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A TRADUÇÃO DA BNCC DE HISTÓRIA (ENSINO MÉDIO) PELA REVISTA NOVA ESCOLA SOBRE O PROTAGONISMO JUVENIL

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A TRADUÇÃO DA BNCC DE HISTÓRIA (ENSINO MÉDIO) PELA

REVISTA NOVA ESCOLA SOBRE O PROTAGONISMO JUVENIL

RAMOS, Márcia Elisa Teté1

Grupo de Reflexão Docente n. 09. Ensino de História e História Pública em tempos de negacionismos: passados em disputa

Resumo: Pretende-se divulgar a investigação sobre as apropriações que a revista Nova Escola,

hoje em suporte virtual, empreende em relação à Base Nacional Comum Curricular de História para o Ensino Médio. Considera-se que a revista é uma forma de divulgação da história a ser ensinada, portanto tem uma visão da história e de ensino almejáveis. Integra a História Pública, na medida em que não parte da história especializada para produzir suas perspectivas, mas de uma leitura que realiza dos currículos vigentes, prescrevendo, recomendando, indicando ao professor e à professora qual história ensinar e como ensiná-la. Tem como fonte de pesquisa, matérias dispostas na revista virtual desde a implementação da BNCC. Nesta parte da pesquisa, focaliza as propostas para desenvolvimento da competência denominada “socioemocional” nos(as) jovens estudantes, concluindo que embora haja o discurso do fomento ao “protagonismo juvenil”, este protagonismo é restrito ao que se entende por competência para o mundo do trabalho regulado por políticas neoliberais. Desviando da história como disciplina escolar sustentada pela ciência de referência para a competência socioemocional, a revista termina por dar chance às histórias baseadas nos revisionismos anistóricos.

Palavras-chave: BNCC. Revista Nova Escola. Competência socioemocional.

1. Introdução

Revista Nova Escola. Base Nacional Comum Curricular. Competência socioemocional. O que estes temas aparentemente sem relação fazem aqui? Começo pela revista, material que trabalho desde o doutoramento terminado em 2009, cujo livro foi publicado 2015.

A revista Nova Escola elabora seu próprio modelo curricular e propõe facilitar e/ou traduzir os currículos oficiais para os professores, portanto, procura realizar uma recodificação curricular e é lida/interpretada conforme determinados códigos culturais. No doutorado, subdividi as propostas didático-pedagógicas da revista em relação ao ensino de história em dois momentos: de 1986 a, aproximadamente, 1995, quando abarcava a historiografia marxista e a pedagogia histórico-crítica, então referenciais dominantes na reestruturação curricular do período

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pós-regime militar realizada no âmbito de cada Estado. Posteriormente tomei o período de 1995 a 2002, momento em que Nova História e o Construtivismo consistiam nos referenciais dominantes na implementação dos Parâmetros Curriculares Nacionais e quando se discutia a necessidade de tornar o país competitivo/moderno diante da “globalização”. Não apenas abordei o conteúdo das propostas, mas também, seguindo referenciais da História da Leitura, recorri aos modelos de interpretação dos professores de história leitores da revista, articulando assim, texto, contexto e apropriação. Resumidamente, este estudo me levou a concluir que no segundo período – sendo que no primeiro, havia mais capacidade crítica da revista devido às demandas de uma sociedade pós-Ditadura – , a revista procurava ajustar-se as propostas conforme o currículo vigente, os PCN, por vezes de forma simplista, porém, os professores conseguiam praticar as propostas mediante suas próprias reelaborações, desta forma, levando para sala de aula, atividades muito mais enriquecedoras, originais e inovadoras que a revista.

