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Foto: Bruna Oliveira

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Academic year: 2022

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Foto: Bruna Oliveira

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Somos a Comissão Organizadora do IX Encontro de Estudantes de Arquitetura e Urbanismo da Regional Nordeste, que acontecerá em Salvador durante os dias 22 a 29 de Janeiro de 2017 na Associação Atlética Banco do Brasil de Salvador. Temos paixão em construir um espaço cheio de Arquitetura e Urbanismo, despojado e político para estudantes que buscam conhecimento e experiências fora da academia. Uma organização de discentes para discentes, sem �ns lucrativos. O projeto nasceu da vontade de repensar cidade e o direto a esse espaço, pôr em discussão às questões Urbanas e Arquitetônicas intrínsecas à realidade de uma Salvador contemporânea, metrópole de 467 anos que coexiste com diversas problemáticas, mas também com um histórico incrivelmente valioso de arquitetura, cultura e resistência.

Patrimônio Histórico, Planejamento e Reforma Urbana, Sustentabilidade, As Minorias na

Complexidade Urbana e o Modelo Atual de Ensino, Estágio e Trabalho são os pontos que direcionarão as discussões, atividades e culturais que farão pa�e dessa semana de troca e aprendizado. Por acreditar no ganho do contato com essa cultura, com essa gente e cidade, defendemos e estamos na construção de um sonho em Salvador, sonho este em constante aspecto de construção.

Entendemos que nosso papel não girará entorno da mudança direta na vida de seus residentes ou na paisagem atual da cidade, mas para começo, sob essa perspectiva, todos nós - organizadores, convidados, pa�icipantes - teremos a experiência da construção de espaços coletivos, de troca conjunta, com moradores e com pessoas que representem a ideia do projeto EREA SSA 2017 - Qual a cor dessa cidade?

Axé,

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ELEA Salvador 1999

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Os Encontros de Estudantes são de caráter Nacional - ENEA - e de caráter

Regional, como se apresenta o EREA Salvador 2017. São projetos respaldados pela Federação Nacional de Estudantes de Arquitetura e Urbanismo – FeNEA – e acontecem anualmente, pós apresentação e aprovação de projeto perante

votação em plenária com estudantes presentes, concomitante ao encontro do ano.

Têm como objetivo o intercâmbio de conhecimento e cultura entre estudantes e as realidades que abraçam os projetos e o fo�alecimento da a�iculação do Movimento Estudantil.

Os Encontros Estudantis

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A cidade, acolhedora e promissora em opo�unidades, deveria ser igual na idealização de sua existência, como um espaço vivo, dinâmico e anti-hierárquico. Entretanto, tem sido resultado de um urbanismo de espaços �nanceirizados e preocupados com a manutenção de serviços/produtos, onde o cuidado com as pessoas e suas respectivas realidades é pensado de forma supe�icial e sem causar dano ao “bem maior” – o capital.Salvador vista em ca�ão postal com suas belas praias, sítio de impo�ante acervo histórico- arquitetônico, cidade de carnaval emblemático não é �el à pluralidade de características que abarcam os

seus traços urbanos. Imersa, assim como a maioria das grandes cidades brasileiras, em um segregacionismo espacial, econômico/social, étnico e cultural, essa mesma cidade que é posta na vitrine do turismo nordestino, caracteriza-se pela existência de várias cidades em uma mesma, realidades limítrofes e distintas. A primeira capital do Brasil não sabe o signi�cado de não existir sob a demasiada herança de uma colonização escravocrata e de democracia usurpada. A casa grande e a senzala soteropolitana passaram por readequação, embora libe�os, a população negra continua tendo seu papel de protagonista negado, suas conquistas são tratadas como fruto da “bondade” do homem branco. A lei Aurea não garantiu a eles o direito a cidade, pelo contrário, passaram da condição de escravo à condição de não cidadão. Para entender o resultado atual da conformação urbana soteropolitana é preciso entender e trazer ao texto um pouco do histórico do seu desenvolvimento espacial em consequência da realidade do Brasil Colonial. A luta da população negra, descapitalizada pelo direito de permanecer na cidade, ocorreu de forma árdua e sob o controle impositivo da burguesia. Na Salvador pós-colonial, ocuparam as ruas e os co�iços. Posteriormente, com a nova reestruturação espacial entre os anos 1940 e 1950 (Corso, 2008) por diversos fatores, a burguesia se desloca do centro, a população menos favorecida passa a ocupar as antigas edi�cações e espaços ainda não urbanizados, novamente sofrendo com a falta de estrutura.

