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RELATÓRIO DE TRABALHO No.2/98

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Academic year: 2021

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LEMT-Laboratório de Estudos Metodológicos em Tráfego e Transportes

Departamento de Engenharia de Transportes - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo

Caixa Postal 61549, CEP 05424-970, São Paulo/S.P., Brasil

RELATÓRIO DE TRABALHO No.2/98

AVALIAÇÃO DA TÉCNICA SUECA DE ANÁLISE DE CONFLITOS DE

TRÁFEGO

- Aplicação ao Estudo de Problemas de Segurança de Pedestres em Interseções

Semaforizadas da Cidade de São Paulo

Prof.Dr.HUGO PIETRANTONIO

Departamento de Engenharia de Transportes-EPUSP

São Paulo, março/1999 (1

a

.edição)

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AVALIAÇÃO DA TÉCNICA SUECA DE ANÁLISE DE CONFLITOS DE TRÁFEGO - Aplicação ao Estudo de Problemas de Segurança de Pedestres em Interseções Semaforizadas da

Cidade de São Paulo. Eng.Hugo Pietrantonio, Prof.Doutor

Departamento de Engenharia de Transportes

RESUMO:

O objetivo deste trabalho é esclarecer as diferenças entre os conceitos gerais e operacionais utilizados nas Técnicas de Análise de Conflitos de Tráfego (TCTs), especialmente no contexto do estudo dos problemas de segurança de pedestres, e investigar a utilidade prática da sua aplicação na análise de interseções semaforizadas da cidade de São Paulo. Depois de discutir cuidadosamente as diferenças entre as técnicas de análise de conflitos de tráfego do U.S.FHWA e LIT/Suécia e as questões práticas e teóricas decorrentes das opções adotadas por cada método, o estudo avalia o potencial de contribuição oferecido pelo uso de dados sobre conflitos de tráfego para o diagnóstico dos problemas de segurança de pedestres, em adição à análise tradicional de dados sobre acidentes de trânsito. Os principais resultados podem ser resumidos na demonstração do caráter complementar dos dados sobre conflitos e acidentes de tráfego para diagnóstico dos problemas de segurança, da insuficiência dos critérios de severidade dos conflitos de tráfego para permitir uma simplificação da análise dos dados de conflitos e, portanto, da importância de parâmetros específicos de análise por tipo de local e conflito para diagnóstico de segurança com base em dados sobre contagens de conflitos de tráfego. O estudo analisou as travessias existentes em interseções de um tipo particular (semaforizadas com grandes fluxos de veículos e pedestres, normalmente com canteiros centrais ou mão única nas aproximações) e que suas conclusões práticas basearam-se na análise comparativa de 2 dias de contagens de conflitos e 2 anos de acidentes.

ABSTRACT:

The paper’s objective is to enlighten the differences between the general and operational concepts used by the Traffic Conflicts Analysis Techniques (TCTs), especially in the context of the study of pedestrian safety problems, and investigate the practical usefulness of its application to the analysis of signalised intersections in the city of São Paulo, Brazil. After carefully discussing the differences between the U.S.FHWA and LIT/Sweden TCTs and the practical and theoretical questions raised by the adopted options of each method, the study evaluates the potential contribution provided by TCTs data for the diagnostic of safety problems, in addition to the traditional analysis of traffic accidents. The main results can be summarised in the demonstration of the complementary role of traffic accident and conflict data to diagnose safety problems, of the insufficiency of the severity criteria for traffic conflicts to permit a simplified analysis of the data on conflicts and, therefore, of the importance of specific parameters of analysis by type of site and conflict for the diagnostic of safety based on traffic conflict counts. The study has analysed the existing crossings on intersections of a particular type (signalised intersections with high vehicular and pedestrian flows, usually with one-way operation or medians in the approaches) and that its practical conclusions were based on comparative analysis of 2 days of conflict counts and 2 years of accidents.

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1. INTRODUÇÃO

O estudo dos problemas de segurança de trânsito é um interessante desafio à Engenharia de Tráfego, cuja importância tem sido reconhecida desde a muito tempo. Os danos decorrentes dos acidentes de trânsito, em especial os de natureza humana, e o incomodo gerado pela vivência cotidiana de situações de risco são as justificativas básicas para esta preocupação.

Um dos aspectos mais delicados do estudo dos problemas de segurança de trânsito decorre da dificuldade em realizar um diagnóstico minimamente informado, em função da precariedade dos dados usualmente disponíveis sobre sua principal fonte de informações: os acidentes de trânsito. Pelo fato de não serem observados de forma controlada durante sua ocorrência, tanto no que se refere aos fatores objetivos como aos aspectos subjetivos envolvidos, existe a reconhecida necessidade de complementar a informação sobre os acidentes de trânsito com dados de outra natureza.

Neste contexto, a legitimidade da utilização de dados sobre os conflitos de tráfego para a análise dos problemas de segurança viária pode ser vista por duas óticas distintas.

Por um lado, admitindo que os problemas de segurança de trânsito são essencialmente relacionados com a ocorrência dos acidentes (isto é, de eventos em que pelo menos um dos usuários da via sofre com a ocorrência de danos materiais ou humanos concretos, que têm repercussões econômicas e pessoais), a utilização de dados sobre conflitos de tráfego decorreria da demonstração da existência de uma forte relação entre a ocorrência de um e outro tipo de fenômeno, relação que deveria ser efetivamente estabelecida em cada contexto específico (nesta ótica, os conflitos seriam vistos como proxies dos acidentes de trânsito).

Por outro lado, admitindo um conceito mais geral para a segurança de trânsito, estendendo sua amplitude para incorporar outros eventos com significação mais diretamente relacionada com a percepção de situações de risco e com o desconforto gerado por elas (efeitos essencialmente subjetivos), a utilização de dados sobre conflitos de tráfego decorreria da necessidade de objetivar a mensuração destas outras dimensões do problema, de forma complementar a descrição dos eventos revelados pela ocorrência dos diferentes tipos de acidentes.

Ambas as óticas podem justificar a utilização das técnicas de análise de conflitos de tráfego e a adoção de uma posição mais aberta (isto é, aceitando os conflitos como um problema de segurança de trânsito, em si próprios) não elimina ou reduz a importância da questão relacionada com a verificação da relação existente entre a sua ocorrência e a ocorrência dos acidentes de trânsito (os eventos mais preocupantes). Existe também um aspecto prático importante. Embora tenha uma dificuldade de aplicação significativa, tanto em termos de custos quanto em termos de prazos para obtenção de dados, a análise de conflitos de tráfego permite utilizar uma técnica de resposta rápida, bastante rica em informações descritivas sobre os aspectos de segurança envolvidos na operação do tráfego e também passível de análise quantitativa. Por sua vez, a coleta de dados sobre conflitos de tráfego permite sempre garantir a obtenção de informações atualizadas e pertinentes (característica que nem sempre pode ser afirmada para os dados disponíveis sobre acidentes).

Fundamentalmente, a técnica de análise de conflitos de tráfego busca uma forma de observação direta que possa proporcionar um diagnóstico e uma avaliação mais precisa e detalhada dos problemas de segurança de trânsito e dos efeitos de alternativas de intervenção. Da mesma forma como acidentes fatais ou com feridos graves devem ser analisados com maior preocupação que os acidentes com feridos

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leves ou danos apenas materiais, esta medida complementar teria uma ponderação específica menor, como medida de insegurança.

As vantagens e desvantagens da utilização da técnica de análise de conflitos de tráfego, dada a aceitação da sua legitimidade, podem então recomendar a sua aplicação a cada estudo específico ao ponderar seu contexto prático (ver PIETRANTONIO/1991, item 1.1, ou então HYDÉN/1987, itens 2.2 e 2.3, MUHLRAD/1988, itens I.1 e I.2, BAGULEY/1988, item 1,2, PARKER/ZEGEER/1989a, capítulo 1, para citar as referências básicas).

Preliminarmente, é interessante ter em vistas dois aspectos importantes relacionados com o uso de dados de conflitos de tráfego (que podem merecer atenção especiais nas técnicas de análise).

Primeiro, deve-se ter em mente que os dados sobre conflitos estão longe de ser a única fonte de dados alternativa sobre problemas de segurança de trânsito em relação aos acidentes.

Dentro da mesma linhagem de acidentes e conflitos, o conceito mais geral é o de nível de exigência (workload), entendido como o nível de desempenho necessário para manter-se em operação segura no tráfego (permitindo avaliar, separadamente, os requisitos sobre usuários, veículo e via).

