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Em Busca da Resource-Based View Dinâmica: Contribuição da Teoria Austríaca de Estratégia

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Academic year: 2021

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Em Busca da Resource-Based View Dinâmica: Contribuição da

Teoria Austríaca de Estratégia

Autoria: Augusto Cesar Arenaro e Mello Dias

A gestão estratégica vem passando por um processo de modernização e adaptação à nova realidade econômica mundial. O processo de globalização, as mudanças tecnológicas e o crescente dinamismo dos mercados aumentaram a complexidade das situações estratégicas enfrentadas pelas empresas, forçando-as a se adaptarem mais rapidamente a diferentes condições de competição. Como consequência, a formulação e implementação de estratégias competitivas adequadas a este ambiente mais agressivo tornaram-se fatores críticos para que as empresas possam obter um desempenho que garanta sua sobrevivência no curto prazo e sustente seu crescimento e desenvolvimento de longo prazo (Ghemawat, 2006).

Com base em ampla pesquisa bibliográfica, o artigo apresenta a evolução das pesquisas de estratégia empresarial a partir das teorias SCP de Porter e da Resource-Based View (RBV), apontando suas contribuições e limitações. Também explica os principais conceitos da teoria austríaca de estratégia, que tem seu foco principal nos processos que, face à competição, movem os mercados na direção do equilíbrio.

A teoria austríaca enfatiza a inovação e a descoberta empreendedora como peças fundamentais para o sucesso dos negócios. De forma a obter vantagem competitiva em relação à concorrência, a empresa deverá sempre estar empenhada em desenvolver e lançar novos produtos inovadores no mercado. Dentro desta perspectiva, o empreendedor passa a ser o agente que possui a força exógena para quebrar o fluxo circular econômico, o que Schumpeter chamou de “destruição criativa”. Conforme Rumelt (1987), as receitas geradas pelo empreendedor emergem da diferença entre valor ex post e custo ex ante da combinação dos recursos. Portanto, esta renda vem do “descobrimento empreendedor do valor dos recursos”, sendo esta receita vista como um fenômeno dinâmico (Lewin & Phelan, 2002).

O quadro que esta perspectiva apresenta é a competição como um processo dirigido por inovações deliberadas ou acidentais, sendo “mudança” a única constante deste sistema. A “máquina” competitiva nunca chega ao repouso, mas, pelo contrário, lança continuamente inovações em produtos e em processos (Schumpeter, 1951). Em outras palavras, a base de conhecimento das empresas estaria sempre em evolução por meio da mistura de mutação, imitação e inovação, iniciativas estas geradas fundamentalmente pela busca contínua do empreendedor na obtenção de lucros superiores.

A partir desta abordagem alternativa, são desenvolvidos argumentos teóricos que sugerem que uma das principais fontes de vantagem competitiva para uma empresa não está na posse dos recursos em si, mas sim no julgamento inovador do empreendedor sobre a melhor forma de utilizá-los. Com vistas a tornar a teoria da RBV mais dinâmica, é proposta a incorporação de um novo construto derivado da teoria de empreendedorismo da escola austríaca de estratégia: o “julgamento do empreendedor”.

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1. Introdução

Na busca pelo aprimoramento da administração estratégica, várias pesquisas nas décadas de 1980 e 1990 seguiram a interpretação de Porter (1980, 1985, 1990) do paradigma

structure-conduct-performance (SCP) da economia de organização industrial (IO), a qual enfatiza a

importância da estrutura da indústria para a lucratividade das empresas. O conhecido modelo das cinco forças competitivas de Porter (1980) é baseado em dois argumentos: (1) a estrutura da indústria determina a natureza da competição dentro de uma indústria e (2) a natureza da competição é o principal determinante da lucratividade das empresas. Segundo a visão do autor, a intensidade destas forças, em conjunto, determina a capacidade das empresas dentro de uma mesma indústria em obter, na média, taxas de retorno de investimento acima do custo de capital. Nesta perspectiva, a intensidade de cada uma das cinco forças competitivas é função da estrutura ou das características técnicas da indústria.

Contudo, algumas pesquisas posteriores (Cubbin & Geroski, 1987; Jacobsen, 1988) encontraram indícios de que as diferenças de desempenho dentro de uma indústria são significativamente maiores do que as diferenças de desempenho entre indústrias, sugerindo que fatores internos das empresas exerceriam uma influência maior do que fatores externos, ou seja, aqueles relacionados à estrutura da indústria. Esta constatação contribuiu para o aparecimento de uma nova linha de pensamento estratégico, que tem recebido bastante atenção dos pesquisadores em tempos mais recentes: a Resource-Based View (RBV).

Segundo Collis (1991), a RBV enxerga a empresa, não por meio de sua atuação no domínio produto-mercado, mas como um conjunto de recursos tangíveis e intangíveis. Em um dos artigos seminais desta teoria, Wernerfelt (1984) ressalta que os recursos são antecedentes importantes para os produtos e, como consequência, para o desempenho da empresa. Entretanto, para que os recursos possam se tornar fontes de vantagem competitiva sustentável para uma empresa, eles devem ser: (1) valiosos, (2) raros (escassos), (3) custosos para imitar e (4) explorados pela organização (Barney, 1997). Dentro desta perspectiva, a estratégia competitiva é a arte de criação, acumulação e utilização destes recursos, ao invés da construção de barreiras de entrada face aos demais concorrentes nos segmentos-alvos de produto-mercado (Foss, 1996).

