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INE EAD INSTITUTO NACIONAL DE ENSINO EDUCAÇAO POPULAR EDUCAÇAO POPULAR (31)

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EDUCAÇAO

POPULAR

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Sumário

1 EDUCAÇÃO POPULAR E MOVIMENTOS POPULARES ... 3

1.1 Definição de termos ... 6

1.1.1 MOBRAL ... 6

1.1.2 Ensino Supletivo ... 8

1.1.3 MOVA ... 9

1.1.4 CONFINTEA ... 11

1.2 Os movimentos populares ... 12

2 EDUCAÇÃO NO CAMPO... 15

2.1 A Pedagogia da Alternância ... 19

3 PAULO FREIRE ... 20

3.1 A Pedagogia de Paulo Freire e a Educação de Jovens e Adultos ... 23

3.2 O método Paulo Freire de Alfabetização de Adultos ... 25

3.3 Educação Libertadora ... 28

REFERÊNCIAS UTILIZADAS E CONSULTADAS ... 29

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1 EDUCAÇÃO POPULAR E MOVIMENTOS POPULARES

Historicamente, a Educação de Jovens e Adultos, no cenário brasileiro, nasce da união e compromisso estabelecido entre a alfabetização e a educação popular. Alfabetização era concebida como um processo de grande extensão e profundidade, destinando-se a grandes contingentes populacionais, ao mesmo tempo em que contribuísse para que estas pessoas voltassem a acreditar na possibilidade de mudança e melhoria de suas vidas ao poderem “ler o mundo e, ao lê-lo, transformá-lo” (FREIRE, 1976 apud FREITAS, 2007). A educação popular era concebida como um instrumento de libertação das classes subalternas, exploradas e expulsas da mínima condição de sobrevivência digna e humana (MANFREDI, 1980; FREITAS, 1998).

Nas décadas de 1960 e 1970, esta união e compromisso materializa-se nos diversos movimentos da educação popular, em que a alfabetização dentro da proposta e filosofia do método/sistema de Paulo Freire, torna-se a viga mestra destes trabalhos de emancipação dos setores desfavorecidos. Assim, de um lado, as práticas de alfabetização desenvolvidas na perspectiva freiriana denunciam, claramente, o caráter reprodutivista e classista da ideologia dominante, que estava presente nas diretrizes educacionais oficiais e que visava a continuidade das condições de exploração e a submissão pacífica dos setores populares a esse status quo (FREIRE, 1992, 1980; PAIVA, 1987).

De outro lado ou, muitas vezes, conjuntamente, é na educação popular que se encontra o compromisso de tornar as condições concretas de vida, destes setores, como a matéria-prima a estar presente nas situações de aprendizagem e nos conteúdos dos diferentes materiais pedagógicos, assim como das análises conjunturais e estruturais que se faziam à época. Ao fazer isto, os trabalhos de educação popular iniciam, junto aos mais variados setores populares, processos intensos de discussão, análise e reflexão. Isto, por sua vez, potencializa processos de conscientização e participação destas pessoas, que passam a entender – dentro de uma perspectiva histórico-social crítica – as razões e os porquês delas estarem vivendo em tais condições desumanas e de exploração.

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E, ao entenderem isto, começam a eliminar o caráter de psicologização das explicações vigentes ou mesmo dos inúmeros fatalismos propagados pela ideologia dominante, e, portanto, passam a divisar alternativas de mudança e de melhoria para suas vidas (FREITAS, 2007).

Assim, dentro dos trabalhos da educação popular aliados às práticas da alfabetização, nesta concepção histórico-social crítica, presenciamos a busca e a criação de novos métodos e teorias, de inspiração e historicidade nacionais, que passam a substituir ou, ao menos, fazer frente à forte importação dos modelos estrangeiros àquela época, nos diversos campos profissionais e, entre eles, também no campo da educação (BEZERRA, 1980). Além disto, é desta parceria clara que são gestados também os germens para o fortalecimento da participação dos setores populares na reivindicação dos seus direitos básicos e fundamentais. Um detalhamento e ilustração maiores e mais ricos a respeito destas várias práticas podem ser encontrados nos trabalhos educacionais desenvolvidos na década de 1960, no campo da alfabetização, dos movimentos populares e da cultura popular. Entre os mais conhecidos encontramos as várias experiências da alfabetização de adultos dentro da filosofia de Paulo Freire, e a experiência acontecida no Rio Grande do Norte denominada “De Pé no Chão também se aprende a ler”, numa alusão aos trabalhadores do campo (FREITAS, 2007).

Durante estas décadas de 1960 e 1970, de reivindicações da maioria da população por melhores condições de vida e contra a carestia, assiste-se à institucionalização dos novos movimentos e tendências no campo da cultura e da educação, que explicitavam um forte vínculo, simpatia e proximidade para com os setores populares. É neste período que se encontram vários movimentos, como: os Movimentos de Educação de Base (MEB), que recebem o apoio da Igreja Católica para a realização de suas atividades; os Movimentos de Cultura Popular (MCP), que materializam os projetos artísticos e culturais (como o teatro de resistência e crítica social, os tipos de música de reivindicação, de protesto e de raízes, entre outros) gestados pelos grupos de profissionais liberais preocupados com a criação e preservação de uma cultura nacional e autóctone; os Centros Populares de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE) e da União Estadual dos Estudantes (UEEs), que

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expressavam um movimento universitário e secundarista nacional mostrando, através da arte e música estudantis, o comprometimento político e a participação nos rumos do país; e programas e campanhas de educação de adultos e de alfabetização em escala ampla, acontecidos em maior abrangência no Nordeste(BEZERRA, 1980)

Portanto, é neste contexto e processo que, ao se falar de educação e em seu perfil e características predominantes, podemos dizer que sempre aparecem, intimamente conectadas, a alfabetização de adultos, a educação de base e a cultura popular (BEZERRA, 1980; FREIRE, 1976).

Falar de educação popular, ao lado da alfabetização de adultos e Jovens, significa falar da relevante presença da dimensão popular no cenário político nacional. Em verdade, o que se via era uma íntima relação entre três aspectos que levam a uma politização da consciência, a saber, entre: alfabetização- educação popular-participação e conscientização. Neste tripé, a ação e a prática populares desempenham um papel importante, ancoradas na assessoria de diferentes naturezas que os profissionais liberais e os intelectuais forneceram a estes movimentos. Esta ligação – ou seja, falar em alfabetização significava na época, também, falar em educação popular e conscientização – mantém-se ainda por alguns anos, nas décadas seguintes, quase permanecendo junta até o final do período do governo de exceção, quando então divisam-se outras possibilidades e anunciam-se outras definições epistemológicas para cada um destes campos e para os diversos movimentos populares e sociais até então (FREITAS, 2007).