Como fontes complementares, existem diversos processos de obtenção de medidas físicas relacionadas com fatores intervenientes em problemas de segurança que podem compor os dados para diagnóstico (por exemplo, distribuição das velocidades veiculares, distância de visibilidade, coeficiente de aderência, luminosidade existentes, entre outras).

Segundo, deve-se ponderar o fato de que os conflitos de trânsito são eventos normais na operação do tráfego, característica da qual decorrem vantagens e desvantagens intrínsecas à sua utilização.

Por um lado, a observação dos conflitos de tráfego torna-se direta, tanto mais fácil e confiável (estatisticamente falando) quanto mais frequente for o tipo de evento em análise.

Por outro lado, fogem da cadeia de causalidade relacionada com a ocorrência dos conflitos de tráfego mais frequentes os fatores singulares muitas vezes associados aos acidentes de trânsito (como os relacionados com condições ambientais especialmente exigentes ou com formas de comportamento aberrante dos usuários ou defeitos veiculares extremos).

Toda esta linhagem de metodologias tem ainda a deficiência comum de não ser adequadamente sensível ao nível de exposição (além da possibilidade de exprimí-las como taxas). Por exemplo, suprimir viagens reduz acidentes, conflitos e nível de exigência experimentados pelos usuários da via mas naturalmente teria de ser associado a uma piora de segurança, ao invés de uma melhora (o que provavelmente exigiria um enfoque que examinasse a realização das atividades dos indivíduos).

Em vista das características apontadas, pode-se ver que é extremamente oportuno desenvolver métodos integrados de análise de problemas de segurança de tráfego. Sem reduzir a importância do estudos dos aspectos metodológicos relacionados com o uso de cada tipo de informação particular (como os dados de conflitos de tráfego), deve-se reconhecer a necessidade de identificar as limitações correspondentes e as fontes de dados complementares que podem ajudar a superá-las.

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2. AS TÉCNICAS DE ANÁLISE DE CONFLITOS DE TRÁFEGO

O desenvolvimento das técnicas de análise de conflitos de tráfego teve já um progresso significativo, desde sua origem que remonta aos anos 60 (ver, por exemplo, o breve histórico na introdução de PIETRANTONIO/1991), sem ter conseguido, entretanto, guindá-la à posição de uma técnica de uso corrente (ou mesmo amplo conhecimento e aceitação) no meio profissional da Engenharia de Tráfego. Embora esta constatação não deva ser transformada em um julgamento desfavorável sobre seu grau de maturidade (por exemplo, em outros campos como no tráfego aéreo ou ferroviário, em que não há a mesma disponibilidade de dados sobre acidentes, as situações de conflito ou de risco menor são normalmente utilizadas na análise de segurança), o fato indica a necessidade de novos aperfeiçoamentos (além de uma mais ampla difusão de informação à respeito).

Os aspectos metodológicos básicos das medições de conflito de tráfego (como a reproducibilidade e comparabilidade dos registros feitos por observadores treinados e com a viabilidade dos procedimentos de observação, dos pontos de vista prático ou estatístico) foram extensamente analisados nos seguidos encontros promovidos pelo ICTCT (originalmente International Commitee on Traffic Conflict

Techniques, hoje International Cooperation on Theories and Concepts in Traffic Safety).

Todas as referências básicas citadas anteriormente, por exemplo, resultaram dos trabalhos das equipes envolvidas nos encontros promovidos pelo ICTCT e surgiram quase simultaneamente, entre 1987 e 1989. Entretanto, em vista deste desenvolvimento paralelo, não se deve supor que os diferentes métodos são uniformes, seja nos aspectos conceituais ou práticos mais específicos.

Como os esforços preliminares de comparação enfatizaram os aspectos metodológicos básicos, pode-se dizer que existe uma lacuna significativa quanto à avaliação prática dos diferentes métodos, do ponto de vista da facilidade de aplicação e da validade dos seus resultados. GUEDES/BRAGA/PIETRANTONIO/1997 mostram um esforço preliminar de comparação entre os métodos do U.S.FHWA e do INRETS/França, aplicados em contextos diferentes e por equipes distintas. Em ambos os casos, a ênfase principal recaiu sobre a análise dos conflitos veiculares (apesar de nenhum dos estudos ter excluído da observação e análise os conflitos envolvendo pedestres).

Assim como os acidentes veiculares foram um foco principal de atenção por muito tempo, as referências básicas mencionadas anteriormente também trataram com muito maior ênfase os conflitos veiculares.

Os trabalhos suecos podem ser considerados, em certa medida, exceções a este respeito. No entanto, embora citem com freqüência dados sobre conflitos envolvendo pedestres e ciclistas, os trabalhos suecos são os menos claros e precisos sobre os conceitos e procedimentos de observação utilizados e seus critérios de aplicação sofreram diversas alterações ao longo do tempo, muitas delas não apresentadas e justificadas de forma ampla na literatura internacional (particularmente os trabalhos realizados no LIT-Lund Institute of Technology, Suécia, antes e também depois de HYDÉN/1987). Por sua vez, PIETRANTONIO/1991 destaca que a aplicação da técnica do U.S.FHWA para a observação de conflitos envolvendo pedestres é uma extensão singela das recomendações feitas para a observação de conflitos veiculares. A aplicação dos procedimentos de diagnóstico dos problemas de segurança dos conflitos veiculares apresentados em PARKER/ZEGEER/1989 para o caso da análise dos conflitos envolvendo pedestres teve de ser complementada e recorrer a dados indiretos relatados em GARDER/1989 (do RIT-Royal Institute of Technology, de Estocolmo) e aos resultados comparativos apresentados em GRAYSON/1984 (referente ao estudo de Malmö).

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Os trabalhos práticos em uma experiência de utilização, que estudou a interseção entre a Avenida 9 de Julho e Alameda Lorena, na cidade de São Paulo, em 1992, evidenciaram resultados globais bastante insatisfatórios em comparação com os obtidos para conflitos veiculares. Neste estudo, não foi possível relacionar esta precariedade dos resultados especificamente com os aspectos de observação ou com os aspectos de diagnóstico (no caso da técnica do U.S.FHWA, a utilização de contagens de conflitos de tráfego para diagnóstico não é imediata e envolve parâmetros diferenciados por tipo de local e tipo de conflito, que não puderam ser obtidos da análise do estudo complementar de GARDER/1989).

Este é o contexto básico que motivou a realização deste trabalho e é a razão básica para o esforço especialmente orientado para a observação dos conflitos de tráfego envolvendo pedestres.

A técnica do LIT/Suécia, além da atenção especial aos conflitos envolvendo pedestres e ciclistas (genericamente incluídos na categoria de usuários desprotegidos), reivindica maior facilidade de aplicação, por estar baseada em critérios de aplicação geral (válidos para os diferentes tipos de locais e de conflitos, divididos em categorias bastante amplas). Na verdade, esta possibilidade de uma aplicação mais simples e direta (que, em princípio, decorreria da classificação dos conflitos por nível de severidade) é um suposto aspecto da técnica do LIT/Suécia ainda não claramente demonstrado no campo empírico. Este ponto justifica um interesse especial na sua validação, por representar a verificação empírica de uma vantagem prática bastante importante.

Enquanto o diagnóstico dos problemas de segurança na técnica do U.S.FHWA depende dos parâmetros específicos por tipo de local e de conflito (os níveis normais de conflito e as taxas de acidente/conflito, que exigem levantamentos e análises de dados extensos, e que estão atualmente disponíveis apenas para interseções simples com quatro aproximações), a técnica do LIT/Suécia considera possível dispensá-los (apenas diferenciando taxas de acidentes por conflito entre categorias genéricas).

Em contrapartida, a técnica do LIT/Suécia está baseada na classificação da severidade dos conflitos de tráfego em função da velocidade dos usuários envolvidos e da sua distância ao ponto de conflito, para limitar a análise à utilização dos conflitos sérios (ao contrário da técnica do U.S.FHWA, que considera todos os conflitos que ocorrem na área de observação). Sua aplicação também utiliza uma forma de registro mais descritiva sobre cada um dos conflitos de tráfegos (ao contrário da técnica americana, que normalmente apenas realiza contagens de conflitos por tipo).

Na verdade, os procedimentos das técnicas do U.S.FHWA e do LIT/Suécia podem ser considerados extremos em relação a diversas das características comentadas acima e, por este aspecto, uma avaliação que contrasta estas facetas é especialmente interessante.

