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A OBRIGATORIEDADE DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS PARA MAIORES DE 70 ANOS DE IDADE À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

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A OBRIGATORIEDADE DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS PARA

MAIORES DE 70 ANOS DE IDADE À LUZ DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988

Leonardo Sebastião Delfino de Souza Contato: leonardodelfino@live.com

RESUMO

O presente artigo objetivou analisar a obrigatoriedade do regime da separação de bens para maiores de 70 anos estipulada no artigo 1.641, II, do Código Civil de 2002, com base no princípio da dignidade da pessoa humana, contido na Constituição Federal de 1988. Pretendeu-se com referido estudo discutir a problemática envolvendo o cerceamento quanto à escolha do Regime de separação de bens imposto à referidos indivíduos. O trabalho foi desenvolvido com base em pesquisa doutrinária, visando avaliar se o disposto na legislação civilista está de acordo, ou não, com a Constituição Federal de 1988.

Palavras-Chave: Constituição Federal. Regime Obrigatório de Bens. Maiores de 70 anos.

ABSTRACT

The aim of this article was to analyze the obligatoriness of property division for people over 70 years old stipulated in article 1.641, II, of the Civil Cold of 2002, based on the principle of human dignity, contained in the Federal Constitution of 1988. It was intended in this study referred to discuss the problematic involving the restriction as to the choice of the Regime of property division imposed to individuals. This work was developed based on doctrinal, aiming to evaluate whether the provisions of legislation are in accordance or not with the Federal Constitution of 1988.

Keywords: Federal Constitution. Obligation of Property Regime; People over 70 years.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho científico terá por finalidade o estudo da obrigatoriedade do regime de separação de bens no casamento para as pessoas maiores de 70 (setenta) anos de idade, conforme disposto no artigo 1.641, II, do Código Civil Brasileiro de 2002, frente ao disposto na Constituição Federal de 1988, em especial, no que tange ao princípio da Dignidade da Pessoa Humana, consubstanciado no artigo 1º, III, da Constituição Cidadã.

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Assim sendo, o presente artigo será dividido em três capítulos. O primeiro capítulo abordará a concepção constitucional da família, bem como o princípio da função social desta, buscando trazer esclarecimentos sobre o real objetivo de referido instituto.

O segundo capítulo tratará do princípio da proteção da dignidade da pessoa humana que se encontra disciplinado no artigo 1º, III, da Constituição Federal de 1988, trazendo à baila o real significado de referido instituto.

O terceiro capítulo trabalhará a obrigatoriedade do regime de separação de bens para maiores de 70 (setenta) anos à luz da Constituição Federal, bem como a possível inconstitucionalidade da norma disciplinada no artigo 1.641, inciso II do Código Civil Brasileiro.

Para alcançar o desiderato científico proposto, será utilizada a metodologia da pesquisa doutrinária, bem como a análise dos textos de lei, visando assim encontrar a melhor interpretação de referido tema ao caso concreto, buscando o objetivo da lei e sua melhor aplicação.

O problema do presente artigo enquadra-se no fato de analisar se a obrigatoriedade de adoção do regime de separação de bens para os maiores de 70 anos é, ou não, constitucional?

Por fim, o objetivo geral deste trabalho será discutir o tema da obrigatoriedade da adoção do regime de separação de bens para as pessoas que possuem mais de 70 anos de idade no momento do casamento, bem como a análise do mesmo diploma legal perante a Constituição da República. Para tanto, alguns objetivos específicos se fazem necessários, dentre eles, analisar a doutrina referente ao tema, relacionar a Constituição Federal com a lei infraconstitucional e verificar a evolução legislativa atinente ao tema.

Destaca-se que o presente artigo não tem por escopo debater direitos patrimoniais, dentre eles a proteção a herança e a expectativa de direito dos herdeiros, sendo o objetivo deste trabalho analisar tão somente o direito subjetivo do indivíduo maior de 70 anos de idade de escolher o regime de bens que quer adotar em seu casamento, tendo por base a Constituição Federal de 1988. Entende-se o não cabimento da discussão neste trabalho de direitos patrimoniais relacionados a herança, sendo contemplado apenas a constitucionalidade, ou não, do artigo 1.641, II, do Código Civil.

O texto final foi fundamentado nas ideias de autores como: Dias (2015), Diniz (2010), Farias (2010), Gagliano (2016), Moraes (2002), Rodrigues (2004), Tartuce (2012), Venosa (2016), dentre outros.