Entretanto, ambas as teorias de Porter e da RBV apresentam uma importante limitação teórica: ambas são baseadas no modelo tradicional da organização industrial (IO) e da teoria econômica neoclássica, que focam a competição sob condições de equilíbrio. Desta forma, tais teorias subestimam o caráter essencialmente dinâmico do sistema capitalista, visto que estabilidade e, portanto, equilíbrio são características de sistemas em repouso.

Uma visão alternativa às duas abordagens anteriores é a teoria austríaca de estratégia, cujo pensamento econômico pode ser creditado aos trabalhos de Mises, Hayek e Schumpeter. Esta teoria tem seu foco nos processos de mercado dentro de um mundo de incertezas, sendo a competição vista como um processo contínuo. O que interessa não são as condições de equilíbrio, mas sim os processos que movem os mercados na direção do equilíbrio. Seguindo a linha de raciocínio de Schumpeter (1942), a economia de mercado, devido à sua natureza, representa um sistema que nunca se encontra em repouso. Consequentemente, o foco deve ser na competição enquanto processo e não na competição sob condições de equilíbrio.

A partir de uma cuidadosa revisão bibliográfica, o artigo propõe a incorporação de construto derivado da teoria do empreendedorismo da escola austríaca de estratégia ao arcabouço teórico da RBV, buscando identificar onde realmente está situada a fonte de vantagem competitiva de uma empresa. A partir desta nova perspectiva, a RBV será beneficiada pela

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adoção de uma visão estratégica mais orientada ao desequilíbrio das atividades produtivas, permitindo superar suas limitações teóricas impostas pelo foco nas condições de competição sob equilíbrio. Contribuirá para o desenvolvimento de uma dimensão dinâmica da RBV que é mais adequada à atual realidade das empresas, que enfrentam condições de mudança e de competição cada vez mais intensas.

A estrutura do restante do artigo é dividida em três partes: na primeira, é apresentada a evolução das teorias de Porter e da RBV, destacando-se sua contribuição aos estudos de estratégia empresarial, e apontando suas limitações teóricas. Em seguida, é descrita a teoria austríaca de estratégia e sua visão de competição sob condições de incerteza. Na segunda parte, desenvolvem-se argumentos mostrando a importância da incorporação de conceitos da escola austríaca à RBV, culminando com a proposição de um novo construto para esta teoria, desenvolvido a partir de elementos da teoria austríaca de empreendedorismo. Na terceira e última parte, são apresentadas as conclusões da pesquisa e são formuladas sugestões para futuras investigações.

2. Referencial Teórico

A teoria SCP de Porter

Porter (1980) define indústria como um grupo de empresas fabricantes de produtos que são substitutos bastante aproximados entre si. Na prática, há, com frequência, um alto grau de controvérsia com relação à definição apropriada, girando em torno do grau de proximidade que a substitutibilidade deve ter em termos de produtos, de processos ou de limites geográficos de mercado.

Uma empresa pode ser caracterizada segundo seu domínio produto-mercado, isto é, um conjunto de produtos, substitutos na ocasião de consumo em que padrões similares de consumo são buscados, dirigidos a determinados consumidores. Já os limites do ambiente competitivo de uma indústria podem ser tão amplos ou estreitos quanto o foco da análise que se queira empregar.

Seja qual for o foco de análise da indústria utilizado, a essência da formulação de uma estratégia competitiva é relacionar a empresa ao ambiente em que ela está inserida. Embora o ambiente competitivo seja amplo, abrangendo tanto forças econômicas como sociais, o aspecto principal do ambiente da empresa é a indústria onde ela compete. A estrutura da indústria tem uma forte influência na determinação das regras competitivas, assim como nas estratégias potencialmente disponíveis para a empresa. Forças externas à indústria são significativas, principalmente em sentido relativo. Uma vez que as forças externas, em geral, afetam todas as empresas na indústria, o foco principal da análise encontra-se nas diferentes habilidades das empresas de lidar com elas.

Um dos modelos mais conhecidos para a análise do ambiente competitivo é o modelo das cinco forças de Porter (1980). Porter criou este modelo baseado na suposição de que a concorrência em uma indústria age continuamente no sentido de diminuir a taxa de retorno sobre o capital investido na direção da taxa competitiva básica de retorno, também chamada de taxa de retorno de mercado livre. A presença de taxas de retorno mais altas que o retorno de mercado livre serve para estimular o influxo de capital em uma indústria, quer por novos entrantes, quer por investimento adicional dos concorrentes já existentes na própria indústria. O conjunto das forças competitivas em uma indústria determina até que ponto este influxo de investimentos

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ocorre e direciona o retorno para o nível da taxa de mercado livre e, assim, a capacidade das empresas de manterem retornos acima da média.