Nova Escola era uma iniciativa da Fundação Victor Civita, ligada ao Grupo Abril com a tiragem mensal de 300 mil exemplares em sua fase inicial e aproximadamente 800.000 mil exemplares na época em que fiz a pesquisa de doutorado (2009). Como era uma revista razoavelmente de preço baixo, comercializada em bancas de jornal, disponibilizada por assinaturas anuais, então distribuída gratuitamente em instituições escolares públicas através de convênio com o Ministério da Educação, presume-se que a revista Nova Escola pudesse atingir de 1,5 a 2,0 milhões de leitores. Durante os primeiros cinco anos de sua circulação, o Ministério da Educação arcava com 70% do custo de Nova Escola, mas a partir de 1991, durante o governo de Fernando Collor de Mello, o convênio entre o MEC e a Fundação Victor Civita não foi renovado, resultando na redução da tiragem, de 370 mil para 04 mil mensais. A retomada do convênio aconteceu apenas ao final do ano de 1992 e a revista conseguiu recuperar e superar sua antiga tiragem (COSTA, 2000, p.74).

A parceria entre o Governo Federal e a revista Nova Escola ainda conseguiu durar até o ano de 2010, quando o Governo Federal passou a realizar licitações para a distribuição da revista nas escolas por mais quatro anos. Em sua versão impressa, foi distribuída gratuitamente nas escolas públicas até 2014. No ano de 2015, a distribuição da revista às escolas e as vendas em bancas foram encerradas e as publicações passaram a ser disponibilizadas exclusivamente para assinantes e sua tiragem era de 120 mil exemplares impressos. Também nesta data, as marcas

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Nova Escola e Gestão Escolar foram transferidas da Fundação Victor Civita para a Associação Nova Escola, criada e mantida pela Fundação Lemann (DIONÍSIO, 2018).

Em 2017, a multiplataforma Nova Escola se reduz à Nova Escola Digital (novaescola.org.br). O site em 2015 apresentava 1,7 milhão de visitantes e 106 mil usuários cadastrados, mas a partir disso, Nova Escola resolve cessar a divulgação de relatórios de tiragens. Atualmente, são 1.268.477 fãs no Facebook, 179 inscritos no canal do Youtube, 11.040 seguidores no LinkedIn e 533 seguidores no Twitter. Como anteriormente, a revista ainda se autoproclama auxiliar do professor de todas as áreas do Ensino Fundamental e no site inclui também o Ensino Médio. Resume sua missão no

slogan: “Fortalecer o educador para transformar o Brasil”.

Aqui preciso fazer um aparte em relação aos PCN: estes currículos eram cimentados em um projeto neoliberal, um projeto combinado entre liberalismo econômico e autoritarismo social. Ao final da década de 1990, uma coalização de centro-direita procurava a todo custo introduzir uma reestruturação curricular que culminou nos chamados PCN em 1997 (FREITAS, 2018, p. 9). Isto, mesmo que no caso do tomo da História, muito se tenha conseguido driblar estes pressupostos. Há uma forte despolitização do conteúdo escolar, haja vista a noção de multiculturalismo para dar conta das diferenças raciais. Não se discute o racismo estrutural e consequentemente uma educação antirracista, mas a necessidade da tolerância (quem tolera suporta o outro). O léxico neoliberal transmuta termos e palavras já naquele momento. Donaldo Macedo e Lilia Bartolomé consideram negligenciadas as palavras como “opressão”, “injustiça social”, “exploração” e “dominação” no discurso educacional (1998, p. 25). Talvez hoje as palavras sejam outras, como resiliência e protagonismo, inseridas no discurso para fundamentar estratégias neoliberais, que buscam não somente otimizar a esfera econômica, mas formar um sujeito desejável para esta ordem: trabalhador, usuário da internet e consumidor.

Queria poder escrever bem mais, mas aqui destaco a questão da competência socioemocional e posteriormente como esta ocorre em alguns momentos na revista Nova Escola. Mostro que não há espaço, segundo a reforma do Ensino Médio com seus itinerários formativos e com a nova disciplina Projeto de Vida que substitui História e outras áreas afins, para efetivar a

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aprendizagem histórica baseada em evidências, conceitos substantivos e estruturais.

