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ECLI:PT:STJ:2007:07B2142.1A

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ECLI:PT:STJ:2007:07B2142.1A

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2007:07B2142.1A

Relator Nº do Documento

Salvador Da Costa sj200706280021427

Apenso Data do Acordão

28/06/2007

Data de decisão sumária Votação

unanimidade

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso

Público

Meio Processual Decisão

Revista negada a revista

Indicações eventuais Área Temática

Referencias Internacionais Jurisprudência Nacional Legislação Comunitária Legislação Estrangeira Descritores

seguro-caução; contrato de locação financeira; incumprimento do contrato; resolução do negócio; solidariedade; procedimento cautelar; veículo apreendido;

(2)

Sumário:

1. No contrato de locação financeira, vincula-se o locador a adquirir ou a mandar construir o bem locando que o locatário pode ou não adquirir findo o contrato de locação financeira.

2. O contrato de seguro-caução é atípico, a favor de terceiro, consubstanciado na tríplice relação, entre o tomador do seguro e o beneficiário designada por relação de garantia, entre a seguradora e aquele considerada relação de cobertura, e entre esta última e o beneficiário definida por relação de prestação.

3. Em quadro de incumprimento pelo locatário do contrato de locação financeira, aquele e a seguradora surgem, em relação à locadora, como principais pagadores em contexto de

solidariedade atípica, o primeiro por virtude do incumprimento e a última em razão disso e da sua vinculação por via do contrato de seguro-caução.

4. A obrigação de pagamento da seguradora em relação à locadora derivada do contrato de seguro-caução é insusceptível de inviabilizar a obrigação de pagamento por parte da locatária derivada do contrato de locação financeira.

5. A apreensão do veículo automóvel objecto mediato do contrato de locação financeira em procedimento cautelar, na sequência da resolução deste último contrato, não inviabiliza a condenação da locatária na sua entrega à locadora na acção declarativa conexa.

Sumário elaborado pelo Relator

Decisão Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I

E... – Sociedade Portuguesa de Locação Financeira SA, a que sucedeu o BPI SA,

instaurou, no dia 17 de Novembro de 1995, contra T... - Comércio de Automóveis Ldª, a Companhia de Seguros I... - A...SA e Euro C... - Sociedade Música e Som Ldª, acção declarativa de

condenação, com processo sumário, pedindo a condenação da primeira a restituir-lhe o veículo automóvel com a nº ..., e dela e da segunda, solidariamente, a pagar-lhe 933 966$,

correspondentes à soma das rendas vencidas, das vincendas e dos respectivos juros de mora ou, subsidiariamente, a pagar-lhe 660 749$, correspondentes à soma das rendas vencidas e não pagas e a indemnização correspondente a 20% do total das rendas vincendas e do valor residual, além juros de mora.

Fundamentou a sua pretensão na celebração com T... SA de um contrato de locação

financeira relativo ao mencionado veículo automóvel na falta de pagamento de rendas vencidas, na resolução do referido contrato, e no contrato de seguro caução celebrado entre T... SA e I...

-A...SA.

Esta contestou a acção no sentido de o contrato de seguro caução só abranger as rendas relativas ao contrato de aluguer de longa duração, ser nulo o contrato de locação financeira e que, em qualquer caso, não poderia ser responsabilizada quanto às rendas vincendas e ao valor

residual, e, em reconvenção, a título subsidiário, pediu a condenação da autora no pagamento da indemnização a liquidar em execução de sentença no montante mínimo por que vier a responder, por ela não ter resolvido oportunamente o contrato de locação financeira nem recuperado o veículo automóvel.

T... SA afirmou, em contestação, que a autora se vinculou a não resolver o contrato de locação financeira, que age em situação de ilegitimidade, que litiga de má fé, dever ser condenada

(3)

em multa não inferior a 1 000 000$ e, em reconvenção, pediu a condenação da autora a accionar o contrato de seguro caução, e foi-lhe concedido o apoio judiciário na modalidade de dispensa de preparos e do pagamento de custas, por despacho proferido no dia 8 de Novembro de 1996. Euro-C... Ldª, em relação à qual a autora desistiu do pedido. afirmou ter celebrado com T... SA um contrato de locação e outro de promessa de compra e venda relativos ao veículo automóvel com a nº ..., e que este já lhe foi apreendido.