Numa definição mais clara, mas não menos simplista, Projeto de Educação Popular vem a ser um instrumento inspirador e transformador da realidade política, social e econômica daqueles que lutam para manter sua vida no campo e na cidade com dignidade, em formas coletivas e de produção associada que correspondam aos sotaques regionais, sem constrangimentos e estigmas (PASSOS, 2007).

A educação popular nasce de duas fontes importantes e decisivas para qualquer projeto: a primeira que tenha como objetivo universal construir pessoas conscientes, críticas e capazes de interferir pessoal e coletivamente no rumo da

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vida de todos. Neste sentido tem uma ação socializadora ou civilizatória. Volta- se como ingrediente da vida cotidiana e perpassa todas as sociedades e agrupamentos na produção dos indivíduos do qual esta sociedade precisa para não perecer. A segunda fonte é a educação que tenha como objetivo específico e estrito sair da generalidade e entabular diálogo intercultural com as especificidades de cada sujeito. Precisa neste sentido recuperar a primeira de sua fonte a de geral e universal, mas ao mesmo tempo que seja específica e capaz de conter as idiossincrasias, isto é as dimensões particulares de cada grupo, na sociedade humana. Precisa, ainda, sair do âmbito privado e cotidiano e mediar-se para o campo institucional, sobretudo aquele reconhecido socialmente como o lugar privilegiado da educação, a sua dimensão escolar (PASSOS, 2007).

A educação popular é, portanto, uma prática política, constituindo-se num tencionamento, para que a realidade se transforme a partir de propostas populares em educação. Como prática educativa coletiva das classes populares, a educação popular é um campo de luta social, em que nos envolvemos em um movimento permanente, buscando a transformação de um quadro histórico que a educação do povo, trabalhadores urbanos e do campo, enfrenta, por estar diferentemente colocada em certos contextos de nossa formação social, em contradição com a necessidade social e econômica (PAIVA, 1987).

1.1 Definição de termos

1.1.1 MOBRAL

O Movimento Brasileiro de Alfabetização - o MOBRAL surgiu como um prosseguimento das campanhas de alfabetização de adultos iniciadas com Lourenço Filho. Só que com um cunho ideológico totalmente diferenciado do que vinha sendo feito até então. Apesar dos textos oficiais negarem, sabemos que a primordial preocupação do MOBRAL era tão somente fazer com que os seus alunos aprendessem a ler e a escrever, sem uma preocupação maior com a formação do homem (BELLO, 1993).

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Foi criado pela Lei n. 5.379, de 15 de dezembro de 1967, propondo a alfabetização funcional de jovens e adultos, visando “conduzir a pessoa humana a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a sua comunidade, permitindo melhores condições de vida”. Apesar da ênfase na pessoa, Bello (1993) enfatiza que o objetivo do MOBRAL relaciona a ascensão escolar a uma condição melhor de vida, deixando à margem a análise das contradições sociais inerentes ao sistema capitalista. Ou seja, basta aprender a ler, escrever e contar e estará apto a melhorar de vida.

O programa de alfabetização funcional do Mobral apresentava seis objetivos:

1. Desenvolver nos alunos as habilidades de leitura, escrita e contagem;

2. Desenvolver um vocabulário que permita o enriquecimento de seus alunos;

3. Desenvolver o raciocínio, visando facilitar a resolução de seus problemas e os de sua comunidade;

4. Formar hábitos e atitudes positivas, em relação ao trabalho;

5. Desenvolver a criatividade, a fim de melhorar as condições de vida, aproveitando os recursos disponíveis;

6. Levar os alunos: a conhecerem seus direitos e deveres e as melhores formas de participação comunitária; a se empenharem na conservação da saúde e melhoria das condições de higiene pessoal, familiar e da comunidade; a se certificarem da responsabilidade de cada um, na manutenção e melhoria dos serviços públicos de sua comunidade e na conservação dos bens e instituições; a participarem do desenvolvimento da comunidade, tendo em vista o bem-estar das pessoas (CORRÊA, 1979, p. 152).

Dando continuidade ao seu programa, foi implantado em 1971, o Programa de Educação Integrada, tendo seu período de expansão entre os anos de 1972 e 1976 e, segundo os técnicos do MOBRAL, revitalizou-se em 1977.

Esse programa foi criado para dar continuidade ao Programa de Alfabetização Funcional, imbuídos do sentimento de educação permanente. Ou

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seja, o aluno considerado alfabetizado recebia uma espécie de promoção passando para uma fase onde teria continuidade e progressividade das condições educativas.

Para este Programa foram criados os seguintes objetivos gerais:

1. Propiciar o desenvolvimento da autoconfiança, da valorização da individualidade, da liberdade, do respeito ao próximo, da solidariedade e da responsabilidade individual e social;

2. Possibilitar a conscientização dos direitos e deveres em relação à família, ao trabalho e a comunidade;

3. Possibilitar a ampliação da comunicação social, através do aprimoramento da linguagem oral e escrita;

4. Desenvolver a capacidade de transferência de aprendizagem, aplicando os conhecimentos adquiridos em situações de vida prática;

5. Propiciar o conhecimento, utilização e transformação da natureza pelo homem, como fator de desenvolvimento pessoal e da comunidade;

6. Estimular as formas de expressão criativa;

7. Propiciar condições de integração na realidade socioeconômica do país (CORRÊA, 1979, p. 177-178).

O livro de Arlindo Lopes Corrêa “Educação de massas e ação comunitária”

apresenta de maneira bem detalhada todos os passos, os acontecimentos que fizeram parte da trajetória do Mobral até sua extinção nos anos 1980, quando foi incorporado pela Fundação Educar.

1.1.2 Ensino Supletivo

A Lei de Reforma Educacional n. 5.692/71 atribuiu um capítulo para o ensino supletivo e recomendava aos Estados atender jovens e adultos, no artigo 24 encontramos que o supletivo tem por finalidade suprir a escolarização regular para os adolescentes e adultos que não tenham seguido ou concluído na idade própria; proporcionar, mediante repetida volta à escola, estudos de

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aperfeiçoamento ou atualização para os que tenham seguido o ensino regular no todo ou em parte.