As cinco forças competitivas (ameaça de novos entrantes, ameaça de produtos substitutos, poder de negociação dos compradores, poder de negociação dos fornecedores e rivalidade entre os atuais concorrentes) refletem o fato de que a concorrência em uma indústria não está limitada aos participantes estabelecidos. Clientes, fornecedores, produtos substitutos e os entrantes potenciais são todos “concorrentes” para as empresas na indústria, podendo ter maior ou menor importância, dependendo de circunstâncias particulares. Desta forma, todas as forças em conjunto determinam a intensidade da concorrência na indústria, bem como a sua rentabilidade, sendo que as forças mais acentuadas predominam e tornam-se cruciais do ponto de vista da formulação de estratégias.

Quando os pesquisadores que seguem a visão da economia da organização industrial (IO) tratam da estrutura da indústria, normalmente referem-se à concentração de mercado e barreiras de entrada (Caves & Porter, 1977). Apesar de Porter (1980) incluir outros fatores, tais como barreiras de saída e crescimento da indústria, estes não podem ser considerados como dimensões de estrutura, visto que barreiras de saída referem-se a decisões tratadas de modo individualizado pelas empresas, enquanto que o crescimento da indústria é função da demanda dos consumidores e da saturação de mercado. O argumento básico no paradigma SCP é que concentração de mercado e barreiras de entrada, em conjunto, determinam a competitividade da indústria e, como consequência, sua lucratividade.

Em razão dos motivos expostos acima, percebemos que o modelo de Porter apresenta dois argumentos básicos: primeiro, a estrutura da indústria determina a natureza da competição dentro de uma indústria e, segundo, a natureza desta competição é o principal determinante da lucratividade das empresas. Portanto, a intensidade das cinco forças competitivas, em conjunto, é o que define a capacidade das empresas dentro de uma determinada indústria em obter, na média, taxas de retorno acima do custo de capital, sendo a intensidade de cada uma delas função da estrutura da indústria.

Porter (1980) também postula que uma empresa pode, por meio de uma escolha estratégica adequada, posicionar-se de modo a obter elevadas taxas de retorno, mesmo que a estrutura da indústria lhe seja desfavorável, ou seja, mesmo sendo sua lucratividade média modesta. Desta forma, a lucratividade de uma empresa é função da natureza da competição, definida pela estrutura da indústria e da estratégia por ela adotada. Dentro desta visão, as empresas, através de suas opções estratégicas, podem influenciar as cinco forças competitivas e, com isso, alterar fundamentalmente a atratividade de uma indústria a seu favor.

Perspectiva SCP

(Fonte: adaptado de Hill & Deeds, 1996)

Estrutura da

Indústria Natureza da Competição Desempenho da Empresa

Estratégia da Empresa

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Resource-Based View

Durante a década de 1980, o principal foco das pesquisas de administração estratégica foi na ligação entre o ambiente externo (a estrutura da indústria), a estratégia e o desempenho das empresas, sendo considerada secundária a relação entre os recursos e competências da empresa e sua escolha estratégica. Os trabalhos de Porter (1980, 1985) foram apontados como os principais exemplos desta perspectiva. Implicitamente, estas pesquisas adotaram duas premissas básicas: primeiro, os modelos ambientais de vantagem competitiva assumem que as empresas dentro de uma indústria (ou dentro de um mesmo grupo estratégico) são idênticas em termos dos recursos estrategicamente relevantes que elas controlam e das estratégias que elas perseguem (Porter, 1981; Rumelt, 1984). Segundo, estes modelos assumem que mesmo que haja heterogeneidade de recursos em uma indústria ou em um grupo estratégico (p.ex. por meio da entrada de um novo

player), esta heterogeneidade terá curta duração, visto que os recursos utilizados pelas empresas

para a operacionalização de suas estratégias são altamente móveis (i.e., podem ser comprados e vendidos no mercado) (Barney, 1986). Estas premissas efetivamente eliminam a heterogeneidade e a imobilidade dos recursos de uma empresa como possíveis fontes de vantagem competitiva.

Entretanto, alguns estudos empíricos posteriores (Cubbin & Geroski, 1987; Jacobsen, 1988; Rumelt 1991; Wernerfelt, 1989) encontraram indícios de que a influência das características idiossincráticas das empresas sobre suas rentabilidades relativas é muito mais significativa do que a influência da indústria à qual pertencem. Adicionalmente, os estudos procuraram identificar quais seriam os atributos necessários para que as empresas pudessem obter uma vantagem competitiva sustentável, qual a influência das barreiras de imitação e qual a importância das rotinas organizacionais para explicar diferenças de lucratividade. Em conjunto, estas pesquisas contribuíram para o desenvolvimento de uma nova linha de pensamento estratégico: a Resource-Based View (RBV).

Na primeira tentativa de formalizar a teoria RBV, Wernerfelt (1984) argumentava que, para a empresa, recursos e produtos eram “dois lados de uma mesma moeda”. Em outras palavras, enquanto o desempenho de uma empresa é diretamente guiado por seus produtos, ele é também indiretamente guiado pelos recursos que são utilizados em sua produção. Seguindo esta linha de raciocínio, o autor postulava que as empresas poderiam obter retornos acima dos considerados normais por meio da identificação e utilização de recursos que fossem críticos para o desenvolvimento de produtos demandados pelo mercado. Segundo Barney (1991), estes recursos incluem todos os ativos, capacidades, processos organizacionais, atributos, informação e conhecimento da empresa que permitam a formulação e a implementação de estratégias que aumentem sua eficiência e eficácia.

