Projeto de Lei n.º705/XIII
Determina a proibição da utilização de animais selvagens nos circos, procedendo à 3.ª Alteração ao Decreto-Lei n.º 255/2009, de 24 de setembro
Exposição de motivos
Os riscos para a saúde e o bem-estar dos animais, colocados em circos e outras manifestações similares, estão diretamente relacionados com a natureza das espécies detidas e ou utilizadas e com as condições de alojamento, treino e exibição proporcionadas pelos mesmos. Consequentemente, o Direito da União Europeia há largos anos que tem vindo a desenhar um quadro normativo detalhado e exigente para a possibilidade de utilização de animais em circos, assegurando a proteção do seu bem-estar e a ausência de riscos para a segurança e saúde de terceiros.
Ainda que a questão em torno da possibilidade de utilização de animais não se afigura inteiramente consensual, no que toca à presença de animais selvagens o caminho que se tem vindo a trilhar na sociedade sobre o tema é claro e aponta no mesmo sentido da mesma evolução verificada em muitos países europeus.
De momento, inúmeros países por todo o mundo já proibiram por completo a utilização de animais selvagens em circos, a saber a Áustria, a Bélgica, a Bolívia, a Bósnia-Herzegovina, a Colômbia, a Costa Rica, a Croácia, Chipre, El Salvador, a Eslováquia, a Eslovénia, a Grécia, a Índia, Israel, o Irão, Malta, o México, os Países
Estónia, a Finlândia, a Hungria, a Itália, a Letónia, o Líbano, a Macedónia, a Noruega, a Polónia, a Sérvia ou a Suécia, para citar apenas alguns).
Efetivamente, as condições de alojamento, treino e utilização destes animais são quase impossíveis de corresponder ao que é exigido no plano sanitário e de segurança sendo que, nestes casos, a manutenção em cativeiro de espécies selvagens se afigura indesejável.
Cientes, no entanto, de que a opção de proibição da utilização de animais selvagens não se pode implementar de forma repentina e sem acautelar as expectativas dos operadores, a necessidade de garantir o realojamento dos animais ou a salvaguarda da vida profissional daqueles que hoje são seus tratadores, o Partido Socialista propõe um período de transição suficientemente longo para oferecer respostas a estas questões, construir uma migração suave e ponderada para um quadro de atividade circense sem animais selvagens e que acautele o acompanhamento através dos entes públicos com competência em matéria de bem-estar animal.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo-assinados apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1º Objeto
A presente lei determina a proibição de utilização de animais selvagens em circos ou atividades conexas ou similares.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 255/2009, de 24 de setembro
São alterados os artigos 2.º e 14.º do Decreto-Lei n.º 255/2009, de 24 de setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 260/2012, de 12 de dezembro, que passam a ter a seguinte redação:
“Artigo 2.º […]
Para efeitos do presente decreto-lei, entende-se por: a) […]
b) «Animal selvagem», todo o animal cuja espécie existe na natureza, no seu habitat natural, partilhando com o seu antepassado comum o mesmo código genético, incluindo também os animais exóticos e selvagens criados em cativeiro que, embora possam ter sido amansados, essa característica não é transmitida à geração seguinte, e por isso não podem deixar de ser considerados como selvagens;
c) Anterior alínea b) d) Anterior alínea c) e) Anterior alínea d) f) Anterior alínea e).
Artigo 14.º […]
1 - Constitui contraordenação punível com coima no montante mínimo de €250 e máximo de €3740 ou 44 890, consoante o agente seja pessoa singular ou coletiva, a
b) […] c) […] d) […] e) […] f) […] g) […] h) […] i) […] j) […] k) […] l) […] m) […] n) […] o) […] p) […]
q) A utilização de animais selvagens em violação do disposto no artigo 3.º-A e nas normas transitórias que regulem a matéria.
2 – […].”
Artigo 3.º
Aditamento ao Decreto-Lei n.º 255/2009, de 24 de setembro
É aditado um artigo 3.º-A ao Decreto-Lei n.º 255/2009, de 24 de setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 260/2012, de 12 de dezembro, com a seguinte redação:
“Artigo 3º-A
Proibição de utilização de animais selvagens em circos
1. É proibida a utilização de animais selvagens em circos, exposições itinerantes, números com animais e manifestações similares
2. A proibição abarca a utilização dos animais selvagens como parte integrante do espetáculo, através da sua presença em palco e em interação com outros animais ou com os tratadores, bem como a sua mera exposição, ainda que detidos em jaula ou de alguma forma limitados na sua locomoção.
3. É igualmente proibida a captura e o treino dos animais referidos no n.º 1 com vista à sua utilização nos espetáculos aí referidos.”
Artigo 4º
Regime transitório de utilização de animais
1. As licenças válidas e em vigor que habilitem a utilização de animais selvagens caducam no prazo de seis meses após a data da entrada em vigor da presente lei, não podendo ser concedidas novas autorizações a partir do dia seguinte à entrada em vigor da presente lei.
2. Os titulares das licenças referidas no número anterior podem requerer uma licença transitória, com um período de duração máxima de 4 anos, durante a qual deve ser assegurada a gradual cessação da utilização dos animais selvagens, sendo autorizada a utilização transitória dos animais nesse período.
3. São indeferidos liminarmente todos os requerimentos pendentes para o mesmo efeito sendo, consequentemente, proibida a aquisição ou reprodução de espécies selvagens de qualquer
tipo-4. É proibido o abandono de qualquer animal selvagem utilizado anteriormente em espetáculos circenses.
de passaporte do animal anteriormente atribuído, identificação da espécie e idade junto da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária.
6. Qualquer transmissão gratuita ou onerosa dos animais, falecimento ou nascimento deve ser comunicada à Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária num prazo de 48 horas.
7. Em caso de falecimento de algum dos animais, o cadáver deve obrigatoriamente ser entregue nos serviços municipais da zona onde ocorreu a morte.
Artigo 5.º
Realojamento dos animais
Os animais selvagens que deixem de ser utilizados em espetáculos devem ser reencaminhados para jardins zoológicos, aquários ou reservas, sempre que possível no quadro de atuação conjunta dos seus detentores, de Organizações Não Governamentais Nacionais e Internacionais ou de entidades que explorem os espaços de destino dos animais, e mediante fiscalização da DGAV, que certifica o processo de realojamento.
Artigo 6.º
Fiscalização durante o período transitório
1. Durante o período transitório todos as entidades que realizem espetáculos com animais selvagens devem ser inspecionadas no município onde tenham a sua sede administrativa, antes da primeira atuação do ano.
2. Durante a fiscalização, se for detetado algum caso grave de comprometimento do bem-estar de um ou mais animais, o Diretor-Geral de Alimentação e Veterinária pode determinar a deslocalização temporária do animal e respetivo tratamento a expensas do detentor ou, nos casos mais graves, pode determinar o confisco dos
animais em causa ou de outros que, não estando no mesmo estado, se verifique o risco de virem a estar.
Artigo 7.º Regulamentação
Para determinação da reconversão profissional dos detentores, domadores e/ou tratadores de animais, bem como do procedimento de acompanhamento pela DGAV do realojamento dos animais o Governo regulamenta a presente lei no prazo máximo de 60 dias, a contar da data da sua publicação.
Artigo 8.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de S. Bento, 15 de dezembro de 2017
As Deputadas e os Deputados
(Pedro Delgado Alves)