No artigo 25 encontramos que o ensino supletivo abrangerá, conforme as necessidades a atender, desde a iniciação no ensino de ler, escrever e contar e a formação profissional definida em lei específica até o estudo intensivo de disciplinas do ensino regular e a atualização de conhecimentos.

Terão estrutura, duração e regime escolar que se ajustem às suas finalidades próprias e ao tipo especial de aluno a que se destinam.

Os cursos supletivos serão ministrados em classes ou mediante a utilização de rádio, televisão, correspondência e outros meios de comunicação que permitam alcançar o maior número de alunos (BRASIL, 1971).

1.1.3 MOVA

O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA) surgiu em São Paulo (1989), na gestão de Luiza Erundina enquanto prefeita e durante a gestão de Paulo Freire na Secretaria Municipal de Educação da cidade de São Paulo.

Sua proposta reunia Estado e organizações da Sociedade Civil para combater o analfabetismo, oferecendo o acesso à educação de forma adaptada às necessidades e condições dos alunos jovens e adultos.

As salas do MOVA estão instaladas em locais onde existem poucas escolas e grande demanda por educação básica, geralmente as aulas são dadas em associações comunitárias, igrejas, creches, empresas, enfim, lugares em que há espaço e necessidade. A flexibilidade e a capacidade de se adequar à realidade e as necessidades dos alunos são as maiores vantagens do MOVA, já que geralmente as salas são próximas de suas casas (poupando o custo e o desgaste do transporte), as exigências com relação à faltas e horários são menores do que e em uma escola tradicional (uma vez que a maior parte dos alunos trabalham e têm obrigações familiares), além do conteúdo ensinado estar mais relacionado com o cotidiano de um adulto que já tem uma experiência de

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vida, cabendo aos educadores fazer uma mediação entre o saber do aluno e a educação formal.

Na cidade de São Paulo, o MOVA é um programa de alfabetização permanente que funciona a partir de convênios entre a prefeitura e entidades assistenciais, sociedades e associações. A prefeitura custeia as despesas de funcionamento das classes e dá bolsa-auxílio os educadores e as entidades se responsabilizam pelo local das aulas e por indicar os educadores.

Cada sala tem cerca de 15 alunos e as aulas, que têm duração média de 3 horas, são dadas 4 vezes por semana (geralmente no período nortuno).

Inspirado no MOVA, o Projeto MOVA-Brasil segue no caminho para além das letras e números. Desenvolvido por meio de uma parceria entre Petrobras, Federação Única dos Petroleiros (FUP) e Instituto Paulo Freire (IPF), tem como finalidade promover a dignidade humana garantindo aos indivíduos e às comunidades a oportunidade de reconstruírem seu destino e de conquistarem o direito à cidadania plena e participativa.

Metodologicamente fundamenta-se nos princípios filosófico-político- pedagógicos de Paulo Freire. A ação pedagógica se desenvolve com base na Leitura do Mundo do educando, a partir da qual se identificam as situações significativas da realidade em que está inserido. Desse processo, surgem os Temas Geradores que, por sua vez, orientam a escolha dos conteúdos programáticos.

Tem como objetivos:

• Contribuir para a redução do analfabetismo no Brasil, o fortalecimento da cidadania e a construção de políticas públicas para a Educação de Jovens e Adultos;

• Estabelecer parcerias com outros projetos do Programa de Responsabilidade Social da Petrobras Desenvolvimento & Cidadania e com organizações, sindicatos, movimentos sociais e populares e governos;

• Organizar turmas de Alfabetização de Jovens e Adultos em regiões prioritárias para os parceiros envolvidos no processo;

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• Formar Coordenadores de Polo, Assistentes Pedagógicos, Coordenadores Locais e Monitores.

Dentre as metas: atender 120 mil alfabetizandos em 36 meses, distribuídos em 4.800 turmas, com dez meses de aula e formar 4.800 alfabetizadores e 350 coordenadores (IPF, 2010).

1.1.4 CONFINTEA

Em 2009 aconteceu a VI Conferência Internacional da UNESCO de Educação de Adultos – Confintea em Belém do Pará – PA.

Na tabela abaixo estão relacionadas de forma sucinta todas as Confinteas realizadas desde sua inauguração em 1949.

Uma vez que discutem e elaboram propostas para a EJA a nível global são as conferências mais importantes e que mesmo rapidamente, o aluno precisa conhecer.

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1.2 Os movimentos populares

A mobilização popular em torno das questões referentes à cidadania, em exercer o seu poder de escolha pelo voto, contribuiu com os movimentos de cultura e educação popular, isto é, vitorioso em algumas eleições locais e urbanas, o movimento popular abriu espaço para o pensamento renovador em educação e absorveu alguns intelectuais com experiência de lutas políticas das classes subordinadas. Estes vão se transformar em intelectuais orgânicos de uma política voltada para a cultura popular (CUNHA e GÓES, 2002).

Neste sentido, o educador pernambucano Paulo Freire, ao participar do II Congresso Nacional de Adultos, realizado na cidade do Rio de Janeiro em 1958, apresentou sua proposta pedagógica fundamentada na História, Antropologia e Metodologia.

Assim, em relação à fundamentação histórica, pressupunha que: [...] nos anos 1960 o povo viveria o “trânsito” de uma sociedade fechada para uma sociedade que se abria, e o cidadão ultrapassaria uma consciência mágica/intransitiva para uma consciência transitiva/crítica (CUNHA e GÓES, 2002, p. 11).

Na perspectiva freiriana, o conceito de “trânsito” representaria o momento em que a educação seria feita pelo povo e não para ele, substituindo assim a educação bancária, caracterizada pela verticalidade do ensino centrado no professor, tido como único detentor do saber, por outra, onde o processo de ensino e aprendizagem se faria por meio do diálogo entre professores e alunos, que conscientes de seu “inacabamento e historicidade”, se constituiriam em sujeitos construtores do conhecimento, perfazendo uma educação crítica e conscientizadora, por isto, libertadora.

Em relação à Antropologia, o objetivo era que o sujeito do conhecimento compreendesse a relevância e a diferença entre o mundo da natureza e o mundo da cultura, como nos esclarece Paiva (1987, p. 252 - 253):

Evitando repetir os erros de uma educação alienada, esta reflexão partia da própria análise da sociedade brasileira como uma sociedade em trânsito.

Nela, como evitar a massificação? O diálogo parecia o único caminho possível, pois nele os dois polos se ligam “com amor, com esperança, com fé um no outro,

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se fazem críticos na busca de algo” e só aí há comunicação. Mas, qual o conteúdo desse diálogo?