Segundo Priem & Butler (2001), existem duas premissas básicas na RBV: (1) os recursos são distribuídos de forma heterogênea entre as empresas, e (2) os recursos produtivos não podem ser transferidos de uma empresa para outra sem custos elevados. Para que possam se tornar fonte de vantagem competitiva sustentável para uma empresa, estes recursos devem apresentar os seguintes atributos: (1) serem valiosos, ou seja, devem possibilitar que a empresa explore oportunidades e neutralize ameaças do ambiente, permitindo a redução de custos e o incremento de receitas; (2) serem raros (escassos) entre os competidores atuais e potenciais da empresa, considerando que o número de empresas necessário para gerar competição “perfeita” na indústria é menor do que o número daquelas que possuem recursos com potencial para criação de valor; (3) serem custosos para imitar, ou seja, as empresas que não possuem os recursos devem enfrentar desvantagem de custos para obtê-los ou desenvolvê-los; e (4) serem explorados pela organização, ou seja, as políticas e os processos devem estar organizados de forma a suportar a

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plena utilização de seus recursos valiosos, raros e custosos para imitar. Estas questões relativas ao valor, raridade, imitabilidade e organização podem ser colocadas juntas em um sistema, conhecido como VRIO, para o entendimento do potencial de retorno associado com a exploração de qualquer um dos recursos ou capacidades da empresa (Barney, 1997).

Devido aos seus conceitos lógicos que, em certa medida, complementavam a análise do ambiente competitivo, a RBV tornou-se uma das perspectivas teóricas mais aceitas na área de administração e de grande importância no processo de definição das estratégias competitivas a serem utilizadas pelas empresas (Powell, 2001; Priem & Butler, 2001).

Prahalad & Hamel (1990) argumentavam que a formulação da estratégia deve ser iniciada pela identificação dos recursos e competências existentes na empresa, seguida pela avaliação da sustentabilidade da vantagem competitiva que eles podem proporcionar, para então ser feita a escolha da estratégia que melhor utilize esses atributos de forma a explorar as oportunidades ou neutralizar as ameaças do ambiente externo. A tarefa crítica para a administração estratégica de uma empresa seria a criação de produtos novos e radicais por meio da utilização de suas competências principais, as quais incluiriam não somente os recursos estáticos, mas também as habilidades para a criação de barreiras à imitação, tecnologias, know-how, etc.

Já Mahoney & Pandian (1992) lembravam que uma empresa pode obter maiores lucros não porque possua melhores recursos, mas sim porque utiliza suas competências distintivas de forma eficiente fazendo o melhor uso destes recursos. Segundo os autores, as empresas que atuam de forma mais competente são aquelas que utilizam seus recursos de tal forma que sua produtividade ou rendimento financeiro sejam maximizados. Raciocínio semelhante foi utilizado por Peteraf (1993), que argumentou que, para conferir vantagem competitiva a uma dada empresa, seus recursos valiosos devem ser administrados de maneira apropriada.

Entretanto, Priem & Butler (2001) argumentavam que a RBV apresentava um grande problema com respeito aos argumentos fornecidos por Barney (1991): o das premissas implícitas relativas a valor e a demanda. Segundo os autores, as definições de valor evidenciavam que era o ambiente do mercado, através de suas oportunidades e ameaças, que determinava o grau do valor possuído por cada recurso da empresa. Como o ambiente competitivo mudava constantemente ao longo do tempo, os valores dos recursos também seriam alterados. Portanto, estes valores não derivavam de causas internas à empresa, mas eram determinados a partir de uma fonte exógena em contínua mutação. Desta forma, a análise econômica da estratégia deveria ser estendida para permitir uma interação dinâmica entre fornecimento e demanda.

Esta constatação expõe uma importante limitação teórica das teorias de Porter e da RBV: ambas são baseadas no modelo tradicional da organização industrial (IO) e da teoria econômica neoclássica, que focam a competição sob condições de equilíbrio. Desta forma, ambas as teorias subestimam o caráter essencialmente dinâmico da economia de mercado, visto que estabilidade e, portanto, equilíbrio são características de sistemas em repouso.

Com o intuito de superar estas dificuldades, alguns estudiosos da RBV têm buscado perspectivas integrativas para a teoria tentando incluir uma dimensão dinâmica. Teece, Pisano & Shuen (1997), por exemplo, definem o conceito de “capacidade dinâmica” como sendo a habilidade de uma empresa em integrar, construir e reconfigurar competências internas e externas para se adaptar rapidamente a ambientes em constante mudança. Entretanto, os autores não contemplam de maneira explícita o papel de um agente específico capaz de executar as adaptações necessárias para que a empresa possa se tornar, ou se manter, competitiva em ambientes de mudança. Sem o completo entendimento da importância deste agente no processo, fica difícil de realmente saber como as capacidades são organizadas e de que forma elas podem se tornar estrategicamente eficientes. Dito de outra maneira, os autores enfatizam que as

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capacidades são formadas pela escolha de trajetórias apropriadas durante certo período de tempo, mas praticamente ignoram aspectos subjetivos do desenvolvimento destas capacidades.