A cidade e as questões urbanas.

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Com a modernização da capital, depois de longo período de estagnação, entre as décadas de 1960 e 1970, o espaço urbano de Salvador continuou sendo consolidado por um urbanismo excludente pela

administração da época. Apoiada pelo plano de Reforma Urbana de 1968 a Prefeitura que detinha maior pa�e das terras da cidade, passou o direito das terras para as mãos da iniciativa privada (Corso, 2008).

De�nida pela lógica capitalista do mercado imobiliário foram traçados caminhos opostos em relação à ocupação espacial, a população pobre continuou a habitar as áreas periféricas, através da ocupação informal da terra em áreas inapropriadas à moradia. A ocupação espontânea direta e coletiva à revelia do proprietário latifundiário, sem consentimento, negociação ou comercialização (Souza, 1990), se dirigiu inicialmente para a zona no�e (Soledade, Lapinha, Casa Nova) e posteriormente ao subúrbio. Este �uxo se deu impulsionado pela construção ferroviária que ligava esta área até às proximidades do comércio, e às zonas limítrofes com outros munícipios – que não faziam pa�e da especulação imobiliária. A elite

�nanceira, em contraponto foi de encontro à zona sul, e toda orla atlântica, para as áreas de maior infraestrutura e melhores condições de vida, impulsionadas pela melhores condições de vida, impulsionadas pela formação de um novo centro comercial e administrativo nas proximidades. A zona central, além de ser um limite segregacionista, entre as duas faces distintas, alocou condomínios de residência para “classe média baixa” que passou por continuada expansão por meio de novos residenciais populares e invasões coletivas, lidando ainda com a escassez de equipamentos urbanos e

serviços.Atualmente, Salvador nada mais é do que a intensi�cação de um processo de urbanização, que tem como objetivo a conversão do direito da cidade em uma “mercadoria de direitos”, atendendo assim a lógica de acumulo de capital onde a cidade é preparada para quem pode morar nos condomínios de luxo e superluxo, em bairros elitizados, nas novas zonas de especulação �nanceira, na orla atlântica. Em

contrapa�ida a população de baixa renda continua a ocupar lugares distantes dos núcleos de serviços, marginalizados, sem infraestrutura, segurança e cultura, por ora, não são de interesse do mercado imobiliário. A organização da cidade e as condições de vida na Salvador de 2016 são re�exos de todo o processo histórico de formação e negação da população carente que compunha o cenário urbano desde sempre. A relação casa grande �cou mais ampla e complexa.

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Atualmente, Salvador nada mais é do que a intensi�cação de um processo de urbanização, que tem como objetivo a conversão do direito da cidade em uma “mercadoria de direitos”, atendendo assim a lógica de acumulo de capital onde a cidade é preparada para quem pode morar nos condomínios de luxo e superluxo, em bairros elitizados, nas novas zonas de especulação �nanceira, na orla atlântica. Em contrapa�ida a população de baixa renda continua a ocupar lugares distantes dos núcleos de serviços, marginalizados, sem infraestrutura, segurança e cultura, por ora, não são de interesse do mercado imobiliário. A organização da cidade e as condições de vida na Salvador de 2016 são re�exos de todo o processo histórico de formação e negação da população carente que compunha o cenário urbano desde sempre. A relação senzala/casa grande �cou mais ampla e complexa.Nos últimos 4 anos, a cidade e sua região metropolitana vêm passando por grandes reformas em espaços/serviços que sofriam pelo descaso, é impo�ante ressaltar a impo�ância da inauguração e ampliação das rotas do metrô, que representam um ganho para o dia a dia do soteropolitano que se deslocava de forma precária e engarrafada, contudo pensar Reforma Urbana é para além disso. Continua-se, sob essa perspectiva de garantir o deslocamento e não a heterogeneidade espacial, rea�rmando a ideia que o pobre pode continuar habitando somente as periferias mediante a existência de mecanismos que o faça se deslocar para as áreas de trabalho. A essa população carente é dado o direito de visita à pa�e bonita e urbanizada da cidade, porém lhe é negado o direito de habitar esses espaços. Ao se falar em Reforma Urbana é preciso trazer o contexto social e econômico que está inserido em Salvador ainda hoje, onde a maior pa�e da população negra e parda continua vivendo nas pa�es mais segregadas e problemáticas, espacialmente falando, periferias que repo�am não somente à precarização da moradia, da habitação, como também às relações desses habitantes com a cidade perante uma sociedade que vive a rea�rmação da política higienista por pa�e dos gestores. Políticas públicas que atuam através da militarização ostensiva na periferia e criminalizam compo�amentos indesejados que fujam dos costumes e aos padrões que interessam ao projeto de barbárie proposto pelo grande capital.

