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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP IRMA PEREIRA MACEIRA

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Academic year: 2018

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

IRMA PEREIRA MACEIRA

A proteção do direito à privacidade familiar na internet

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

SÃO PAULO

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

IRMA PEREIRA MACEIRA

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Ciências Sociais sob a orientação da Professora Doutora Maria Helena Diniz.

SÃO PAULO

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BANCA EXAMINADORA.

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Resumo

O presente trabalho tem como objetivo investigar até que ponto, no direito brasileiro, o sistema de proteção mostra-se adequado às relações jurídicas praticadas pela internet, a partir de uma visão do direito como um conjunto de normas e princípios.

As novas tecnologias, a sede de informações e o deslumbramento com inovadores rumos na aquisição de conhecimento, faculta a cada indivíduo a busca de respostas e soluções para suas necessidades a partir de realidades cujas condutas são regidas por princípios, tradições e experiências outras que não as de seu mundo circundante.

A intenção é conclamar a família, a sociedade e o poder público para revisar as tarefas fundamentais no tocante à educação, a proteção frente à violência, as ameaças e os perigos crescentes aos direitos da personalidade, notadamente a privacidade familiar na internet, pela ausência de conhecimento por parte de alguns usuários e de princípios éticos e morais por outros.

Sendo assim, com a revolução da tecnologia da informação, e a rapidez assustadora com que as transformações vêm se sucedendo no cenário mundial, a vida privada das pessoas comuns passou a ser parte integrante deste cenário, com consequências inimagináveis, merecendo a união de todos em prol de um objeto fundamental: a preservação da privacidade familiar, como fator preponderante de respeito ao superior princípio da dignidade da pessoa humana.

(5)

Abstract

This paper aims to investigate how adequate is the protection system in Brazilian Law when it comes to legal relationships established over the internet, from a point of view of the Law as a set of rules and principles.

The new technologies, the thirst for information, and the enchantment of the new ways for acquiring knowledge - bring to the individuals answers and solutions to their needs, by means of alternative approaches ruled by principles, traditions and experiences others than those from their usual surrounding reality.

The intention is to capture the attention of the family, society and public institutions to review the foundations concerning education, protection against violence and threats to the rights of the personality – in special the family privacy in the internet – given the digital ignorance of some users and the lack of ethical and moral principles of others.

Given the revolution we observe in information technology and the astonishing agility of the change in the worldwide scenario, the private life of ordinary people started taking part in this scene, with unimaginable consequences and thus deserving our attention towards a fundamental objective: the preservation of the family privacy as a major factor concerning the respect to the superior principle of dignity of the human being.

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Resumen

El presente estudio pretende investigar en qué medida el sistema de protección, en el derecho brasileño, muestra relaciones jurídicas adecuadas a lo largo de la internet, desde una visión del derecho como un conjunto de normas y princípios.

Las nuevas tecnologías y la sed de información y el deslumbramiento con las nuevas orientaciones en la adquisición de conocimientos, proporciona todas las respuestas que buscan persona y soluciones para sus necesidades de realidades cuyas tuberías están regidas por princípios, tradiciones y experiencias distintas de las de su mundo circundante.

La intención es llamar la atención de la familia, la sociedad y las autoridades públicas para las amenazas y los peligros cada vez más los derechos de la personalidad, en particular la privacidad de la familia en internet, por la falta de conocimiento por parte de algunos usuarios y princípios éticos y morales por otros.

Así, con la revolución de la tecnología de información y la aterradora rapidez con que las transformaciones están triunfando en el escenario global, la vida privada de la gente común pasó a ser parte integrante de este escenario, con consecuencias inimaginables, que merece la Unión de todos hacia un objeto fundamental: la preservación de la privacidad de la familia, como factor preponderante del respecto al principio superior de la dignidad del humano de la persona

.

(7)

Cada indivíduo é visto, mas não vê; objeto de uma informação, nunca sujeito de uma comunicação. ( ...) O panoptismo faz funcionar ao arrepio do direito, uma tecnologia que vai além dos limites traçados. ”

(Michel Foucault)1

A educação para os direitos humanos, tanto formal como não formal, deve envolver mais que a transmissão de informações e deve ser constituir em um processo amplo, que dure por toda a vida, e através do qual as pessoas em todos os níveis de desenvolvimento e de todas as camadas da sociedade possam aprender a respeitar a dignidade uns dos outros, e os meios e métodos de assegurar este respeito em todas as sociedades.

(Comunidade Bahá’i do Brasil)2

Dedicatória

1 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão Tradução de Raquel Ramalhete.

Petrópolis: Vozes, 1987.

2 Programa Nacional de Direitos Humanos da Comunidade Bahá’i do Brasil, Organização não

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A dedicatória é especial e destinada à Professora

Maria Helena Diniz, não só por seus ensinamentos ilimitados, mas pelo particular interesse, carinho e empenho na orientação dos temas que lhe são oferecidos. À professora de alma, de coração e de conhecimento profundos, o meu mais sincero e eterno agradecimento.

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Agradecimentos

Enormes barreiras foram encontradas para a realização desse trabalho. Mas, com humildade, coragem e determinação, foi possível superar todas elas. À Deus por ter iluminado a minha mente, por ter me concedido a oportunidade de aprendizado sobre o direito e sobre mim. Aos meus pais pela educação e profundos ensinamentos dos valores ético-sociais, sem os quais não teria idealizado e concluído mais esta etapa da minha vida.

De forma especialíssima, um agradecimento à minha filha Sheila, pelo suporte, dedicação e reconhecimento. Ao Marcelo pelo favorecimento de elementos essenciais ao raciocínio na proteção da privacidade familiar na internet. Um agradecimento especial à minha irmã

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com a minha pessoa, durante todo o tempo em que permaneci na busca de elementos para a realização desse trabalho. À Maria Luisa e Carlos Francisco Gaspar, pelo apoio sempre presente e pela amizade sincera cultivada desde os bancos da faculdade de direito. À Susana e José Tadeu Falsoni, pelas horas incansáveis de troca de informações e enriquecimento do conhecimento. Aos meus irmãos de alma Lilia, Elza e Hélio pela eternidade na amizade sempre presente. À Cleide Gagliardo Correia, pela amizade sincera dentro e fora da advocacia durante todos esses anos. À Delanilde Blanco (in memorian) pelo incentivo e lições de vida deixadas durante sua passagem entre nós.

(11)

Com o avanço assustador da ciência tecnológica, sua conciliação com o direito é mera ousadia e tarefa das mais árduas. Mais difícil se torna enfrentá-la no ambiente familiar, onde o importante é a relação emocional do núcleo, porquanto ainda incipiente na ciência jurídica e depreendida de reflexões que a apreciem com a devida profundidade e peculiaridade. Encontram-se as ciências em mundos totalmente distintos, porém a divisão entre o real e o virtual reside numa linha tênue, quase imperceptível.

A internet está cada vez mais presente na atualidade e, consequentemente, na vida das pessoas, influenciando, transformando e trazendo mudanças no cotidiano. O novo ambiente tem a capacidade de desenvolver novos modos de socialização, alcançando desde a privacidade, as relações mais próximas, alcançando as redes sociais. A insatisfação permanente leva as pessoas a buscas e, muitas vezes, sem qualquer percepção de valores, distorce o processo de construção da identidade.

O processo de globalização cultural, caracterizado pela concorrência das informações com o conhecimento sistemático e o imediatismo de sua veiculação, de um extremo a outro do planeta, promove uma inteiração de padrões e valores. O ser humano é envolvido por outros núcleos culturais, notadamente dos países cêntricos deste processo, integrando realidades virtuais. O poder da informação, a utilização de dados cadastrais e os aspectos de vários interesses estão situados no contexto da modernidade de novas relações na era da sociedade digital.