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1 – Concepção constitucional de família e sua função social

A Constituição Federal de 1988, trouxe no Título VIII – Da ordem social, o Capítulo VII que trata da família, da criança, do adolescente e do idoso, mostrando desta forma a preocupação do legislador constituinte com os quatro temas supramencionados.

Interpretando-se um dos dispositivos constantes desse capítulo, qual seja, o artigo 226 da Constituição da República, podemos constatar que a família, base da sociedade, tem a especial proteção do Estado e é decorrente do casamento civil, da união estável ou através da família monoparental.

Destaca-se que, tem prevalecido na doutrina, o entendimento pelo qual o rol constitucional familiar é exemplificativo (numerus apertus) e não taxativo (numerus clausus), sendo assim, são admitidas outras formas de família.

Destes três tipos de famílias trazidos pela Constituição Federal nos debruçaremos sobre a família decorrente do casamento civil.

Sabe-se que, a família é considera a célula mater da sociedade, ou seja, segundo o caput do artigo 226, da Constituição Federal de 1988, a família é base da sociedade.

Trazemos à baila referida questão para mostrarmos o quanto a Carta Magna deu importância à família e à sua constituição, uma vez que o objetivo é a constituição de um vínculo matrimonial baseado no amor, respeito mútuo e fidelidade recíproca.

Ocorre que, conforme verificaremos, a norma infraconstitucional, qual seja, o Código Civil de 2002, restringiu os efeitos patrimoniais de uma determinada parcela de indivíduos, quais sejam, os cidadãos acima de 70 (setenta) anos, tão somente pela questão da idade.

Pela análise da concepção constitucional de família e o princípio da função social desta, percebemos que, o que deve regular referida união diz respeito ao amor mútuo dos nubentes entre si, e não apenas uma questão meramente patrimonial, como se infere pela análise de referida proibição.

Ao serem obrigados a adotar o regime de separação de bens, os maiores de 70 anos, são cerceados do direito de escolha, tendo em vista apenas o fator etário, sendo-lhes negado a oportunidade de escolha do regime de bens que melhor lhes aprouver.

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2 – Princípio da proteção da dignidade da pessoa humana

Segundo estipula o artigo 1º, inciso III, da Constituição da República, a República Federativa do Brasil tem entre seus fundamentos a Dignidade da Pessoa Humana. Referido princípio trata-se do que comumente se denomina de princípio máximo, ou superprincípio, ou

macroprincípio, ou princípio dos princípios.

No campo do direito privado, não há ramo que a Dignidade da Pessoa Humana tenha maior concentração do que no Direito de Família. Maria Helena Diniz (2015), posiciona-se sobre a dignidade da Pessoa Humana da seguinte forma:

É o princípio maior, fundante do Estado Democrático de Direito, sendo afirmado no primeiro artigo da Constituição Federal. A Preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor nuclear da ordem constitucional. (grifo do autor) (DINIZ, 2015, p. 62)

A exata conceituação de Dignidade da Pessoa Humana é muito difícil, até por se tratar de uma cláusula geral, de um conceito indeterminado, com as mais diversas interpretações.

A ideia da dignidade da pessoa humana surgiu após a II Guerra Mundial devido à imperativa necessidade de se resguardar os direitos básicos que propiciassem ao ser humano a realização em todos os setores de sua existência, qual seja, psicológico, emocional, físico, afetivo e mental, tendo referido princípio por objetivo o amparo e a proteção à pessoa humana.

Boa parte da doutrina moderna aborda o princípio da dignidade humana como basilar para permitir que os indivíduos se realizem enquanto pais, filhos, cônjuges, crianças, adolescentes, idosos, enfim, como sujeitos titulares de direito que são.

Para tentar nos situarmos, podemos analisar a dignidade humana a partir do ser humano em seu contexto social.

Referido princípio é fundamental ao analisarmos o processo de formação da família, de maneira igualitária e digna em relação à sua constituição, independente de raça, cor, credo, sexo ou muito menos a idade dos cônjuges.

Desta forma, faz-se necessária refletirmos na formação da entidade familiar de maneira digna, recebendo, acima de tudo, tratamento igualitário quanto à sua constituição e formação,

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permitindo assim que todos os membros de uma família se desenvolvam do ponto de vista pessoal e social.

A constitucionalidade, ou não, da norma ora analisada reflete diretamente no que diz respeito ao princípio da Dignidade da Pessoa Humana, além de ferir outros princípios que dele decorrem.

A Dignidade da Pessoa Humana, apesar das dificuldades materiais e socioculturais, deve ser resguardada e protegida de qualquer tipo de transgressões que possa vir a agredir o ser humano e os direitos a ele resguardado.