Teoria austríaca de estratégia

Uma visão alternativa às abordagens anteriores é a teoria austríaca de estratégia, que tem seu foco principal nos processos de mercado, sendo a competição vista como um processo contínuo. O que interessa não são as condições de equilíbrio, mas sim os processos que movem os mercados na direção do equilíbrio. Além disso, a teoria austríaca desafia o argumento de que a estrutura da indústria, definida por barreiras de entrada e concentração de mercado, determine a natureza da competição (Hill & Deeds, 1996). Os pesquisadores desta escola argumentam que a natureza da competição é independente da estrutura da indústria e não pode ser influenciada por ações individuais das empresas, sendo esta uma característica dada ou fixa da economia de mercado. Segundo a visão austríaca, as diferenças de lucratividade entre as indústrias são atribuídas a diferenças na demanda por seus produtos, sendo a demanda vista como totalmente independente da estrutura.

Na verdade, ao invés de ser vista como um determinante no desempenho das empresas, a estrutura da indústria que observamos em um determinado ponto no tempo, representaria simplesmente um resultado endógeno da eficiência perseguida pelas empresas dentro da indústria. Ou seja, a estrutura não determinaria o desempenho, sendo tão somente a consequência do movimento, ao longo do tempo, das diferenças de desempenho entre as empresas. Por este motivo, o modelo utilizado pela escola austríaca para determinar o desempenho das empresas difere fundamentalmente daquele da perspectiva SCP.

Perspectiva Austríaca

(Fonte: adaptado de Hill & Deeds, 1996)

A partir da perspectiva adotada pela teoria austríaca, passamos a olhar a empresa com um foco diferente. Segundo Hill & Deeds (1996), uma empresa pode ser vista como sendo composta de hardware e software. O hardware é o conjunto de recursos sobre os quais a empresa é constituída, tais como, pessoas, equipamentos e instalações.

Entretanto, uma empresa é muito mais do que a simples soma de recursos humanos e materiais, sendo também um conjunto de processos organizacionais que servem para coordenar os diversos recursos de forma que estes possam ser utilizados para transformar entradas em saídas comercializáveis (Nelson & Winter, 1982). Incorporado nestas rotinas está o corpo de conhecimento - o software da empresa - sobre como conduzir o processo de transformação. Kogut & Zander (1992) referem-se a este conhecimento como “conhecimento processual”, ou seja, o conhecimento de como saber fazer as coisas. Este conhecimento não é estocado em

Natureza da

Competição Desempenho da Empresa Estrutura da Indústria

Estratégia da Empresa

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nenhum lugar dentro da empresa, estando disperso entre seus colaboradores, a maioria dos quais teria somente o conhecimento requerido para executar suas próprias tarefas rotineiras. Além disso, a maioria destes conhecimentos seria tácita por natureza (Nelson & Winter, 1982).

O conhecimento que fundamenta os processos organizacionais geralmente parte da criação de um empreendedor. Estes processos podem ser utilizados para a concepção de um novo produto a ser comercializado a partir dos recursos disponíveis. De forma alternativa, estes processos podem resultar em uma melhor coordenação dos recursos disponíveis para a fabricação de um produto já existente com um custo mais baixo do que o custo obtido por seus concorrentes. Como é sabido, a visão original do empreendedor nunca é perfeita e precisa ser modificada pela experiência devido às circunstâncias de mercado e às mudanças organizacionais. Conforme Hill & Deeds (1996), podemos conceber uma empresa como uma entidade que aprende e que procura soluções satisfatórias para os problemas que ela conscientemente identifica, tanto pela modificação dos processos existentes como também pela criação de novos procedimentos. Neste processo, novos conhecimentos são criados, sendo os antigos deixados para trás.

Este processo pode ser visto como cumulativo, no qual a solução adotada para um determinado problema, em determinado tempo, é função do contexto organizacional dentro do qual o problema é considerado. Este contexto é função dos processos organizacionais, os quais são definidos pela própria história da empresa, incluindo as soluções para os problemas passados. Esta é a noção de dependência da trajetória, a ideia de que a resposta de uma empresa para um determinado problema, em determinado tempo, é função de sua história (Arthur, 1989; Barney, 1991). Como a história de cada empresa é, de certa forma, única, também única será sua resposta para um problema específico.

Uma implicação desta perspectiva é a ideia de que a base do conhecimento de cada empresa é única. Em outras palavras, cada empresa terá um conjunto único de processos organizacionais: um software único. Os processos que a empresa possui em um determinado ponto no tempo, serão função, tanto da visão inicial do empreendedor que levou à sua criação, como também de todas as modificações subsequentes devido ao aprendizado obtido por meio da experiência e da solução de problemas.

Consideremos agora uma indústria, em um determinado momento, sendo composta por diversas empresas. Podemos assumir um estado inicial em que as empresas se diferenciem tanto pelos recursos (hardware) quanto pelos processos (software). Logicamente, estas diferenças serão refletidas nas diferenças de lucratividade entre as empresas. Mantendo-se o software constante, estas diferenças aparecem, pois algumas empresas possuem instalações, equipamentos e mão-de-obra superiores. Mantendo-se o hardware constante, as diferenças de lucratividade serão devidas a processos organizacionais superiores. Estes processos podem ser julgados superiores em relação a seus concorrentes na indústria, se eles fornecerem uma vantagem competitiva, seja pela diminuição da estrutura de custos da empresa, por meio de uma administração produtiva de recursos, ou pelo aumento do valor que os produtos da empresa proporcionam a seus clientes.