A ânsia e a facilidade pela procura do conhecimento esbarram na ausência de uma educação voltada para o uso das novas tecnologias. O conteúdo das informações inserido na rede é capaz de causar prejuízos incalculáveis e eternos, se vier a ferir a dignidade da pessoa, vez que não existe a menor possibilidade de apagá-las por conta da velocidade com que o dado circula na internet.

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existentes. O Estado necessita implementar programas de conscientização envolvendo a família e sociedade como um todo no sentido de que possa conduzir a educação voltada à viabilização da absorção de novas tecnologias, sem aviltar os valores éticos e morais, como forma de salvaguardar a privacidade familiar.

Objetiva-se a reflexão por parte dos pais, familiares, escola, professores, e alunos, para melhor conscientização, prevenção, aprendizado e ensinamentos de como conviver com o mundo virtual, sem causar ou sofrer prejuízos, para com isso poder desfrutar de todas as maravilhas que este mesmo universo oferece. E, só será possível alcançar a proteção da privacidade tão almejada, com a união e manutenção dos valores, ético e moral. A internet, com o meio de comunicação em massa constitui-se no primeiro poder, o poder da informação. Para o mundo virtual, o futuro é agora.

Quanto à responsabilidade civil, o que se persegue é o resguardo do ambiente familiar, buscando delimitar a gravidade do dano relacionado ao acesso aos dados e informações pessoais, para se ter condições de fixar o correspondente dano moral, nos limites da proporcionalidade e razoabilidade. Não podemos esmorecer diante do espaço jurídico vazio existente, mas buscar soluções por meio de interpretações e integração das normas, bem como aplicação dos princípios de forma sistematizada, numa perfeita adequação ao que denominamos de “avanço social”.

Novos estudos merecem atenção por parte dos pensadores não só do campo do direito, mas também da tecnologia, da psicologia e disciplinas correlatas, num sistema multidisciplinar, empenhados na proteção integral do direito à privacidade familiar como forma de preservação da dignidade da pessoa humana, atendendo à utilização de primordial ferramenta para o desenvolvimento do ser humano: a internet.

São Paulo, março de 2012.

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Resumo...IV Abstract...V Prefácio...XI

Capítulo I - Direito da personalidade ...01

1.1 Evolução histórica...01

1.2 Sua delimitação conceitual...11

1.3 Privacidade: direito da personalidade...18

Capítulo II - Direito à privacidade ....31

2.1. Privacidade: desenvolvimento histórico...31

2.2 Privacidade: considerações gerais...39

2.3 Definição jurídica da privacidade ...48

2.4 Direitos fundamentais e privacidade...58

2.5 Vida privada...66

2.5.1 Privacidade e intimidade...69

2.5.2 Privacidade e imagem...79

2.5.3 Privacidade e honra...88

2.6 Privacidade e tutela jurídica...91

Capítulo III - Aspectos juridicos da internet.......104

3.1 Direito à privacidade sob a ótica da Constituição Federal e do Código Civil...110

3.2 Vida privada e direito à Informação...123

3.3 Proteção de dados pessoais...134

3.4 Dados pessoais e sua comercialização ...144

(14)

3.5.2 Vantagens...157

3.5.3 Desvantagens...158

Capítulo IV - Tecnologia, internet e privacidade......161

4.1Mundo virtual...161

4.2 Direito à privacidade no ambiente da internet...173

Capítulo V - Transformação famíliar face às novas tecnologias...177

5.1 Noções gerais...177

5.2 Redes sociais ...190

5.3 Impactos no ambiente familiar e os reflexos das informações inseridas nas redes sociais ...192

5.3.1 Na família ...194

5.3.2 No ambiente escolar...196

5.3.3 No trabalho ... 199

5.4 Disciplina: a família e a formação do individuo ...202

5.4.1 Poder familiar: exercício da paternidade responsável ...205

5.4.1.1 Guarda compartilhada ...212

5.4.1.2 Guarda unilateral ...216

5.4.1.3 Exercício da guarda por terceiros ...217

5.4.2 Dever de solidariedade social ...218

5.4.3 Função do Estado ...219

5.5 Relacionamento familiar e valor ético-moral...221

5.5.1 O fascínio pelo desconhecido...223

5.5.2 Mundo encantado traz mudança de comportamento...225

5.5.3 Conduta dos pais...231

(15)

6.1 Seu histórico e delimitação conceitual...238

6.2 Fundamentos na atualidade ...241

6.3 Posição doutrinária: danos decorrentes de informações disponibilizadas na internet... ...248

6.4 Responsabilidade civil e ano à privacidade familiar na internet ...254

6.5 Dano moral e sua reparação ...264

6.5.1 Pontos gerais controvertidos...264

6.5.2 Dano: reparação e sua prova...266

6.5.3 Limite da reparação...268

6.5.4 Razoabilidade, proporcionalidade, equidade...273

Capítulo VII - Sugestão de lege ferenda...280

Conclusão ...283

Projeto de Lei ………..291

Bibliografia ...294

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Capítulo I – Direitos da personalidade

1.1 Evolução histórica

Analisar a evolução histórica dos direitos da personalidade1 significa o acompanhamento da evolução dos direitos humanos que, a partir do concreto reconhecimento de sua dignidade, foram sendo especificados, segundo as reações provocadas pelas diferentes manifestações do poder, assim em cada etapa históricamente considerada, como na estruturação das diferentes culturas e, também, porque um homem não deve ser protegido somente em seu patrimônio, mas, principalmente, em sua essência2.

Fábio Konder Comparato3 enumera três fases através das quais se foi reconhecendo os direitos humanos, até serem criadas instituições jurídicas em sua defesa: a fase axial-religiosa, a filosófica e a da ciência.

Fase axial: o reconhecimento da preeminência do ser humano no mundo surgiu com a afirmação da fé monoteísta, cuja expressão mais pura surgiu no século VI A.C, com o Dêutero-Isaías, que inovou pela autorização do indivíduo poder entrar em contato direto com Deus, afastando o culto coletivo, indireto, dependente da

1 GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA Filho, Rodolfo (Novo curso de direito civil: parte geral:

volume 1. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 144), expõem: “A expressão ‘direitos da personalidade’ foi consagrada pela legislação nacional e desfruta da predileção da doutrina. Há, contudo, na doutrina alienígena, o emprego de outras expressões, como ‘direitos fundamentais da pessoa’, ‘direitos subjetivos essenciais’, ‘direitos personalíssimos’, ‘ direitos sobre a própria pessoa’ etc.

2 GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA Filho, Rodolfo. Novo curso de direito civil, cit. volume 1, p.

143. Sobre a matéria: BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001; TEPEDINO, Gustavo e outros. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

3 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. São Paulo: Saraiva,

(17)

intermediação sacerdotal ou grupal.4 Considera o ser humano em sua essência

dotado de liberdade e razão, ponto de partida para a consideração dos fundamentos intelectuais a afirmação dos direitos universais inerentes à pessoa humana. Esta convicção nasceu vinculada à instituição social da lei escrita, sagrada entre os judeus e adquirindo o caráter de fundamento da sociedade política, em Atenas, quando além de escritas, assumiram a proporção de serem consideradas noções universais, regras gerais e absolutas, devendo atingir todas as nações.

Fundamento filosófico: a partir do estoicismo, com o reconhecimento da unidade substancial do ser humano – unidade moral do ser humano e dignidade do homem, passando por Boécio (século VI), que afirmava ser propriamente pessoa a substância individual da natureza racional e chegando à discussão conceitual dos doutores da Igreja, com a concepção medieval de pessoa como núcleo do conceito universal de direitos humanos onde “escolásticos e canonistas medievais tiraram a conclusão lógica de que todas as leis contrárias ao direito natural não teriam vigência ou força jurídica; ou seja, lançaram-se as bases de um juízo de constitucionalidade avant la lettre.” 5

Fase da ciência: elaboração teórica do conceito de pessoa, iniciada com Kant6, por meio de postulados éticos que distinguiram as pessoas, somente o ser racional possui a faculdade de agir de acordo com a representação de leis ou princípios, tem vontade racional, pela qual vive em condições de autonomia, isto é tem dignidade, considerada enquanto valor absoluto. Deposita no fundamento da liberdade o universo axiológico, preferências valorativa e ética de modo geral, a do mundo das normas que são passíveis de violação consciente.