1. Competência socioemocional e neoliberalismo

Não me preocupei muito com a revista durante o governo Lula, de 2003-2011, pois o convênio continuou para a distribuição nas escolas e a proposta neoliberal parece ter arrefecido diante dos pressupostos políticos do capitalismo desenvolvimentista. Nem pretendo, assim como Freitas (2018) considerar que no governo Lula-Dilma a questão educacional tenha sido “resolvida”, mesmo porque não temos muitos trabalhos que discutam a revista Nova Escola neste momento. Acredito mesmo que quanto ao ensino de história ainda é um recorte temático e temporal necessário para futuros estudos2.

Contudo, devo frisar que após o golpe jurídico-parlamentar em 2016, o neoliberalismo veio mais potente, inclusive tendo como plataforma política a reestruturação do Ensino Médio no governo Temer. Reaviva-se os PCN, agora de forma muito mais intensa. Mesmo que ensaiado uma BNCC de História mais afeita às inovações da área pelas pesquisas acumulados por mais de trinta anos – e aqui não quero dizer que esta primeira versão era perfeita, mas que sim, precisava de muitos ajustes –, chegamos à terceira e última versão que consegue o contra-mérito de mesclar o ensino de história tradicional com o ensino por competências, a máxima dos pressupostos neoliberais.

Destaco a chamada “competência socioemocional”. Quem que fosse suficientemente inteligente e preocupado com nosso jovem aluno do Ensino Médio ou qualquer outro sujeito poderia rebater a necessidade equilíbrio socioemocional? A questão primordial ultrapassa os parâmetros psicopedagógicos, e a minha concepção é de que esta competência cumpre propósitos mais econômicos do que humanistas. E defendo aqui também que a revista, embora em alguns momentos tenha criticado a BNCC e a própria ideia de competência, e corajosa e declaradamente questionado o Presidente quando ainda não eleito com sua noção de “kit gay”3, adota a demanda da competência socioemocional para o Ensino Médio sem grandes questionamentos.

2 Mas existem trabalhos nesta direção, sendo LABEGALINI, Andréia Cristina Fregate Baraldi; BRANDÃO, Carlos da Fonseca. A Revista Nova Escola no período de 2003 a 2010 e a formação de professores. RPGE– Revista on line de Política e Gestão Educacional, v.20, n.03, p. 710-728, 2016; ROMEU, Silvanya Suellem de Lima. Discurso e identidade docente: um estudo comparativo das capas da revista Nova Escola. Revista Leia Escola, Campina Grande, v. 18, n. 3, 2018.

3 Ver: https://novaescola.org.br/conteudo/9937/ainda-tem-duvidas-sobre-o-caso-bolsonaro-nova-escola-esclarece Acesso em 19 de out. de 2020.

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A parte da Base onde se insere as competências propriamente ditas, destoa da parte explanatória explanatória dos pressupostos teóricos para os anos finais do Ensino Fundamental elencando como cruciais para a aprendizagem histórica o desenvolvimento de alguns conceitos como “contextualização” e o emprego escolar do documento histórico (CATELLI JR, 2019, p. 189-190). A impressão é que são partes produzidas por grupos diferentes, um mais habituado aos fundamentos para construção do conhecimento histórico e outro mais técnico, que indicou as competências. Contudo, no Ensino Médio, não temos mais a disciplina específica da História, mas das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.

Desde 1997, Nova escola advoga que sua “missão” é empreender a Qualidade Total da Educação. Apresenta-se ainda como relacionada aos fins filantrópicos, mas também, naquele período, pensada, produzida e distribuída segundo os preceitos empresariais de excelência, finalidades que, para a revista, são paralelos. O que pode ser chamado de “filantropia empresarial”, não apenas pelos seus preceitos, mas pelo seu objetivo de formação do sujeito para determinada sociedade que quer divulgar/financiar. Para isso, se solicita a escola que melhore a qualidade de trabalho e ao mesmo tempo se reduz o gasto público com ela (LAVAL, 2019, p. 37). Os “benfeitores” como a Fundação Lemann, assim como outros partícipes do Movimento pela Base Nacional Comum formado em 2013, em uma “filantropia de risco”, “doam” com propósitos econômicos, incentivado a racionalidade embutida nas políticas educacionais/curriculares de formação do novo trabalhador/consumidor/usuário: “Os novos filantropos querem ver impactos e resultados claros e mensuráveis em seus ‘investimentos’ de tempo e dinheiro” (LAVAL, 2020, p. 122), sendo o foco convergir as demandas dos setores privados e públicos4.