3– A obrigatoriedade do regime de separação de bens para maiores de 70 anos

de idade

Segundo o artigo 1.513 do Código Civil Brasileiro de 2002: “É defeso a qualquer pessoa de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família”, por esta norma legal, verificamos a consagração do princípio da liberdade ou da não intervenção na ótica do Direito de Família.

Já o artigo 1.565, § 2º, da mesma codificação rege que: “O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições públicas ou privadas”

Por certo que o princípio da liberdade ou não intervenção na ótima do Direito de família mantém relação direta com o princípio da autonomia privada que deve existir no campo do Direito de Família, tendo como fundamento constitucional da autonomia privada, a liberdade, um dos principais atributos do ser humano, consagrados no artigo 1º, III, da Constituição da República.

Retomando à análise do artigo 1.513 do Código Civil de 2002 percebemos que, o real sentido do dispositivo e que, o Estado ou mesmo um ente privado não podem intervir coercitivamente nas relações de família.

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Em regra, cabe aos noivos escolher o Regime de bens que irá reger o casamento, nos termos do artigo 1.639 do Código Civil que assim dispõe: “é lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver. ”

Seguindo a mesma linha de direcionamento, o artigo 1.640, parágrafo único do mesmo Código, estipula que: “Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este Código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas”.

Tais dispositivos corroboram a liberdade de escolha para o casamento, devendo o princípio da liberdade de escolha ser encontrado em todas as formas do casamento, assegurando aos nubentes o direito de constituir a união da forma como melhor lhes aprouver.

Ressalta-se ainda que o regime de separação de bens trata de direito disponível, sendo mais claro o caráter substancialmente patrimonial do regime de bens, surgindo assim a possibilidade da livre disposição pelos noivos.

A liberdade rege, desta forma, a situação dos bens dos nubentes, sendo-lhes possibilitado escolher qual a melhor forma de atingir os objetivos de ambos.

Se referida forma de liberdade rege o poder de escolha quanto ao regime de bens dos casais das demais faixas etárias, o mesmo deveria ocorrer em relação aos idosos com mais de 70 anos de idade, mas o mesmo não ocorre, sendo estes últimos obrigados a contrair núpcias com um regime de bens escolhido segundo a vontade do legislador pátrio.

Existem, todavia, exceções a essa autonomia de escolha, em situações nas quais a lei impõe o regime de separação de bens que deverá ser adotado, sendo imposto em determinadas condições, um regime obrigatório de bens. Neste sentido o artigo 1641 do Código Civil de 2002 assim dispõe:

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos;

III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Em relação ao referido dispositivo, o que nos interessa é o inciso II que estipula que é obrigatório o regime de separação de bens no casamento no que diz respeito às pessoas maiores de 70 (setenta) anos de idade.

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Interessante destacarmos que referido inciso foi alterado em 09 de dezembro de 2010 pela lei nº 12.344, que aumentou de 60 (sessenta) para 70 (setenta) anos de idade a obrigatoriedade do regime de separação de bens.

No que diz respeito ao casamento do maior de 60 (sessenta) anos, conforme constava no Código Civil, antes da Lei 12.344 de 09/12/2010, como os maiores de 50 (cinquenta) anos conforme estipulado no Código Civil de 1916, o legislador compreendera que nessa fase da vida, na qual provavelmente o patrimônio de um ou de ambos os nubentes já encontraria estabilizado, e quando não mais casariam no arroubo da juventude, devendo o conteúdo patrimonial ser peremptoriamente afastado.

O objetivo seria afastar o incentivo patrimonial para a contração do matrimônio dos mais jovens com os mais idosos.

O atual Código Civil, em atendimento à igualdade constitucional do homem e da mulher, estabeleceu a idade de 60 (sessenta) anos para ambos os sexos, sendo a faixa posteriormente majorado para 70 (setenta) anos pela Lei 12.344/2010, como já mencionado.

Sílvio Rodrigues (1999), posiciona-se contra a disposição, no sentido de a norma ser uma imposição legal contra a liberdade individual, da seguinte forma:

Aliás, talvez possa dizer que uma das vantagens da fortuna consiste em aumentar os atrativos matrimoniais de quem a detém. Não há inconveniente social de qualquer espécie em permitir que um sexagenário ou uma quinquagenária ricos se casem pelo regime da comunhão, se assim lhes aprouver. (RODRIGUES, 1999, p. 165)

Podemos perceber, embora pese a resistência doutrinária, o Código Civil de 2002 manteve a restrição da lei.

