foi a questionário aos componentes da AIB acerca das motivações que os levaram a aderir à AIB, do qual teve o seguinte resultado:

MOTIVAÇAO DE ADESÃO À AIB DOS DIRIGENTES E MILITANTES DE BASE (em números absolutos)

Anticomunismo 65

Simpatia pelos fascismos europeus 56

Nacionalismo 50

Oposição ao sistema político da época 39

Valores Autoritários 24

Valores Espirituais 23

Corporativismo 18

Desenvolvimento do país 13

Anti- semitismo 05

Fonte: TRINDADE, Hélgio. Op. Cit. 1974. p. 61

Dado este quadro podemos tirar conclusões próximas às de Trindade, no que diz respeito à inspiração da AIB e de seus integrantes nos movimentos fascistas europeus. Trindade conclui que ao responderem que a motivação de aderir a AIB foi o anticomunismo, provavelmente estas pessoas se referiram ao anticomunismo europeu, já que o PCB terá expressão nacional apenas em 1935 com a criação e o crescimento da ANL.

Dois aspectos são centrais para entendermos o caráter deste grupo e a sua relevância para o período estudado. Cabe ressaltar que a origem social dos componentes e sua hierarquia. Podemos notar que este grupo se adaptou aos interesses políticos momentâneos, como foi o caso mostrado por Trindade das eleições presidenciais e da sua aproximação com a burguesia.

Outro aspecto será a influência do fascismo europeu e do anticomunismo na AIB. No decorrer neste trabalho utilizaremos esta aproximação, principalmente no que diz respeito às práticas utilizadas por este grupo.

Foi a AIB que organizou as manifestações de cunho fascista que o movimento operário se contrapôs durante todo o período analisado, construindo uma resistência a essa ofensiva.

(22)

2. O PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO E A LIGA COMUNISTA INTERNACIONALISTA: DIVERGÊNCIAS

Para analisarmos o movimento antifascista, a LCI e o PCB, nos primeiros anos do Governo Vargas, é necessário compreendermos o processo que desembocou na “revolução de 1930”, o contexto da luta de classes no Brasil onde a política fascista emerge, é fundamental apontarmos as divergências entre os trotskistas e os stalinistas na URSS e sua repercussão nas duas organizações citadas.

2.1 A “REVOLUÇÃO DE 1930” E OS PRIMEIROS ANOS DO GOVERNO VARGAS:

Antes da “revolução de 1930”, quem dominava o cenário econômico brasileiro eram as oligarquias cafeeiras através do sistema de alternância do poder conhecido como “República do café-com-leite”, entre os estados de Minas Gerais e São Paulo que definia o cenário político. Aos poucos estas oligarquias foram se enfraquecendo economicamente e como conseqüência, perdendo seu espaço político. Com isso a classe com possibilidades de “ocupar” este vazio de poder seria a burguesia industrial. Contudo, por ser uma classe ainda em formação, não havia proposições comuns que solidificassem a burguesia industrial enquanto tal.

Boris Fausto24 nega a tese que a “revolução de 1930” teria sido um movimento que procurou ascender a burguesia industrial ao poder, ou então uma revolução feita pelas classes médias, como propõem alguns historiadores. Na verdade, o que acabou acontecendo foi um rearranjo do poder pelas classes dominantes. Este rearranjo foi a expressão do desenvolvimento econômico desigual, fruto da inserção do Brasil na esfera do sistema capitalista internacional e na sua dependência ao capital internacional. Desta forma, não havia oposição entre as oligarquias da terra e da indústria, ou seja, com o movimento de 1930 não houve uma substituição de uma fração de classe por outra. Segundo Boris Fausto:

Na área econômica, embora retire o comando dos negócios cafeeiros da esfera estadual, com o esvaziamento das funções do Instituto do Café do Estado de São Paulo e a criação do Conselho Nacional do Café (1931), mais tarde Departamento Nacional do Café (1933), o governo não pode deixar de atender os interesses do setor, pois o café, ainda que em crise, continua a ser o núcleo fundamental da economia. Sem dúvida, a política de destruição do produto pela queima, que se estende de junho de 1931 a julho de 1944, impõe restrições aos cafeicultores, mas impede o colapso total. 25