4 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação ..., p. 20

5 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação...., p. 25

6 Segundo Immanuel KANT (Fundamentação da metafísica dos costumes. Tradução Paulo Quintela.

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Na era contemporânea, com a descoberta da estrutura do DNA (ácido desoxirribonucléico), ciência e filosofia seguem um mesmo rumo de interpretação: a partir de um primeiro molde da personalidade individual – o patrimônio genético7 -, há que se considerar a influência conjugada do meio orgânico, do meio social e do próprio indivíduo sobre si próprio, como fator de diferenciação. O ser humano possui um caráter único dotado de valor, demonstrando a existência singular da dignidade.8

Com a Revolução Francesa e a promulgação da Déclaration des droits de l’homme et du citoyen (Declaração dos direitos do homem e do cidadão) em 1789 ocorreu o reconhecimento da liberdade e respeito visando a proteção da condição humana. A Declaração motivou e embasou as legislações posteriores de inúmeros países, diante da significativa intenção de declarar os direitos humanos ou

fundamentais9. Calcadas nas ideias de Rousseau, grandes transformações

ocorreram no pensamento ético, passando o homem a ser visto como pessoa moral, destacada do Estado e da sociedade, considerados meios para alcançar seus fins.10

Em consequência, o Código Civil Francês de 1804, conhecido como o Código Napoleônico, muito embora não tenha reconhecido expressamente os

7 GONÇALVES, Carlos Roberto, (Direito Civil brasileiro, volume 1. Parte geral 8ª.Ed. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 184), pondera: “[...]Cogita-se, ainda, na doutrina, da existência de uma quarta geração, que decorreria das inovações tecnológicas, relacionadas com o patrimônio genético do indivíduo, bem como de direitos de uma quinta geração, que decorreriam da realidade virtual.[...]”

8 COMPARATO, Fabio Konder. A afirmação..., p. 31.

9 JABUR, Gilberto Haddad (Liberdade de pensamento e direito à vida privada: conflito entre direitos

da personalidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 36-37) evidencia: “Primeira parte do preambulo da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, ‘Les représentants du peuple français, constitués em Assemblée nationale, considérant que l’ignorance, l’oubli ou le mépris des droits de l’homme sont les seules causes des malheurs publics et de la corruption des gouvernements, ont résolu d’exposer, dans une déclaration solennelle, les droits naturels, inaliénables et sacrés de l’homme, afin que cette déclaration, constamment présente à tours le membres du corps social, leur rappelle sans cesser leurs drotis et leurs devoirs (...)’. Em vernáculo : ‘Os representantes do povo francês, reunidos em Assembleia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, resolvem expor, solenemente, os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que esta declaração, constantemente presente em todos os membros do corpo social, seja-lhes lembrada sem cessar seus direitos e deveres (...)”.

10 MICELI, Vincenzo. La personalità nella filosofia del diritto, Milão, Società Editrice Libraria, 1922, p.

138-165 e, principalmente, p. 152. Capelo de Sousa, O direito geral, cit., p. 62, esclarece que: “Os

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direitos da personalidade, trouxe para o seu bojo os princípios da Declaração dos Direitos do Homem, tutelando os direitos subjetivos, entre os quais o da vítima da lesão ao ressarcimento de danos sofridos pela conduta culposa de outrem, assentado, inicialmente, como regra geral da responsabilidade civil subjetiva no artigo 1.382: 11

“Tout fait quelconque de l’homme, qui cause à autrui um dommage, oblige celui par la faute duquel il est arrivé, à le réparer”.

Conforme elucida Maria Helena Diniz12, já existia tutela jurídica aos

direitos da personalidade na Antiguidade, prevendo punições às ofensas físicas e morais à pessoa: a dike kakegorias, na Grécia e, em Roma, sua defesa através da

actio injuriarum. Sob a ótica do Cristianismo, o parâmetro adotado era o da ideia da fraternidade universal. Durante a Idade Média, a Carta Magna (séc. XIII), na Inglaterra, reconheceu direitos próprios do ser humano – ainda que implicitamente, passou-se a entender o homem como o fim do direito. Porém a defesa dos direitos individuais e a valorização da pessoa humana e da liberdade do cidadão só vieram a ser impulsionadas com a Declaração dos Direitos de 1789.

Segundo Rabindranah Capelo de Sousa, a partir de então se iniciou a nova luta pela unidade e pela expansividade da personalidade humana, especialmente a partir da Constituição Federal alemã de 1949, que, no artigo 2º

11CIONTI, Ferdinando, La nascita, cit., p. 19; Rabindranah V.A. Capelo de Sousa (O direito geral, cit.,

p. 70), alega que o mesmo se deu com o Código Civil alemão, de 1900, que deixou de consignar um direito geral de personalidade, sendo que a doutrina e a jurisprudência consideram o parágrafo 823 fonte de obrigação por lesão aos direitos da personalidade (p. 82). Maria Helena Diniz, Anotações de aula no curso direitos da personalidade: questões polêmicas, PUC-SP, explica que também o Código Civil italiano de 1865 e o Código Civil português de 1866 quase nada mencionaram sobre os direitos da personalidade. Artigo 1382 Código Civil Francês: “Qualquer fato oriundo daquele que provoca um dano a outrem obriga aquele que foi a causa do que ocorreu a reparar este dano.” (tradução nossa).

12 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Teoria geral do direito civil. São Paulo:

Saraiva, 2011, v.1, p. 132/133. Sobre o tema: Carlos Roberto Gonçalves, Direito civil 1 esquematizado, volume 1. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 152; René Ariel Dotti, Proteção da vida privada e liberdade de informação, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1980, p. 40-43; Capelo de

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estabeleceu que “todos têm o direito ao livre desenvolvimento da personalidade”, erigindo a dignidade da pessoa humana à condição de um direito inviolável.13

A conscientização acerca da importância dos direitos da personalidade para o mundo jurídico como categoria de direitos subjetivos é relativamente recente. Surgiu a sua valorização, a partir das agressões à dignidade humana efetivada pelos governos extremistas, no contexto da Segunda Guerra Mundial, em decorrência das barbaridades ocorridas nos campos de concentração. Assim é que vieram resguardados na Assembleia Geral da ONU de 1948, na Convenção Européia de 1950, destacando-se o artigo 8º da Convenção para a Proteção dos Direitos do

Homem e das Liberdades Fundamentais assinada em Roma14e no Pacto

Internacional das Nações Unidas15 e no Pacto de São José da Costa Rica – Convenção Americana sobre Direitos Humanos, artigo 11.16

O princípio da personalidade foi consagrado na promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada unanimemente pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, a proclamação

13 SOUZA, Rabindranah V. A. Capelo de. O direito geral, cit. p. 85.

14 Conselho da Europa. Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades

Fundamentais. Direito ao Respeito pela vida privada e familiar. 1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicilio e da sua correspondência. 2. Não pode haver ingerência de autoridade publica no exercício desse direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providencia que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança publica, para o bem-estar econômico do país, a defesa da ordem e prevenção das infrações penais, a proteção da saúde ou da moral ou a proteção dos direitos e liberdades de terceiros.

15 ONU. Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. Resolução nº 2200-A (XXI) de 16.12.1966,

Artigo 17 “§ 1. Ninguém poderá ser objeto de ingerências arbitrárias ou ilegais em sua vida privada, em sua família, em seu domicilio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra e reputação. § 2. Toda pessoa terá direito à proteção da lei contra essas ingerências ou ofensas”.