Pareceu então que conceito antropológico de cultura, a distinção entre o mundo da natureza e o mundo da cultura e o realce do papel ativo do homem sobre a realidade criando cultura, seria o conteúdo mais adequado para ajudar o analfabeto a superar a sua compreensão mágica do mundo e desenvolver uma postura crítica diante da realidade. Ele ajudaria o homem a perceber o seu papel como sujeito e não como mero objeto e serviria de base para a mudança de suas atitudes (SILVA, 2007).

Já na questão metodológica, Paulo Freire propunha que, antes do momento da sala de aula, deveriam ser executados alguns procedimentos que propiciassem um trabalho pedagógico, contextualizado e interdisciplinar, mediante a realidade vivenciada pela comunidade, sugerindo as seguintes etapas:

• Levantamento do universo vocabular / investigação do universo temático:

pesquisa informal, dialogada, feita com os moradores da comunidade, para apurar o universo de fala da cultura da gente do lugar (BRANDÃO, 1981, p. 25);

• Definição das palavras geradoras / mundo: ocorre por meio da compilação do universo vocabular dos alunos, em que são identificadas e selecionadas as palavras ma apropriadas para o início da alfabetização, sob um triplo critério: riqueza fonêmica, dificuldades fonéticas da língua e densidade pragmática do sentido (BRANDÃO, 1981, p. 31);

• Elaboração de situações que envolvam o cotidiano dos alunos, para posterior discussão com o grupo classe (debates);

• Elaboração de material a ser utilizado no decorrer das aulas, como cartazes de cultura, fichas de roteiro / plano de palavras (BRANDÃO, 1981, p. 31), para auxiliar o professor nos debates em sala; fichas de decomposição das famílias silábicas, elaboradas a partir das palavras geradoras, e fichas de descoberta, com as quais, os alunos passam a

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formar novas palavras, a partir dos fonemas, que compõe as famílias silábicas (BRANDÃO, 1981, p 31).

Desta maneira, motivados pela efervescência de ideias, proporcionadas no II Congresso Nacional de Adultos (Rio, 1958), no período compreendido entre 1960 e 1961, têm um aumento crescente de movimentos populares, destacando- se: o MCP (Movimento de Cultura Popular) de Recife; De pé no chão também se aprende a ler – Natal (RN); o MEB (Movimento Educacional Brasileiro) – iniciativa ligada à Igreja Católica; CPC (Centro Popular de Cultura) – iniciativa ligada à UNE (União Nacional dos Estudantes) (SILVA, 2007).

Assim, em maio de 1960, na cidade de Recife, sob a administração de Miguel Arraes, o MCP (Movimento de Cultura Popular) organizou-se como Sociedade Civil, constituindo-se em uma rede de ensino paralela à rede de ensino pública, cuja visão de mundo:

[...] não era a da produção de bens culturais para a posterior doação ao povo. Pelo contrário, a participação do povo no processo de elaboração da cultura foi fundamental para os pernambucanos. Por isso, em 1963, o MCP recomendou uma estratégia que privilegiasse atividades que caracterizassem:

a) pela oferta de assessoramento a esforços criadores de cultura desenvolvidos pelos núcleos de cultura das próprias organizações populares; b) pela aplicação das várias modalidades de incentivos ao surgimento, ao florescimento e à multiplicação de tais fontes produtoras de cultura popular; c) pela criação de mecanismos de estímulo e de coordenação capazes de criar interdependências e ajudas mútuas entre as diversas organizações nos seus diversos níveis de existência social, facilitando desse modo que as deficiências de umas sejam completadas pelas pontencialidades de outras e permitindo, em última análise, que as mais atrasadas encontrem condições favoráveis para ascender ao nível das mais adiantadas (CUNHA e GÓES, 2002, p. 16).

A partir daí, sob a coordenação do MCP (Movimento de Cultura Popular), no Centro de Cultura Dona Olegarinha, surge a primeira oportunidade de aplicação do Sistema Paulo Freire, onde foram alfabetizados, em aproximadamente trinta horas, a primeira turma de formandos, composta por quatro homens e uma mulher, que segundo CUNHA e GÓES (2002, p. 20):

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“No clima das Reformas de Base do Governo de Jango, o Sistema Paulo Freire foi um verdadeiro achado. Através dele seria possível – era a previsão – acrescentar cinco milhões de eleitores ao corpo eleitoral em 1965, e assim desequilibrar o poder da oligarquia em favor do movimento popular. De janeiro de 1962 (Dona Olegarinha) até final de 1963 e início de 1964, a proposta de Paulo Freire de alfabetização em 30 horas saiu dos limites de uma quase anônima experiência com cinco analfabetos para ser adotada nacional e oficialmente como proposta do governo federal”.

Neste contexto, em abril de 1963, na cidade de Angicos, interior do Rio Grande do Norte, mais uma turma de alunos se formava pelo Sistema Paulo Freire de alfabetização, ocasião que foi prestigiada pela presença do presidente da República e pelo governador do Estado (SILVA, 2007).

2 EDUCAÇÃO NO CAMPO

A constituição histórica das práticas educativas emerge das necessidades de diferentes grupos sociais em acessar a educação. A perpetuação de traços coloniais na estrutura social brasileira, na composição dos governos e na administração do público tem fortes raízes rurais e patriarcais. A sobrevivência de traços coloniais na interpretação da realidade perpassa as relações históricas que conformam a estrutura fundiária brasileira. Atrelada a esta estrutura, a educação rural não é exceção nas determinações que, antes de representarem um instrumento de ruptura com a ordem estabelecida, sofrem processos de conformação em relação à estrutura social, cultural e econômica gestada no e para o país.

Como afirma Leite (1999, p. 14) a educação rural no Brasil, por motivos socioculturais, sempre foi relegada a planos inferiores e teve por retaguarda ideológica o elitismo acentuado do processo educacional aqui instalado pelos jesuítas e a interpretação político-ideológico da oligarquia agrária, conhecida popularmente na expressão: “gente da roça não carece de estudos. Isso é coisa de gente da cidade”.

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Delineia-se, assim, um imaginário de que, para viver na roça, não há necessidade de amplos conhecimentos socializados pela escola. Esta concepção de educação rural considerava que, para os trabalhadores do campo, não era importante a formação escolar já oferecida às elites brasileiras. As

“escolinhas” criadas no meio rural, geralmente multisseriadas e isoladas, eram poucas e questionadas pelas forças hegemônicas da sociedade quanto a sua eficácia no ensino. Com o processo de urbanização crescente e o movimento de correntes migratórias, a educação rural começa a ser objeto de algumas preocupações de alguns setores ligados à educação. Contudo, algumas iniciativas destas forças, de caráter assistencial e outras privadas, defendiam a necessidade de alguma formação para o trabalho agrícola. Também no âmbito público, algumas manifestações se dirigiam a “clamar por uma educação de sentido prático e utilitário, e insistia-se na necessidade de escolas adaptadas à vida rural” (Calazans, 1993, p. 17).