24 FAUSTO, Boris. A Revolução de 30: historiografia e história: São Paulo, Companhia da Letras: 2002 25 FAUSTO, Boris. Op Cit. P. 137

(23)

A nova forma de Estado que se configurou após 1930 - mais centralizado, intervencionista - foi uma condição básica para a expansão das atividades industriais mesmo quando submetida ao capital externo. Ou seja, foi necessário que o núcleo dominante do ponto de vista econômico perdesse o comando do Estado para que este se “abrisse” aos grupos técnicos da nova classe média, à influência dos setores militares, que deram forma a algumas medidas condizentes a um desenvolvimento autônomo sob a pressão dos movimentos populares. Os incentivos à diversificação da produção no governo Vargas, ao mesmo tempo em que atendem às reivindicações das classes dominantes divorciadas do setor cafeeiro, não possibilita uma identificação política imediata do governo com estas classes.

De acordo com Boris Fausto26, o exército teve um papel importante, pois garantiu a existência do “Estado de compromisso”, baseado na aparente inexistência de oposições radicais e do atendimento de interesses das diversas frações de classe (da burguesia agrária à industrial) ao mesmo tempo em que o Estado manteve o atrelamento das organizações operárias. Para Boris Fausto o exército sustentou o regime não como representante de classes médias, mas como estrato unificador das várias frações das classes dominantes.

Boris Fausto ressalta que a consolidação do novo governo dependia da homogeneização do aparelho militar. Isso implicou na liquidação do “tenentismo” como força política autônoma.

O “Estado de compromisso”, fruto do rearranjo nas relações internas das classes dominantes, significou uma maior centralização, um intervencionismo ampliado não apenas restrito ao setor cafeeiro, o estabelecimento de uma certa racionalização no uso de algumas fontes fundamentais de riqueza pelo capitalismo internacional (Código de Minas, Código de Águas, incentivo ao consumo de produtos nacionais, criação do Conselho Federal de Comércio Exterior).

A maior centralização foi facilitada pelas alterações institucionais que colocaram fim ao sistema oligárquico (sistema do “café-com-leite”) porém, não significou o fim dessas oligarquias. As fontes de poder dessas oligarquias (grandes propriedades) permanecem intocadas, no entanto, essas oligarquias passaram a serem subordinadas do Poder Central perdendo o controle direto que tinham nos Estados onde foram instalados interventores federais oriundos do tenentismo.

(24)

As necessidades desse novo Estado que se abriu, ou que se equilibrou sobre todas as pressões e tendo, sobretudo, que enfrentar às velhas práticas da oligarquia cafeeira levou, posteriormente, a influências de ideologias autoritárias. Essas ideologias serão fruto, do ponto de vista das classes dominantes, da necessidade de desenvolvimento econômico capitalista, num país dependente como o Brasil, mas que fundamentalmente não rompeu com o processo histórico procurando sempre rearranjar os interesses destas classes.

Como aponta Boris Fausto27, o Estado que emergiu da revolução de 1930 manteve o papel fundamental de desorganizador político da classe operária, reprimindo sua vanguarda e suas organizações partidárias ao mesmo tempo em que procurava estabelecer com o conjunto da classe um “novo” tipo de relações: através do atrelamento das organizações operárias junto ao Estado, que será a base para a implantação da política do populismo.

2.2 O PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO

A análise do Partido Comunista Brasileiro parte da forte presença do anarquismo dentro do movimento operário brasileiro e da sua vanguarda.

Entre os teóricos anarquistas no Brasil reinava uma grande confusão ideológica que será expressa de maneira mais clara na relação dos anarquistas brasileiros com a revolução russa de 1917.

De acordo com Bandeira: “A revolução russa introduziu no movimento operário brasileiro, novas idéias, novos conceitos, novas palavras, embora, inicialmente de forma vaga e confusa (...) Os militantes anarco-sindicalistas saudavam-na como a realização da utopia libertária”. 28

Em 1919 os anarquistas Hélio Negro e Edgard Leuenroth publicaram um brochura intitulada “O que é o maximismo ou bolchevismo?”. Como “bolche” em russo significa máximo e “menche” quer dizer mínimo a tradução de bolchevismo para o português segundo os dois autores era “maximismo” e menchevismo era “minimismo”.