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Entende-se também que todos esses con�itos, baseados em dialético histórico, cultural e urbano, são pa�es do que Marx e Engels denominam como Luta de Classes. Além de toda luta de gênero, onde a mulher precisa se rebelar contra o ideal patriarcal, para que assim possa fazer pa�e de espaços na sociedade, onde entende-se que não existe justi�cativa para a escravidão doméstica e distinção de direito perante os gêneros – ve�ente que será melhor explorada num outro texto de apoio – a questão urbana de Salvador está intrinsecamente ligada a questão da raça, a divisão do trabalho e a ordem �nanceira – consequência do colonialismo, do regime escravocrata e da intensi�cação do capitalismo.

Trata-se de uma sociedade que perpetua a ocupação da população branca nos melhores lugares/espaços, as melhores habitações, os melhores empregos e os melhores salários, enquanto a maior pa�e de Salvador, negros e pardos, vive em uma grade faixa de precarização – respectivamente – da moradia e dos serviços, num clima de insurgência urbana, �lhos das resistências e da informalidade, rebelam-se e resistem, pois são essas suas alternativas para manterem-se �rmes, vivos e com suas identidades ainda vivas. A

discussão, proposta pelo projeto EREA Salvador 2016, não é sobre modelo econômico vigente, mas sobre a cidade, consequência desse modelo. É necessário pensar urbanismo e o preceito que se deve levar em consideração quando nos propomos a estuda-lo, atentando-se à pa�icipação popular, às novas organizações coletivas de luta e ao contato, vivência e embasamento com a sociedade marginalizada.

Entendemos Salvador como uma cidade modelo do não urbanismo – alienador e anti-humano – e é através disso que propomos discussões e troca de ideias sobre os modelos atuais de urbanização e sobre o papel do Arquiteto Urbanista no entendimento e formação de espaços igualitários, com condições de uso e permanência saudável, para todo habitante da cidade. O espaço não é para ser um agente econômico, antes disso o espaço e a moradia de qualidade são direitos de todo cidadão (Estatuto da Cidade, 2010).

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Foto: Henrique Magno

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A preocupação com o passado está presente na sociedade desde as épocas mais remotas, no Brasil as origens da necessidade de preservação do patrimônio se iniciam na década de 1920, onde os primeiros projetos de lei voltados a questão foram criados. Patrick Geddes e Marcel Poete defendem a ideia de que para um conhecimento da cidade no presente, seus desa�os e problemas, é preciso ter um embasamento histórico. Assim pensar em patrimônio é também pensar em urbanismo e na proteção ambiental, pois estão intimamente vinculadas e não devem ser trabalhadas como atividades independentes umas das outras.

Na década de 60-70 a população brasileira crescia em ritmo acelerado tanto no campo quanto no meio urbano. O patrimônio estava ameaçado e destruído. Assim começaram a surgir órgãos especializados em diversos estados e municípios. Em destaque a implantação do Programa de Cidades Históricas, no qual as ações de preservação se deslocavam do esquema de tombamento de edifícios isolados para formas abrangentes, essa ação intensa no meio urbano envolve uma série de questões, até então pensadas de formas parciais e que apresentam necessidade de uma análise mais complexa. Existe também a dualidade entre manter a preservação e projetar novos bairros, mas até onde preservar e até que ponto renovar?

Na cidade de Salvador não é diferente, nos anos 60 começa uma política de preservação do patrimônio histórico ligada a uma política de desenvolvimento turístico no Brasil. Salvador tinha posição excepcional devido ao seu acervo arquitetônico extenso, a sua área litorânea e a suas riquezas culturais. Ao longo das décadas intervenções vêm acontecendo no centro histórico, no entanto não conseguiram reve�er o quadro de degradação. Esse projeto de funcionalidade da área implicou na destinação de imóveis para uso público, comercial e serviços, diminuindo cada vez mais o uso habitacional. Do ponto de vista social, a questão habitacional foi caracterizada pelo abandono radical de intervenção com mantimento da população, foram oferecidas indenização ou relocação dessas famílias como negociação, sendo algumas efetivas outras não.

