• Nenhum resultado encontrado

Sumário. Tribunal da Relação de Lisboa Processo nº 906/10.9YRLSB-4

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "Sumário. Tribunal da Relação de Lisboa Processo nº 906/10.9YRLSB-4"

Copied!
11
0
0

Texto

(1)

Tribunal da Relação de Lisboa Processo nº 906/10.9YRLSB-4 Relator: PAULA SÁ FERNANDES Sessão: 07 Dezembro 2010

Número: RL

Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: APELAÇÃO

Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO

SERVIÇOS MÍNIMOS GREVE TRIBUNAL ARBITRAL

Sumário

1. O tribunal arbitral, ainda que sumariamente, fundamentou a sua decisão, não assistindo por isso razão ao recorrente quanto à nulidade do acórdão pois que a mera discordância quanto aos fundamentos da decisão não

consubstancia a sua falta de fundamentação.

2. A greve suspende, no que respeita aos trabalhadores que a ela adiram, o contrato de trabalho, designadamente o direito à retribuição e os deveres de subordinação e assiduidade. Todavia, a lei investe os trabalhadores aderentes à paralisação em certos deveres que podem implicar a necessidade de

prestação de serviços durante a greve.

3. Tal ocorre em duas situações: - assegurar os serviços necessários à

segurança e manutenção do equipamento e instalações da empresa; e quando estão em causa empresas ou estabelecimentos que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.

4. Quanto ao conceito relativo às necessidades sociais impreteríveis, o n.º2 do artigo 537ºdo CT/2003 enuncia alguns sectores que integram empresas ou estabelecimentos que se destinam à satisfação dessas necessidades, nos quais se incluem o sector dos transportes

5. O tribunal arbitral fixou como serviços mínimos a prestar nos dias da greve, apenas, uma carreira no período da manhã e outra no período da tarde, entre os quatro destinos que aquela empresa cobre e que são: Cacilhas – Cais do Sodré; Montijo – Cais do Sodré; Seixal – Cais do Sodré Trafaria – Porto – Brandão – Belém, pelo que ao estabelecer tal mínimo não houve violação dos invocados princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade, sendo que a única alternativa seria a de não fixar quaisquer serviços mínimos, como

(2)

entende o recorrente, mas que não é compatível com as normas que regulam o direito à greve, pois está em causa uma empresa de transportes públicos

fluviais que a lei classifica como empresa que se destina à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.

(sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

O Sindicato dos Trabalhadores da Marinha Mercante, Agência de Viagens, Transitários e Pescas interpôs recurso do acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral constituído no âmbito do processo de arbitragem obrigatória

n.º23/2010-SM que, relativamente à greve decretada pelo referido Sindicato para os dias 11 e 12 de Maio de 2010, decidiu quais os serviços mínimos que deviam ser prestados pelos trabalhadores durante o período de greve.

O recorrente nas suas alegações do recurso formula as a seguir transcritas, Conclusões:

1.O recorrente é uma associação sindical que representa um elevado número de trabalhadores da TRANSTEJO, SA;

2. Tendo deliberado realizar uma greve, naquela Empresa, nos dias 11 e 12 de Maio de 2010, por um período de três horas em cada turno, abrangendo todos os seus trabalhadores, o recorrente apresentou o respectivo pré-aviso, com a antecedência e nos termos previstos na lei;

3. A TRANSTEJO, SA é, nos termos do art.º537º,n°2, al. h) do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n. °7/2009, de 12 de Janeiro, uma daquelas

empresas em que pode verificar-se a necessidade de prestar, durante a greve, serviços mínimos, destinados à satisfação de necessidades sociais

impreteríveis, pelo que o recorrente apresentou, no referido pré-aviso de greve, o seu entendimento sobre a fixação desses serviços no transporte fluvial, concluindo não se justificar a sua fixação, no caso concreto;

4. O Tribunal Arbitral veio a definir os serviços mínimos, a cumprir durante a referida greve, por acórdão de 7 de Maio de 2010, com voto de vencido do árbitro dos trabalhadores;