Com a notícia da fundação da Internacional Comunista (a 3ª Internacional) em março de 1919, na qual se orientava a constituição de Partidos Comunistas em cada país, os militantes

27

FAUSTO, Boris. Op Cit, 2002.

28BANDEIRA, Moniz et alli. O Ano Vermelho: A Revolução Russa e seus reflexos no Brasil. Rio de Janeiro:

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anarquistas que se consideravam “maximalistas” e se identificavam com o regime soviético decidiram fundar no mesmo ano o efêmero Partido Comunista do Brasil. Nos dias 21, 22 e 23 de junho de 1919 realizou-se a Conferência para constituir o PCB. Porém era um partido comunista anarquista, com uma estrutura organizativa totalmente anarquista, sem centralização, federalizado, com ampla autonomia entre os organismos. Posteriormente, com o desenvolvimento da situação na Rússia, com a influência da literatura marxista que passa a ganhar adeptos entre ex-militantes anarquistas e da oposição dos anarquistas às medidas do governo bolchevique, o PC anarquista foi dissolvido.

No entanto de acordo com Bandeira:

Era a primeira vez que os anarquistas procuravam agrupar numa só organização nacional, os diversos núcleos que existiam pelos Estados. Tentavam a unidade sob a inspiração do que se passava na Rússia. E plantavam, dessa forma, as sementes do futuro Partido Comunista do Brasil. 29

Desde 1921 porém, militantes já se distanciavam do anarquismo, desenvolvendo atividades para se constituir no Brasil um PCB com base nos princípios da 3ª Internacional. No Brasil, militantes (entre os quais os ex-anarquistas Astrojildo Pereira, João da Costa Pimenta, Antônio Canellas) decidiram criar um movimento por um Partido Comunista. Em 7/11/1921 é criado o “Grupo Comunista” que lança uma revista intitulada “Movimmento Comunista”.

Em 1922 grupos comunistas de Porto Alegre, Recife, São Paulo, Cruzeiro-SP, Niterói e Rio de Janeiro realizaram um congresso nacional para a fundação de um partido comunista no Brasil. O Congresso de fundação do PCB se realizou nos dias 25, 26 e 27 de março no Rio de Janeiro e contou com 9 delegados representando 130 militantes. Abílio Nequete participou como membro do Partido Comunista Uruguaio e membro da Agência de Propaganda para a América do Sul da Internacional Comunista.

Neste congresso foram discutidos os 21 pontos de admissão à Internacional Comunista, aprovados por unanimidade e também, foi aprovado um estatuto com base no estatuto do Partido Comunista Argentino:

As 21 condições foram examinadas e aceitas por todos. Os estatutos do partido, que se baseavam nos do Partido Comunista Argentino, foram elaborados, discutidos e provisoriamente aceitos no dia 2730.

Declarava-se no texto que o Partido Comunista, Seção Brasileira da Internacional Comunista, tinha por fim promover o entendimento, a ação internacional dos trabalhadores e a organização política do proletariado em partido de classe, ‘para a conquista do poder e conseqüente transformação política e econômica da sociedade capitalista em comunista’. A Comissão Executiva Central, segundo os estatutos, se comporia de

29 BANDEIRA, Moniz et alli. Op Cit. P. 167 30

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cinco membros titulares e cinco suplentes, devendo manter ‘o mais rigoroso controle político sobre todos os organismos do partido’31.

Neste Congresso, Antonio Canellas foi eleito o titular da Comissão Executiva Central e representante do PCB no IV Congresso Mundial no fim de 1922 em Paris. Neste Congresso, Canellas divergiu, primeiramente, com a preocupação de Trotsky a respeito da presença da maçonaria dentro do PC Francês e sua posição de declarar “guerra à maçonaria”. Posteriormente corrigiu uma tese de Lênin sobre os anarquistas da América do Sul. Desta forma, Canellas votou em duas resoluções contrárias à da executiva da Internacional Comunista. Dulles descreve a conseqüência do posicionamento de Canellas:

Em dezembro de 1922 o Comitê Executivo da Terceira Internacional publicou um relatório em que declarou não constituir o PCB um verdadeiro Partido Comunista. ‘Ele conserva restos de ideologia burguesa alimentados pela presença de elementos da maçonaria e influenciados por preconceitos anarquistas, o que explica a estrutura descentralizada do Partido e a confusão reinante sobre a teoria e a tática comunistas’32.