Patrimônio Histórico

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Foto: Henrique Magno

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Hoje resta apenas uma pequena parcela dessas pessoas que conseguiram se manter no local, mas a grande questão é, a falta mais uma vez de políticas que conversem, não se pode pensar em conservação do patrimônio e não pensar em outros fatores que implicam, como a questão da habitação. Muitos desses casarões se encontram em desuso hoje, onde poderia morar muita gente. Observou-se também a ação de grupos coorporativos privados em processo de construção de patrimônio fundiário em áreas adjacentes, com caráter especulativo, a exemplo do que ocorre na região de Conceição - Largo Dois de Julho. Alguns problemas são apontados na região atualmente após essas especulações, como a perda da dinâmica comercial, aumento do trá�co de drogas, a insegurança, a diminuição do policiamento, a degradação do ambiente construído, o assedio aos turistas, o turismo sexual entre outros. As modi�cações no papel de capital econômico das cidades decorrentes da aceleração do processo de globalização nos ajudam a compreender o que acontece hoje com a preservação patrimonial, ambiental e com o urbanismo.É necessário o pensamento de preservação da cidade como um todo, não apenas em espaços

fragmentados, criando um processo de musealização da cidade. Os planos urbanísticos não se organizam de modo integrado com os tombamentos. Não existe no IPHAN um sistema e�ciente de monitoramento, assim como a valorização social desse patrimônio perante a população e, por conseguinte não existe uma análise do impacto social/�nanceiro que esses mesmos patrimônios causam na realidade dos que habitam seu entorno. É fundamental a implantação adequada desse sistema, assim como o debate sobre a questão patrimonial deve se ampliar além do círculo de arquitetos, urbanistas, restauradores e especialistas, deve- se atingir toda a gama da sociedade civil, para que cada vez mais exista o conhecimento perceptivo e compreensivo da impo�ância que, um espaço, um edifício, um monumento, uma cultura tem como agente nas relações transitórias na cidade, além de serem grandes atores que permitem o contato com a história.

“Para bem restaurar, é necessário amar e entender o monumento, seja estátua, quadro ou edifício, sobre o qual se trabalha... Ora, que séculos souberam amar e entender as belezas do passado? E nós, hoje, em que medida sabemos amá-las e entendê-las?” Camillo BOITO, 1884.

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A documentação de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) surgem no Brasil em 1981 com as modi�cações na Lei federal 6.938, instituindo a criação do CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) e determinando a Política Nacional de Meio Ambiente. Estes são instrumentos �scalizadores e reguladores dos efeitos de impacto ambiental nos projetos e intervenções arquitetônicas e urbanísticas. Tais parâmetros passam a ser mais rígidos a pa�ir da ECO 92- RJ, onde foram debatidas as questões urbanas, rurais e coletivas a nível mundial, estabelecendo parâmetros universais de preservação ambiental, indiferenciando os países por suas economias. Desde então, a legislação ambiental tem se sobreposto à legislação urbanística nas questões de uso e ocupação do solo, confo�o térmico e acústico e tudo o que tange a preservação ou reutilização de recursos naturais, resigni�cando a discussão do espaço e impo�ânciasócio urbanístico no trabalho do arquiteto. Toda produção passa a ser analisada por estruturas administrativas e chegam à discussão nas comunidades organizadas através das audiências públicas, exigindo cada vez mais a pa�icipação do pro�ssional de arquitetura nessa re�exão e a estrutura de uma formação acadêmica já baseada nesses preceitos. É preciso que a formação vá além do

“encontrar soluções para os problemas” e que se enquadre nas edições de normas ambientais, sem que seja necessário especializações ou complementações educacionais. Apenas no ano de 1995 é que surge uma tímida indicação para este caminho, quando a po�aria 1770 do MEC reformula o Currículo de Arquitetura e Urbanismo, introduzindo os Estudos Sociais e Ambientais. Área que, por sua vez, é fragmentada mais tarde (1999), em Estudos Ambientais e Estudos Sociais, abrindo espaço para que as universidades de maneira individual se aprofundem mais ou menos em tais aspectos em seus currículos de formação.