O processo passou a seguir a forma ordinária, a autora replicou, impugnando os pedidos reconvencionais formulados por T... SA e I... - A...SA, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 6 de Julho de 2006, por via da qual os pedidos reconvencionais foram julgados improcedentes. a ré T... SA foi condenada a entregar à autora aquele veículo, e solidariamente com I... - A...SA a pagar-lhe € 2 873,37 relativos às rendas vencidas e não pagas, o imposto sobre o valor acrescentado e a indemnização prevista na alínea c) do nº 2 do artigo 15º das condições gerais do contrato de locação financeira, bem como € 417, 44 concernentes aos juros de mora incidentes sobre a mencionada quantia até 13 de Novembro de 1995, e dos juros de mora sobre a mesma quantia à taxa prevista no nº 7 do artigo 9º das condições gerais daquele contrato,

vencidos, e vincendos desde 14 de Novembro de 1995.

Apelou T... SA, e o relator da Relação, por sentença proferida no dia 20 de Dezembro de 2006, negou provimento ao recurso, aquela interpôs recurso de revista, o Relator submeteu a caso à conferência, que, por acórdão proferido no dia 13 de Fevereiro de 2007, indeferiu a reclamação e confirmou a sentença proferida no tribunal da 1ª instância.

Interpôs T... SA recurso de revista, formulando, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação:

- o seguro caução directa em causa é uma garantia autónoma automática à primeira interpelação, constituída durante a vigência do protocolo de 1 de Novembro de 1992;

- não devia ser condenada a restituir o veículo automóvel à recorrida porque ele, aquando da instauração da acção, já lhe haver sido foi entregue;

- a recorrente não devia ser condenada no pagamento à recorrida de qualquer quantia por não ser devedora solidária, por só o ser seguradora, dada a natureza do contrato de seguro caução; - foram violados os artigos 220º, 221º, 334º, 398º, 405º, 406º e 805º do Código Civil, 426º e 427º do Código Comercial, 668º, nº 1, alíneas b) a e) e o Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio, devendo ser revogado o acórdão recorrido e condenar-se apenas I... - A...SA.

Respondeu o recorrido, em síntese de conclusão de alegação:

- nunca acordou com a recorrente não resolver o contrato de locação financeira nem em não a accionar judicialmente;

- o seguro-caução é apenas um reforço da garantia do seu direito de crédito e não a sua substituição, pelo que não impede o exercício dos direitos emergentes do contrato de locação financeira;

- a circunstância de o seguro-caução ser uma garantia autónoma não impedia o recorrido de accionar a recorrente;

- a recorrida apenas autorizou a sublocação da viatura, e, como a recorrente incumpriu o contrato de locação financeira, não se verificou a possibilidade de exercer a faculdade de pagar o valor residual que lhe proporcionaria o direito de propriedade sobre a viatura;

(4)

ter cumprido ou não o contrato de seguro caução. II

É a seguinte a factualidade declarada provada nas instâncias:

1. A autora é uma instituição de crédito, que tem por objecto a actividade de locação financeira, e fez depender o declarado sob 2 da prestação de uma garantia consubstanciada em seguro-caução de uma companhia de seguros aceite por ela, e obedecendo a condições previamente definidas. 2. Os representantes da antecessora do autor e da ré T... SA declararam que esta apresentaria, em simultâneo com a sua formalização, um seguro-caução cuja beneficiária seria a autora, válido até ao fim do período de vigência do contrato de locação financeira.

3. O representante da autora e da ré T... SA declararam, por escrito, no dia 4 de Dezembro de 1992:

- dar a primeira à última, de locação, o veículo automóvel marca Renault, modelo Exp Blanc, com a matrícula nº ..., pelo preço de 1 419 610$, valor residual 85 177$, imposto sobre o valor

acrescentado de 22 138$, prazo de trinta e seis meses, montante de cada uma das doze rendas trimestrais 143 708$, início no dia 25 de Dezembro de 1992 e termo em 25 de Dezembro de 1995; - em caso de resolução do contrato, ficar a locatária obrigada a restituir o equipamento ao locador – artigo 15º, nº 2, do clausulado geral).