Considerando que Canellas não estava ‘livre da confusão ideológica que havia em seu Partido’33 a

Internacional, portanto decidiu aceitar provisoriamente o PCB dentro do seu organismo, como um ‘partido simpatizante’, e esperando que a situação se resolvesse através da Agencia de Propaganda para a América do Sul da Terceira Internacional. 34

Antônio Canellas ainda debateu estas resoluções do dia 06 de junho de 1923 na Comissão Executiva do PCB. Esta comissão adotou uma resolução que negava qualquer influência no Partido da maçonaria. A Comissão Executiva elaborou duras críticas a Canellas, apontando que ele não havia representado a política do PCB no Congresso. Canellas se retirou desta reunião e publicou críticas a Octávio Brandão e ao PCB35. Em dezembro de 1923 foi expulso do partido.

Segundo Dulles, em janeiro de 1924 Rodolfo Ghioldi veio para o Brasil como delegado da Comissão Executiva da Internacional Comunista onde foi posto a par da posição a respeito de Canellas e da maçonaria. Ghioldi elaborou um relatório que favoreceu o PCB frente à IC, decidindo o envio de Rodolfo Coutinho como representante em Moscou. Ao que parece Astrojildo Pereira também foi a Moscou no V Congresso da IC. Neste congresso o PCB conseguiu sua filiação.

31 Dos Estatutos do Centro do Partido Comunista do Brasil, cujo registro sob títulos das Sociedades Civil foi

publicado na página 6.970 do Diário Oficial da União, 7 abr. 1922, reproduzido em [Luis Alberto] Moniz Bandeira, Clóvis Melo e A. T. Andrade, O Ano Vermelho: a Revolução Russa e seus reflexos no Brasil, pp. 294-296. (nota original do autor)

32 Estudos I, nº 2, mar. 1971, pp. 93 e 95. (nota original do autor)

33 BANDEIRA, Moniz, et alli., O Ano Vermelho, p. 408, (nota original do autor)

(27)

Ângelo José da Silva aponta para as dificuldades que o PCB passou em realizar congressos partidários até 1930, para este autor a falta de discussão e elaboração política deixaram marcas no PCB.

A atuação do PCB se deu na frente sindical e na via parlamentar através do Bloco Operário Camponês (BOC)36, buscando implementar as resoluções do II Congresso do Partido, realizado em maio de 1925, nestas áreas. As orientações da IC davam-se no sentido de utilização das instituições parlamentares burguesas apenas para a propaganda comunista, visando à destruição desses Parlamentos.

Segundo Karepovs, no seu início, o PCB não priorizava a atuação parlamentar devido, principalmente, ao legado anarco-sindicalista. Com o BOC, no entanto, a partir de 1924, ocorrerá o lançamento de candidaturas operárias de forma independente, através da agitação de plataformas de reivindicações dos trabalhadores.

Para Karepovs, a tarefa do BOC portanto, era conjugar o trabalho eleitoral, o trabalho sindical, a educação política dos trabalhadores, fortalecendo a consciência de classe. A política tornava-se apenas um meio pelo qual o PCB, através do BOC, deixava de ser uma organização com fins eleitorais para ser um organismo para a conquista do poder, para a revolução.

Para Silva, a maior dificuldade do PCB na década de 1920 foi a linha da IC, que desmantelou a direção do PCB às vésperas da Revolução de 1930. Essa desarticulação provinha da linha do “obreirismo” ou seja, afastar todos os intelectuais da direção do Partido pois, segundo a linha política, seria necessário “proletarizar” o partido, visando afastar as influências pequeno-burguesas da direção do PCB. Na verdade tratava-se de adequar o PCB à linha política da IC.