5.Tal acórdão do Tribunal Arbitral é, no entender do recorrente, nulo, por falta de fundamentação e ofende o direito fundamental à greve dos trabalhadores da TRANSTEJO, SA, por violação dos princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade. Com efeito,

6. O direito á greve está configurado na Constituição da República

Portuguesa, como um direito fundamental inserido no capítulo dos direitos,

(3)

liberdades e garantias dos trabalhadores (artº57) que só pode ser limitado na medida do necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses

constitucionalmente protegidos (art.º18, n°2);

7. Com vista à salvaguarda desses outros direitos ou interesses

constitucionalmente protegidos, a própria Constituição prevê, actualmente, a prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e

manutenção de equipamento e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis (art.º57, n°3);

8. Em todo o caso, a restrição do direito de greve, com essa finalidade, não pode diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial desse direito, isto é, a obrigação de prestação daqueles serviços, durante a greve, não pode descaracterizar o próprio direito de greve, esvaziando-o de conteúdo (art.º18, n°3);

9. No Código do Trabalho, esta restrição do direito de greve vem regulada, fundamentalmente, no artigo 538°, nos termos do qual, na falta de acordo entre trabalhadores e empregadores, sobre a definição dos serviços mínimos, esta definição compete, no caso de se tratar de empresa que se inclua no sector empresarial do Estado, a um Tribunal Arbitral (nº4b). A definição dos serviços mínimos deve, contudo, respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade (n°5);

10. As necessidades sociais impreteríveis a que se referem o n°3 do artigo 57°

da CRP e o n. °1 do artigo 537° do Código do Trabalho, hão-de ser, à luz do nº2 do art.º18 da CRP, necessidades sociais cuja insatisfação se traduza na violação de correspondentes direitos e interesses constitucionalmente

protegidos e não meros transtornos ou inconvenientes resultantes da privação ocasional de um bem ou serviço habitualmente utilizado;

11. Ora, no que se refere aos serviços prestados pela TRANSTEJO, SA, a

eventual existência de necessidades sociais impreteríveis, a satisfazer durante a greve, não pode consistir na necessidade normal de transporte de um

determinado número de utentes dessa Empresa, preterindo outros, no âmbito de uma greve com a duração de apenas três horas por cada turno, porque a ser assim, tal constituiria violação da CRP;

12. A existência de necessidades sociais impreteríveis, a satisfazer durante uma greve de três horas, por turno, na TRANSTEJO, SA, só pode verificar-se em relação a utentes que se encontrem em situação especial, seja resultante de uma condição específica ou de uma circunstância concreta que tornem esses utentes especialmente carenciados de transporte, a ponto de verem sacrificados direitos ou interesses constitucionalmente consagrados, se ficassem privados desse concreto meio de transporte, durante três horas;

(4)

13. E tal estaria, sempre, assegurado, como se deduz do pré-aviso de greve e da acta da reunião realizada no Ministério do Trabalho, no dia 26 de Abril de 2010;

14. Sendo de salientar, ainda, a possibilidade dos utentes recorrerem a

transportes alternativos, pois a greve não era coincidente com outras greves no sector dos transportes e de realçar, também, que no dia 11 de Maio, por força da visita papal, a própria Empresa decidiu suspender as carreiras entre as 9 e as 21 horas;

15. A consideração de que a necessidade normal de transporte na

TRANSTEJO, SA, durante três horas, sem a ocorrência de qualquer condição ou circunstância especiais, constitui uma necessidade social impreterível equivaleria, em relação aos trabalhadores dessa Empresa, à supressão do direito fundamental à greve;

16. Mas, menos admissível ainda, se assim se pode dizer, seria assegurar o transporte, de forma indiscriminada, a uma pluralidade dos utentes habituais de algumas carreiras, a título da satisfação de necessidades sociais

impreteríveis, deixando os restantes privados desse transporte, apesar de se encontrarem na mesma situação. Esta discriminação infundada constituiria, só por si, a negação da existência de necessidade social impreterível a satisfazer;