O sujeito que se quer formar seria o trabalhador, o usuário da internet e o consumidor, que tenha competências para inserir o país no rol dos países modernizados, inseridos na globalização. Na verdade, este novo mundo do trabalho é um mundo do trabalho precarizado ou do não-trabalho. Diz David Harvey em meados da década de 90, mas que podemos emprestar para refletir sobre a atualidade, que ao invés da rigidez do fordismo, ocorria o que ele denominou de

4 Outros “filantrocapitalistas” (BROOKS et al, 2009, p. 4 apud BALL, 2020, p. 124): fundações Roberto Marinho e Maria Cecília souto Vidigal; os institutos Ayrton Senna, Península (da família Abílio Diniz), Unibanco, Natura e Inspirare/PORVIR; o movimento empresarial Todos Pela educação; Banco Itaú; REDUCA parceria do Banco Interamericano de Desenvolvimento; o Consed (Conselho Nacional dos Secretários da Educação) e a Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação).

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“acumulação flexível” que se apoiada na volatilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e dos padrões de consumo. A reestruturação produtiva é marcada pelos altos níveis de desemprego, aumento da competição e/ou estreitamento da margem de lucro das empresas, ganhos modestos de salários reais, retrocesso do poder sindical, o que resulta na imposição de contratos de trabalho e trabalhadores mais flexíveis. Na forma flexibilizada de acumulação, baseada na reengenharia, na empresa enxuta, há uma crescente redução do trabalho estável e desconcentração do espaço físico produtivo, gerando o novo trabalhador - subcontratado, terceirizado, “part-time”, etc.-, e em menor escala o trabalhador polivalente e multifuncional da era informacional, capaz de controlar diversas máquinas (HARVEY, 1996, p. 140-146). Referindo-se ao tempo recente, LAVAL alerta que estamos vivenciando uma nova fase da acumulação do capital, dependendo cada vez mais da inovação da mão-de-obra, tanto em relação ao domínio científico como cultural (LAVAL, 2019, p. 18).

Silva (2008) questiona a concepção de competência que se tornou comum na legislação curricular, discursos midiáticos e políticos de competência como “resultado da interação entre o indivíduo e a sociedade, sem tomar, porém, a dimensão – histórica -, da cultura como elemento de mediação nessa formação” (SILVA, 2008, p. 15). Competência refere-se a um desempenho, a uma execução, quando o sujeito se adapta ao social mediante seus próprios meios, desvinculado da mediação histórico-cultural. Assim, competência combina com a noção de meritocracia, pois se subentende que os sujeitos então em iguais condições de adquirir as competências, independente da realidade socioeconômica em que se insere.

A noção de competência difere do que se entende por saberes disciplinares, que pensa sobre que o desenvolvimento cognitivo depende do contexto histórico vividos pelos sujeitos, considerando variáveis como: classe social; tipo de escola frequentada; estímulos culturais que chegam aos alunos; além da etnia, da religião, da geração etc. A progressão do pensar historicamente seria avaliada segundo as habilidades de os alunos operarem metodologicamente as evidências históricas mobilizando conceitos históricos (LEE, 2001). Em um Ensino Média sem a especificidade da disciplina histórica escolar, valerão mais o acúmulo de competências do que de fato a construção do conhecimento histórico fundamentado e crítico.

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Para chegar às reportagens na revista Nova Escola sobre o assunto, utilizei o sistema de busca da própria revista, recorrendo às palavras “socioemocionais”, “protagonismo juvenil” e “projetos de vida”, priorizando o Ensino Médio, embora muitas vezes, tais palavras apareçam em outros segmentos de ensino.