A forma que o PCB expressou sua política –na ilegalidade ou não- exprimindo suas opiniões para os trabalhadores foi através dos jornais “Movimento Communista” e depois “A

Classe Operária”, este a partir de 1925. A partir de 1930 observamos nestes jornais seu completo alinhamento com a política da 3ª Internacional, já stalinizada. A Dissolução do BOC pelo executivo da IC será o grande exemplo do alinhamento do PCB à política do grupo majoritário que controlava a Internacional, o grupo de Stálin.

36 O nome “Bloco Operário” era inspirado na orientação político-eleitoral que Leon Trotsky havia proposto na

reunião da Executiva da IC em junho de 1922 ao Partido Comunista Francês. O “Bloco Operário” no Brasil será chamado de BOC (Bloco Operário e Camponês) em 1927 e, de BOCB (Bloco Operário e Camponês do Brasil) em 1929.

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2.3 O FIM DO BLOCO OPERÁRIO CAMPONÊS

Segundo Karepovs, as conquistas políticas e eleitorais do BOC, como a eleição dos vereadores Minervino de Oliveira e Octávio Brandão no Rio de Janeiro em 1928; o impulso que as entidades sindicais e operárias filiadas ao BOC37 deram para a constituição em 1929 da Confederação Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB); o crescimento organizativo do BOC (em 1929, no seu Primeiro Congresso, o BOC representava 44 organizações operárias de 12 estados brasileiros); o acréscimo do número de militantes ao PCB (cerca de 1.000 em 1927) eram fruto do que, segundo Karepovs: “(...) podemos considerar que a organização do BOC apresentou algo diferente e novo ao mundo político-eleitoral do final dos anos 1920: um organismo político, permanente, que não mais funcionava, como as demais organizações partidárias até então existentes, apenas às vésperas da eleição”38.

Mesmo com estes avanços a IC, no seu VI Congresso em julho de 1928, decidiu por uma nova orientação para o Brasil que resultará no fim do BOC. Este Congresso consolidou a hegemonia do grupo de Stálin sobre o grupo de Leon Trotsky (este e vários membros da oposição já haviam sido expulsos por Stálin do Partido, em 1927).

O VI Congresso em total oposição as orientações do III e IV Congressos (de 1921 e 1922) impôs um curso “esquerdista” para a IC. Em 1921 e 1922 as resoluções da IC (com Lênin e Trotsky à frente) defendiam a necessidade da frente única operária com a social-democracia e a necessidade de se formar “governos operários e camponeses”. A constatação partia do refluxo e da derrota das revoluções européias (fracasso da revolução alemã de 1918, da revolução húngara de 1919, das revoluções italiana e francesa em 1920) e pelo fato da social democracia (apesar de ter traído as revoluções a partir de 1914) ainda ser o partido majoritário da classe operária.

As teses aprovadas pelo grupo de Stálin partiram da apreciação de “radicalização das massas”. Era a política que a IC passou a chamar de “Terceiro Período”. O primeiro, de 1917-1923 seria de “ascenso revolucionário e de crise do capitalismo”; o segundo de 1917-1923-1927 seria de “estabilização do capitalismo” e o terceiro seria segundo Karepovs: “...o de uma estabilização

37 Não existiam filiações individuais ao BOC, apenas por Entidades de proletários e camponeses que se reunia uma

vez por mês através de uma Assembléia de delegados eleitos nas Entidades e que elegia um Comitê Central. Em 1929 ocorre o Primeiro Congresso do BOC.

38

KAREPOVS, Dainis. A Classe operária vai ao Parlamento: O Bloco Operário e Camponês do Brasil

(29)

relativa do capitalismo (...) ao lado de um novo crescimento das formas socialistas da economia na URSS, a qual levaria à quebra da estabilização capitalista e a uma agravação da crise geral do capitalismo. Em termos práticos, tais orientações decretavam a morte política da frente única”. 39

No período ocorrido entre o V e o VI Congressos da IC, realizados em 1924 e 1928. respectivamente, surge como teoria oficial a teoria stalinista do “socialismo num só país” que, em linhas gerais, significava “não ficar esperando pela revolução mundial” mas sim supostamente “construir o socialismo nas fronteiras da URSS”. O VI Congresso dividiu os países em 3 categorias: os desenvolvidos, os de nível médio e os coloniais e semi-coloniais. Para países coloniais e semi-coloniais como o Brasil, que se encaixava na última definição, a revolução proletária só seria possível através de uma série de etapas preparatórias, objetivando primeiro se chegar a revolução democrático-burguesa e depois à revolução socialista. Foi a consagração da “revolução por etapas”.