4. A autora entregou a T... SA e esta recebeu, no dia 25 de Dezembro de 1992, o veículo automóvel mencionado sob 2.

5. Os representantes de I... - A...SA, como seguradora, e de T... SA, como tomadora, declararam, por escrito consubstanciado na apólice nº ..., no dia 15 de Dezembro de 1992:

- ser E... SA a beneficiária, e a primeira garantir a esta o pagamento de doze rendas

trimestrais mencionadas sob 3 relativas ao veículo automóvel referido sob 3, com início no dia 11 de Dezembro de 1992.

- corresponder em cada momento a indemnização a pagar pela primeira ao valor das rendas vencidas em dívida, bem como, às vincendas não pagas, com o limite do capital seguro indicado na apólice.

6. Apesar das repetidas insistências da autora, a ré T... SA não lhe pagou, nos respectivos vencimentos, nem posteriormente, as rendas vencidas em 25 de Setembro de 1994, 25 de

Dezembro de 1994, no valor de 166 701$ cada, nem a renda vencida em 25 de Março de 1995, no valor de 168 138$, no total de 501 540$.

7. O representante da autora declarou à ré T... SA, por carta de 5 de Junho de 1995, resolver o contrato mencionado sob 3.

8. A autora participou à ré I... - A...SA, no dia 6 de Junho 1995, o facto mencionado sob 7, por meio de carta registada com aviso de recepção, e, posteriormente, reclamou-lhe o pagamento da

indemnização que considerava devida.

9. Em procedimento cautelar, foi o veículo automóvel com a matrícula nº ... entregue à autora. antes de 17 de Novembro de 1995.

III

A questão essencial decidenda é a de saber se o recorrido tem ou não direito a exigir a

condenação da recorrida T... SA na entrega do veículo automóvel em causa e a indemnizá-lo por incumprimento contratual.

(5)

recorrido, a resposta à referida questão pressupõe a análise da seguinte problemática: - lei processual aplicável à acção e aos recursos;

- natureza e efeitos do contrato celebrado entre a antecessora do recorrido e a recorrente; - natureza do contrato celebrado entre a recorrente e I... - A...SA;

- exclui ou não o mencionado contrato a obrigação de pagamento da recorrente no confronto do recorrido?

- tem ou não o recorrido direito a exigir a condenação da recorrente na entrega do veículo automóvel em causa?

- síntese da solução para o caso espécie decorrente dos factos provados e da lei. Vejamos, de per se, cada uma das referidas sub-questões.

1

Comecemos, no quadro da aplicação da lei processual no tempo, por determinar qual é a aplicável na acção e nos recursos.

Como a acção foi intentada no dia 17 de Novembro de 1995, são-lhe aplicáveis as pertinentes normas processuais anteriores às do Código de Processo Civil Revisto (artigo 16º do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).

Como a primeira sentença foi proferida no tribunal da 1ª instância no dia 6 de Julho de 2006, aos recursos são aplicáveis as pertinentes normas do Código de Processo Civil Revisto (artigo 25º, nº 1, do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).

2.

Atentemos agora a natureza e efeitos do contrato celebrado entre T... SA e a antecessora do recorrido.

Quando alguém pretenda adquirir a disponibilidade sobre determinado bem de equipamento ou de consumo duradouro ou, pelo menos, usá-lo durante o período mais relevante do seu

funcionamento, mas não queira ou não possa pagá-lo a pronto, pode obtê-lo de instituições financeiras que para o efeito surgem no mercado na dupla posição de vendedoras e de financiadoras.

É esta realidade que está na origem dos chamados contratos de locação financeira, especialmente regulados na lei, os quais, versando sobre coisas móveis, como é o caso vertente, a sua duração corresponde ao período presumível da sua utilização económica.