No lado do custo, como resultado de suas rotinas superiores, algumas empresas serão capazes de atender às demandas dos consumidores a um custo menor do que outras. Mesmo considerando rendimentos constantes e hardware idêntico, isto levaria a diferenças de lucratividade entre as empresas dentro de uma mesma indústria. No lado da receita, como resultado do aumento do valor que as rotinas superiores proporcionam aos clientes, algumas empresas serão capazes de estipular um preço maior pelos seus produtos do que outras. Mesmo

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considerando custos constantes e hardware idêntico, isto também levaria a diferenças de lucratividade entre as empresas.

A heterogeneidade das empresas com relação à lucratividade aumenta os incentivos para imitação. Se a razão de melhor desempenho é devida somente ao hardware, empresas com baixo desempenho tenderão a comprar hardware semelhante. Com exceção de possíveis processos de manufatura patenteados, a maioria do hardware é móvel. Na linguagem de Barney (1986) e Dierickx & Cool (1989), hardware é um fator estratégico comercializável. Assim sendo, em teoria, todas as empresas de uma indústria poderiam ter hardware semelhante. Consequentemente, as persistentes diferenças de desempenho entre as empresas dentro de uma indústria não podem ser atribuídas somente ao resultado de diferenças de hardware.

Já em relação ao software, a premissa de que possam existir processos organizacionais idênticos é irreal, pois sempre existirão diferenças de rotinas entre as empresas. Visto que o conhecimento que fundamenta os processos é disperso na empresa, e que boa parte dele é tácito, este não pode sempre ser “vendido” por meio dos mecanismos de mercado (Dierickx & Cool, 1989; Kogut & Zander, 1992). Em outras palavras, os custos transacionais de rotinas organizacionais são proibitivamente elevados, exatamente porque são imóveis (Barney, 1991). Diferentemente do hardware, o software não pode ser livremente comercializado entre as

empresas no mercado. É claro que diferenças de lucratividade poderiam desaparecer, caso as empresas com baixo desempenho pudessem imitar as rotinas daquelas de melhor desempenho. Entretanto, tal fato é bastante improvável devido à existência de barreiras de imitação, que dificultam a cópia de processos organizacionais superiores (Barney, 1991; Dierickx & Cool, 1989). Em alguns casos, as patentes podem funcionar como barreiras de imitação, mas, de uma maneira geral, estas podem ser atribuídas a problemas de capacidade de observação e à inércia organizacional por parte do imitador (Lippman & Rumelt, 1982; Nelson & Winter, 1982; Reed & DeFillippi, 1990). Adicionalmente, outros dois fatores atuam contra a convergência de taxas de lucratividade: a mudança dos processos e as inovações intencionais a partir da visão original de um empreendedor.

Após a análise de como se desenvolve a natureza da competição dentro da perspectiva austríaca, fica evidente de que a competição nada mais é do que um processo, no qual equilíbrio é raramente, ou talvez nunca, alcançado e que as diferenças de lucratividade dentro da indústria persistam com o tempo. Estas diferenças de lucratividade incentivam as empresas de baixo desempenho a imitar as rotinas das melhores. Entretanto, a imitação não é fácil de ser atingida devido à existência de barreiras não-triviais de imitação. Este ponto por si só já seria suficiente para diminuir qualquer tendência de convergência dos lucros; entretanto, existem outras forças ativas que asseguram que esta tendência não ocorra.

Segundo Barney (1986), os imitadores podem até ter “sorte”, visto que tentativas imperfeitas de imitação podem eventualmente produzir mutações que sejam valiosas. Levado ao extremo, estes acidentes, poderiam transformar empresas com baixo desempenho em empresas com alta performance e vice-versa. Mais importante do que tudo isso, entretanto, são os enormes incentivos que os empreendedores têm para buscar inovações, visto que estas inovações periodicamente revolucionam a competição, alterando radicalmente a distribuição dos lucros dentro de uma indústria.

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3. Em Busca da RBV Dinâmica

Uma nova perspectiva para a RBV

Conforme Barney (1986), Rumelt (1984) e Wernerfelt (1984), a teoria da RBV enfatiza a importância dos recursos idiossincráticos da empresa como fonte de vantagem competitiva. Além disso, o denominador comum entre os estudiosos da RBV está na busca dos atributos dos recursos em si. Entretanto, nesta perspectiva, os recursos que produzem esta vantagem competitiva são apresentados como simples “dados”, fazendo com que não seja dada uma explicação clara de como os recursos são criados, a origem dos seus atributos e de que maneira podem se tornar estrategicamente eficientes. Não fica claro como os recursos possam ser a fonte de vantagem competitiva de uma empresa (Foss & Ishikawa, 2007).