De acordo com Vendramini (2007) a educação do campo vem conquistando espaço, nos últimos anos, nos debates e nas políticas educacionais no Brasil. Tal fato merece nossa reflexão, diante do contexto em que ele se manifesta. Observamos a continuidade do êxodo rural, iniciado no século passado e intensificado nas décadas de 1960 e 1970 (hoje, 19% da população vive nas zonas rurais), a inviabilização da agricultura familiar e o fortalecimento do agronegócio e da produção para a exportação.

É preciso compreender que a educação do campo não emerge no vazio e nem é iniciativa das políticas públicas, mas emerge de um movimento social, da mobilização dos trabalhadores do campo, da luta social. É fruto da organização coletiva dos trabalhadores diante do desemprego, da precarização do trabalho e da ausência de condições materiais de sobrevivência para todos.

Uma importante e significativa mudança de teoria e de prática no que se refere à educação rural foi o movimento nacional desencadeado para a construção de uma escola do campo, vinculada ao processo de construção de um projeto popular para o Brasil, que inclui um novo projeto de desenvolvimento para o campo. Nesta orientação, foram realizadas diversas conferências estaduais e nacionais, sendo a primeira conferência nacional, "Por uma

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Educação Básica do Campo", realizada em 1998 e organizada pelo MST, CNBB, UNICEF e UNESCO. Essa primeira Conferência inaugurou uma nova referência para o debate e a mobilização popular: Educação do Campo e não mais educação rural ou educação para o meio rural, ao reafirmar a legitimidade da luta por políticas públicas específicas e por um projeto educativo próprio para os sujeitos que vivem e trabalham no campo (VENDRAMINI, 2007).

Para compreender a diferença da conceituação rural e campo, é preciso considerar alguns pensamentos construídos dentro do conhecimento acadêmico, que resultam de pesquisas realizadas e compartilhadas pelos atores sociais do campo. Partindo desse princípio, a expressão educação rural está relacionada em uma postura encadeada pela concepção positivista, mercadológica, competitiva, capitalista, na qual a política de educação direciona para uma formação pragmática, que instrui o indivíduo para desenvolver atividades no mundo do trabalho. Transforma a força de trabalho humana em objeto, coisa, mercadoria. É a “coisificação” e desumanização do sujeito.

A expressão educação rural foi empregada na época do governo Vargas, para delimitar o espaço urbano e definirem políticas públicas de ação para estes espaços geográficos já compreendidos na época, como diferentes, mas, no entanto, as práticas educativas implementadas para ambas as situações, se constituíam em um único paradigma, o urbano.

O rural representava o espaço das políticas compensatórias e paliativas, um lugar onde projetos econômicos e políticos da cultura capitalista se instauravam demarcando o território do agronegócio, das empresas exploradoras de madeira, mineiro e outros. Nessas circunstancias, a relação homem-natureza se caracteriza como exploratória, depredatória, concentradora de bens, o lugar do latifúndio, da escravidão, exclusão social e da expropriação de uns em detrimento de outros.

A educação rural esteve também associada a uma situação de precariedade, atrasada, com pouca qualidade e recursos pedagógicos escassos, estrutura física inadequada: “A sala de aula é a sala da residência da professora.

Pequena e ladeada por meia parede de madeira que se estende até o final da casa. O teto é coberto parte por telha de cerâmica, parte por palhas”. Tinha como

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pano de fundo um interior arcaico, com tímidos programas educacionais pensados e elaborados para o povo sem sua participação (MOLINA, 2004).

Observamos que a educação do campo foi incorporada e/ou valorizada na agenda de lutas e de trabalho de um número cada vez maior de movimentos sociais e sindicais do campo, com o envolvimento de diferentes entidades e órgãos públicos. O que pode ser conferido pelo conjunto de promotores e apoiadores da II Conferência Nacional por uma Educação do Campo, ocorrida em Luziânia (GO), em 2004. Participaram desta iniciativa representantes de movimentos sociais, sindicais e outras organizações sociais do campo e da educação, de universidades, de ONGs e de Centros Familiares de Formação por Alternância, de secretarias estaduais e municipais de educação e de outros órgãos de gestão pública (VENDRAMINI, 2007).

A Conferência de Luziânia debruçou-se especialmente sobre como efetivar no Brasil um tratamento público específico para a Educação do Campo, enquanto política pública permanente (VENDRAMINI, 2007).

Uma conquista do conjunto das organizações do campo, no âmbito das políticas públicas, foi a aprovação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (Parecer n. 36/2001 e Resolução n. 1/2002 do Conselho Nacional de Educação). As diretrizes definem a identidade da escola do campo

(...) pela sua vinculação às questões inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva no País (BRASIL, 2002, p. 37)

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2.1 A Pedagogia da Alternância

A Pedagogia da Alternância consiste numa metodologia de organização do ensino escolar que conjuga diferentes experiências formativas distribuídas ao longo de tempos e espaços distintos, tendo como finalidade uma formação profissional. Esse método começou a tomar forma em 1935 a partir das insatisfações de um pequeno grupo de agricultores franceses com o sistema educacional de seu país, o qual não atendia, a seu ver, as especificidades da Educação para o meio rural. A experiência brasileira com a Pedagogia da Alternância começou em 1969 no estado do Espírito Santo, onde foram construídas as três primeiras Escolas Famílias Agrícolas (TEIXEIRA, BERNARTT, TRINDADE, 2008).

Atualmente existem no Brasil diversas experiências de educação escolar que utilizam a Pedagogia da Alternância como método. As experiências mais conhecidas são as desenvolvidas pelas Escolas Família Agrícola (EFAs) e pelas Casas Familiares Rurais (CFRs). Não obstante, tendo em vista a proximidade de propósitos, as entidades que articulam essas organizações educacionais, bem como diversos pesquisadores da área, vêm utilizando uma terminologia genérica para se referir às instituições que praticam a alternância educativa no meio rural:

Centros Familiares de Formação por Alternância (CEFFAs). O Brasil conta hoje com 243 CEFFAs (UNEFAB, 2007) em atividade em todas as regiões e em quase a totalidade dos estados, com exceção de Alagoas, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte (TEIXEIRA, BERNARTT, TRINDADE, 2008).