Trata-se de contratos de longo ou de médio prazo destinados a proporcionar a alguém um

financiamento, não através de uma quantia em dinheiro, mas por via do uso de um bem, ou seja, através dele o locador proporciona ao locatário, não tanto a propriedade do bem, mas a sua posse e utilização para determinado fim, pelo que o objectivo final deste contrato é o de concessão de crédito para financiamento do uso do bem.

O modelo legal do contrato de locação financeira na espécie mobiliária visou a consecução do importante escopo económico de solucionar o problema da actualização do equipamento produtivo, sem necessidade de o locatário despender vultuosas quantias em dinheiro.

Em conformidade com a referida perspectiva de regulação económico-jurídica, a lei caracteriza o contrato de locação financeira como aquele pelo qual uma das partes se obriga, mediante

retribuição, a conceder a outra o gozo temporário de uma coisa, adquirida ou construída por indicação da última, em que esta, nos termos do próprio contrato, num prazo determinado ou

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determinável, a pode comprar (artigo 1º do Decreto-Lei nº 171/79, de 6 de Junho, substituído pelo Decreto-Lei nº 149/95, de 24 de Junho, alterado pelo Decreto-Lei nº 285/2001, de 3 de Novembro). Dir-se-á que o contrato de locação financeira se estrutura em termos de uma das partes - o locatário - formular à outra - o locador - um pedido de financiamento com o alcance de o último adquirir ou construir determinado bem para uso do primeiro, por certo período de tempo, mediante determinada renda periódica, com a possibilidade de, no seu termo, poder adquiri-lo por compra, mediante um preço pré-estabelecido, em conformidade com a referida renda, por forma a que aquele preço se identifique com o seu valor residual, assim englobando elementos próprios dos contratos de locação, de compra e venda a prestações e de mútuo.

O locatário não adquire, por mero efeito do contrato, o direito de propriedade sobre o bem em causa, apenas integrando na sua esfera jurídica o direito potestativo de o adquirir pelo preço que haja sido ajustado que, em princípio, deverá corresponder ao seu presumível valor residual.

Assim, são elementos do contrato de locação financeira a aquisição ou a construção dessa coisa por indicação do locatário, a cedência do gozo temporário da mesma pelo locador, o respectivo prazo, a retribuição correspondente à cedência, a possibilidade de compra, total ou parcial, por parte do locatário e a determinação ou a determinabilidade do preço de cedência.

Face aos factos transcritos sob II 1 a 3, a conclusão não pode deixar de ser no sentido de que a antecessora do recorrido e a recorrente celebraram um contrato de locação financeira, a primeira como locadora, e a segunda como locatária, cujo objecto mediato foi o identificado veículo

automóvel.

Dele resultaram, para a antecessora do recorrido a obrigação de entrega do mencionado veículo automóvel à recorrente, e para esta a obrigação de pagar àquela o montante de cada uma das prestações de renda convencionadas.

3.

Vejamos agora a natureza e os efeitos do contrato celebrado entre a recorrente e I... - A...SA. O contrato de seguro em geral é a convenção pela qual uma seguradora se obriga, mediante retribuição paga pelo segurado, a assumir determinado risco e, caso ele ocorra, a satisfazer, ao segurado ou a um terceiro, uma indemnização pelo prejuízo ou um montante previamente estipulado.

Trata-se de um contrato formal, certo que a sua validade depende de o respectivo conteúdo ser consubstanciado num documento escrito, denominado apólice, da qual devem constar, além do mais, o nome do segurador, do tomador e do beneficiário do seguro, o respectivo objecto, a natureza e valor e os riscos cobertos (artigo 426º, § único, do Código Comercial).

Conformado com o referido tipo negocial geral, o contrato de seguro-caução configura-se como uma das modalidades do contrato de seguro de créditos, especialmente regido pelo Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio, alterado pelos Decretos-Leis nºs 127/91, de 22 de Março, 29/96, de 11 de Abril, 214/99, de 15 de Junho e 51/2006, de 14 de Março.

O contrato de seguro de créditos é susceptível de cobrir, por exemplo, o risco da falta ou do atraso de pagamento dos montantes devidos ao credor (artigo 3º, nº 1, alínea c), do Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio).

O contrato de seguro-caução compreende o seguro-caução directa e o seguro-caução indirecta, o seguro-fiança e o seguro-aval (artigo 1º, nº 4, do Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio).