17. Como se pode verificar pelo teor do acórdão recorrido, o Tribunal Arbitral, limitando-se a invocar a necessidade normal de transporte de eventuais

utentes com condições de deficiência, idade ou estado de gravidez que

justifiquem a fixação de serviços mínimos e de utentes de certos veículos que não estão autorizados a cruzar as pontes sobre o rio Tejo, concluiu que os serviços mínimos necessários seriam determinadas carreiras, a que teriam acesso, de forma indiscriminada, os utentes habituais da TRANSTEJO, SA, sem clarificar como se garantiria que seriam aqueles utentes a ter acesso às

carreiras fixadas, como, aliás, bem salientou o Árbitro de Parte Trabalhadora, no seu voto de vencido;

18. Ora, não existindo qualquer garantia de que os utentes desses serviços mínimos seriam os mais carenciados de transporte, a prestação desses serviços constitui uma discriminação arbitrária e uma injustificada restrição do direito à greve, uma vez que os demais utentes habituais dessa Empresa, sempre, poderiam prescindir desse transporte normal, durante um período de três horas, sem que fossem afectados, de forma intolerável, os seus direitos ou interesses constitucionalmente protegidos;

19. Tal situação só poderá entender-se à luz do objectivo de reduzir o impacto da greve e a sua eficácia, no âmbito das relações laborais e não a satisfação de qualquer necessidade social impreterível;

20. Pelo supra exposto se conclui que, nas condições da greve em apreço, não

(5)

se justificaria a necessidade de fixação de serviços mínimos, como o recorrente defendeu, desde a apresentação do pré-aviso;

21. Será de realçar que, para a outra empresa de transporte fluvial do Tejo (SOFLUSA, Sociedade Fluvial de Transportes, SA), com igual pré aviso de greve, para os mesmos dias e iguais períodos, por acordo, não foram fixados serviços mínimos, como bem referiu o Árbitro de Parte Trabalhadora, no seu voto de vencido;

22. Violou, assim, o douto acórdão recorrido o disposto no art. 18°, nº 2 e no art. 57°, nº 1, da CRP, ao limitar o direito à greve sem que as restrições impostas fossem indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, bem como violou o art. 537° e o art. 538°, nº 5, do CT;

23. Acresce que, contrariamente ao que resulta do dever de fundamentação, previsto no art. 23°, nº 3 e nº 1, al. d) do art. 27°, ambos da Lei 31/86, de 29 de Agosto e art. 659°, n°s 2 e 3 do CPC o acórdão recorrido não se encontra fundamentado, uma vez que não esclarece devidamente quais as necessidades sociais impreteríveis a satisfazer, nem contém fundamentos que concretizem, justifiquem, ou, sequer, esclareçam quais as razões em que assenta a

discriminação que opera, assegurando a realização de determinadas carreiras de transporte e não de outras;

24. Isto, quando é certo que estava sublinhado, no pré-aviso de greve a impossibilidade de estabelecimento desta discriminação, o que reforçava a obrigação de fundamentação do acórdão recorrido, ou seja, a obrigação de indicar a razão pela qual o funcionamento de determinadas carreiras do

serviço normal era imprescindível, ao contrário do restante serviço, inclusive, no dia 11 de Maio, das carreiras entre as 9 e as 21 horas, que foram

suprimidas por decisão da TRANSTEJO, SA;

25. Assim, o acórdão recorrido deverá ser anulado, por falta de fundamentação;

26. Apesar de a greve a que se refere o acórdão recorrido não se ter realizado, por ter sido celebrado um protocolo de acordo de revisão do AE / TRANSTEJO, para o ano de 2010, mantém utilidade o presente recurso. Com efeito,

27. Tendo em consideração o disposto no art.º27, n°3 do Dec. Lei nº 259/2009, de 25 de Setembro, a decisão ora recorrida pode constituir precedente

negativo em relação a futuras greves, a realizar pelos trabalhadores da TRANSTEJO, SA, sendo certo que, em função dos prazos a que se encontra sujeito o processo de definição dos serviços mínimos, a prestar nas empresas do sector empresarial do Estado, não existe, em relação a cada uma das decisões, pelas quais são definidos esses serviços, meio de obter, em tempo oportuno, decisão judicial que obste à sua execução;

28. Pelo exposto, o douto acórdão arbitral recorrido não fez uma correcta

(6)

aplicação das normas constitucionais e legais vigentes, designadamente dos arts. 18°, n° 2 e 57°, nº 1, da CRP, arts. 537° e 538°, nº 5 do CT, art. 23°, nº 3 e art. 274°, nº 1, al. d) da Lei nº 31/86, de 29 de Agosto e art. 659°, nºs 2 e 3 do CPC.