16 OEA. Pacto de São José da Costa Rica. Convenção Americana sobre Direitos Humanos, 22 de

novembro de 1969. Artigo 11 – Proteção da honra e da dignidade. 1. Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação. 3. Toda pessoa tem direito à

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e que todo homem tem direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa – artigo XII. 17

Objetivando atingir a paz, o documento firmado por João XXIII tem como fundamento a dignidade humana. A encíclica sustenta que todos são iguais em natureza, em nobreza e em dignidade. Baseados diretamente nesta natureza estão os direitos universais e inalienáveis. O reconhecimento e o respeito tanto da dignidade da pessoa como desses direitos universais é o único fundamento certo para um mundo justo e pacífico.18

O grande passo para a proteção dos direitos da personalidade foi construída em fins do século XX, com base no aperfeiçoamento da noção de respeito à dignidade humana. No Brasil, foi dado com o avento da Constituição Federal de 1988, em seus artigos 1º, III, e 5º, X. Referidos dispositivos, reconhecem nos direitos da personalidade a dimensão axiológica e objetiva, através da tutela legal e constitucional, protegendo-os contra abusos e, já antevendo o avanço tecnológico, conciliou a liberdade individual com a social, garantindo condições de solução para problemas futuros, com bom senso, prudência, objetividade além da lógica do razoável. 19

17 Artigo XII “Ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou

na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques”.

18 OVERBERG, Kennet R. (Consciência em Conflito. São Paulo: Paulus, 1999, p. 166/167) afirma: “A

dignidade humana está sempre presente na pessoa; não é conferida pela família, pela sociedade ou pelo governo. Pelo contrário, a dignidade humana faz sua reivindicação sobre outras pessoas e sobre a sociedade. Para que esta dignidade seja concretizada em situações históricas e culturais particulares, exigem-se formas de comportamento de estruturas sociais especificas. Essas exigências, portanto, são valores que constituem as condições necessárias para a realização do valor fundamental, que é a dignidade humana. [...]”.

19 DINIZ, Maria Helena. Curso..., cit. v.1, p. 133; anotações de aula do curso de pós-graduação –

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O direito brasileiro utilizou-se de cláusulas gerais consagradas pela norma constitucional sob o manto da dignidade da pessoa humana ou tutela integral da pessoa20 (artigo 1º, III) e da previsão individualizada de direitos específicos, conceituado como direitos da personalidade no Código Civil de 2002.

Apesar da vasta discussão sobre o tema no cenário internacional, a proteção do direito à privacidade na internet tem se mostrado lenta e somente se verifica mediante o reconhecimento pelos países, internamente, com programas de conscientização da sociedade no uso inteligente da rede, na edição de normas e reconhecimento pelo poder Judiciário.

A proteção da privacidade no Brasil é objeto, inclusive, de tutela em leis especiais, mas é aos aplicadores do direito a quem coube a difícil tarefa do desenvolvimento da proteção da intimidade do ser humano, sua imagem, nome, corpo e preservação de sua dignidade.21

Ante o avanço da tecnologia, a norma jurídica não acompanhou o progresso técnico e social. Porém o Código Civil de 200222 trouxe uma das principais inovações na Parte Geral, destinou um capítulo próprio aos direitos da personalidade, mas de forma receosa para assunto de tamanha envergadura, principalmente pelo status atribuído à dignidade humana, pela Constituição Federal.

20 MIRAGEM, Bruno. (A responsabilidade civil da imprensa por dano à honra. Porto Alegre: Livraria do

advogado, 2005, p. 109) justifica: “(..)Esta expressão cunhada por Gustavo Tepedino para superar a divisão das normas de proteção presentes na legislação infraconstitucional sob diversos títulos, e que guardam como objetivo, igualmente, a proteção jurídica da pessoa humana”.

21 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil 1 esquematizado... cit. p. 152.

22 GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso... v.1, p.143, no mesmo

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Discorrendo sobre os fundamentos dos direitos da personalidade, Silvio Rodrigues pondera que,

“se porventura se ligar a proteção dos direitos da personalidade aos princípios constitucionais que proclamam os direitos do homem, aqueles direitos se encontram protegidos na maioria dos países do Ocidente, sem

necessidade de uma legislação específica sobre a matéria” 23.

Esclarece o autor que os direitos da personalidade foram disciplinados, inicialmente, pelo Código Civil italiano de 1942, recebendo denominações diferenciadas. A opção do legislador italiano reconhecendo distintas esferas da personalidade, não significa que deixavam de ser protegidas pela ordem jurídica, vez que se ocuparam de normas penais resguardando os mesmos bens jurídicos sob o conceito de personalidade.24

Vale destacar as lições de Renan Lotufo no sentido de que inúmeros foram os Códigos que disciplinaram os direitos da personalidade, dentre eles, o suíço, o japonês, o grego, o egípcio, o italiano e de Quebec, sendo que o direito italiano contribuiu consideravelmente para a inserção dos direitos da personalidade nos referidos Códigos por considerar tratar-se de direito natural, uma das razões pelas quais o Código Civil, Lei n. 10.406, de 11-1-2002, abraçou a questão. 25

A personalidade não é um direito, é o objeto do direito. É um direito subjetivo de defender o que lhe é próprio. Tamanha é a importância dos direitos da

23 RODRIGUES, Silvio (Direito civil – Parte geral. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 64), acentua, “[...]

Tenho a impressão de que os direitos da personalidade foram, pela primeira vez, disciplinados pela lei, de forma sistemática e embora sem usar essa denominação, pelo Código Italiano de 1942. [...]” Para Carlos Roberto Gonçalves (Direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 183: “[...] Certas prerrogativas individuais, inerentes à pessoa humana, aos poucos foram reconhecidas pela doutrina e pelo ordenamento jurídico, bem como protegidas pela jurisprudência. São direitos inalienáveis, que se encontram fora do comércio, e que merecem a proteção legal. [...] São dos direitos da personalidade, cuja existência proclamada pelo direito natural [...].”

24 MIRAGEM, Bruno. Responsabilidade civil da imprensa por dano... cit. p. 109-110.

(24)

personalidade que vem protegido pelo ordenamento jurídico de todos os países civilizados, desfrutando dos mais diversos estatutos considerando-se o prisma analisado, além de vários campos: constitucional, penal, civil e legislação extravagante. Dentre eles, encontra-se o direito à privacidade, objeto de estudo por profissionais do direito, de forma globalizada.

Particularmente sob o ponto de vista tecnológico, é na internet que se vislumbra um terreno fértil para a prática de atos ilícitos e aviltamento aos direitos humanos, fruto do galopante avanço. Sem território ou nacionalidade definidos, encerra em si a contradição de ser uma sociedade dependente, sem vida própria e, em parte independe do mundo físico para existir.

Encontramos neste grande veículo de massa, os mais diversos tipos de usuários, desde os mais simples que se utilizam para enviar e-mail a um familiar, como também os detentores das cifras e-commerce e do e-business, os incitadores do crime organizado e o cyberterrorismo. O cidadão do mundo virtual é antes de tudo um cidadão do mundo real26. A exposição direta àquele mundo, de um lado,

traz como consequência prejuízos ao núcleo familiar por ver diminuídas as condições de cidadania, com resultados concretos na forma de emprego, relacionamento social e mesmo intrafamiliar; de outros conhecimentos ilimitados, inimagináveis, sem fronteiras, em tempo real.

É fácil perceber que as relações virtuais se dão principalmente, através da utilização do telefone celular, pelos jovens e adolescentes que permanecem vinte e quatro horas conectados: com a família, com amigos - conhecidos e virtuais, participando de jogos, chats, redes sociais etc. chegando à dependência da

26 VANCIM, Adriano Roberto e outro. Direito& internet: contrato eletrônico e responsabilidade civil na

(25)

conectividade27. Tanto as gerações passadas, quanto as de hoje precisam filiar-se a

um determinado grupo até mesmo para consolidar uma identidade.

Neste contexto, no círculo familiar, é dever dos pais criar novos meios para controlar o uso do celular e da internet, mediante imposição de regras e fiscalização, como forma de prevenir até mesmo o isolamento social, mantendo uma convivência salutar. O uso das tecnologias de comunicação deve ser satisfatório, saudável e benéfico, sem deixar de lado a vida normal fora da internet.