(7)

inserir, inter alia, a obrigação a que se reporta (artigo 8º do Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio). É celebrado com o devedor da obrigação a garantir ou com o contra-garante, a favor do respectivo credor (artigo 9º, nº2 do Decreto Lei nº 183/88 de 24 de Maio).

É individualizado pela específica natureza do risco coberto, isto é, o de incumprimento temporário ou definitivo de obrigações que, por lei ou convenção, sejam susceptíveis de caução, fiança ou aval (artigo 6º, nº 1, do Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio).

O beneficiário da indemnização pode ser o credor da obrigação a que se reporta o contrato de seguro, caso em que se está perante o contrato de seguro-caução directa, ou a pessoa que garantir o cumprimento da referida obrigação, situação que se configura como contrato de seguro caução indirecta.

Dir-se-á que o contrato de seguro caução é atípico, a favor de terceiro, consubstanciado numa tríplice relação, entre o tomador do seguro e o beneficiário, designada por relação de garantia, entre a seguradora e o tomador do seguro, caracterizada por relação de cobertura, e entre a seguradora e o beneficiário, definida por relação de prestação.

A obrigação de indemnizar por parte da seguradora tem como limite o montante correspondente ao que é objecto do contrato de seguro (artigo 7º, nº 2, do Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio). Perante a factualidade constante de II 5, a conclusão é no sentido de que T... SA e I... - A...SA celebraram um contrato de seguro-caução directa, em que a primeira figura como tomadora, a segunda como seguradora e a antecessora do recorrido como beneficiária.

4.

Atentemos agora sobre se o conteúdo do contrato de seguro-caução exclui ou não a obrigação de pagamento da recorrente derivada do contrato que celebrou com a antecessora do recorrido. Conforme acima se referiu, trata-se uma garantia pessoal que cobre directamente o risco de incumprimento ou de atraso no cumprimento da obrigação da recorrente no confronto da antecessora do recorrido (artigo 6º, nº 1, DL 183/88 de 24 Maio).

A qualificação do contrato de seguro-caução como garantia de pagamento à primeira solicitação ou como garantia simples, ou seja, dependente da verificação de determinado circunstancialismo, depende das respectivas declarações negociais das partes.

Os factos provados não revelam que se trate de garantia de pagamento à primeira solicitação, pelo que importa assentar em que estamos perante uma garantia autónoma simples ou de boa execução do contrato de locação financeira.

Trata-se, na espécie, da coexistência de três obrigações conexas, designadamente a da

recorrente perante a antecessora do recorrido derivada do contrato de locação financeira e face a I... - A...SA no que concerne ao pagamento do prémio, e da última relativa à cobertura do risco de incumprimento pela recorrente da obrigação derivada do primeiro dos referidos contratos.

A garantia pessoal e patrimonial decorrente do referido contrato de seguro-caução assume-se como adicional em relação à garantia derivada do património da recorrente, o mesmo é dizer que o recorrido, ao lado da devedora originária, passa a ter um novo devedor que responde pela mesma dívida.

A recorrente surge em relação ao recorrido como principal pagadora, por virtude do incumprimento do contrato base de locação financeira, e I... - A...SA em relação à antecessora do recorrido, como principal pagadora face ao incumprimento pela primeira do contrato de locação financeira.

(8)

lado, e I... - A...SA, por outro, respondem perante o recorrido pela mesma prestação de

ressarcimento, conformada embora pelo limite derivado do contrato de seguro-caução que traça a diversidade da fonte obrigacional.

Dir-se-á que a recorrente e I... - A...SA, ambas devedoras principais, respondem pelo mesmo núcleo de prestação de fonte obrigacional diversa, sendo a responsabilidade da primeira fundada no incumprimento próprio contrato de locação financeira e a da última baseada no incumprimento daquele contrato pela primeira e no contrato de seguro caução.

Por isso, ao invés do que a recorrente alegou, a circunstância de funcionar, na espécie, a garantia derivada do contrato de seguro-caução, da responsabilidade de I... - A...SA, não a

exonera, no confronto do recorrido, da sua responsabilidade contratual derivada do incumprimento do contrato de locação financeira.