A majoração realizada pela lei 12.344/2010 veio com o objetivo de atender a atualidade, uma vez que, com base nos novos padrões de expectativa de vida, vivemos cada vez mais, o que justificaria o aumento de 60 (sessenta) para 70 (setenta) anos.

Maria Berenice Dias (2015), ao tratar do tema em sua obra Manual de Direito das Famílias, assim se posiciona:

Das várias previsões que visam negar efeitos de ordem patrimonial ao casamento, nenhuma delas justifica o risco de gerar enriquecimento sem causa. Porém, das hipóteses em que a lei determina o regime de separação obrigatória de bens, a mais desarrazoada é a que impõe tal sanção aos nubentes maiores de 70 anos (art. 1641, II), em flagrante afronta ao Estatuto do idoso. A limitação

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da vontade, em razão da idade longe de se constituir em uma precaução (norma protetiva), se constitui em verdadeira sanção. Somente quando o casamento é antecedido de união estável não vigora a odiosa restrição, podendo os noivos optar pelo regime de bens que desejarem. (DIAS, 2015, p. 327)

Para a autora acima mencionada, as demais sanções contidas no artigo 1641, ao menos existem justificativas de cunho patrimonial, uma vez que, é possível identificar a tentativa de proteger o interesse de alguém.

No que tange aos idosos, no entanto, há uma presunção juris et juris da total falta de capacidade mental dos mesmos, pois sem buscar qualquer subsídio probatório, o legislador, de plano, limita a capacidade de alguém exclusivamente para o fim de subtrair a liberdade de optar por qual regime de bens deseja adotar quando do casamento.

Referida incomunicabilidade é ampla e absoluta, não restando prevista qualquer possibilidade de ser afastada da condenação legal.

Quando analisamos as outras duas hipóteses do artigo 1641 do Código Civil, percebemos que as mesmas podem ser excluídas pelo magistrado, o que não ocorre com o inciso II.

No caso do inciso I de referido artigo, este poderá ser excluído pelo parágrafo único do artigo 1.523, que permite aos nubentes solicitar ao juiz que não lhes sejam aplicadas as causas suspensivas previstas em alguns dos incisos do artigo.

Outro caso é o do inciso III do artigo 1.641, que permite a utilização do suprimento judicial.

Tal oportunidade não é dada aos noivos idosos, mesmo que estes comprovem a sinceridade do amor, sua plena capacidade mental e até mesmo o fato de não terem herdeiros necessários a quem deixar seus bens, todas essas circunstâncias não possuem o condão de eliminar, para os que passaram dos 70 anos de idade, o direito de escolher o regime de bens que regerá seu casamento.

Referido proibitivo, segundo muitos autores, é uma escancarada afronta ao princípio da isonomia e ao da Dignidade da Pessoa Humana.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2016), em sua obra direito de família: as famílias em perspectivas constitucional, defendem a ideia de que a situação de previsão do artigo 1.641, II, do Código Civil é absurda, indo além, afirmando que a mesma é inconstitucional.

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Para referidos autores a alegação de que a imposição do regime de separação de bens entre aqueles que tem mais de 70 anos de idade, que teria o intuito de proteger os idosos das investidas de interesseiros que teria por objetivo aplicar o “golpe do baú”, não convence.

Os autores trazem à baila o fato que, mesmo que esse fosse o objetivo da lei, a mesma resguardaria tão somente uma pequena parcela de pessoas abastadas, prejudicando, em contrapartida, um número bem maior de brasileiros, que teriam o direito da escolha do regime de bens cerceados por uma minoria.

Ainda sobre o tema, os autores deixam claro que a idade avançada, por si só, não seria uma causa de incapacidade.

Se houvesse o receio de o idoso ser vítima de um golpe por conta de uma possível vulnerabilidade explicada por enfermidade ou deficiência mental, o caminho mais indicado seria a instauração de um procedimento próprio, qual seja, uma ação de interdição, mas não se concluir por uma restrição de direitos, simplesmente por conta da idade.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona ainda alertam que, em nosso país, com 60 anos (como era o limite da redação do dispositivo) e aos 70 anos (como encontra-se na atual redação), pode-se integrar a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, podendo ainda, no limite etário de 60 anos, compor a mais alta Corte Brasileira, na condição de ministro, não se podendo, todavia, escolher o regime de bens.

Em suma, para referidos autores, o artigo 1.641, II, é inconstitucional, muito embora esta, ainda, não tenha sido pronunciada, em controle abstrato, pelo Supremo Tribunal Federal.