Em recente matéria veiculada sobre comportamento dos jovens e adolescentes, restou patente a preocupação de vários países do mundo, com a intensidade da relação dos adolescentes com a internet e o celular, principalmente quanto aos limites de utilização desses meios de comunicação, sendo que alguns pais ficam preocupados em interferir na relação do filho com a tecnologia, por não saber ao certo se é saudável ou não a intervenção.

No tocante às escolas, a pesquisa demonstra a preocupação também dos professores com a hiperconectividade dos alunos, que passam mais tempo se comunicando do que propriamente no ambiente escolar. Em decorrência da situação algumas escolas estão utilizando o celular dos próprios alunos como instrumento de apoio ao progresso do ensino, para pesquisas, conscientizando-os sobre o uso e visando tornar o aluno mais participativo.28

O debate da questão acerca da proteção da privacidade familiar na internet é globalizado. A intenção está na tentativa de solucionar os problemas

27 Maíra Lie Chao. (Revista Planeta. Comportamento. 24 horas conectados. Ano 40, edição 473 –

Fevereiro 2012, p. 30) coloca: “[...]O dependente da conectividade passa o dia inteiro ligado à internet, pondo em risco o emprego, burlando as normas da empresa, faltando à escola ou abrindo mão de atividades como academia, jantar com amigos, etc. Com o celular, por exemplo, o estudante vai à aula, mas só de corpo presente. [...]”

28 CHAO, Maira Lie. Revista Planeta . O vicio da conexão eletrônica 24 horas. Ano 40, Edição 473,

(26)

enfrentados pela família pela violação aos valores éticos e sociais do usuário e da família, atributos da personalidade, como se a invasão agisse no ego da própria pessoa.29

A problemática envolve a família, a sociedade e o Estado, cada qual na sua esfera participativa. Sobrelevar os direitos da personalidade com discussões envolvendo os temas relativos à identidade, privacidade, autocontrole, uso responsável das tecnologias, cuidado com a imagem e informações disponibilizadas na rede mundial é tarefa de todos. O debate deve ser multidisciplinar para surtir o efeito desejado. Não podemos fazer da internet um problema, mas sim a solução para muitos problemas. Direcionar e indicar meios para amenizar a situação é o objetivo deste trabalho; solucionar é praticamente impossível.

1.2 Sua delimitação conceitual

O objeto do estudo da análise etimológica do termo “privacidade” transporta-nos, necessariamente, a considerações sobre intimidade, individualismo e personalidade do ser humano. Foram esses os valores que, durante a evolução histórica dos grupos humanos, emergiram como imposições a serem delimitadas e respeitadas.

Assim, etimologicamente30, personalidade é um “Vocábulo que apareceu no século XIV (1380), na Alemanha. [...] No século XVIII-XIX significa qualidades ou conjunto de qualidades que faz de uma pessoa o que ela é, enquanto diferente de outras pessoas e diferentes de um indivíduo para outro, não divisível do ponto de vista físico”.

29 GASPARIAN, Taís. Privacidade em tempos de internet. Revista do Advogado, ano XXIII, n. 69,

maio de 2003, p. 37.

30 Enciclopédia Mirador Internacional – vol. 17. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil, 1995,

(27)

O conceito jurídico da personalidade vem fartamente delineado pelos doutrinadores, especificando sua abrangência e distinguindo os diversos direitos de defesa que contém. Dentre eles e sendo a todos inerentes, o direito de defesa da privacidade, que alcança a dignidade, a intimidade, a vida privada.

E, no entender de Renan Lotufo31:

“São o mínimo imprescindível para o ser humano desenvolver-se dignamente.”

A personalidade é um conceito básico extensivo a todo ser humano, consiste na realização dos valores, finalidade última do direito e encontramos consagrado na legislação civil e constitucional de quase todos os países.

Maria Helena Diniz32 ao lecionar sobre a matéria traz os ensinamentos de

Goffredo Telles Jr., que pontificia:

“Os direitos da personalidade são os direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja: a identidade, a liberdade, a sociabilidade, a reputação, a honra, a autoria, etc. [...] são direitos comuns da existência, porque são simples permissões dadas pela norma jurídica, a cada pessoa, de defender um bem que a natureza lhe deu, de maneira primordial e direta”.

Ressalta a autora que a personalidade não é um direito, é objeto do direito, é o bem que pertence à própria pessoa como de primeira utilidade para que ela possa se adaptar às condições do ambiente em que se encontra. Serve-lhe

31 LOTUFO, Renan. Código Civil comentado. v.1, p. 49.

32 DINIZ, Maria Helena. (Curso de direito civil brasileiro... v.1, cit. p. 114; 133/134), traz as lições de

Tércio Sampaio, que assevera: “[...] A personalidade não é um direito, de forma que seria errôneo afirmar que o ser humano tem direito à personalidade. A personalidade é que apoia os direitos e deveres que dela irradiam, é objeto de direito, é o primeiro bem da pessoa, que lhe pertence como primeira utilidade, para que ela possa ser o que é, para sobreviver e se adaptar às condições do ambiente em que se encontra, servindo-lhe de critério para aferir, adquirir e ordenar outros bens.

Sobre a matéria ver também: Giselda Maria Novaes Hironaka/Maria Clara Osuma Diaz Falavigna (coord.) Ensaios sobre responsabilidade civil na pós-modernidade. Porto Alegre: Magister, 2007, Artigo de Flávio Tartuce e Gisele Câmara Groeninga. O dano à integridade psíquica: uma análise

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também como critérios de aferição para outros bens, são traduzidos pelo conjunto de caracteres próprios da pessoa.33

Elimar Szaniawski traz as lições de Hubmann34, no sentido de que a personalidade humana é composta por três elementos fundamentais: a dignidade, a

individualidade e a pessoalidade. Segundo o Autor referidos elementos são responsáveis pela formação do caráter próprio de cada indivíduo, permitindo-lhe desenvolvimento e evolução, a fim de alcançar a realização como ser humano.

Rabindranath V. A. Capelo de Sousa35 traz uma noção comparada do direito geral da personalidade como sendo:

“o direito de cada homem ao respeito e à promoção da globalidade de elementos, potencialidades e expressões da sua personalidade humana bem como da unidade psico-físico-social-ambiental dessa mesma personalidade humana, com a obrigação de se absterem de praticar ou deixar de praticar actos que ilicitamente ofendam ou ameacem ofender tais bens jurídicos da personalidade alheia, sem o que incorrerão em responsabilidade civil e/ou na sujeição às providências cíveis adequadas a evitar a consumação da ameaça ou a atenuar os efeitos da ofensa cometida.”

Aplica o direito geral da personalidade como sendo o direito de cada homem ao respeito. Acrescenta que as demais pessoas detém a obrigação de se absterem.

33 TELLES Jr, Gofredo. (Iniciação na ciência do direito. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 297-299) ensina:

“[...] A personalidade é o conjunto dos caracteres próprios de um determinado ser humano. É o conjunto dos elementos distintivos, que, permitem, primeiro, o reconhecimento de um indivíduo como pessoa e, depois, como uma certa e determinada pessoa. [...] É uma qualidade em sentido estricto, porque é uma disposição ou maneira de ser do indivíduo humano. [...] Todo ser tem suas propriedades, ou seja, suas qualidades próprias, que o caracterizam. [...] Os direitos da personalidade não são direitos de ter uma personalidade, mas, isto sim, direitos subjetivos de defender essa primordial propriedade humana. [...]”

34 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos de personalidade e sua tutela. São Paulo: RT, 2005, p.114/115.

35 SOUSA, Rabindranath V. A. Capelo de. O direito geral de personalidade. Editora Coimbra,

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Logo, personalidade e direitos da personalidade são coisas totalmente distintas. A personalidade é conceito básico da ordem jurídica, que a estende a todos os homens, toda pessoa é dotada de personalidade, mas nem toda pessoa é dotada de personalidade jurídica.