2.1. As Principais Técnicas Oficiais de Análise de Conflitos de Tráfego

Conforme dito, diversos países desenvolveram e avaliaram procedimentos próprios para análise de conflitos de tráfego, desde que a idéia inicial foi proposta nos estudos pioneiros de Perkins, no General Motors Research Laboratories (ver PARKINS/HARRIS/1968) e o estudo internacional de calibração em Malmö, Suécia, foi um marco importante para a maturação de diversos dos métodos propostos. As principais técnicas atualmente propostas são a sueca (do LIT/Suécia, descrita genericamente em HYDÉN/1987, e que pode ser complementada pelas anotações de ALMQVIST/1998), a francesa (do INRETS/França, descrita detalhadamente em MUHLRAD/1988), a inglesa (do U.K.TRL, descrita detalhadamente em BAGULEY/1988) e a norte-americana (do U.S.FHWA, descrita detalhadamente em PARKER/ZEGEER/1989a,b). Todas estas técnicas estiveram presentes no estudo de calibração de

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Malmö e tiveram evoluções importantes nesta ocasião. ASMUSSEN/1984 contém uma coletânea de descrições contemporâneas, no estágio inicial da realização do estudo de calibração de Malmö (que, além das técnicas mais conhecidas, incluem as de países como Alemanha, Canadá, Finlândia e Austria) e GRAYSON/1984 mostra os resultados principais do estudo comparativo realizado em Malmö.

O primeiro produto deste esforço internacional de calibração foi um consenso inicial sobre o conceito genérico de conflito de tráfego. As posições norte-americana e sueca são, também aqui, uma demonstração da (pequena) amplitude de posições existentes.

Segundo PARKER/ZEGEER/1989a, “um conflito de tráfego é um evento envolvendo dois ou mais usuários da via, em que a ação de um usuário faz com que o outro usuário realize uma manobra evasiva para evitar a colisão” (pp.8). Adiante, adicionam que “Para um conflito ocorrer, os usuários da via tem de estar em um curso de colisão”, “A definição genérica, entretanto, exclui ações ... como parada normal diante de um sinal de PARE ou luz vermelha de semáforo”, “O requisito primário de um conflito de tráfego é que a ação do primeiro usuário coloca o outro usuário em uma rota de colisão ...” e “Colisões e situações de risco iminente que ocorrem sem manobra evasivas ... são também registradas como conflitos” (pp.8 e 9).

HYDÉN/1987 admite, de princípio, que a distinção entre conflitos leves e sérios é essencial para a análise da segurança viária. Segundo sua conceituação, conflitos sérios ocorrem quando: “Dois usuários estão aproximando-se de tal maneira que há um risco potencial de colisão. Há ainda uma pequena margem ... Pelo menos um dos usuários da via fica bastante surpreendido e é forçado a tomar uma ação evasiva imediata ...”. Os conflitos leves ocorrem quando: “Dois usuários estão aproximando-se de maneira que há um risco potencial de um conflito sério ... Pelo menos um dos usuários toma uma ação evasiva em tempo amplo, evitando o conflito sério ...” (pp.35; conceitos levemente distintos são enunciados na seção anterior do trabalho, pp.28).

Em geral, admite-se sumariamente que os mesmos conceitos gerais podem ser estendidos para conflitos que envolvem outros tipos de usuários (como pedestres) ou usuários e elementos da via ou do seu entorno.

Note que ambas as definições destacam a existência de curso de colisão e a necessidade de uma manobra evasiva como características da ocorrência de conflitos de tráfego. Esta convergência de posições pode ser atribuída à interação patrocinada pelo ICTCT e deixa de lado uma série de situações de interesse para a segurança de trânsito usualmente denominadas de risco iminente (near miss), em que não há manobra evasiva por opção voluntária, em função de erro de percepção, erro de decisão ou tempo insuficiente.

Ambas as definições também definem os conflitos de tráfego como manobras de risco médio, distintas de situações extremas, usualmente denominadas por quase-acidentes (near accidents), que apesar de também serem classificadas como conflitos de tráfego (das quais distinguem-se apenas pelo nível de gravidade maior) são eventos mais raros e, portanto, de observação mais difícil (isto é, mais custosa em termos de tempo e recursos).

Em geral, apesar de adotarem a relação entre conflitos e manobras evasivas como definidora, todas as técnicas usuais de análise de conflitos de tráfego reconhecem a importância das situações de risco iminente e recomendam seu registro. Da mesma forma, eventuais ocorrências de quase-acidentes (ou de acidentes) também seriam eventos de interesse especial (que podem ser anotados com maior detalhe). Por outro lado, todas as técnicas de análise de conflitos de tráfego excluem o registro de eventos que usualmente chamam a atenção dos observadores como manobras que causam interferência na fluidez do

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tráfego, violações intencionais (ou não) das regras de trânsito ou comportamentos preventivos dos usuários em local de risco, a menos que estas provoquem a interação entre usuários associada à definição dos conflitos (existência de dois usuários, onde a manobra do primeiro coloca-os em curso de colisão e o segundo tem de realizar uma manobra evasiva imediata para evitá-la).

Manobras erráticas ou interferências regulares (como as decorrentes de estacionamento no meio-fio, conversões à esquerda, veículos de serviço ou de emergência, paradas de coletivos ou travessias de pedestres), manobras com inobservância de sinalização (como violação da sinalização de prioridade na via ou da indicação de vermelho em semáforos, transgressão dos limites de velocidade, travessia fora de local) ou ações inusitadas (como acionamento de buzinas ou faróis, redução preventiva de velocidade ou travessia em passo acelerado ou corrida) não são conflitos de tráfego, em si.

O conceito de conflito de tráfego adiciona a necessidade de existência de risco objetivo (decorrentes da existência de risco de colisão e da necessidade de manobra evasiva imediata) e seria, por isso, uma medida mais rigorosa de insegurança na operação do tráfego. Pelo menos em relação às interferências e violações, portanto, os conflitos de tráfego distinguiram-se apenas pelo grau de risco (desprezando-se as situações em que interferências e violações não geram riscos de acidentes).

Entretanto, o mesmo não pode ser dito das ações preventivas, que são comportamentos adaptativos que evitam o risco de colisão mas são um reconhecimento do potencial de risco que existiria no local, na alternativa de comportamento normal.

Em vista da importância destas informações, existem algumas iniciativas de recomendar seu registro simultâneo com os conflitos de tráfego (por exemplo, em FHWA/1986, pp.69-74, é proposta a realização de Estudos de Eventos e Conflitos de Tráfego), coletando dados que podem ser úteis para diagnóstico de problemas e avaliação de intervenções (tipo antes/depois). No entanto, a análise dos outros tipos de eventos de tráfego é um campo carente de estudos metodológicos detalhados, sobre a validade de utilizá-los como medidas (diretas ou indiretas) de segurança de tráfego.

2.2. Diferenças entre os Conceitos Operacionais de Conflito de Tráfego

A definição de conceitos operacionais de conflitos de tráfego, mesmo a partir de conceitos genéricos bastante similares, comporta uma variação maior (o que pode ser atribuído ao espectro contínuo de gravidade dos eventos estudados e às nuances das diversas situações diferentes que podem ocorrer na operação do tráfego). Em certa medida, os conceitos operacionais também incorporam instruções de observação para seleção dos eventos a registrar e, desta forma, delimitam concretamente o conceito genérico de conflito de tráfego, a partir de recomendação de critérios essencialmente práticos.

2.2.1. O Procedimento Operacional do U.S.FHWA

A técnica de observação do U.S.FHWA (ver PARKER/ZEGEER/1989a, pp.9 a 21) define seus conceitos operacionais a partir de uma tipologia de manobras envolvidas na interação entre os usuários e da classificação em conflitos primários (usuais) ou secundários (que decorreram da ocorrência de um conflito anterior imediato).

A posição do observador, segundo a técnica norte-americana, é padronizada e deve observar os veículos por trás (de maneira a identificar com maior precisão as frenagens, normalmente as manobras evasivas mais frequentes). Em cada período de observação, o observador apenas registra os conflitos adiante de si, no sentido de que o segundo veículo está sendo observado por trás e em direção à interseção (a cada período de 20 a 25 minutos o observador troca posição para observar outros conflitos). Há a

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recomendação para interromper a observação durante períodos de operação saturada (bloqueio da interseção e fila contínua), anotando-se o tempo de interrupção após reiniciar o período corrente ou encerrá-lo (o que será considerado no procedimento de expansão dos dados).

Os tipos de conflitos veiculares mais comuns são classificados em conflitos de mesma direção (por sua vez divididos em quatro categorias, em função da manobra do veículo da frente: conversão à esquerda, conversão à direita, veículo lento, mudança de faixa), conflitos com conversão à esquerda oposta (isto é, com o movimento secundário de conversão à esquerda da mesma via, no sentido oposto), conflitos com fluxos transversais (por sua vez divididos em seis categorias, em função da posição da via transversal, à direita ou à esquerda do observador, e da manobra do veículo na via transversal, conversão à direita, cruzamento ou conversão à esquerda).