Nem sempre a revista se coaduna completamente com as perspectivas de determinado grupo, mesmo sendo mantida por uma fundação filocapitalista, pois precisa lidar com um público plural. Em uma reportagem, Base do Ensino Médio: por que o

relator não votou contra nem a favor que traz uma entrevista com um dos relatores da

BNCC, Chico Soares, este diz não concordar com o modo como a BNCC insere as competências. Reportando-se ao que o entrevistado diz, a revista destaca que: “O modelo ideal na visão do educador seria uma mescla de conhecimento, habilidades, atitudes e valores que, juntos, teriam poder de ação na formação integral do indivíduo”. Sendo Chico Soares, as competências negligenciam os saberes disciplinares e corre-se o risco de serem implementadas de forma mecânica (WINKEL; SEMIS, 04 de dezembro de 2018).

Em matéria anterior, Habilidades socioemocionais são tão importantes quanto os

rankings, a noção de competência é valorizada, especialmente a socioemocional: As escolas

brasileiras terão de incluir as habilidades socioemocionais nos seus currículos, a partir de 2020, conforme prevê a nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Projetos como o Guia da Base - Competências Gerais e iniciativas como a do Porvir destacam a importância da aplicação dessas habilidades em sala de aula (CALÇADE, 25 de maio de 2018). A matéria continua dizendo sobre a importância da competência socioemocional, atestada empiricamente por um estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde “aponta que alunos expostos a um aprendizado que inclui o desenvolvimento das competências socioemocionais apresentam um comportamento melhor e possuem mais autocontrole” (CALÇADE, 25 de maio de 2018). Como vimos, a revista em algumas (poucas) vezes até reconhece a voz de quem questiona a noção de competência, mas o comum é abraçar a ideia, especialmente das competências socioemocionais, para enfrentar a “crise”: “A Educação voltada para o desenvolvimento socioemocional é imprescindível diante de mudanças constantes que a sociedade, bem como as relações humanas, protagoniza. Saber resolver conflitos, ter criatividade e se reinventar diante de

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Na matéria Como aplicar na prática as competências socioemocionais, se adota com todas as letras e linhas a noção da Base sobre competências. Quanto à competência socioemocional, considerada fundamento da construção do protagonismo juvenil, tomando como referência Oliver John, identificado como pesquisador de Berkeley, são eixos desta competência: “abertura ao novo (que se desdobra em curiosidade para aprender, imaginação criativa e interesse artístico)”, bem como a “consciência ou autogestão (determinação, organização, foco, persistência e responsabilidade)”, ainda a “extroversão ou engajamento com

os outros (iniciativa social, assertividade e entusiasmo), amabilidade (empatia, respeito e

confiança) e estabilidade ou resiliência emocional (tolerância ao estresse, autoconfiança e tolerância à frustração)”. (SEMIS, 11 de maio de 2018 – grifo da revista).

Já em Crianças precisam aprender habilidades socioemocionais na escola, a revista retoma as outras competências pensadas no identificadas pelo Forum Econômico Mundial, marcando que das dez, quatro competências estão relacionadas às competências socioemocionais, como:

Consciência social. Saber olhar as coisas em perspectiva, desenvolver empatia, apreciar diversidade e respeitar os outros. Autogerenciamento. Aprender a controlar impulsos, saber lidar com estresse, ter disciplina, automotivação, buscar objetivos, construir habilidades organizacionais. Habilidades de relacionamento. Comunicação, engajamento social, construir relações e saber trabalhar em grupo. Tomada de decisão responsável. Identificar problemas, analisar e avaliar situações, solucionar problemas, refletir, ter responsabilidade ética (YOSHIDA, 10 de maio de 2018 – grifo da revista)

Percebo, mesmo na matéria acima, direcionada às competências infantis, uma semelhança com as qualidades requeridas pelo novo mundo do trabalho com novas formas de trabalho. Ou seja, competências socioemocionais se relacionam diretamente com as habilidades voltadas para a empregabilidade em um mundo em crise, competitivo, perpassado pelo desemprego e subempregos: comunicação clara e precisa; capacidade de análise tanto para solucionar conflitos como para prever e corrigir problemas do sistema produtivo; familiaridade com computadores e novas tecnologias; saber enfrentar as mudanças individualmente e em equipe; ser responsável, versátil, equilibrado emocionalmente, polivalente e policognitivo e estudar continuamente (GENTILI, 1996).