Inseparáveis são do seu titular os direitos da personalidade, subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, de maneira primordial e direta, de exigir um comportamento negativo dos outros, protegendo um bem inato, mediante ação judicial.36

Orlando Gomes37 entende os direitos da personalidade como sendo direitos essenciais à pessoa humana a fim de resguardar a sua dignidade, protegendo-a contra práticas e abusos atentatórios.

Os direitos da personalidade são inerentes à pessoa e, para que haja o desenvolvimento humano e construção da personalidade é necessário o afeto do amor, dependente da convivência com o outro e dos exemplos que fazem sua inscrição no psiquismo de forma consciente e inconsciente, sem os quais não nos humanizaremos. E o amor, independe de disposição legal, interpretação jurisprudencial ou doutrinária. Depende somente do outro ser.38

36 DINIZ, Maria Helena. Curso... cit. p 135. Sobre o tema: WALD, Arnold. Curso de direito civil

brasileiro – introdução e parte geral. 5ª. Edição, p. 108/109; LOTUFO, Renan. Curso avançado de direito civil, cit. p. 79.

37 GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p.

141-149.

38 Flavio Tartuce/Gisele Câmara Groeninga (O dano à integridade psíquica: uma análise

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E, sendo os direitos da personalidade os referentes às projeções para o mundo exterior, no relacionamento com a sociedade, ou seja: a pessoa como ente moral e social, só será completa com o respeito e a preservação da dignidade humana.39

Dignidade40 enquanto elemento indicador da localização do ser humano, espiritual, no universo, dotado de dons, através dos quais age, realiza valores éticos. Individualidade enquanto caráter próprio, evoluindo e complementando-se através da educação, do progresso moral e espiritual. Pessoalidade, na relação do indivíduo com o mundo exterior, na interação social – o indivíduo se afirma como ser, segundo valores éticos. Para tornar possível a cada ser humano que se realize, respeitando os direitos de seus semelhantes e tendo respeitados os seus, impõe-se que a comunidade de personalidades seja ordenada juridicamente.41

Por sua vez, Alexandre de Moraes42, em comentário ‘a Constituição Federal salienta:

“A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que

– as identificações, que são o resultado dessas experiências emocionais com os adultos, pais ou substitutos. [...]”

39 BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. (atualização de Eduardo C. B. Bittar) Rio de

Janeiro: Forense Universitária, 2001, p.10.

40 BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos... p. 108 “[...] A dignidade não tem um conteúdo único. Da

mesma forma, a personalidade não o tem, tem ficado à interpretação doutrinária e jurisprudencial contextualizar e quantificar a ameaça ou dano, contando também com o aporte de experts que possam avaliar sua extensão em uma atividade multidisciplinar. [...]

Ver também: Erick Frederico Gramstrup. A família nas constituições brasileiras e nas constituições do MERCOSUL, in Giovanni Ettore Nanni (Coord). Temas relevantes do direito civil contemporâneo, São Paulo: Atlas, 2008, p.589/597.

41 MARTINS, Ives Gandra da Silva. PEREIRA Jr. Antonio Jorge. Direito à Privacidade. (Coord.)

JABUR, Gilberto Haddad. (A Dignidade e o rompimento da privacidade. São Paulo: Ideias e Letras, p. 87) expõe: “ Dignidade não é norma e nem direito, é valor supremo que dita e limita, o alcance de qualquer outra regra ou princípio jurídico. O direito desconhece o indigno. Indignidade é conceito extrajurídico. Introduzi-la no terreno jurídico excepcionaria a unicidade de tratamento à própria e única medida de todas as coisas ou regras. É o termômetro de que há de servir o interprete ou, antes, o exegeta.”

42 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo:

(31)

todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.”

E, ao analisar a dignidade da pessoa humana43, acentua que o princípio

fundamental constitucional apresenta dupla concepção: direito individual protetivo, tanto em relação ao Estado, como aos demais indivíduos; dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes, que se configura:

“pela exigência de o indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal

qual a Constituição Federal exige que lhe respeitem a própria.” 44

Renan Lotufo45, ao discorrer sobre os direitos da personalidade, enfatiza

que:

“tratando-se de uma construção recente, fruto da elaboração originária da doutrina germânica e francesa, da segunda metade do século XIX, os direitos da personalidade devem ser vistos como relacionados à tutela da pessoa humana, essencialmente quanto à sua integridade e dignidade. O respeito à dignidade humana passou a ser a tônica dos sistemas constitucionais, em anteposição ao estatismo prevalente no período anterior.”

Desse modo, para que haja dignidade é preciso que pessoa tenha assegurados os direitos fundamentais e sociais, neles incluído o direito a um meio ambiente equilibrado, previsto no artigo 225 da Constituição Federal, assim

43 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil, cit. p.129.

44 CANOTILHO, J.J. (Direito constitucional e teoria da Constituição. 4ª. Ed. Coimbra: Almeida, 2000,

p. 390), enfatiza que: “[...] muitos dos direitos fundamentais são direitos da personalidade, mas nem todos os direitos fundamentais são direitos da personalidade. Explica que, na atualidade, tendo em vista a interdependência entre o estatuto positivo e o estatuto negativo do cidadão e em face da concepção de um direito geral de personalidade como “direito à pessoa ser à pessoa devir”, cada vez mais os direitos fundamentais tendem a ser direitos da personalidade e vice-versa. [...] os direitos da personalidade abarcam certamente os direitos do Estado (por ex. direito de cidadania), os direitos sobre a própria pessoa (direito à vida, à integridade moral e física, direito à privacidade), os direitos distintivos da personalidade (direito à identidade pessoal, direito à informática) e muitos dos direitos de liberdade (liberdade de expressão). Tradicionalmente, afastam-se dos direitos de personalidade os direitos fundamentais políticos e os direitos a prestações por não serem atinentes ao ser como pessoa. [...]”

(32)

entendendo, com sendo o ambiente virtual e familiar. Caso contrário, teremos as indignidades que nos provocam um sentimento de injustiças e até mesmo de fúria46.

Mas, como equilibrar esse meio ambiente com relações saudáveis entre os membros da família diante da dependência da conectividade, sem ferir a dignidade humana? Para os adolescentes, não há castigo maior do que ficar sem celular ou computador. Possuir um celular ou computador é muito mais do que um simples aparato tecnológico, significa a passagem para uma nova fase do ciclo familiar, significa liberdade, confiança e autonomia.

Todo o cuidado por parte dos responsáveis é pouco. Existe uma necessidade de monitoramento dos filhos pelos pais, em função da violência e da insegurança presentes na atualidade. A tecnologia, não pode ser um problema da família ou um aliado da educação, mas deve ser tratada apenas como um complemento nas relações familiares e um estímulo para o desenvolvimento da criança e do adolescente. A autoridade continua sendo dos pais, não só para o exercício do poder parental, como também como forma de proteção da privacidade familiar no ambiente virtual.

1.3 Privacidade: direito da personalidade

A personalidade é o gênero da qual a privacidade é a espécie, portanto, remonta aos princípios da criação da humanidade.

46 Conforme Hanna Arendt, (A condição humana. Trad. Roberto Raposo. Rio de Janeiro: Forense

(33)

O ser humano sente necessidade de resguardar determinados fatos particulares ocorridos na vida familiar. Tem-se que tais fatos, não devem transpor a esfera familiar, sob pena de causar transtornos e desgostos a seus membros, além de ameaçar a liberdade individual.