Não foram apresentadas contra-alegações.

A Exm.ªProcuradora-geral-adjunta deu parecer no sentido da improcedência do recurso (fls.105vºe106).

Colhidos os vistos legais.

Apreciando

O recorrente pretende a revogação do acórdão proferido pelo tribunal arbitral, requerendo a sua anulação por falta de fundamentação, alegando ainda que a decisão recorrida, com a fixação de serviços mínimos, limita o direito à greve pois as restrições nela impostas não eram indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.

Vejamos se lhe assiste razão Dos autos resulta:

- O recorrente, com o Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Fluviais, Costeiros e da Marinha Mercante e o Sindicato da Mestrança e Marinhagem da Marinha Mercante, Energia e Fogueiros de Terra, comunicaram, de acordo com o texto dos avisos prévios, uma greve a decorrer nos dias 11 e 12 de Maio de 2010, nos turnos e nas carreiras indicadas nos avisos, abrangendo todos os trabalhadores da empresa, os afectos às embarcações, às estações, à

manutenção, ao controlo de actividade, aos serviços administrativos e restantes trabalhadores.

- Os serviços mínimos não estão regulados no instrumento de regulamentação colectiva aplicável.

- Tal como decorre da acta de 26 de Abril de 2010, realizou-se nesse dia uma reunião no MTSS, nas instalações da Direcção de Serviços das Relações Profissionais de Lisboa, convocada ao abrigo do disposto no n.º2 do artigo 538º do CT, para negociação de um acordo sobre os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar.

- No âmbito dessa reunião não foi alcançado acordo quanto aos serviços mínimos.

- A Transtejo, SA, apresentou proposta de serviços mínimos. Os sindicatos discordaram, tendo reiterado a posição já assumida nos avisos prévios que, no caso, não se justifica fixar serviços mínimos.

(7)

Como acima se referiu, o recorrente começa por requer anulação do acórdão do tribunal arbitral por falta de fundamentação, invocando para o efeito o disposto nos art.ºs 23, nº3 e 27º, n.º1d) da Lei nº31/86, de 29 de Agosto, Lei da Arbitragem Voluntária, aplicável por força do art.º505, n.º4 do CT.

No acórdão recorrido o tribunal arbitral apreciou a questão nos termos que passamos a transcrever:

“…II. Enquadramento

Como supra se referiu, as Associações Sindicais comunicaram

tempestivamente o aviso prévio da greve para os dias 11 e 12 de Maio de 2010 às entidades que deveriam ser notificadas para o efeito, incluindo

naturalmente a TRANSTEJO, SA.

O tribunal arbitral reuniu com os representantes dos sindicatos e da

TRANSTEJO, SA, por esta ordem, verificando que as partes mantiveram as posições que haviam expressado na reunião havida no MTSS no dia 26 de Abril de 2010, complementando essas posições com os esclarecimentos que os árbitros do tribunal solicitaram.

O tribunal arbitral teve e tem em consideração, face à legitimidade da

convocação da greve que esta é um direito constitucionalmente tutelado, mas não um direito absoluto. Pode e deve ser conciliado com outros direitos

fundamentais que respondam a necessidades sociais impreteríveis.

Sem prejuízo do que precede e numa lógica de equilíbrio dos interesses em causa, o tribunal constatou que em anteriores acórdãos foram fixados serviços mínimos para várias carreiras fluviais de travessia do rio Tejo, nomeadamente da TRANSTEJO, SA, tendo em conta o período de greve (Proc. n.o 17/2010).