Uma pressuposição básica de ordem prática é a de que conflitos de mesmo tipo, em aproximações diferentes, são eventos similares. Com esta consideração, os conflitos de mesmo tipo nas diversas aproximações são agregados em uma contagem total na interseção (dado utilizado para diagnóstico). A análise por aproximação seria, naturalmente, mais refinada mas exigiria um período de coleta de dados bastante maior para garantir a obtenção de informações estatisticamente significativas.

Diversos outros tipos de conflito, normalmente pouco comuns, são também discutidos e é recomendado registrá-los individualmente nos locais em que sua freqüência for significativa. Esta categoria inclui os conflitos com pedestres (ver PARKER/ZEGEER/1989a, pp.19 e 20). Estes também são observados e classificados em função da posição relativa ao fluxo veicular, considerando a manobra dos veículos (travessia diante do movimento direto, da conversão à direita ou à esquerda), sem distinguir a posição (antes ou após a interseção) ou o sentido (direita ou esquerda) da travessia.

Em qualquer caso, todos os conflitos adiante do observador são registrados (apenas os eventos com amplo tempo de reação, em que a manobra evasiva é muito leve e eventualmente precedida de uma manobra preventiva são classificados como conflitos virtuais e desconsiderados). A distância da posição do observador em relação à interseção, detalhe que não recebe grande consideração, é selecionada em função da velocidade dos veículos, entre 30 (valor recomendado para áreas urbanas, com velocidades até 25 mph) e 90 metros (ver PARKER/ZEGEER/1989b, pp.21).

Maior atenção é dada à distinção entre a cessão normal do direito de prioridade no uso da via pelos fluxos secundários e os conflitos de tráfego. Os eventos em que os veículos dos fluxos secundários cedem passagem nunca são considerados conflitos de tráfego, mesmo envolvendo frenagens, exceto nos casos em que ocorram manobras evasivas claras ou extremas, como nos quase-acidentes (que indicam que, provavelmente por falha de percepção, a frenagem foi uma resposta ao perigo de acidente e não uma cessão normal da prioridade no uso da via). Portanto, no caso de uma interseção com sinalização de prioridade usualmente os observadores são posicionados apenas nas vias principais (ambos os sentidos, em vias bidirecionais), visto que na via secundária as manobras normais serão de cessão da prioridade no uso da via (as exceções devem ser facilmente percebidas). Em uma interseção com semáforos são utilizados observadores em todas as aproximações.

Esta preocupação em distinguir manobras normais de conflitos de tráfego está refletida na visão do evento como uma cadeia de 4 estágios: o primeiro veículo executa uma manobra, o segundo veículo fica em perigo de colisão, o motorista do segundo veículo reage ao risco de colisão, o segundo veículo segue um curso normal. Este ultimo estágio é adicionado como verificação de que a reação foi motivada pelo risco de acidente. Por exemplo, o curso seguido distingue entre uma frenagem devida a um conflito com veículo lento adiante (um conflito) de uma frenagem realizada para convergir à direita (uma manobra normal, mesmo com veículo adiante).

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São discutidos diversos casos (ver PARKER/ZEGGER/1989a, pp.26 a 29) em que a identificação dos conflitos e a oportunidade de seu registro é esclarecida, notando-se que eventos distintos dos conflitos normais podem também ser importantes do ponto de vista do diagnóstico dos problemas de segurança de tráfego. Em particular, os eventos com manobras evasivas extremas (usualmente frenagens bruscas) são classificados como quase-acidentes e são uma exceção importante à regra geral de observação. Dado que sua probabilidade de ocorrência é bastante pequena, estes eventos devem ser registrados e descritos em qualquer situação (embora sua freqüência reduzida não permita basear a análise neste dado, o que requereria um período de observação excessivamente extenso). O registro das situações de risco iminente não é claramente tratada da mesma forma, na descrição do procedimento operacional. No procedimento original, sempre que um conflito é observado, o evento é apenas registrado como uma contagem referente ao período de observação e tipo de conflito correspondentes. São distinguidos conflitos primários e secundários (que derivam da ocorrência dos conflitos primários e são registrados apenas uma vez e normalmente desconsiderados das tabulações finais) e conflitos simples e múltiplos (quando mais de um usuário tem de realizar manobra evasiva em função do mesmo evento causador de conflito primário, que é considerado como gerador de múltiplos conflitos primários).

As observações sobre circunstâncias frequentemente relacionadas com a ocorrência de cada tipo de conflito são anotadas como comentários mas seu registro não é sistemático, a menos de requisição específica do supervisor da pesquisa. Entretanto, o próprio formato do formulário de coleta de dados dificulta a anotação de dados mais detalhados sobre os eventos (ver Figura A1, usualmente cada coluna representa um tipo de conflito e cada linha representa um período de observação).

Há um procedimento alternativo, utilizado mais recentemente (ver HUMMER/1994), em que é feito o registro de um evento em cada linha do mesmo formulário (na coluna correspondente ao tipo de evento), com anotação do horário de ocorrência e comentários na coluna de observações.

De forma geral, como os conflitos são sempre observados apenas para o fluxo adiante do observador, da posição do segundo veículo (isto é, do veículo que faz a manobra evasiva), não há grande dificuldade com a eliminação de registros em duplicação, mesmo com diversos observadores trabalhando simultaneamente, no caso da técnica do U.S.FHWA. Mesmo que haja mais de um observador na mesma posição (o que é pouco frequente, em locais usuais), é fácil evitar o problema de duplicidade instruindo-os para limitarem o registro de cada um a tipinstruindo-os de conflito diferentes.

É importante notar, para os objetivos deste estudo, que a forma de observação utilizada pela técnica do U.S.FHWA não pode ser estendida para o caso de conflitos envolvendo pedestres (ver item 2.3). 2.2.2. O Procedimento Operacional do LIT/Suécia

A técnica observação do LIT/Suécia é muito menos documentada em publicações internacionais e estas poucas referências também são menos detalhadas em termos de critérios e procedimentos práticos recomendados para observação em campo (a única publicação em inglês obtida sobre critérios e procedimentos práticos é o anexo IV de ALMQVIST/1998). Apesar disso, pelo simples exame do formato do seu formulário de coleta de dados (ver Figura B1, cada planilha refere-se a um evento registrado), é fácil ver que sua técnica de observação é sempre muito mais descritiva.

Em princípio, muitos aspectos relevantes de cada estudo devem ser decididos pelo supervisor da pesquisa, buscando obter a melhor informação (o que corre o risco de tornar o processo pouco sistemático a respeito de pontos eventualmente importantes). Por exemplo, os conceitos operacionais também são definidos a partir das manobras envolvidas na interação mas não há uma classificação padrão e tanto a tipologia/codificação de conflitos quanto a área de observação podem ser decididos

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especificamente para cada local. As manobras são usualmente identificadas de forma mais detalhada (distinguindo o sentido do movimento dos pedestres e a posição dos usuários na interseção) e a classificação/codificação de tipos de conflitos pode ser decidida a posteriori (após observar os tipos mais frequentes/importantes, durante o trabalho de campo).

Entretanto, os aspectos mais objetivos e de interesse especial para este trabalho são relacionados com o registro de dados complementares que são utilizados para determinar o nível de severidade de cada conflito. Para cada evento registrado, para cada usuário da via envolvido no conflito de tráfego, devem ser anotados o tipo de veículo, a velocidade aproximada do veículo, sua distância ao ponto de colisão e o tipo de manobra evasiva realizada. Devem também ser identificados outros usuários intervenientes (por exemplo, por obstruir a visibilidade ou desviar a atenção dos envolvidos), deve ser feito um esquema das trajetórias dos envolvidos sobre o croqui do local (previamente incluído no formulário de campo) e devem ser anotadas observações pertinentes ao evento, incluindo o tipo de manobra evasiva realizada pelos usuários (frenagem, aceleração ou desvio, se foi realizada alguma manobra evasiva). Os dados de velocidade e distância serão utilizados para classificar a severidade de cada conflito (que será baseada no valor estimado do tempo até o acidente, TA, no início da manobra evasiva) e o esquema das manobras é utilizado para identificar o tipo de conflito (cuja codificação pode ser decidida especificamente). A avaliação de ambos os dados (distância e velocidade) é subjetiva mas é objeto de atenção especial no treinamento dos observadores, visto que usualmente é necessário eliminar certos vieses pessoais (que são peculiares de cada indivíduo) para obter dados minimamente confiáveis. Além disso, recomenda-se que os observadores tomem algumas referências do local a ser pesquisado como base para a avaliação de distância (larguras de faixas ou canteiros, posição de elementos do mobiliário urbano) e que façam medições efetivas de velocidades usuais nas manobras mais comuns do local (fluxo direto, conversões, travessias) para melhorar a qualidade dos dados.