Houve uma crescente evolução no tocante à proteção da privacidade, inclusive tem sido objeto de estudo por doutrinadores de vários países. A preocupação, entretanto, não é recente, remonta à Bíblia, o de encontramos várias referências, apesar da proteção ainda que tímida nos primórdios das culturas hebraica e grega e na China antiga, onde na maioria das vezes estava voltada ao "direito a estar só". Também, na antiguidade a preocupação das pessoas na proteção da intimidade era bem pouca ou praticamente nula, uma vez que a vida transcorria em espaços públicos. 47

Mas, com a consolidação das sociedades feudais, a idade média marca um crescimento da necessidade da vida privada, posto que o senhor feudal acabava muitas vezes tolhendo a liberdade e a privacidade dos servos. A vida privada ganha relevância na medida em que os indivíduos passam mais tempo no ambiente doméstico, com a família, perdendo espaço a esfera pública, em razão da religiosidade e as crenças da época.48.

Já no Império Romano, a vida privada era delimitada de forma "negativa", ou seja, era um resíduo daquilo que uma pessoa poderia fazer sem atentar contra seus deveres e funções públicas, sendo certo que até o fim da Idade Média não

47 FARIAS, Edílson Pereira de. Colisão de direitos – A honra, a intimidade e a vida privada e a

imagem versus a liberdade de expressão e informação. 2. ed. atualizada. Porto Alegre: Fabris, 2000. p. 137.

48 ALVES, Marina Vitório. Direito à intimidade e à vida privada: Os contornos da individualidade no

mundo contemporâneo in O direito à vida digna. Coord. Cármen Lúcia Antunes Rocha. Belo

(34)

havia uma clara noção de indivíduo e as atitudes e relações tinham caráter coletivista, apesar da habitação das pessoas serem reconhecidas como lugar de sossego e de recato.

O antigo dualismo romano entre direito público e direito privado, ressurgiu com o fim dos Estados absolutistas, mediante a geração de um espaço a ser preenchido por novos agentes sociais, causando um aumento na distinção entre a área de influência estatal e a área de atuação dos indivíduos que vivenciavam o emergente liberalismo. 49

Com o intuito de proteção da privacidade, no período da guerra fria ocorreram vários movimentos de estudiosos do direito, tais como: conferências, seminários e encontros, ensejando a edição de inúmeros documentos reconhecidos internacionalmente50.

O escritor britânico George Orwell com a publicação da obra "1984", de forma brilhante criou um clássico sobre privacidade e autonomia, cunhando o termo

big brother, tão conhecida e presente na mídia atual. Extrai-se da estória contida na obra a utilização, pelo Estado autoritário de espiões, captação e controle das massas e seus pensamentos, imagens, revisionismo histórico além de controlar os meios de comunicação, manipulando o significado das palavras de acordo com seus interesses, e com a finalidade única de manter o seu poder sem interferências, intocável. Até mesmo as ideias e sonhos dos cidadãos são vigiados por uma Polícia do Pensamento, sendo a privacidade uma aspiração quase impossível. Para o escritor o comunismo representava a grande ameaça à liberdade individual, fixou: A

24 AGUIAR JR., Ruy Rosado de (Org.). Jornada de Direito Civil. Brasília: CJF, 2003. p. 105.

50 SAMPAIO, Jose Adercio Leite. Direito à intimidade e à vida privada. Belo Horizonte: Del Rey, 1998,

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liberdade é a liberdade de dizer que dois e dois são quatro. Admitindo-se isto, tudo o mais decorre. 51

O futuro que se aproxima não tem um grande irmão que observa e "protege" a todos. Ao invés disso, tem centenas de pequenos irmãos, diminutos intrusos do dia-a-dia, que nos vigiam e monitoram. As novas ameaças à privacidade têm suas raízes no capitalismo e não no comunismo, com sua economia liberal de mercado, tecnologia avançada e troca eletrônica de informações. Além disso, acentuou-se o quadro de vigilância e controle dos cidadãos por meio das informações, oportunidade em que surgiram as primeiras manifestações para uso de tecnologia e, consequente tratamento de informações pessoais.52

Todavia, foi somente com o Estado Moderno que surgiram as características que conhecemos como sociedade civil, onde o indivíduo passa a ser um cidadão frente ao Estado e os aspectos relativos à sua personalidade adquirem novo valor, tornando-se a privacidade elemento de extrema relevância na sociedade.

51 ORWELL, George. 1984. Tradução de Wilson Velloso. São Paulo: Companhia Editora Nacional,

2001, p. 79.

Segundo Marco Antonio Zanelatto (Condutas Ilícitas na Sociedade Digital. O direito civil no Século XXI. Coord. Maria Helena Diniz e Roberto Senise Lisboa, p. 375): “ [...] No alvorecer do século XXI, a metáfora do Big Brother, o grande irmão, espionando o menor movimento das pessoas, constante do livro 1984, de George Orwell, está obsoleta, presa nos pesadelos do século XX. Com efeito, hoje não é o Estado totalitário (praticamente desaparecido com a queda do muro de Berlim) quem mais espreita a vida privada. “São empresas, milhares de empresas, conhecidas ou anônimas, que fazem essa vigilância 24 horas por dia. Somos filmados nos estabelecimentos, identificados digitalmente na entrada dos escritórios, escaneados a cada embarque num avião, monitorados por circuitos de tevê na entrada dos prédios, seguidos nos mínimos cliques na internet. Monumentais bancos de dados garantem que informações desse tipo sejam acumuladas. Na Web, entre senhas e cookies, esse controle chega ao ápice. [...]”

52 AIETA, Vania Siciliano (A garantia da intimidade como direito fundamental. Rio de Janeiro: Lumen

Juris, 1999. p. 7) diz: “[...] Diversos aparatos e dispositivos técnicos, fabricados com objetivos

militares, passaram a servir a vida civil. Alicerçados no chamado princípio da fidelidade, os Estados do pós-guerra, impulsionados pela Guerra Fria, impuseram aos indivíduos uma ambiência de

(36)

No direito brasileiro, Tatiana Malta Vieira53, nos mostra um panorama

geral da evolução da privacidade na atualidade:

“[...] O mundo se deslumbra com os novos rumos e do conhecimento; a tecnologia da informação ilumina horizontes de todas as esferas: invade o cotidiano, altera a forma de produção das empresas, modifica as atividades do setor público e do setor privado, transforma o padrão cultural das pessoas e as formas de relacionamento, enfim, revoluciona a concepção de vida que até então norteava as ações dos indivíduos, e o homem desperta no universo da tecnologia, deixa-se cativar pela máquina que oferece perspectivas de interação jamais experimentadas, expondo-se, de outro lado, cada vez mais em sua intimidade e vida privada diante de novos recursos constitucionais. [...]”

Hannah Arendt54, ao estabelecer uma diferença entre o que temos em comum e o que possuímos privadamente, coloca como segunda característica não privativa da privacidade, as seguintes afirmações:

“ [...] as quatro paredes da propriedade particular de uma pessoa oferecem o único refúgio seguro contra o mundo público comum – não só contra tudo que ele ocorre, mas também contra sua própria publicidade, contra o fato de ser ouvido. Uma existência vivida inteiramente em público, na presença de outros, torna-se, como diríamos, superficial [...]. O único modo eficaz de garantir a sombra do que deve ser escondido contra a luz da publicidade é a propriedade privada – um lugar só nosso, no qual possamos nos esconder. [...]”

Pugnando pelo caráter absoluto da dignidade humana, analisando as lições contidas na esfera religiosa, verificou-se que restou preservada a liberdade de cada ser humano, de seu íntimo, de seu querer. Consultado sobre como

53 VIEIRA, Tatiana Malta. O direito à privacidade na sociedade da informação. Porto Alegre: Sergio

Antonio Fabris Editor, 2007, pág. 22/23. E prossegue “[...] Em outras situações, a intervenção na privacidade se consuma mediante espionagem em meio eletrônico, promovida por empresas e governos, que interceptam informações pessoais e toda espécie de comunicação ao redor do mundo. Assiste-se, portanto, ao crescimento assustador dos riscos de violação à privacidade, o que merece criterioso estudo não apenas à luz da ciência do direito, mas também da tecnologia. [...]” Acrescenta ainda que “Nesse contexto encontra-se o cidadão comum, cujos dados pessoais caem em domínio publico; inerme, o próprio titular já não logra exercer controle sobre informações a seu respeito, sequer sobre as mais intimas, especialmente após o advento e a massificação da internet. Tradicionalmente, transmitem-se os dados pessoais tão somente por telefone, radio ou papel, mas, com a revolução da tecnologia, essas informações passaram a ser veiculadas mediante potentes computadores ligados em rede que facilitam o acesso, a alteração, a destruição, o armazenamento, a interconexão e toda espécie de tratamento de dados por terceiros não autorizados.”