5.

Vejamos agora se o recorrido tem ou não o direito a exigir a condenação da recorrente na entrega do veículo automóvel objecto mediato do contrato celebrado entre a última e a antecessora do primeiro.

Está assente que o veículo automóvel objecto mediato do contrato de locação financeira foi entregue à antecessora do recorrido antes da instauração da acção, no âmbito de um procedimento cautelar instaurado pela primeira contra a recorrente e Euro-CC... Ldª.

A antecessora do recorrido e a recorrente acordaram, esta por aceitação do clausulado geral, particular e especial do contrato de locação financeira, que a resolução deste implicaria a obrigação da última de restituição à primeira do aludido veículo automóvel.

Portanto, resolvido que foi o contrato de locação financeira, à luz do convencionado e de harmonia com o disposto no artigo 405º, nº 1, do Código Civil, tinha a antecessora do recorrido o direito de exigir à recorrente a restituição do referido veículo automóvel.

Com efeito, o direito de propriedade sobre o mencionado veículo automóvel inscrevia-se na titularidade da antecessora do recorrido, sendo que a recorrente era em relação ao mesmo mera detentora ou possuidora em nome alheio.

A circunstância de o referido veículo automóvel haver sido entregue à antecessora do recorrido no âmbito de um procedimento cautelar não obsta à condenação da recorrente na respectiva entrega.

Com efeito, a função dos procedimentos cautelares é meramente instrumental em relação ao que for decidido na acção principal (artigo 383º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Não procede, por isso, a alegação da recorrente no sentido de não estar vinculada à condenação na devolução ao recorrido do veículo automóvel em causa.

6.

Atentemos, finalmente, na síntese da solução para o caso espécie decorrente dos factos provados e da lei.

É aplicável à acção o regime processual anterior ao que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 1997, e ao recurso o que naquela data passou a vigorar.

A antecessora do recorrido e a recorrente celebraram um contrato de locação financeira relativo ao veículo automóvel com a matrícula nº ..., que a primeira cumpriu quanto à entrega daquela viatura, mas não a última no que concerne ao pagamento pontual das rendas.

(9)

boa execução, abrangeu a falta de pagamento das rendas relativas ao mencionado contrato de locação financeira.

A vinculação de I... - A...SA no confronto da antecessora do recorrido por via do contrato de seguro-caução não dispensa a obrigação de pagamento das rendas por parte da recorrente derivada do contrato de locação financeira.

Resolvido contrato de locação financeira por virtude do incumprimento por parte da recorrente, ficou esta vinculada ao devolver à antecessora do recorrido o mencionado veículo automóvel. A circunstância de o referido veículo automóvel ter sido apreendido e entregue à antecessora do recorrido no âmbito de um procedimento cautelar não constitui obstáculo legal à condenação da recorrente na sua entrega no âmbito da acção subsequente.

A antecessora do recorrido agiu ao abrigo da lei, sem abuso do direito, ao exigir a condenação da recorrente no pagamento das rendas relativas ao contrato de locação financeira e na entrega do aludido veículo automóvel.

Não tem qualquer fundamento a invocação pela recorrente de que o acórdão recorrido infringiu os artigos 220º, 221º, 334º, 398º, 405º, 406º e 805º do Código Civil, 426º e 427º do Código

Comercial, 668º, nº 1, alíneas b) a e), do Código de Processo Civil, ou o Decreto-Lei nº 183/88, de 24 de Maio.

Improcede, por isso, o recurso.

Vencida, é a recorrente responsável pelo pagamento das custas respectivas (artigo 446º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Mas como ela é beneficiária do apoio judiciário na modalidade de assistência judiciária, tendo em conta o disposto nos artigos 15º, nº 1, 37º, nº 1 e 54º, nºs 1 a 3, do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, 57º, nº 1, da Lei nº 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 51º, nº 2, da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, inexiste fundamento legal para que seja condenada no pagamento das referidas custas.

IV

Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso. Lisboa, 28 de Junho de 2007

Salvador da Costa (Relator) Ferreira Sousa

Armindo Luís

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