Os autores acima mencionados, posicionam-se no sentido de que:

Ora, promovendo a exegese de referida intervenção estatal na esfera de interesses privados, é fácil concluir que, a partir da valorização da pessoa humana e de suas garantias constitucionais, a regra legal se põe em rota direta de colisão com os princípios da igualdade substancial, da liberdade e da própria dignidade humana”. (STOLZE, PAMPLONA, 2016, p. 325)

Referido posicionamento, corrobora o entendimento no sentido da inconstitucionalidade da norma à luz da Carta Maior, principalmente em clara afronta ao princípio da igualdade, bem como o princípio da Dignidade da Pessoa Humana constante no artigo 1º, III, da Constituição Federal de 1988.

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CONCLUSÃO

Pelo presente estudo foi possível constatar que a família é considerada pela Constituição Federal e pelo ordenamento jurídico brasileiro como a base da sociedade, tendo como princípios norteadores a autonomia da vontade e a liberdade de escolha quanto a constituição do mesmo.

Abordou-se ainda, o princípio da Dignidade de Pessoa Humana que se encontra consagrado no artigo 1º, inciso III, da Constituição da República que assegura a todos os seres humanos a garantia de ter assegurado os direitos básicos para a sua plena realização física, psicológica, mental, emocional, intelectual e espiritual, tendo por base a felicidade e a satisfação pessoal.

Analisou-se ainda a obrigatoriedade do regime de separação de bens para os maiores de 70 anos à luz da Constituição Federal de 1988, abordando os pontos contravertidos na doutrina sobre referido tema.

A partir do estudo sobre a matéria constatou-se, ao nosso sentir, a desnecessidade da norma contida no artigo 1.642, II, do Código Civil de 2002, tanto do ponto de vista legislativo, quanto do ponto de vista humanístico.

O idoso acumula em si toda a experiência de uma vida toda, trazendo consigo os ensinamentos experimentados ao longo dos anos.

Acreditar que o único atributo que o idoso tenha seja sua conta bancária ou os bens materiais que este possui e desacreditar que as pessoas acima dos 70 anos de idade possam possuir pontos positivos a fim de despertar em outras pessoas o interesse de com ela contrair núpcias e passar ao seu lado os últimos anos de sua vida.

Pressupor que a simples senilidade, por si só é causa de debilidade intelectual, mental ou cognitiva e relegar as pessoas de mais idade à ideia preconcebida de que as mesmas são incapazes de gerir os atos da vida civil, dentre eles o direito de livre escolha do regime de bens que, porventura desejem escolher.

Caso exista algum tipo de incapacidade mental ou cognitiva que impeça, não só os idosos, mas todos as pessoas em geral, de exercer os atos da vida civil, o instrumento que deverá ser manejado é a ação de interdição.

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O artigo 1.642, II, do Código Civil, traz em seu bojo, sob o véu da proteção ao idoso, uma carga valorativa carregada de preconceito e discriminação, no qual relega o idoso a ideia de um indivíduo que já não mais consegue distinguir entre o afeto e o interesse, entre o prazer da companhia e o prazer do poder de compra, dando-nos a imagem que o único ponto positivo que a melhor idade pode ter é o acúmulo de bens que o indivíduo realizou ao longo de sua existência.

Em momento algum estamos defendo a ingênua tese de que todas os relacionamentos em que haja diferença de idade seja baseado no amor e na ausência de interesse, o que se procura defender é a igualdade de direitos, inclusive o direito de escolha do regime de bens ao qual se submeterão, de indivíduos que possuem a mesma capacidade para os atos da vida civil.

A Constituição Federal, principalmente o princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III) deixa claro que o ser humano tem o direito de buscar a felicidade, e desde que não haja nenhum impedimento da ordem que afete o discernimento necessário para a tomada de decisões dos atos da vida civil, de escolher o regime de bens que deseja se casar após os setenta anos de idade.

Lembramos ainda que, tanto a população brasileira, como a população global, a cada dia envelhece mais, sendo que a expectativa de vida, ao que tudo indica, continuará a subir, ou seja, cada vez mais teremos pessoas acima dos 70 anos de idade com seus direitos violados por conta de referida norma infraconstitucional em flagrante afronta aos princípios contidos em nossa Carta Magna.

Diante de todo o exposto, percebeu-se que a norma do artigo 1.641, II, do Código Civil de 2002, encontra-se em desacordo com a Dignidade da pessoa humana insculpido no artigo 1º, III, da Constituição Federal de 1988, bem como com outros princípios como a isonomia, o direito de livre escolha no que diz respeito ao casamento, dentre outros.

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