Vale notar que a técnica de observação sueca é a única que preservou a coleta de uma estimativa quantitativa das velocidades dos usuários envolvidos no conflito após o estudo de calibração de Malmö. Os demais participantes consideraram que o dado coletado tem pouca validade como medida objetiva, em função do nível de precisão obtido, embora mantenha a validade como medida subjetiva (ver, por exemplo, a utilização da informação sobre velocidade em MULHRAD/1988 e BAGULEY/1988, que preservam a anotação individualizada dos conflitos em cada formulário mas dispensaram a estimativa de velocidade, como pode ser visto nas Figuras C1 e D1).

A avaliação da distância ao ponto de colisão potencial também pode ser delicada em certos tipos de eventos. A distância a ser avaliada não se refere à distância entre os veículos ou à distância até o cruzamento mas sim à distância ao ponto da colisão potencial, antes do início da realização da manobra evasiva (isto é, mantendo as trajetórias e velocidades iniciais). No caso de um conflito de mesma direção (que corresponde a uma colisão traseira), este ponto de referência está adiante de ambos os veículos envolvidos, com uma distância que é função da diferença entre as suas velocidades e da sua distância inicial (o que torna a avaliação bastante difícil neste caso e em alguns outros).

A impressão obtida nas atividades práticas de campo é a de que, mesmo com precisão insuficiente, a informação sobre a velocidade dos usuários parece importante para caracterizar a gravidade dos conflitos e identificar problemas relevantes no local. Algo similar pode ser dito em relação à avaliação da distância ao ponto de colisão potencial (ou mesmo distância inicial entre os veículos ou algum outro dado relacionado). A utilização destes dados para classificar a severidade dos conflitos, com procedimentos alternativos de natureza mais qualitativa, é também realizada por outras técnicas, diretamente em campo (ver a discussão no item IV.3.2 em MULHRAD/1988) ou na tabulação (ver BAGULEY/1988, pp.33, 34) e tem diversos outros aspectos críticos (ver tem 2.4). Este tipo de

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informação poderia também ser fornecido através de medições gerais de velocidade (através de valores médios e extremos da sua distribuição), sem ser diretamente relacionado com os eventos.

De qualquer forma, como a classificação da severidade dos conflitos na técnica do LIT/Suécia é feita posteriormente, a decisão de registro dos eventos tem de ser feita pelos observadores durante a atividade em campo, com critérios próprios. Além de considerar sua avaliação subjetiva da severidade dos conflitos, os observadores devem ter atenção especial a características usualmente presentes em conflitos relevantes, entre elas o fato de que a manobra do primeiro usuário é inesperada e a reação do segundo usuário tem de ser repentina, em certa medida.

Naturalmente, a intensidade da manobra evasiva e o tempo disponível para sua realização são também fatores considerados para selecionar os conflitos a registrar. Entretanto, os fatores relacionados com a ação inesperada e a reação repentina não são usualmente considerados em outras técnicas e tem um significado interessante para a determinação do grau de severidade dos conflitos, que a técnica sueca oficial não chega a caracterizar adequadamente (mas foi destacada durante as atividades de treinamento). Pode-se observar que, no trabalho prático, estes fatores “qualitativos” parecem ter sido muitas vezes utilizados para classificar como sérios alguns conflitos que teriam sido desprezados pelo critério formal utilizado pela técnica do LIT/Suécia (que é, a rigor, precário). A atenção a estas características pode ser considerada importante por serem fatores usuais nos acidentes de tráfego (visto que a ocorrência de erros de percepção ou decisão é evidenciada por estas características).

Não há uma discussão específica relativa à distinção de manobras de cessão do direito de prioridade no uso da via ou de conflitos primários e secundários. Conflitos múltiplos são também considerados. Não há recomendação para interromper a observação durante períodos com operação saturada enquanto os dias com períodos de chuva são evitados, pelo desconforto de observação.

Nenhum cuidado especial é atribuído à definição do local de observação, além dos aspectos práticos relativos à visibilidade ampla do movimento dos usuários envolvidos (recomenda-se adotar uma distância de 10 a 25 metros da interseção, segundo AMLQVIST/1998, pp.IV-1, como posição usual). Em princípio, devem ser selecionados tantos pontos de observação quantos sejam necessários para observar conflitos em todas as aproximações e travessias (em qualquer dos tipos de locais). Não há uma preferência sistemática por localizar os observadores atrás do fluxo veicular ou restrição a registrar conflitos do fluxo de apenas uma das aproximações. Em geral, a observação é repartida por local de ocorrência dos conflitos, na área da interseção, e a possibilidade de observar os mesmos tipos de conflito por mais de um ponto de vista pode ser evitada quando da utilização da técnica do LIT/Suécia (o que é um problema geral nas demais técnicas, exceto a norte-americana).

A preferência observada nos trabalhos de campo realizados foi a de utilizar a observação simultânea de toda a interseção (com múltiplos pesquisadores, em cada um dos diversos períodos do dia), ao invés de alternar pesquisadores por local e período como na técnica do U.S.FHWA. Portanto, no caso da técnica do LIT/Suécia, o registro de todos os quase-acidentes não chega a ser uma exceção à regra geral de observação (exceto no caso em que o trabalho de campo em um local foi dividido entre trechos que não seriam observados simultaneamente). Os eventos classificados como risco iminente também são mencionadas e seu registro recomendado, embora seja impossível classificar seu nível de gravidade segundo os critérios recomendados pela técnica sueca, dado que não há manobra evasiva (nos estudos realizados, a severidade foi decidida subjetivamente pelo pesquisador sueco).

2.2.3. Comparação Preliminar dos Procedimentos Operacionais

Considerando ambas as técnicas, pode-se ver que a norte-americana é mais viesada para a observação de conflitos veiculares e mais sumária no registro de dados (por isso, o tratamento dos dados coletados

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é mais simples) enquanto a sueca é mais descritiva e potencialmente rica em detalhes relevantes para diagnóstico (dados cuja importância é reconhecida também na técnica do U.S.FHWA). Também é importante notar que ambas as técnicas enfatizam o valor da informação qualitativa sobre os fatores contribuintes para a ocorrência dos conflitos e sua inter-relação (tanto quanto a informação quantitativa sobre a freqüência ou taxa de conflitos) para cada tipo de evento. Em ambos os casos, a descrição dos conceitos operacionais e a ilustração do seu uso nas atividades de treinamento dos observadores é apoiada por diversos exemplos apresentados em vídeo.

Vale lembrar, que a técnica norte-americana é eventualmente aplicada registrando cada conflito individualmente (isto é, cada linha do formulário de campo registra o horário de ocorrência de um conflito e seu tipo) e dados complementares sobre o evento (usualmente introduzidos em colunas complementares), como recomendado em HUMMER/1994. Este é um formato similar ao originalmente utilizado pela técnica sueca (ver HYDÉN/1987, pp.50), em que também eram registrados diversos eventos em uma mesma planilha (que incluía também um esquema das manobras).

Como informação comparativa, pode-se notar que as técnicas do U.K.TRL e INRETS/França também utilizam classificações de severidade e registram os conflitos em formulários por evento (ao contrário da técnica do U.S.FHWA, em ambos os aspectos).

A classificação do U.K.TRL (ver BAGULEY/1988, pp.33, 34) é feita na etapa de tabulação, com base em quatro informações obtidas em campo, tempo até o acidente, intensidade da manobra evasiva, complexidade da manobra evasiva, distância mínima entre os usuários, todas avaliadas com uma escala qualitativa. A classificação de severidade do conflito (de 1 a 4, em nível crescente) é feita consultando uma tabela de combinações de fatores e níveis resultantes de severidade. O nível 1 de severidade representa aos conflitos leves (usualmente desconsiderados na tabulação de resultados), enquanto os demais correspondem aos conflitos sérios (o nível 4 representa os quase-acidentes). O apêndice D mostra o formulário de registro e a tabela de classificação recomendados em BAGULEY/1988).