Neste quadro, o tribunal arbitral ponderou várias situações: a necessidade de salvaguardar necessidades sociais impreteríveis, relacionadas com eventuais utentes das carreiras da TRANSTEJO, SA que tenham condições de

deficiência, de idade, ou em estado de gravidez, que justifiquem a fixação de serviços mínimos e, nestas, a preocupação de terem prioridade no embarque sobre as demais, e ainda que os utentes de certos veículos, que não estão autorizados a cruzar as pontes sobre o rio Tejo, só podem atravessar o rio através das carreiras da TRANSTEJO, SA.

Nesta ponderação cabe ainda atender ao facto de no dia 11 de Maio, por força da visita de Sua Santidade e em razão da Missa a ter lugar na tarde desse dia no Terreiro do Paço, terem sido interrompidas as carreiras fluviais da

TRANSTEJO, SA entre as 9h e as 21h, particularmente os navios que deveriam atracar no Terreiro do Paço

III. Cumpre decidir:

1. O sector de actividade em questão integra-se na âmbito da previsão

normativa do Código do Trabalho, pelo que se impõe determinar os serviços

(8)

mínimos previstos legalmente.

2. Em geral, entende este tribunal arbitral, que a jurisprudência arbitral existente que decorre do nº 2 do artigo 538.º do CT, deve ser ponderada, sempre sem prejuízo da liberdade dos árbitros em cada processo e, como se disse, das circunstâncias de cada caso concreto e dos elementos carreados pelas partes para cada processo. Assim, devem ser considerados com especial relevo para este caso os acórdãos arbitrais 11/2007, 22/2007 e 17/2010

relacionados com greves para a TRANSTEJO, SA.

3. Importa distinguir a situação de greve no dia 11 de Maio, em que estão suspensas as carreiras entre as 9h e as 21h, e no dia 12 de Maio, em que não há impedimentos na navegação fluvial.”

Assim, o acórdão recorrido, ao fixar serviços mínimos postos em causa pelo recorrente, baseia-se nos seguintes fundamentos:

- O sector de actividade em questão – transportes – integra-se no âmbito da previsão normativa do Código do Trabalho, que impõe a prestação de os serviços mínimos, (como decorre do art.º537, nºs 1 e 2 al. h) do CT.)

- No âmbito da fixação desses serviços mínimos, o tribunal arbitral ponderou as seguintes situações: “a necessidade de salvaguardar necessidades sociais impreteríveis, relacionadas com utentes das carreiras da Transtejo que tenham condições de deficiência, de idade, ou em estado de gravidez, e, nestas, a preocupação de terem prioridade no embarque sobre as demais, e ainda que os utentes de certos veículos, que não estão autorizados a cruzar as pontes sobre o rio Tejo, só podem atravessar o rio através das carreiras da TRANSTEJO, SA.”

- Ponderação da jurisprudência arbitral existente, (face ao disposto no n. °3 do art.º538 do CT).

Deste modo, ainda que sumariamente, o tribunal arbitral fundamentou a sua decisão, não assistindo por isso razão ao recorrente quanto à nulidade do acórdão pois que a mera discordância quanto aos fundamentos da decisão não consubstancia a sua falta de fundamentação.

Importa contudo apreciar se a decisão proferida pelo tribunal arbitral traduz uma limitação do direito à greve, como entende o recorrente, por considerar que as restrições impostas pela fixação dos serviços mínimos, não eram

indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.

O direito à greve é reconhecido pela Constituição como um direito

fundamental dos trabalhadores, no n.º1 do art.º57, remetendo para a lei a definição das condições de prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de

serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades

(9)

sociais impreteríveis, cf. o seu n.º3 do art.º57.

O direito à greve não é assim um direito absoluto pois pode ser limitado ou restringido por outros direitos fundamentais, encontra-se regulado nos art.ºs 530, e ss do Código do Trabalho de 2003.