Pode-se argumentar que o atributo de um recurso vem de uma estimação subjetiva sobre sua possibilidade de criar valor, isto é, os atributos não são inerentes aos recursos em si, nem se consegue obter um completo entendimento pela análise dos recursos de forma isolada. Pelo contrário, os atributos dos recursos, tais como, características, funções e possíveis usos de ativos, enquanto principais componentes da vantagem competitiva, somente podem ser determinados a partir da intervenção de um empreendedor, que toma decisões sob condições de incerteza (Foss, Foss, Klein & Klein, 2007). Dito de uma forma mais precisa, deve existir primeiramente a percepção empreendedora de uma oportunidade estratégica em potencial, antes que a questão da alocação de recursos possa ser economicamente relevante (Lewin & Phelan, 2002).

Dentro da perspectiva apresentada, a teoria da RBV não considera o papel que o empreendedor possui na avaliação dos recursos e na sua utilização de diferentes e inovadoras maneiras. A RBV considera todo o conhecimento sobre as características dos recursos como sendo composto de informações objetivas, ao invés de construtos subjetivos da percepção empreendedora e, além disso, negligencia a possibilidade de criação de novos recursos estratégicos. Por este motivo, a fim de possibilitar que o arcabouço teórico da RBV se desenvolva de uma forma mais dinâmica e adequada à realidade vivenciada pelas empresas, consideramos que esta teoria necessita incorporar conceitos oriundos da escola austríaca de estratégia, tal como a teoria do empreendedorismo.

O julgamento do empreendedor como fonte de vantagem competitiva

Um dos pontos mais importantes da teoria austríaca é sua ênfase na inovação e na descoberta empreendedora como fatores fundamentais para o sucesso dos negócios. Segundo Jacobson (1992), esta é a noção “schumpeteriana” do mercado em equilíbrio, sendo rompido por inovações e, então, retornando ao equilíbrio. De forma a obter vantagem competitiva, a empresa deverá sempre estar empenhada em desenvolver e lançar novos produtos inovadores no mercado.

Nesta teoria, o empreendedor é o agente que possui a força exógena para quebrar o fluxo circular econômico, o que Schumpeter chamou de “destruição criativa”. Estudiosos de administração e de economia consideram o empreendedor como sendo um inovador, um líder, um criador, ou um descobridor, entre outras definições. Para os fins deste artigo concebemos o empreendedor como aquele indivíduo que possui uma forma inovadora de se dedicar às atividades de organização, administração e execução, principalmente na geração de riquezas, na transformação de bens e conhecimentos em novos produtos ou serviços, gerando um novo método ou processo a partir de suas experiências passadas.

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Entretanto, em um mundo de incertezas, o empreendedor não conhece a priori os atributos relevantes de todos os ativos quando as decisões de produção são tomadas, e nem os futuros atributos de um ativo podem ser previstos de maneira precisa. Estes atributos precisam ser criados ou descobertos quando o empreendedor vislumbra possibilidades inovadoras de utilizar os ativos para a produção de bens e serviços (Foss, Foss, Klein & Klein, 2007).

Segundo Lachmann (1956), o empreendedorismo consiste, primariamente, em uma escolha entre combinações de ativos de capital. Segundo o autor, a função do empreendedor é tomar decisões concretas de como alocar os seus recursos de capital na especificação da tecnologia, dos bens de capital e do layout da planta industrial a serem utilizados na produção de bens e serviços. Já Schumpeter (1951) afirma que a essência do empreendedorismo está na percepção e no aproveitamento de novas oportunidades no âmbito dos negócios, estando sempre relacionada com a criação de formas inovadoras de utilização dos recursos, quando estes forem deslocados de seu emprego tradicional e sujeitos a novas combinações.

Conforme Mises (1949), o empreendedorismo pode ser interpretado como a realização de julgamentos em relação a um evento incerto, como, por exemplo, o surgimento de um novo mercado onde não havia nenhum mercado anterior que o empreendedor pudesse tomar como base. Em um ambiente de contínuas mudanças e incertezas, o mercado não pode ser visto como substituto ao julgamento do empreendedor (Lachmann, 1956). Portanto, podemos considerar que os atributos dos recursos devem derivar do julgamento do empreendedor em oposição às características objetivas “dadas”. Somente após a intervenção do empreendedor é que poderemos analisar apropriadamente os atributos dos recursos. Sem esta premissa, os atributos, ou valores, dos ativos na empresa não ficam claramente evidenciados.

Lippman & Rumelt (2003) argumentam que o coração da administração estratégica está na criação, avaliação, manipulação, administração e disposição de recursos heterogêneos especializados. O empreendedor, por meio do exercício de seu julgamento, procura utilizar combinações inovadoras destes recursos de forma que ele possa se apropriar do maior lucro possível. Os autores ressaltam que o julgamento e as escolhas feitas pelo empreendedor são baseadas em sua experiência prévia e que, portanto, tendem a possuir um caráter altamente subjetivo.

A partir desta constatação, fica claro que as oportunidades estratégicas emergem somente a partir da expectativa subjetiva do empreendedor. Ao vislumbrar uma nova oportunidade, o empreendedor necessita se utilizar do julgamento em função de sua característica subjetiva. Mesmo que o empreendedor desejasse “vender” o seu julgamento, sua relevância não poderia ser avaliada através do mercado. Desta forma, pode-se afirmar que não existe nenhum mecanismo de mercado que possa atuar como substituto para o julgamento subjetivo do empreendedor (Foss, Foss, Klein & Klein, 2007).