A classificação do INRETS/França (ver item IV.3.2 em MULHRAD/1988) é feita diretamente em campo, em função de uma caracterização descritiva de conflitos leves, moderados e severos. Todos os eventos são conflitos porque envolvem manobras evasivas. Nos conflitos leves (severidade 1), entretanto, as distâncias e os tempos de reação são tão amplos que o observador não crê na ocorrência do acidente (estes são usualmente descartados da análise dos problemas de segurança no local). Nos conflitos moderados (severidade 2), a manobra evasiva é clara, não podendo ser confundida com eventos normais no tráfego, e o observador crê na possibilidade de ocorrência de acidente. Nos conflitos severos (severidade 3), a manobra evasiva é emergencial e tem de ser precisa, deixando os usuários extremamente próximos no instante de resolução do conflito (tocando-se, às vezes), e o observador crê na previsão de ocorrência do acidente até a resolução do acidente. O apêndice C mostra o formulário de registro recomendado em MULHRAD/1988.

Vale a pena fazer uma observação sobre a terminologia adotada em MULHRAD/1988, que utiliza como sinônimos os termos quase-acidente e conflito e denomina a manobra evasiva imediata necessária para evitar o acidente de manobra de urgência. Em ambos os casos, a terminologia mais recente reserva estes termos (quase-acidente e manobra de urgência) para distinguir os conflitos mais graves e próximos dos acidentes.

2.3. Conflitos Envolvendo Pedestres e Elementos Viários

Os conflitos que envolvem pedestres são menos discutidos na literatura técnica, embora exista um conjunto significativo de trabalhos publicados a respeito, indicando a existência de uma série de

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problemas específicos a considerar (para citar apenas algumas linhas de pesquisa, pode-se mencionar ZEGEER/CYNECKI/OPIELA/1984 e CLARK/HUMMER/DUTT/1997).

A técnica do U.S.FHWA é fundamentalmente viesada para a observação de conflitos veiculares (pelo menos com a aplicação das recomendações usuais de PARKER/ZEGGER/1989a,b).

A evidência mais clara desse viés é a referente à seleção do ponto de observação (por trás do segundo veículo, que supostamente realiza a manobra evasiva, à 30 ou até 90 metros da interseção), que não mantém sua vantagem quando se trata de observar conflitos envolvendo pedestres. Para estes tipos de conflito, pode-se manter a regra de observação apenas dos eventos para o fluxo veicular adiante do observador mas isto elimina a coincidência com a observação do usuário que realiza a manobra evasiva, visto que pode ser o pedestre o usuário a fazê-la. Entretanto, existem diversas dificuldades específicas relativas à observação dos conflitos envolvendo pedestres. Por exemplo, quando o mesmo observador registra simultaneamente os conflitos veiculares e com pedestres, a sua posição (normalmente recuada para observar a frenagem dos veículos) proporciona uma área de atenção muito ampla e não auxilia na distinção de eventos com amplo tempo de reação no caso de pedestres. Utilizar observadores distintos para conflitos veiculares e com pedestres (onde estes são significativos) é, portanto, uma recomendação interessante (mas que não auxilia em excluir conflitos virtuais).

Em boa parte dos casos, a pesquisa relativa a conflitos com pedestres mostra a necessidade de combinar sua observação com a de outros aspectos comportamentais importantes. Por exemplo, ZEGEER/CYNECKI/OPIELA/1984 incluem a observação de hesitação ou violação como parte da definição dos conflitos de tráfego e CLARK/HUMMER/DUTT/1997 definem os tipos de conflito pela identificação do usuário que realizou a manobra evasiva e pelo tipo de manobra evasiva realizada. As manobras evasivas são, muitas vezes, muito similares a estes tipos de comportamento (exceto no caso de fuga do ponto de conflito, como atitude repentina diante do perigo de atropelamento).

Outro aspecto, especialmente relevante no Brasil, é o relacionado com a ambiguidade da regulamentação de prioridade no uso da via entre pedestres e veículos (nos locais em que não há semáforos para pedestres). No caso de técnicas como a do U.S.FHWA, que tentam distinguir cuidadosamente as manobras evasivas das situações de cessão normal da prioridade no uso da via, perde-se uma referência importante para a coleta de dados (visto que há incerteza sobre o entendimento dos usuários à respeito do seu comportamento normal em cada situação). Neste caso, frenagens dos veículos e paradas dos pedestres assumem um significado ambíguo e, muitas vezes, objetivamente indistinguível (cessão de prioridade ou reação ao risco de acidente). Alguns critérios simples podem ser formulados, como o requisito de que os pedestres e veículos estejam na mesma porção da via (a pista), sem dar conta da variedade de situações ambíguas que podem ocorrer na operação do tráfego.

É possível ver, portanto, que os estudos especialmente orientados para a observação dos conflitos envolvendo pedestres destacaram peculiaridades específicas e a lacuna de recomendações para julgar aspectos como os mencionados ilustra a falta de critérios específicos para a observação de conflitos envolvendo pedestres na técnica do U.S.FHWA, conforme observado anteriormente. Pode-se também observar que nenhum dos casos discutidos no manual do U.S.FHWA (ver PARKER/ZEGGER/1989a, pp.26 a 29) refere-se a conflitos envolvendo pedestres.

Esta não é uma circunstância peculiar aos conflitos envolvendo pedestres. Também a extensão destes conceitos operacionais para conflitos que envolvem elementos da via ou de seu entorno (que estariam relacionados com acidentes singulares como choques ou tombamentos) está fora do conteúdo atual da técnica proposta pelo U.S.FHWA. Sua aplicação foi tentada por diversos autores mas é também ainda menos desenvolvida que para os demais tipos de conflito (pode-se mencionar os trabalhos de

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PARKER/1979, ZEGEER/PARKER/1984, ZEGEER/HUMMER/HANSCOM/1990 e REINFURT/ZEGEER/SHELTON/NEUMAN/1991).

No que se refere a técnica do LIT/Suécia, mesmo tendo sido aplicada de forma frequente ao estudo de conflitos envolvendo pedestres e ciclistas, existe também pouca orientação adicional sobre a identificação e registro dos eventos, em relação aos conflitos veiculares. Por exemplo, os mesmo tipos de manobras evasivas são distinguidas (frenagem, aceleração e desvio), ainda que a manobra evasiva seja realizada pelos pedestres (caso em que as formas mais comuns seriam associadas à aceleração, quando for uma fuga, e frenagem, quando for uma parada repentina). A corrida para frente ou o recuo para trás são tipos de fuga não distinguidos (que, entretanto, podem ser registrados nos croquis ou nos detalhes da descrição do evento) e a dificuldade de certificar-se que paradas são manobras evasivas não é mencionada. Deve-se notar que a técnica do LIT/Suécia também não menciona a cessão normal da prioridade no uso da via no caso dos conflitos veiculares. Entretanto, a situação no caso de conflitos envolvendo pedestres é marcantemente distinta (dada a freqüência com que ocorrem situações de cessão de prioridade, especialmente por parte dos pedestres, onde não há semáforos de pedestres). Em princípio, a ênfase dada pela técnica do LIT/Suécia aos requisitos de que a ação do primeiro usuário (que provoca o conflito) seja inesperada e de que a ação do segundo usuário (que realiza a manobra evasiva) seja repentina seriam teoricamente adequada para dirimir a maior parte das ambiguidades. Entretanto, a aplicação destes critérios de distinção na prática da observação em campo nem sempre esclarece estas ambiguidades de forma cristalina. Além disso, uma ênfase fundamental à verificação destes requisitos como definidora dos conflitos parece ir além da intenção original da técnica do LIT/Suécia (pelo menos esta é a interpretação construída a partir do treinamento obtido e das instruções contidas em ALMQVIST/1998).

A precariedade do critério de severidade utilizado pela técnica do LIT/Suécia, que será discutido no item a seguir, sacrifica outra possibilidade de eliminar ambiguidades na identificação das situações de maior risco, nos eventos envolvendo pedestres. No entanto, aqui o problema seria apenas o de aprimorar os critérios hoje utilizados para transformá-los em um recurso eficaz. A visão crítica expressa neste trabalho não parece ser partilhada pelos técnicos do LIT/Suécia, que nas atividades de treinamento discutiram e recomendaram a aplicação dos seus critérios padrões aos conflitos envolvendo pedestres, sem maiores preocupações (apesar das questões colocadas pela audiência).

Vale notar que a lacuna de recomendações detalhadas a respeito da identificação dos conflitos envolvendo pedestres também ocorre na técnica inglesa do U.K.TRL, que limita claramente seu escopo ao estudo dos conflitos veiculares (ver item 1.1, pp.3 em BAGULEY/1988, ou os exemplos discutidos no manual, pp.10 a 24, que não incluem eventos envolvendo pedestres).