A Pedagogia da Alternância atribui grande importância à articulação entre momentos de atividade no meio socioprofissional do jovem e momentos de atividade escolar propriamente dita, nos quais se focaliza o conhecimento acumulado, considerando sempre as experiências concretas dos educandos.

Por isso, além das disciplinas escolares básicas, a educação nesse contexto engloba temáticas relativas à vida associativa e comunitária, ao meio ambiente e à formação integral nos meios profissional, social, político e econômico (Gimonet, 1999; Estevam, 2003; Silva, 2005; Begnami, 2006 apud TEIXEIRA, BERNARTT, TRINDADE, 2008).

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3 PAULO FREIRE

Aqueles que estão engajados na educação de jovens e adultos sabem perfeitamente que ela não existe sem Paulo Freire! Essa é uma verdade, uma constatação que não se pode deixar de exaltar.

Aos que não são tão familiarizados, terão oportunidade de conhecer um pouco do trabalho desse pedagogo que revolucionou uma época, é um ícone, um ídolo que precisamos sempre buscar.

Pensando na situação de exploração do trabalhador e nas condições que oportunizam uma educação conscientizadora, Paulo Freire nos possibilita observar o sistema educacional da sociedade brasileira, dentro do processo de mudança, quando identifica a educação como elemento fundamental para o sujeito do campo ou da cidade. E considera como necessidade primordial dessa mudança, a leitura de mundo com o sujeito que aprende, mas que também ensina. Ele desenvolveu uma metodologia de ensino para a alfabetização e conscientização do trabalhador do campo que partia dessa leitura de mundo.

Uma iniciativa surgida na década de 1950, que continua presente na ação educativa de muitos professores do campo e da cidade. Ao fazer uma apologia a educação da cultura dominante comentava Freire:

Na concepção bancária a educação é o ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos; Se o educador é o que sabe, se os educandos são os que não sabem, cabe aquele que dá entregar, levar, transmitir o seu saber aos segundos. Saber que deixa de ser experimento feito para ser experiência narrada ou transmitida (2002, p. 59, 60).

Estudos de Medeiros (2005) mostram que o pensamento pedagógico de Paulo Freire, assim como sua proposta para a alfabetização de adultos inspiraram os principais programas de alfabetização e educação popular que se realizaram no país no início dos anos 1960. Esses programas foram empreendidos por intelectuais, estudantes e católicos engajados numa ação política junto aos grupos populares. Desenvolvendo e aplicando essas novas diretrizes, atuaram os educadores do MEB (Movimento de educação de base), ligados à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dos CPCs (Centros de Cultura Popular), organizados pela UNE (União Nacional dos Estudantes),

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dos Movimentos de Cultura Popular, que reuniam artistas e intelectuais e tinham apoio de administrações municipais, a Campanha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler, da Secretaria Municipal de Educação de Natal e a Campanha de Educação Popular (CEPLAR) na Paraíba. Essas duas últimas campanhas citadas tinham vínculos com o estado e efetuaram um tipo de educação popular, que, "se não estavam diretamente em função dos interesses dos trabalhadores, abriram espaços, a partir de interesses imediatos, para a conquista daqueles interesses fundamentais” (WANDERLEY, 1984, p.106).

Em 1963, a União Estadual de Estudantes do Estado de São Paulo realizou importante projeto piloto de educação popular na vila Helena Maria em Osasco, também orientando os trabalhos pela concepção de alfabetização de Paulo Freire.

Segundo Jezine (2003, p.157), esses movimentos "tinham como objetivo promover a conscientização do povo, para que este pudesse atuar transformando sua realidade". Esses diversos grupos foram se articulando e passaram a pressionar o governo federal para que os apoiasse e estabelecesse uma coordenação nacional das iniciativas. Em janeiro de 1964, foi aprovado o Plano Nacional de Alfabetização, que previa a disseminação por todo o Brasil de Programas de Alfabetização orientados pela proposta de Paulo Freire.

A alfabetização e a educação de adultos deveriam partir sempre de um exame crítico da realidade existencial dos educandos, da identificação das origens de seus problemas e das possibilidades de superá-los. “Uma educação que lhe propiciasse a reflexão sobre seu próprio poder de refletir e que tivesse sua instrumentalidade, por isso mesmo, no desenvolvimento desse poder, na explicitação de suas potencialidades, de que decorreria sua capacidade de opção” (FREIRE, 1985, p.59). Em outras palavras, uma educação que “tratasse de ajudar o homem brasileiro em sua emersão e o inserisse criticamente no seu processo histórico. Educação que por isso mesmo libertasse pela conscientização” (FREIRE, 1986, p.66).

Além da dimensão social e política, os ideais pedagógicos que se difundiam tinham um forte componente ético, implicando um profundo comprometimento do Educador com os educandos. Os analfabetos deveriam ser reconhecidos

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como homens e mulheres produtivos, que possuíam uma cultura. Dessa perspectiva, Paulo Freire criticou a chamada educação bancária, que considerava o analfabeto rejeitado e ignorante, uma espécie de gaveta vazia onde o educador deveria depositar conhecimento. No dizer de Freire (2002, p.67):

A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres vazios a quem o mundo encha de conteúdos; não pode basear-se numa consciência espacializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens como corpos conscientes e na consciência como consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo.

Tomando o educando como sujeito de sua aprendizagem, Freire propunha uma ação educativa que não negasse sua cultura, mas que fosse transformando através do diálogo. Na época, ele referia-se a uma consciência ingênua ou intransitiva, herança de uma sociedade fechada, agrária e oligárquica, que deveria ser transformada em consciência crítica, necessária ao engajamento ativo no desenvolvimento político e econômico da nação (MEDEIROS, 2005).

O paradigma da educação popular, inspirado originalmente no trabalho de Paulo Freire nos anos 1960, encontrava na conscientização sua categoria fundamental. A prática e a reflexão sobre a prática levou a incorporar outra categoria não menos importante: a da organização. Afinal, não basta estar consciente, é preciso organizar-se para poder transformar (MEDEIROS, 2005).

Segundo Freitas (2007) Nas "Cartas aos Camaradas de São Tomé e Príncipe", que trabalhavam em animação cultural nos grupos de alfabetização Paulo Freire vai indicando uma série de aspectos e reflexões que servem como diretrizes às atitudes e posturas necessárias a esse trabalho político-pedagógico de aprender ensinando e ensinar aprendendo no processo de alfabetização.