Foi, no entanto, no 10° Plenário da Executiva da IC –após o afastamento de Bukhárin da Executiva da IC por Stálin- realizados de 3 a 19 de julho de 1929, que surge como conseqüência da orientação “esquerdista” a tática do combate a social-democracia, classificada de “social-fascista”.

De acordo com Karepovs:

As orientações esquerdistas da IC ao longo dos anos de 1930 redundaram, no caso brasileiro, no afastamento de praticamente toda a direção que havia fundado o partido, além de uma orientação extremamente sectária. No campo internacional, o resultado mais desastroso dessa nova orientação política foi, sem dúvida alguma, propiciar a ascensão de Hitler ao poder na Alemanha em 1933, em razão da recusa de realizar uma aliança com a social democracia40.

Entre 29/12/1928 e 4/01/1929 ocorreu o III Congresso do PCB onde foram aprovadas as teses do VI Congresso da IC. As teses do III Congresso do PCB afirmavam que havia no Brasil uma aliança da burguesia industrial (apoiada pelos EUA) e a burguesia agrária (apoiada pela Inglaterra) ao lado de uma radicalização das massas. A “radicalização das massas” segundo o PCB, explodiram com as revoltas tenentistas de 1922 e 1924 e a Coluna Prestes.

O PCB procurou então se aproximar do Partido Democrático, visando o diálogo com os tenentes, a pequena burguesia e a Coluna Prestes. O objetivo de tal tática: a revolução democrático-burguesa no Brasil. No entanto, o Comitê Regional do BOC de São Paulo foi duramente criticado pelo Comitê Central do BOC pela retirada das candidaturas operárias do

39 KAREPOVS, Dainis . Op. Cit. 2006, Pg. 120 40 KAREPOVS, Dainis . Op. Cit. 2006, Pg. 122-123

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Bloco, em proveito dos candidatos do Partido Democrático nas eleições de 1928 na capital paulista. 41

O VI Congresso da IC e o 10° Plenário da Executiva da IC, através do suíço Jules Humbert-Droz, apresentou uma resolução ao PCB na qual se alertou sobre o risco dos comunistas perderem a direção do BOC levando-o ao eleitoralismo e o fato dos militantes do PCB diluírem o Partido no interior do BOC, sem manifestar-se publicamente.

O Secretariado Sul Americano-Internacional Comunista enviou uma carta ao PCB na qual se reiteravam os argumentos para que os comunistas não se diluissem no interior do Bloco e que os tenentes e a Coluna Prestes haviam “perdido sua influência sobre as massas” e que os comunistas estavam se tornando o “guia único do movimento revolucionário”. No entanto segundo Karepovs, a onda de prisões e invasões na sede do BOC e apreensões do jornal “A

Classe Operária” reforçam, num primeiro momento, a postura dos comunistas de não atuarem abertamente pelo PCB no interior do BOC, ignorando a carta do SSA-IC.

O IC passou a pressionar o PCB. Em setembro de 1929, uma Carta Aberta do SSA-IC aos partidos comunistas da América do Sul criticou o fato do conjunto dos partidos “não ter discutido as decisões e a linha política fixada pelo VI Congresso da IC”, e alertava sobre o “social-fascismo” e os “perigos de direita” nos partidos comunistas. Há que se destacar ainda, segundo Karepovs, que “Embora alguns dos principais dirigentes da IC como Humbert-Droz e Ruggero Griecco, considerassem que, com exceção da Argentina, não existiam nem partido nem tradições social-democratas na América Latina, o SSA-IC, por meio de uma ginástica semântica, transformou os partidos democráticos e nacionalistas em socialistas”. 42

Como a orientação do “Terceiro Período” foi denunciar os sociais democratas como sociais-fascistas o SSA-IC ao fazer a “ginástica semântica”, passou a criticar a política de aproximação do PCB com os tenentes, a Coluna Prestes, o Partido Democrático, os setores reformistas (Partido Socialista Brasileiro (PSB), ao invés de denunciá-los abertamente como traidores e, com uma menção expressa ao BOC, passa a criticá-lo pelo fato do Partido Comunista ficar “ocultado”43.