Ora, no art.º536 do CT estabelece-se que a greve suspende, no que respeita aos trabalhadores que a ela adiram, o contrato de trabalho, designadamente o direito à retribuição e os deveres de subordinação e assiduidade. No entanto, a mesma lei investe os trabalhadores aderentes à paralisação em certos

deveres que podem implicar a necessidade de prestação de serviços durante a greve, tal como decorre do disposto nos nºs 1,2,3 do art.º537 do CT, e que se verificam em duas situações:

- Os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações (n.º3);

- Quando estão em causa empresas ou estabelecimentos que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis (n.º1e 2)

Nesta última situação – satisfação de necessidades sociais impreteríveis – os seus limites revestem-se de alguma complexidade pois pressupõem a

articulação de dois conceitos relativamente indetermináveis: - a satisfação de necessidades socialmente impreteríveis e os serviços mínimos que devem ser prestados para assegurar a referidas necessidades, pelo que os seus limites hão-de ser integrados em função e à luz de cada situação.

A doutrina tem entendido a possibilidade e a necessidade de desenvolver um critério qualificador das necessidades sociais impreteríveis, de entre o

conjunto das necessidades inerentes aos bens e interesses

constitucionalmente protegidos em sede de direitos fundamentais,

designadamente, Monteiro Fernandes, em “Manual do Direito do Trabalho”, 13ª edição, pág. 926. Também no mesmo sentido, Liberal Fernandes, em obra recente, “A obrigação de serviços mínimos como técnica de regulação da Greve nos serviços essenciais”, a pág.457, refere que: “Em sentido laboral, os serviços mínimos compreendem a actividade que os trabalhadores em greve ficam obrigados a prestar (ou a continuar a prestar, uma vez que, por

definição, a satisfação das necessidades sociais impreteríveis não admite interrupções) durante a paralisação colectiva; esta dimensão está

directamente relacionada com os limites que a ordem jurídica impõe ao exercício do direito à greve e traduz a quota de prestação laboral que não pode ser interrompida ou suspensa, sob pena de lesão dos direitos

fundamentais dos cidadãos.”

Por outro lado, o legislador reconhecendo as dificuldades de concretização do referido conceito enuncia, no nº2 do art.º537 do CT, alguns sectores que integram empresas ou estabelecimentos que se destinam à satisfação das

(10)

necessidades socais impreteríveis, nos quais se inclui o sector dos transportes, incluindo os relativos a passageiros, sendo certo que o direito de deslocação é tutelado na Constituição, no art.º44, como um direito fundamental.

Mas, na situação em apreço, não está em causa essa classificação pois o recorrente reconhece que a empresa Transtejo tem uma actividade que se integra no satisfação de necessidades sociais impreteríveis, tendo por isso participado no processo de definição dos serviços mínimos, a que se refere do art.º538 do CT/2003, uma vez que o instrumento de regulamentação colectiva aplicável não prevê a sua definição.

O recorrente discorda porém da definição dos serviços mínimos fixados pelo tribunal arbitral, alegando que não foram respeitados os princípios da

necessidade, da adequação e da proporcionalidade, como impõe o n.º5 do mesmo art.º538 do CT.

Na verdade, na definição dos serviços mínimos a fixar para ocorrer à

satisfação das referidas necessidades sociais impreteríveis, não deve pôr-se em causa exercício do direito à greve, devendo antes a sua delimitação obedecer aos referidos princípios da necessidade e proporcionalidade o que pressupõe, no caso, que a tutela dos utentes não pode ser transformada num limite que anule o exercício da greve.

Todavia, sendo essa valoração complexa, deve ter-se em atenção as

circunstâncias do conflito em causa com a prevenção da lesão dos direitos fundamentais ameaçados (no caso o direito de deslocação) que não sejam meros interesses de comodidade ou de eficiência.

O tribunal arbitral fixou como serviços mínimos a prestar na greve em causa para o dia 11 de Maio – uma carreira de manhã entre Cacilhas-Cais do Sodré, em virtude das carreiras estarem suspensas entre as 9h. e 21h. por causa da visita do Papa e Missa a celebrar no Terreiro do Paço; e para o dia 12 de Maio, uma carreira no período da manhã e outra no período da tarde, entre os

quatro destinos que aquela empresa cobre: Cacilhas – Cais do Sodré; Montijo – Cais do Sodré; Seixal – Cais do Sodré; Trafaria – Porto Brandão – Belém.