Estes aspectos podem ser indicados, brevemente, nos seguintes itens que poderiam ter, aqui, um papel de relembrar cuidados e compromissos

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importantes ao trabalho de alfabetização dentro de uma perspectiva histórico- social de emancipação. Esses aspectos referem-se a:

• Ter uma atitude crítica diante de qualquer material, instrumento ou proposta de ação pedagógica, buscando uma compreensão da sua construção histórico-social;

• A própria decisão de participar de um processo de alfabetização (seja o educando, seja o educador) é já um ato político. Consequentemente, a própria educação e alfabetização também expressam uma intenção política;

• Necessidade de estar vigilante quanto à coerência entre a opção política assumida e a prática que é realizada no processo de alfabetização. Isto leva a ter de explicitar e responder à indagação: em favor de que e de quem se trabalha em Educação?;

• A prática do educador deve ser crítica, consciente e oposta à prática dos educadores colonizadores ou reprodutivistas;

• É na prática que se aprende cada vez melhor o como trabalhar, de acordo com cada realidade em questão;

• Toda educação e também a alfabetização, além de terem uma intenção política, são um ato de conhecimento;

• No processo de alfabetização, o necessário diálogo permanente entre educando e educador se dá através da prática e da reflexão, gerando um conhecimento mútuo em que há saberes distintos e relevantes;

• O trabalho do educador/animador/alfabetizador não termina quando finda seu trabalho diário; é importante que conviva com os alfabetizandos e com o povo (FREITAS, 2007).

3.1 A Pedagogia de Paulo Freire e a Educação de Jovens e Adultos

A Pedagogia proposta por Paulo Freire, parte do pressuposto de uma Educação problematizadora, que envolve o processo de dialogicidade entre os polos dialéticos formados por professores e alunos de tal modo que, um inexiste sem o outro, porque há um influxo que permeia esta relação como se uma força

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os atraísse e os repelisse ao mesmo tempo, razão pela qual nenhum deles se basta, fazendo com que se movam pela complementaridade.

Assim a dialogicidade, essência da Educação, refere-se ao diálogo ocorrido entre os sujeitos do conhecimento que por meio da palavra compõem a práxis pedagógica, constituída pela dimensão da ação e da reflexão, pois:

Não há palavra verdadeira que não seja práxis. Daí que dizer a palavra verdadeira, seja transformar o mundo. [...] A existência, porque humana, não pode ser muda, silenciosa, nem tampouco nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras verdadeiras. [...] Existir, humanamente, é pronunciar o mundo. [...] O mundo pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar (FREIRE, 2002, p. 77 - 78).

Porém, para que haja um novo pronunciar da palavra, é necessário que a leitura do mundo preceda sempre a leitura da palavra (FREIRE, 2002, p. 90), pois a partir da compreensão do contexto imediato dos alunos em relação ao mundo, do qual este cotidiano faz parte, é que começa a se formar a inquietação no professor que é educador. Assim, o processo de dialogicidade se inicia não no momento em que os alunos se encontram com o professor em sala de aula, mas, quando este ao refletir, se questiona em torno do que vai dialogar com aqueles (FREIRE, 2002, p. 83).

Referindo-se ao diálogo, Paulo Freire insiste que o professor de Educação de Jovens e Adultos, precisa compreender que a cultura dos grupos populares é tão importante quanto a sua própria, e que a compreensão que eles têm sobre o mundo, provém de uma construção empírica (senso-comum), que embora não tenha os padrões de cientificidade que a norma culta exige, produz um conhecimento que é relevante para a sobrevivência do grupo social, e que portanto, deve ser respeitado, valorizado e apreendido.

Assim, a visão que os grupos populares têm sobre o mundo, pode ser o início desse diálogo entre professores e alunos, que propiciará além da investigação da realidade, também, uma análise do nível de imersão ideológica em que se encontram, e ainda, o estabelecimento de uma mútua confiança entre os sujeitos, que, a partir do conhecimento obtido por meio da análise destas informações que exprimem o pensamento coletivo do grupo, será possível

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compor a base de dados, na qual se constituirá o conteúdo programático do planejamento a ser feito pelo professor, isto é, a estruturação organizada e sistematizada do conhecimento de senso-comum, obtido diretamente da comunidade, transformado em conhecimento científico, e que será ministrado nas aulas.

3.2 O método Paulo Freire de Alfabetização de Adultos

De acordo com Brandão (1981, p. 21), Paulo Freire ao pensar em um método de alfabetização para adultos, partiu do pressuposto que: [...] educar é uma tarefa de trocas entre pessoas e, se não pode ser nunca feita por um sujeito isolado (até a auto-educação é um diálogo à distância), não pode ser também o resultado do despejo de quem supõe que possui todo o saber, sobre aquele que, do outro lado, foi obrigado a pensar que não possui nenhum. [...] De um lado e do outro do trabalho em que se ensina e aprende, há sempre educadores- educando e educandos-educadores. De lado a lado se ensina. De lado a lado se aprende.

Por outro lado, o saber contido nas cartilhas, é um saber imposto que reflete em suas entrelinhas o pensamento da elite dominante, que acaba determinando o pensamento e a consciência da população, ao propor o uso de materiais como este.

Daí a importância de investigar junto às comunidades que farão parte das classes de alfabetização a sua realidade sociocultural, o seu modo de “dizer o mundo” (BRANDÃO, 1981, p. 23), fazendo o levantamento do universo vocabular.

No entanto, cabe ressaltar que este levantamento não se constitui em uma pesquisa metódica, rigorosa, mas algo mais simples, que ocorre por meio do diálogo, em reuniões informais costumeiras, onde se investiga as palavras mais usadas pela população da comunidade (BRANDÃO, 1981, p. 25). A ideia em relação a esta etapa, reside no fato de que existe uma oralidade peculiar da comunidade que traduz sua cultura e que precisa ser observada mais de perto pela equipe de educadores e ainda, como uma forma de aliar a teoria à prática, o pensado e o vivido, que segundo Brandão (1981, p. 27):

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O que se descobre com o levantamento não são homens-objeto, nem é uma realidade neutra. São os pensamentos-linguagens das pessoas. São falas que, a seu modo, desvelam o mundo e contêm, para a pesquisa, os temas geradores falados através das palavras geradoras.