A campanha presidencial de 1930, com a vitória do situacionista Júlio Prestes sobre Getúlio Vargas (que não se concretizou abortada pelo movimento revolucionário de 1930) foi a

41 CARONE, Edgard. Movimento Operário no Brasil (1877-1944). São Paulo: DIFEL, 1977. P.541-543. 42 KAREPOVS, Dainis . Op. Cit. 2006, P. 135

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despedida do BOC e, terminou como começara em 1924: com fraudes, repressão da polícia, prisões, dissolução de comícios, o confisco da documentação eleitoral e de cédulas. O resultado é que, diferente dos anos de 1927 e 1928, o BOC não conseguiu organizar a “boca de urna”, não conseguiu nomear fiscais, não se fez colagens de materiais e divulgação de panfletos.

A morte do BOCB não tem uma data específica. As reações a sua dissolução foram de revolta. Octávio Brandão, vereador pelo BOC e militante do PCB afirmará:

Foi uma discussão horrível. Eu digo: ‘Mas como?! O Bloco Operário e Camponês nos deu uma vitória e uma organização de massas. Tem sessenta comitês nos sindicatos, nas fábricas. Como é que nós vamos liquidar uma organização de massas?’ Ele (Brandão refere-se a Astrojildo Pereira) cumpriu passivamente as decisões do Bureau da Internacional Comunista em Buenos Aires (Brandão refere-se ao SSA-IC), e foi liquidado o Bloco Operário e Camponês44.

O jornal “A Luta de Classe” de julho de 1930, órgão do trotskista “Grupo Comunista Leninista”, que reuniu militantes expulsos do PCB e que aderiu às teses da Oposição de Esquerda Internacional trazidas ao Brasil por Mário Pedrosa, transformando-se na LCI (Liga Comunista Internacionalista), protestará a respeito do manifesto publicado no jornal do PCB que dissolvia o BOCB:

Quem ler o manifesto fica numa dúvida cruel. Terá o Bloco Operário e Camponês delegado poderes ao Partido Comunista para falar em seu nome? Terá o Partido passado por cima da direção do Bloco? Será que o presídio do partido seja a mesma comissão dirigente do Bloco? Será que o Partido Comunista e o Bloco Operário e Camponês constituem uma única organização com dois nomes diferentes? Para que, porém os dois nomes?”45

Segundo a análise de Karepovs:

a morte do BOCB já vinha se processando desde o instante em que começou a ser implantada a política do ‘Terceiro Período’ no âmbito da IC, a qual, pelo seu esquerdismo, se chocava com a política do PCB de aliança com os setores médios da população. Ao mesmo tempo, ainda no terreno da IC, o processo de controle e centralização dos partidos comunistas em escala planetária por parte do grupo stalinista, homogeneizando-os em ‘tipos de partidos’ que tinham que seguir ‘receitas’ de revolução, resultou em um domínio intransigente sobre a orientação política desses partidos. No caso do PCB, essa radicalização levou-o alevou-o islevou-olamentlevou-o plevou-olíticlevou-o em relaçãlevou-o ás clevou-orrentes plevou-olíticas clevou-om as quais vinha tentandlevou-o se relacilevou-onar e, alevou-o mesmo tempo, produziu um acirramento por parte da repressão policial. Nesse meio tempo surgiu a Aliança Liberal que acabou se apropriando de algumas das propostas do BOCB, descaracterizando-as o que acelerou ainda mais seu isolamento”.46

2.4 AS DIVERGÊNCIAS ENTRE TROTSKY E STÁLIN

44 BRANDÃO, Octávio. APUD. KAREPOVS, Dainis . Op. Cit. 2006, P 164 45 KAREPOVS, Dainis . Op. Cit. 2006, P. 164

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