Assim, ao estabelecer tal mínimo, não se nos afigura que possa ter havido violação dos invocados princípios da necessidade, adequação e

proporcionalidade, sendo que a única alternativa seria a de não fixar

quaisquer serviços mínimos, como entende o recorrente, mas que, como se viu, não é compatível com as normas que regulam o direito à greve, pois está em causa uma empresa do sector dos transportes que a própria lei considera como empresa que se destina à satisfação de necessidades sociais

impreteríveis e como tal têm de ser assegurados os serviços mínimos à

satisfação daquelas necessidades. Com efeito a empresa em causa liga as duas margens do rio Tejo, transportando colectiva e diariamente milhares de

(11)

pessoas para Lisboa e desta cidade para os diversos destinos na outra margem do rio, pessoas que se deslocam por variadas razões, designadamente de

emprego, deslocações a hospitais, tribunais e nas mais diversas situações, como enunciou o tribunal recorrido, de deficiência, de idade, em estado de gravidez e outras, sendo que muitas delas não têm recurso a outros meios de transporte.

Se é certo que a inegável imprescindibilidade da empresa em causa, que assegura um direito fundamental de deslocação, não pode ser factor de

limitação do direito à greve dos seus trabalhadores, a Constituição impõe que, nessa circunstância, sejam assegurados os serviços mínimos indispensáveis à satisfação das necessidades sociais impreteríveis que são objecto da

actividade da referida empresa, nas condições impostas pela lei que impõe a sua definição (art.º538 do CT/2003). Não basta assim que as associações que convoquem a greve declarem o compromisso genérico de assegurar os

serviços mínimos pois a lei determina a sua fixação, por acordo entre o empregador e o representante dos trabalhadores, e, não sendo possível, o recurso à decisão arbitral quando se trata, como é o caso, de uma empresa do sector empresarial do Estado – n.º4 do art.º 538 do CT.

O tribunal arbitral ao fixar os referidos serviços a prestar pelos trabalhadores na greve em causa, que compreendem apenas uma carreira no turno da

manhã e uma no turno da tarde, entre os quatro destinos que a empresa

assegura, estabeleceu o mínimo a ser prestado numa empresa cuja actividade tem como objecto a satisfação de necessidades sociais impreteríveis, como é o transporte fluvial colectivo entre as duas margens do rio Tejo em volta de Lisboa.

Afigura-se-nos pois que os fundamentos do recurso não podem proceder.

Decisão

Face ao exposto, julga-se improcedente o recurso interposto, confirma-se o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 7 de Dezembro de 2010.

Paula Sá Fernandes José Feteira

Filomena Carvalho

Referências

Documentos relacionados

A partir do momento em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete passa a contar com o prazo mais longo da prescrição penal (desde que o acto ilícito constitua crime

O Tribunal considera que a anulação, por falta de fundamentação, da decisão de não reter a candidatura do recorrente para preencher, por via de promoção, o lugar em causa e

Competência para o cumprimento de sentença arbitral, penal condenatória, decisão homologatória de sentença estrangeira e acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo ....

135º do C.P.Penal, que o Tribunal Superior pode decidir pela quebra do princípio do segredo profissional quando o respeito pelas normas e princípios civis implique a derrogação

Quanto à primeira, importa referir que o requerimento do Ministério Público de requisição ao Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Lisboa de informação sobre

Competência para o cumprimento de sentença arbitral, penal con- denatória, decisão homologatória de sentença estrangeira e acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo ....

Ou seja, se bem vemos, ainda que os elevadores instalados no prédio urbano devessem ser qualificados como sua parte integrante (e não como partes.. componentes ou constitutivas, como

Logo, tendo a Autora retirado os estendais colectivos sem os substituir, até hoje, por outros idênticos ou por estendais próprios para cada habitação (nem sequer na altura ideal para