Torna-se evidente, portanto, que a vantagem competitiva relacionada aos recursos heterogêneos prevista no arcabouço teórico da RBV precisa estar diretamente conectada ao julgamento do empreendedor. Apesar das relevantes contribuições já realizadas pelos estudiosos de estratégia para o desenvolvimento da RBV, ainda há uma lacuna significativa para o completo entendimento da relação causal entre o julgamento do empreendedor e a heterogeneidade dos recursos, tendo em vista que o papel do empreendedor e o seu julgamento, em nível analítico, têm sido praticamente ignorados pela literatura acadêmica tradicional.

Tendo em vista que os julgamentos dos empreendedores são subjetivos e não comercializáveis, o mercado não pode facilmente avaliar o valor esperado dos recursos e dificilmente existirá mecanismo de mercado capaz de atribuir valor ao julgamento do empreendedor. Isto não quer dizer que serão obtidos lucros de forma automática a partir do

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momento em que as decisões são tomadas pelo empreendedor. Deve ficar claro que em um mundo de incertezas, alguns julgamentos irão falhar enquanto outros obterão sucesso, alguns, inclusive, acima das melhores expectativas. Entretanto, somente se um empreendedor utilizar seu julgamento frente às situações de incerteza é que uma oportunidade estratégica poderá ser aproveitada, permitindo, como consequência, a obtenção de lucros superiores.

Em função de todos os aspectos até aqui apresentados, chegamos ao ponto central de nossa argumentação e concluímos que uma das principais fontes de vantagem competitiva de uma empresa não está na posse dos recursos em si, mas sim no julgamento do empreendedor sobre a melhor forma de utilizá-los. Por este motivo, propomos a criação de um novo construto para ser incorporado ao arcabouço teórico da RBV, aqui denominado de “julgamento do empreendedor”.

A incorporação deste novo construto poderia ser bastante útil para a evolução da RBV. Permitiria superar algumas limitações teóricas impostas pelo seu foco nas condições de competição sob equilíbrio. Contribuiria para o desenvolvimento de uma abordagem mais dinâmica e realista do RBV considerando as condições de competição desafiadoras enfrentadas pelas empresas em mundo globalizado em constante mutação. Dentro desta nova perspectiva, podemos conceber a estratégia empresarial como sendo a busca incessante por lucros superiores gerados a partir do julgamento inovador de um empreendedor em torno dos recursos organizacionais disponíveis, sendo este indivíduo visto como o principal fator impulsionador endógeno para o sucesso de uma empresa.

4. Conclusões e Sugestões para Futuras Pesquisas

A partir das lacunas existentes nas teorias de Porter e da RBV, o artigo enfatiza a importância dos conceitos propostos pela escola austríaca de estratégia, principalmente aqueles relacionados à teoria do empreendedorismo.

Pelos argumentos apresentados ao longo do texto, fica claro que a RBV, apesar de sua destacada importância no estudo da administração estratégica, ainda apresenta limitações teóricas importantes, notadamente o fato de seu arcabouço estar baseado na perspectiva econômica neoclássica, que analisa os mercados sob condições de equilíbrio. Esta premissa dificulta a análise das reais situações estratégicas dinâmicas enfrentadas pelas empresas, que estão inseridas em um mundo de constantes mudanças e incertezas.

Até o presente momento, foram realizadas poucas pesquisas buscando entender melhor os processos pelos quais novos recursos são descobertos ou criados, e como a estrutura organizacional, incentivos e mecanismos de governança afetam a criação e a utilização dos recursos (Foss, Foss & Klein, 2007). Além disso, como os teóricos da RBV consideram os recursos como “dados”, eles subestimam o importante fenômeno de como os atributos dos recursos podem ser determinados e valorizados a partir do julgamento inovador de um empreendedor. Ao desconsiderar o papel fundamental do empreendedor, os estudiosos acabam utilizando metodologias de pesquisa que não levam ao entendimento dos aspectos subjetivos dos recursos. Algumas limitações teóricas da RBV foram apontadas inclusive por Barney, Wright & Ketchen (2001), os quais sugeriram que a geração seguinte de pesquisas sobre a teoria deveria necessariamente incluir conexões com o empreendedorismo, a administração de recursos humanos e os negócios internacionais.

Assim, buscou-se, ao longo do texto, apontar um novo caminho para a superação destas dificuldades com a proposta de inclusão de conceitos da escola austríaca de estratégia, mais

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especificamente aqueles relacionados com a teoria do empreendedorismo, tendo em vista que as perspectivas subjetivas para os recursos podem trazer importantes contribuições para a RBV. Concluímos que uma das principais fontes de vantagem competitiva de uma empresa está no julgamento inovador do empreendedor sob condições de incerteza e não na posse dos recursos em si. Pela mesma ocasião, sugerimos a inclusão de um novo construto no arcabouço teórico da RBV, que aqui denominamos de “julgamento do empreendedor”. Sem dúvida, ainda existem lacunas a serem preenchidas, tais como as dificuldades relacionadas com o desenvolvimento deste construto em nível operacional, as quais deveriam ser objeto de futuras pesquisas. Entretanto, considerando a RBV como uma teoria ainda inacabada, a incorporação de novas variáveis e construtos, baseados na escola austríaca, pode também ser um caminho para estas pesquisas.

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