A técnica do INRETS/França é uma exceção a este respeito e MULHRAD/1988 (ver item VI.3.2, pp.48-52) fornece alguns critérios especificamente orientados a distinguir a severidade de conflitos envolvendo pedestres, assim como critérios específicos para conflitos envolvendo veículos de duas rodas (motocicletas, também incluídas na categoria de usuários desprotegidos, e bicicletas).

Para pedestres, os conflitos leves são considerados mais difíceis de avaliar e caracterizados como uma parada não prevista ainda na calçada ou no curso da travessia, quando o veículo está ainda a uma boa distância, um retorno, recuo ou aceleração do passo nas mesmas condições; os conflitos moderados são caracterizados por parada súbita, salto para trás ou corrida adiante do pedestre no momento em que o veículo passa ou para (sem tocá-lo); os conflitos severos são caracterizados por um salto muito rápido para frente ou para trás (sem comparação com um movimento normal do pedestre) ou um salto lateral súbito ao tocar o veículo diante de si.

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Para veículos de duas rodas, os conflitos leves são caracterizados por uma frenagem súbita mas à boa distância do ponto crítico, um desvio não brusco e comodamente controlado, uma parada não prevista (que leva o pé ao chão) mas executada sem dificuldade ou uma aceleração repentina; conflitos moderados são caracterizados por frenagem sem risco para o veículo, um desvio súbito de trajetória ou mudança de faixa bastante prematura, mas deixando uma margem razoável entre os implicados, no momento crítico; conflitos severos são caracterizados por frenagens bastante intensas, podendo gerar travamento de rodas e perda de equilíbrio ou um desvio brusco que pode desequilibrar o veículo e permite evitar a colisão por uma margem bastante reduzida.

Pode-se ver que, mantendo a coerência com o conceito geral de conflito em ambos os casos, a técnica do INRETS/França busca delimitar os eventos relevantes a partir de diversas características observáveis, relacionadas com a gravidade do conflito (de forma a descartar os eventos menos perigosos e mesmo os conflitos mais leves). Reconhecidamente, a identificação e classificação de eventos envolvendo pedestres é mais delicada mas a caracterização menciona diversos aspectos objetivos como a distância do veículo envolvido e o tipo e intensidade das manobras dos pedestres. No caso dos veículos de duas rodas, a magnitude do efeito sobre o controle da máquina é um aspecto que auxilia a identificação e classificação dos conflitos.

2.4. Diferenças entre os Métodos de Diagnóstico a partir de Contagens de Conflito

Embora os aspectos relacionados com os conceitos gerais ou operacionais e com os procedimentos de coleta de dados sejam relevantes, as diferenças mais importantes são as relacionadas ao uso dos dados coletados para diagnóstico dos problemas de segurança de tráfego e da eficácia das medidas de intervenção. Estes são os aspectos básicos em que a utilização de dados sobre conflitos de tráfego busca superar as dificuldades existentes na análise tradicional baseada em dados sobre acidentes.

2.4.1. O Procedimento de Diagnóstico do U.S.FHWA

A técnica do U.S.FHWA recomenda um procedimento preciso e detalhado de utilização dos dados coletados sobre os conflitos de tráfego. A variável analisada é a contagem média por dia em um período padrão (calculado por expansão a partir das taxas de conflitos nos sub-períodos pesquisados) e a unidade de análise é, em princípio, toda a interseção. Naturalmente, a mesma análise pode ser feita para cada travessia ou aproximação, o que torna mais crítico o levantamento de dados (o manual do U.S.FHWA define critérios precisos para obter o número de horas de observação necessário e a amostra de dias pesquisados, para um dado requisito de confiabilidade estatística, para as interseções com 4 aproximações, conforme a Tabela A1, do apêndice A).

O diagnóstico dos problemas de segurança em um local, é feita por tipo de conflito, através de uma comparação com locais da mesma natureza, considerando o controle de tráfego e a magnitude dos fluxos envolvidos como fatores de contexto. Os dados atualmente disponíveis referem-se a dias úteis, pavimento seco e período diurno (entre 07 e 18 horas) para interseções com 4 aproximações (existem alguns estudos posteriores sobre interseções com 3 aproximações, não semaforizadas, discutidos adiante). Os valores obtidos nas pesquisas são usados comparando com os níveis normais de contagens e ponderando a taxa de acidentes/conflito correspondente a cada tipo de conflito para o tipo de local analisado (ver PIETRANTONIO/1991 ou PARKER/ZEGEER/1989a). As Tabelas A2 e A3 mostram a natureza dos parâmetros disponíveis para diagnóstico, segundo a técnica do U.S.FHWA.

Embora esta seja uma restrição prática importante, porque exige a disponibilidade de dados comparativos previamente analisados, este método decorre da observação de que os diferentes tipos de conflitos e tipos de locais estão relacionadas com situações intrinsecamente diferentes em termos de

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níveis de conflito normais e potencial de geração de acidentes, independente da existência de problemas específicos de segurança. Por exemplo, os conflitos de mesma direção são mais frequentes que os conflitos transversais em todos os locais e os conflitos com fluxo oposto são mais perigosos (tem maior propensão de gerar acidentes).

Um exemplo da importância destes parâmetros para o diagnóstico de segurança pode ser visto no caso do estudo de validação realizado para uma interseção na cidade de São Paulo (relatado em GUEDES/BRAGA/PIETRANTONIO/1997). Os conflitos de mesma direção são mais frequentes (239,0 contra 133,5 expandidos para o período padrão) mas os conflitos transversais são os mais graves, dado que o nível normal de conflitos para o tipo de interseção analisada é de 410 para conflitos de mesma direção e 24 para conflitos transversais (para nível de confiabilidade de 90%). Ainda, especificamente neste tipo de interseção (não semaforizadas, com médios volumes de tráfego), apenas os conflitos transversais tem potencialidade maior de gerar acidentes (não os de mesma direção). Estas informações tiveram ampla concordância com os dados sobre acidentes, que apontaram 16 acidentes, todos colisões transversais (a previsão, com parâmetros propostos em PARKER/ZEGEER/1989a, era de 13,6 colisões transversais por ano, em dias úteis e com pavimento seco).

A metodologia para determinação dos níveis normais de conflito, parâmetros fundamentais para diagnóstico, é claramente apresentada em PARKER/ZEGEER/1989a (pp.61-66, ver também TOURINHO/PIETRANTONIO/1998). O procedimento está baseado na caracterização da distribuição da contagem diária de conflitos no período padrão, para cada tipo de conflito, para todos os locais dentro de um dado contexto (isto é, interseções ou travessias de um mesmo tipo e tráfego).

A partir da hipótese, sugerida em PARKER/ZEGEER/1989a, de que a distribuição de contagens pode ser aproximada por uma função Gama, podem ser estabelecidos os valores limites para contagens normais com qualquer nível de confiabilidade estatística. A hipótese de distribuição Gama é especialmente conveniente, dado que esta tem uma relação direta com a distribuição Chi-quadrado, largamente tabulada e utilizada em estatística: “se X tem distribuição Gama com parâmetros a e b, então

Y=2.a.X tem distribuição Chi-quadrado com parâmetro k=2.b, onde a é a razão entre a média e a

variância de X, b é o produto de a com a média de X e k é o número de graus de liberdade de Y”.

Dada uma amostra de dias pesquisados em um local, pode-se obter seu nível médio de conflitos/dia, por tipo de conflito (corresponde a uma observação de X). Tomando diversos locais semelhantes (que representam o mesmo contexto, isto é, tipo e tráfego), pode-se calcular a média e variância do nível médio de conflitos/dia para a amostra de locais e determinar os parâmetros a e b da distribuição Gama correspondente, por tipo de conflito. Tomando k=2.b graus de liberdade e um nível de confiabilidade estatística L (usualmente 80%, 90% ou 95%), obtém-se o valor limite da variável Chi-quadrado YL e a

contagem limite correspondente XL=YL/(2.a) (ver TOURINHO/PIETRANTONIO/1998).

Apesar da fundamentação estatística adequada, diversos aspectos são críticos no caso da metodologia adotada pelo U.S.FHWA. Primeiro, vale notar que os níveis normais não são obtidos comparando locais perigosos e não perigosos e sim analisando a distribuição de uma amostra de locais dentro de um contexto (que devem constituir uma amostra aleatória, dentro do procedimento original). Segundo, deve-se observar que a análise pressupõe uma classificação de locais por fatores de contexto, utilizados para identificar os locais semelhantes (aspecto que deve ser estudado para dar eficiência estatística ao diagnóstico, evitando que a variância aleatória das contagens seja magnificada por diferenças de natureza entre locais não similares). Terceiro, a utilização da hipótese de uma distribuição Gama para as contagens médias de conflitos/dia entre locais semelhantes merece melhor avaliação (do ponto de vista teórico, obter a média de cada local exigiria diversos dias de pesquisa por local, para eliminar a variabilidade da contagem média em cada um, ou a utilização de uma distribuição combinada mais dispersa, como a Pascal, que compusesse ambos os efeitos). Por fim, pode-se questionar uma análise

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diretamente voltada para a caracterização da frequência absoluta de contagens de conflitos (ao invés de alternativas eventualmente mais adequadas como a caracterização de taxas de conflito por volume de usuários, que seriam sensíveis ao tráfego de cada local).