Mas é no Ensino Médio que as competências socioemocionais aparecem repetidamente, mais ainda quando ligadas ao que se chama como Projetos de Vida que por sua vez se articula

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com o chamado “protagonismo juvenil”. Evidenciando que “Em um mundo em constante transformação, escolher uma carreira parece cada vez mais difícil”, na matéria Como apoiar os

jovens a pensar em seus projetos de vida?, o objetivo seria exemplificar a demanda do jovem ter

suas próprias escolhas, de forma equilibrada e criativa, recolhendo ideias na escola para “planejar seu futuro” (SALAS, 10 de setembro de 2020). Nesta matéria, um jovem negro designado como “microempreendedor”, já estaria realizando curso superior de Publicidade e Propaganda, mas após um curso ligado aos Projetos de Vida, decide ser bombeiro. Obviamente, não existe nada errado em ser bombeiro, mas o que a revista está indicando seria o fato de que o jovem não precisa mais ter o curso superior como meta. A matéria se sustenta na ideia do protagonismo jovem, na sua liberdade de escolher o que quer da vida. Um protagonismo individual, que necessita das competências socioemocionais, que contraditoriamente prega o mérito, mas implanta a ideia de que existe um limite aonde este jovem deve chegar.

É comum, como na matéria Como alinhar a Educação 4.0 ao projeto de vida dos

estudantes relacionar as competências socioemocionais com outro fator considerado

imprescindível para a empregabilidade: a inclusão digital: “Compreender esse cenário atual é essencial para fortalecer o aprendizado em sala de aula, mas é importante dizer que ele deve ser acompanhado do desenvolvimento das habilidades socioemocionais – que são fundamentais para ensinar esses jovens a lidar com anseios e necessidades”, sendo que “Afinal, essas meninas e meninos vão circular em ambientes de trabalho digital, muitas vezes antes mesmo de aprender a ler e escrever” (GAROFALO, 20 de agosto de 2019 – grifo da revista)

Concordo com Laval, que nos apresenta a ideia de que todas as instituições foram afetadas pela chamada globalização e o neoliberalismo, “inclusive a instituição da subjetividade humana”, na medida em que seria necessário “a eliminação ode toda ‘rigidez’, inclusive a psíquica, em nome de uma adaptação às situações mais variadas com que o indivíduo depara n o trabalho e na vida” (LAVAL, 2019, 39). A insegurança diz respeito não só sobre conseguir um emprego, mas também ao conteúdo da profissão “a natureza das tarefas, a participação das empresas, as qualificações do indivíduo dentro de uma organização do trabalho mais fluida” (LAVAL, 2019, p. 43).

Entendo que o protagonismo juvenil nestes termos, na verdade é um discurso de exalta uma suposta participação juvenil, mas que na verdade procura evitar assegurar uma coesão, um equilíbrio em uma sociedade que não oferece muito futuro a este sujeito. Assim, o

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“protagonismo” ou “ativismo” juvenil, seria então uma apropriação de discursos construídos com outros objetivos, no exercício político e em espaços de formação do sujeito compromissado de forma individual e coletiva com a democracia. Estamos nos despedindo da literacia histórica o que certamente dá margem para que o jovem estudante aceite toda gama de “opiniões" históricas, inclusive aquelas revisionistas conservadoras ou mesmo negacionistas. Sem a História como ciência, o jovem torna-se, por mais inteligente que seja, vulnerável a determinadas correntes pseudo-históricas. Ainda mais quando o discurso é o de protagonismo juvenil, que incide na ideia de que o jovem pode escolher, optar, defender, muitas vezes, o indefensável. Por isso mesmo, discuto brevemente também este termo mal utilizado nas reformas curriculares: o protagonismo juvenil.