Após a coleta de dados, a equipe têm o resultado efetivo do trabalho realizado, que se traduz no registro das falas, costumes e hábitos, também a afetividade mútua gerada pela convivência e a identificação da equipe de pesquisadores com os problemas da comunidade, ou seja, é o momento gerador – da descoberta coletiva da vida através da fala; do mundo através da palavra que consiste em um ato criativo e não um ato mecanizado, alienado ou de consumo (BRANDÃO, 1981, p. 28).

Assim, o Método Paulo Freire prossegue com a escolha das palavras geradoras, que além de ser um instrumento de releitura da realidade social do lugar, também contém do ponto de vista pedagógico, relevância quanto ao valor:

• Sintático (possibilidade ou riqueza fonêmica, grau de dificuldade fonêmica complexa, de manipulabilidade dos conjuntos de sinais, as sílabas, etc.);

• Semântico (maior ou menor intensidade do vínculo entre a palavra e o ser que designa, maior ou menor adequação entre palavra e ser designado, etc.);

• Pragmático (maior ou menor teor de conscientização que a palavra traz em potencial, ou conjunto de reações socioculturais que a palavra gera na pessoa ou grupo que a utiliza) (BRANDÃO, 1981, p. 31).

Mas se as palavras geradoras, codificam o modo de vida das pessoas, o

“Círculo de Cultura”, faz a decodificação por meio dos “núcleos de referência gerador” (BRANDÃO, 1981, p. 33), que são roteiros de sugestão para os debates durante as aulas, contemplando questões ao mesmo tempo existenciais, referentes à vida, e políticas, referentes “aos determinantes sociais das condições de vida” (BRANDÃO, 1981, p. 33).

Nesta perspectiva, para uma comunidade situada nos morros do Rio de Janeiro, as palavras geradoras escolhidas foram: “favela, chuva, arado, terreno, comida, batuque, poço, bicicleta, trabalho, salário, profissão, governo, mangue,

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engenho, enxada, tijolo, riqueza” (BRANDÃO, 1981, p. 33), cujo sentido semântico e pragmático evoca o modo de vida das pessoas, assim: [...] para a palavra 'batuque' os aspectos de discussão foram: 'cultura do povo, folclore, cultura erudita, alienação cultural'. Para 'governo': 'plano político, o poder político, o papel do povo na organização do povo, participação popular' (BRANDÃO, 1981, p. 33 – 34).

Desta maneira, a palavra geradora ao trazer à lembrança recordações de vida, provoca e instiga o pensamento a refletir sobre as questões sugeridas, entretanto, quando o objetivo do trabalho pedagógico é apenas o de ler, escrever e realizar cálculos, sem adentrar na dimensão da conscientização crítica, o planejamento e elaboração do material didático para as aulas, termina com a seleção das palavras, mas, quando o objetivo é mais amplo, o trabalho de

“codificação” do material didático prossegue com a escolha dos temas geradores.

A princípio Paulo Freire, pensou em trabalhar com os temas geradores somente na pós-alfabetização, mas como Brandão (1981, p. 38) nos esclarece, o seu levantamento ocorre em dois níveis, o primeiro como núcleo gerador dentro da fase de alfabetização, quando o professor está trabalhando a palavra geradora, e observa durante o debate dentro do Círculo de Cultura, um apontamento que sugere o tema gerador que deverá ser trabalhado no segundo nível, correspondente à pós-alfabetização, como o exemplo a seguir:

Uma série de temas geradores pode ser distribuída assim:

1) A natureza e o homem: o ambiente;

2) Relações do homem com a natureza: o trabalho;

3) O processo produtivo: o trabalho como questão;

4) Relações de trabalho (operário ou camponês);

5) Formas de expropriação: relações de poder;

6) A produção social do migrante;

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7) Formas populares de resistência e de luta (BRANDÃO, 1981, p. 39).

3.3 Educação Libertadora

No entendimento de Passos (2007) a educação voltada para um projeto que vise a libertação e protagonismo dos setores populares, é a educação que tem sido chamada de educação libertadora.

Ela é o projeto de educação através da qual, os trabalhadores do campo e da cidade construirão o seu projeto transformador das relações desiguais e injustas da presente sociedade. É um projeto democrático porque tem por objetivo negar ou superar a manutenção das díades: oprimido-opressor. Esta educação é cultural, isso é, é marcada pelo jeito do povo da terra, com os seus projetos e objetivos, em função de construir neles e nos seus filhos, a defesa dos seus interesses, a partir do lugar que ocupam nesta sociedade. É um jeito de pensar o mundo, orientar valores e uma prática coerente com o projeto de transformação do mundo, com óbvias implicações para o modelo econômico- social e educacional do país. Possui uma cultura, isso é um projeto que tem o jeito humano e cultural do povo que vive nas periferias sociais e culturais, construído com a ‘cara’ que estes trabalhadores possuem (PASSOS, 2007).

A história da educação popular, uma das geradoras dos fundamentos da educação do campo, como vimos anteriormente, possibilita-nos compreender que os anseios populares de transformar a sociedade em que vivemos encontraram nos Temas Geradores uma das formas de problematizar essa realidade, mas também nos mostra que os processos históricos estão sempre se fazendo, e, como agentes deste processo histórico, necessitamos nos situar em constante refazer-se. Essa dinamicidade processual constitui-se em matéria de reflexão, que nos permite sempre reelaborar nossas práticas pedagógicas no sentido de uma educação necessária à libertação e nos remete ao desafio constante de reiventar as formas como as produzimos, o que significa refletirmos sobre a complexidade em que nossas práticas educativas estão imersas (ANTONIO E LUCINI, 2007).

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REFERÊNCIAS UTILIZADAS E CONSULTADAS

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<http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v27n72/a05v2772.pdf> Acesso em: 02 mai.

2010.

BELLO, José Luiz de Paiva. Movimento Brasileiro de Alfabetização - MOBRAL.

História da Educação no Brasil. Período do Regime Militar. Pedagogia em

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Foco, Vitória, 1993. Disponível em:

<http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb10a.htm> Acesso em: 03 mai. 2010.

BEZERRA, A. As atividades em Educação Popular. In: BRANDÃO, C. R.

(Org.). A questão política da Educação Popular. São Paulo: Brasiliense, 1980, p. 16-39.

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Institui as diretrizes operacionais para a educação básica nas escolas do campo.

Diário Oficial da União, Brasília, DF, 9 de abril de 2002. Seção 1, p. 32.

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Educação e escola no campo. Campinas: Papirus, 1993.

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CUNHA, Luiz Antônio; GÓES, Moacyr. O golpe na educação. 11 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002.

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 16 ed. Rio de Janeiro:

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FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 11 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 8 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 33 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.

Referências

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