A metodologia para determinação da taxa de acidentes/conflito (usualmente expressa em taxa de acidentes por milhão de conflitos) é mais simples e direta. O método utilizado pelo U.S.FHWA calcula taxas em cada local e obtém a média e variância correspondentes na amostra de locais (ver GLAUZ/BAUER/MIGLETZ/1985, pp.7). Entretanto, a sua determinação adiciona uma nova necessidade de dados: os registros ou históricos de acidentes dos locais. O manual do U.S.FHWA apresenta taxas de acidentes/conflito apenas para interseções com 4 aproximações, somente para dias úteis com pavimento seco (admitindo implicitamente a necessidade de diferenciar este parâmetro em função das condições ambientais, pelo menos). Estas taxas de acidentes/conflito, que podem ser interpretadas como medidas de periculosidade dos conflitos, variam de forma significativa por tipo de conflito e para diferentes contextos operacionais, conforme pode ser visto na Tabela A4.

Desde a publicação de PARKER/ZEGEER/1989a, apareceram apenas dois estudos nos EUA relacionados com a determinação de parâmetros para diagnóstico de segurança de tráfego, ambos voltados à determinação dos níveis normais de conflitos veiculares em interseções não semaforizadas com 3 aproximações (CROWNE/1990 e WEERASURIYA/PIETRZYK/1998; ver também o estudo semelhante de SALMAN/Al-MAITA/1995, para a Jordânia). Este indicador permite avaliar o grau de dificuldade em realizar a análise requerida (entre os estudos citados, apenas WEERASURIYA/PIETRZYK/1998, buscou também a análise comparativa com dados de acidentes). O aspecto crucial, entretanto, está na pressuposição de que é necessário utilizar parâmetros adicionais para realizar um diagnóstico preciso de segurança de tráfego utilizando dados de contagens de conflitos (se o pressuposto é verdadeiro, o trabalho é árduo mas estritamente necessário). A experiência existente com a aplicação da análise de conflitos do U.S.FHWA pode ser considerada conclusiva a respeito da importância destes parâmetros de diagnóstico (considerando seus conceitos operacionais).

2.4.2. O Procedimento de Diagnóstico do LIT/Suécia

Na técnica do LIT/Suécia, a análise recomendada desconsidera estas especificidades e compara diretamente as contagens de conflitos sérios, categoria identificada a partir de um critério de objetivo de classificação da gravidade dos conflitos de tráfego, desta forma repousando no pressuposto de que há uma relação direta entre risco de acidente e freqüência de conflitos de tráfego sérios. A classificação de severidade dos conflitos deveria ser, portanto, capaz de identificar fenômenos de risco semelhante (independente dos tipos de manobras envolvidas e do tipo de contexto da operação do tráfego).

A classificação da gravidade dos conflitos de tráfego utiliza um critério genérico baseado no tempo até o acidente (TA=time to accident), isto é, o tempo remanescente até o acidente potencial no início da manobra evasiva, avaliado supondo a manutenção das trajetórias e velocidades iniciais até o ponto de conflito (ver Figura B2 ou ALMQVIST/1998, pp.IV-5). Os valores observados para TA (avaliados com base nas estimativas de velocidade e distância no início da manobra evasiva) são comparados com valores críticos para identificação dos conflitos sérios. O critério é genérico porque não distingue o tipo de usuário, conflito ou contexto específico. Caso mais de um usuário tenha realizado a manobra evasiva, deve-se considerar a classificação de severidade com base no menor TA (que corresponderia à situação mais crítica). O conflito é sério se o valor de TA observado é menor que o valor crítico.

O critério atualmente recomendado (uma evolução do critério original, que adotava um valor crítico fixo e uniforme de 1,5 segundos) é baseado em uma simples curva de tempo de frenagem veicular, sendo difícil admitir a hipótese de sua validade geral. Este aspecto, aliás, não é claramente exposto em

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HYDÉN/1987 (também não foi afirmado claramente durante as atividades de treinamento, a despeito dos questionamentos a respeito). Entretanto, os valores correspondentes ao gráfico atualmente recomendado (ver a Figura 3) são perfeitamente reproduzidos a partir da equação de frenagem apresentada em HYDÉN/1987 (pp.117-118, que aliás recomenda critérios distintos dos incorporados à equação que corresponde ao gráfico), incluindo-se a margem de 0,5 segundo, isto é, pela fórmula

0,5 10,78.e V TAcrit = 0,0137.V + (V em m/s, ou 0,5 38,8.e V

TAcrit = 0,0038.V + para V em km/h). O aspecto crítico deste critério é o de incluir o tempo de manobra (o que limitaria sua generalidade).

A aplicação de um critério único, sem distinguir o tipo de conflito, e mesmo o tipo de manobra evasiva realizada (frenagem ou desvio) ou o tipo de usuário que a realiza (veículo ou pedestre) tem uma base teórica bastante frágil. Em um evento com as mesmas distâncias e velocidades, diferentes tipos de usuário e de manobra teriam valores críticos distintos para o tempo até o acidente. Um exemplo claro é o do pedestre que corre para evitar a aproximação de um veículo: o valor crítico do tempo até o acidente é o necessário para perceber o risco e correr até livrar-se da área de atropelamento (digamos 2 metros), dado que a manobra evasiva não foi a frenagem do veículo (o valor observado do tempo até o acidente continuaria sendo calculado com a velocidade e a distância do veículo até o pedestre).

A base empírica de um critério desta natureza deveria repousar, adicionalmente, sobre sua validade efetiva para identificar conflitos sérios (isto é, relacionados com acidentes, nas diversas situações). No caso da técnica do LIT/Suécia, que utiliza diretamente as contagens de conflitos para os distintos tipos de locais, este critério deveria também garantir que os conflitos sérios tenham o mesmo grau de risco, nas diversas situações, dando conta das especificidades relativas às diferenças dos níveis normais de conflito (que teriam de ser atribuídos aos conflitos leves).

A dificuldade em obter este tipo de propriedade com base em critérios práticos de severidade não deve ser menosprezada. Basta citar aspectos reconhecidos em análise de segurança viária, como o fato que a relação entre acidentes por nível de gravidade é fortemente dependente do tipo de acidente (por exemplo, colisões frontais versus colisões traseiras), o que mostra que acidentes sem vítimas (um nível além dos quase-acidentes, em termos de gravidade) não seriam uma boa medida de potencial de acidentes totais de um local, de forma geral (quem dirá os conflitos, mesmo sérios).

O grau de periculosidade dos conflitos, ao contrário da freqüência crítica de conflitos, é diferenciado na técnica do LIT/Suécia. No entanto, mesmo neste caso, as classes distinguidas são ainda bastante amplas, função apenas do tipo genérico de manobra envolvida.

Por exemplo, as taxas de acidente por milhão de conflitos para a Suécia, apresentadas durante o treinamento, distinguiam três classes: 28 para conflitos veiculares com trajetórias paralelas (mesmo sentido ou sentidos opostos), 119 para conflitos veiculares com trajetórias angulares (qualquer sentido) e 339 para conflitos entre veículos e usuários desprotegidos (pedestres e ciclistas, principalmente). Portanto, o potencial de geração de acidentes não é considerado uniforme entre classes genéricas (mas as diferenças entre classes específicas e entre tipos de contexto são desprezadas, o que pode ser, ou não, uma simplificação prática admissível). Entretanto, dentro de cada categoria genérica, a comparação entre contagens de conflitos pode ser feita diretamente e as taxas de acidentes/conflito apresentadas normalmente não variam por tipo de local (por exemplo, interseções semaforizadas ou não).

Em alguns trabalhos suecos, são apresentadas taxas de acidentes/conflito que variam em função da velocidade do tráfego ou da severidade dos conflitos (ou de uma combinação de ambos ...) e estas taxas dependem do critério de severidade (ver, por exemplo, os itens 5.4, 5.5 e 5.6 em HYDÉN/1987, que utilizou critério original com um valor crítico fixo e uniforme de 1,5 segundos para o tempo até o acidente e calculou taxas de conversão distintas para conflitos veiculares ou com usuários

Referências

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