Referências

BALL, Stephen J. Educação Global S. A. Novas redes políticas e o imaginário neoliberal. Trad. Janete Bridon. Ponta Grossa, PR: UEPG, 2020.

CATELLI JR, Roberto. BNCC e a história na educação básica: um pouco mais do mesmo. IN: CÁSSIO , Fernando; CATELLI JR, Roberto (Org.). Educação é a base? 23 educadores discutem a BNCC. São Paulo: Ação Educativa, 2019.

COSTA, Marisa V. Mídia, magistério e política cultural. In COSTA, M. V. (Org.) Estudos

culturais em educação: mídia, arquitetura, brinquedo, biologia, literatura, cinema... Porto

Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2000.

DIONÍZIO, Elisângela Vieira. Plataformas digitais da Associação Nova Escola: interações e desenvolvimento profissional docente. Uberlândia: Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia, 2018.

GENTILI, P. A. A. O discurso da “qualidade” como nova retórica conservadora no campo educacional. In GENTILLI, P. A. A.; SILVA, T. T. Neoliberalismo, qualidade total e

educação. 4 ed., Petrópolis, RJ: Vozes, 1996.

HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. Trad. Adail Ubirajara Sobral; Maria Stela Gonçalves. 6 ed., São Paulo: Edições Loyola, 1996. LAVAL, Christian. A escola não é uma empresa. O neoliberalismo em ataque ao ensino público. Trad. Mariana Echalar. São Paulo: Bointempo, 2019.

LEE, Peter. Progressão da compreensão dos alunos em História. In.: BARCA, Isabel (org.)

Perspectivas em Educação: Actas das Primeiras Jornadas Internacionais de Educação Histórica.

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MACEDO, D.; BARTOLOMÉ, L. A globalização como uma forma de colonialismo: um desfio para os educadores e as educadoras. In SILVA, L. H. (Org.) A escola cidadã no contexto da

globalização. 2 ed., Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.

Fontes (Revista Nova Escola):

CALÇADE, Paula. 25 de maio de 2018. Disponível em

https://novaescola.org.br/conteudo/11796/habilidades-socioemocionais-sao-tao-importantes-quanto-os-rankings Acesso em 30 de novembro de 2020.

GAROFALO, Débora. 09 de outubro de 2019. Disponível em

https://novaescola.org.br/conteudo/18465/como-uma-atividade-em-grupo-ensina-inteligencia-emocional-aos-alunos Acesso 30 de novembro de 2020.

GAROFALO, Débora. 20 de agosto de 2019. Disponível em

https://novaescola.org.br/conteudo/18210/como-alinhar-a-educacao-40-ao-projeto-de-vida-dos-estudantes Acesso em 30 de novembro de 2020.

SALAS, Paula. 10 de setembro de 2020. https://novaescola.org.br/conteudo/19678/como-apoiar-os-jovens-a-pensar-em-seus-projetos-de-vida Acesso em 30 de novembro de 2020.

SEMIS, Laís. 11 de maio de 2018. Disponível em https://novaescola.org.br/conteudo/11736/para-entender-as-competencias-gerais-da-base-e-as-socioemocionais Acesso 30 de novembro de 2020.

WINKEL, Sophia; SEMIS, Laís. 04 de dezembro de 2018. Disponível em

https://novaescola.org.br/conteudo/14384/base-do-ensino-medio-por-que-o-relator-nao-votou-contra-nem-a-favor Acesso em 30 de novembro de 2020.

YOSHIDA, Soraia. 10 de maio de 2018. Disponível em

https://novaescola.org.br/conteudo/11731/criancas-precisam-aprender-habilidades-socioemocionais-na-escola Acesso em 30 de novembro de 2020.

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