54 ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução: Roberto Raposo, revisão técnica: Adriano

(37)

exemplificar, através da Bíblia, que o próprio Criador respeitou a privacidade, enquanto direito íntimo e individual de cada ser humano, Frei Bruno Glaab55 ressaltou que:

“[...] o Criador confere a todos a liberdade total, a opção livre de decidir e fazer, o que significa que nem o próprio Deus Criador interfere na privacidade de suas criaturas.[...]”

Tal acepção é confirmada nas mais diversas circunstâncias, tanto no Antigo Testamento como no Novo Testamento, onde:

‘[...], a privacidade é o refúgio da dignidade pessoal, o núcleo inexplorável do indivíduo, pelo que somente ele, e exclusivamente ele, pode autorizar sua desprivatização. [...] Tudo que é informado, se torna público, deixa de

ser íntimo ou privado, [...]. Em suma, sem privacidade não há dignidade56.

Não há como negar que a família exerce, neste contexto, uma importante influência no desenvolvimento do direito à intimidade e à privacidade, uma vez que o compartilhamento da vida familiar em ambiente privilegiado e distante do mundo público passa a ser visto como um direito, e não mais como um privilégio como na sociedade feudal.

Contudo, diante das pressões culturais e financeiras, exigências de concorrência, mudança de valores, a vida familiar se tornou mais desafiadora que nunca. As novas tecnologias e a correria da vida moderna fazem com que os membros da família se distanciem cada vez mais, sem os encontros, as reuniões diárias, comunicando-se apenas, virtualmente.57

55 GLAAB, Bruno Frei, Mestre em Teologia bíblica pela Pontifícia Faculdade “Nossa Senhora da

Assunção” – São Paulo, Doutor em Teologia Bíblica na PUC-RJ, atualmente lecionando Novo Testamento na ESTEF – Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana, em Porto Alegre – RS e no Unilasalle (Seminário de Canoas – RS)

56 PASSOS, J.J.Calmom de. A imprensa, a proteção da intimidade e o processo penal. Revista

Forense nº 324, p. 61-67, apud Sérgio Cavalieri Filho. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2008, p. 108.

57 SILVA, Edgard Moreira. (Direito e internet. Introdução. Caderno Jurídico. Ano II, nº IV – Julho de

(38)

Verifica-se que tais direitos crescem na medida em que a autonomia da vida privada é ameaçada pelo surgimento e consequente avanço de novas tecnologias. Tanto a intimidade quanto a privacidade ganham relevância em decorrência da valorização e comercialização de dados pessoais, uso indevido e nocivo dos meios tecnológicos e científicos, além de algumas ações praticadas pelo próprio Estado de forma arbitrária, dentre outros.

Hanna Arendt expõe que a subjetividade da privacidade pode se multiplicar na família tornando-se tão forte a ponto de ser sentida no domínio publico, mas esse mundo familiar, jamais pode substituir a realidade resultante da soma de aspectos apresentados por um objeto na multidão58.

O homem, naturalmente, sempre objetivou a transposição de seu espaço geográfico, descobrindo novas terras, conquistando o espaço fazendo com que novos elementos de reflexão surgissem em decorrência das situações vivenciadas e cujos efeitos, possivelmente, a serem enfrentados. A interação representada pela multidão na internet e a exposição da vida cotidiana das pessoas, em velocidade inimaginável, associado ao crescimento diuturno de usuários interconectados, culmina, muitas vezes, em prejuízos incalculáveis na esfera da privacidade.

Para Ricardo Luís Lorenzetti, considerando que os usuários estão conectados desde a sua intimidade, em um estágio que se sobrepõe aos demais meios de comunicação, afirma que a internet torna os limites do lar como espaço privado debilitado.59 Acrescenta Lorenzetti60:

grande maioria dos lares do globo terrestre. Vivemos a era dos chips, dos bits e dos bytes. O ser humano já não consegue mais conviver sem a informática e a internet; elas fazem parte das suas atividades diárias, tanto no campo profissional como na própria vida familiar e no lazer. No mundo hodierno, está se tornando comum a comunicação entre familiares e amigos pela internet.[...].”

58 ARENDT, Hannah. A condição humana, cit. p. 70

59 LORENZETTI, Ricardo Luís. Comércio eletrônico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 47/48.

60 LORENZETTI, Ricardo Luís. Reprodução em internet e direito – aspectos jurídicos relevantes, obra

coletiva, São Paulo: Edipro, 2000, p. 419 e ss. (Publicado originalmente em Tratado de los Contratos.

(39)

“[...] O advento da era digital criou a necessidade de repensar importantes aspectos relativos à organização social, à democracia, à tecnologia, privacidade, liberdade e se observa que muitas abordagens não apresentam a sofisticação teórica que tais problemas requerem: tornaram-se estéreis em função da retórica, da ideologia e da ingenuidade. [...]”

Inegável, que a era da tecnologia está suscitando problemas de elevada repercussão na seara jurídica, diante das profundas transformações nossa âmbitos social, econômico, político e tecnológico, refletindo, sobremaneira, nas culturas, costumes, relações interpessoais, educação61, trabalho e principalmente no âmbito familiar, ganhando destaque essencial a informação que adquire relevância econômica.62

Destarte, com o advento da era tecnológica, encontramos uma nova fase de ruptura com o modelo social vigente criada por uma sociedade sem fronteiras, ocorreu um devassamento da vida privada, atravessando fronteiras, uma vez que a informática e a tecnologia da informação passaram a participar do cotidiano das pessoas. O que, inicialmente deveria constituir-se em multiplicidade do enriquecimento e aprofundamento do conhecimento, transformou-se em desvirtuamento, ante a dimensão de um dinamismo próprio, totalmente desprovido

Argentina, abril de 2000, p. 813). Buscar também do Autor: Comércio Eletrônico. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, maio de 2001.

61 Revista de direito educacional. Maria Garcia, (Coord.) São Paulo: Revista dos Tribunais, Ano 1, n.

2, jul/dez 2010. Artigo de Ana Laura Vallarelli Gutierres Araujo. “ Educações: pratica da liberdade e da responsabilidade, p. 15/16. “ [...]A educação do home existe por toda a parte e, muito mais do que a escola, é o resultado da ação de todo o meio sociocultural sobre seus participantes. É o exercício de viver e conviver o que educa. E a escola de qualquer tipo é apenas um lugar e um momento provisórios onde isto pode acontecer. Portanto, é a comunidade que responde pelo trabalho de fazer com que tudo pode ser vivido e aprendido da cultura seja ensinado com a vida – e também com a aula – ao educando. [...]”. Conclui Ana Laura que “a educação é um compromisso de todos em construir uma sociedade livre. Isso só será possível quando tiver por finalidade o desenvolvimento integral da pessoa, para que ela possa ser agente transformado e transformador da sociedade em que vive, sem a perda da sua individualidade, mas ao contrário, a partir dela.”

62 Paulo Daniel Gonçalves Gannam, em artigo sobre Dependência, internet e família, adverte que: “A

internet pode ser uma direção para oportunidades, o escape da violência e da reclusão, ampliação de horizontes e uma das mais poderosas ferramentas de ensino que conhecemos até o momento. Mas também é detentora de conteúdos inapropriados, propicia vulnerabilidade, aliciamento, alienação e

dependência. [...]” disponível em www.saolourenco.com, acesso em30;10.2011.

Referências

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