Arquitetura, Urbanismo e Meio Ambiente

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É preciso a formação acadêmica que vá além do “encontrar soluções para os problemas” e que se enquadre nas edições de normas ambientais, sem que seja necessário – obrigatoriamente, posteriormente a conclusão, especializações ou complementações educacionais para tratar uma demanda que é presente na vida do pro�ssional, recém formado, que precisa ingressar no mercado.

Considerando que hoje 50% da população mundial ocupa os centros urbanos, a questão da preservação, manutenção e recuperação ambiental está diretamente ligada aos pro�ssionais que pensam a cidade. Cabe ao arquiteto e urbanista a desmisti�cação de que a construção de cunho ambiental está deslocada do meio urbano, locando-se em ambientes não-urbanizados. É preciso desenvolver a sustentabilidade nos edifícios e lotes comuns, adaptando os conceitos de arquitetura sustentável e o pensar da cidade democrática às condições locais, disponibilidade de materiais e mão-de-obra. Tal percepção precisa ser fomentada nas grandes cidades seja por conselhos universitários ou por órgãos regulamentadores da pro�ssão, criando com o tempo, a cultura do pensamento ecológico. O descolamento da arquitetura sustentável e a ideia de que é um método para poucos também precisa acontecer, pois não se trata necessariamente de alta tecnologia, mas de soluções técnicas simples e acessíveis a�iculadas nos projetos de arquitetura e planejamento ambiental. Na cidade de Salvador é possível observar que nos últimos dez anos, pa�e da construção na faixa atlântica tem se utilizado dos quesitos de sustentabilidade. Tais empreendimentos que se auto intitulam sustentáveis, conectados com a natureza, ou que remetem de alguma forma, através do marketing, sua relação com o verde, apresentam na verdade uma preocupação bastante supe�icial, relacionada à venda. É mais uma adaptação às exigências de mercado que uma real preocupação ambiental, visto que sua construção deriva de grandes áreas desmatadas e sua grande maioria não apresenta planos ou projetos sequer de saneamento básico, principalmente no que tange as áreas mais distantes do centro como o Litoral No�e.

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Foto: Bruna OliveiraFoto: Bruna Oliveira

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São empreendimentos voltados para as classes mais altas de Salvador e região metropolitana cuja

“conexão com a natureza” provém de incessantes feridas na faixa de mata atlântica e região de dunas restantes e que encontram apo�e cada vez maior na legislação municipal. Quando

apresentam algum fator de redução de impacto ambiental, limitam-se a sistemas de diminuição de consumo de energia e água, ce�amente por apresentar grande vantagem �nanceira ao consumidor

�nal.

Numa escala mais abrangente, vemos grandes intervenções do poder público que não apresentam os Relatórios de Impacto Ambiental. As vozes das comunidades são silenciadas em audiências públicas forjadas onde os projetos são apresentados sem abrir espaços para debates. Tal realidade tem se repetido em quase todas as grandes obras de mudança de tráfego, abe�uras de grandes vias e requali�cação de espaços públicos como é o caso da Via Expressa, o polêmico projeto da Linha Viva, que em 2014 estimava a retirada de três mil e duzentas famílias (linhavivanao.org), e as últimas intervenções na orla da cidade. São projetos que não têm levado em conta as áreas de preservação ambiental, as questões relacionadas a escoamento de águas pluviais, recuperação ou degradação dos rios e tampouco as relações sociais já constituídas nas comunidades mais pobres, além de outros fatores como materiais e mão de obra disponíveis.

Por isso é preciso que façamos uma profunda re�exão sobre a atuação e formação desses pro�ssionais, que já não podem continuar na contramão dos indicativos internacionais de meio ambiente e ecologia. São trinta e cinco anos de disparidade entre as de�nições das leis nacionais com a real aplicabilidade dos mesmos nos meios urbanos e rurais e a possibilidade mais tangível para a mudança dessa realidade é através das bases de formação e discussão nas universidades com a comunidade civil.

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Do Ensino ao Trabalho

Muitos jovens iniciam o curso com uma versão muito supe�icial sobre a pro�ssão. Essa visão vem do que a sociedade passa: um ser com qualidades magní�cas de estética e design que simplesmente desenha edifícios primorosos, impo�ados de uma cultura europeia, completamente a pa�e de nossa cidade tropical.

Na História, temos a imagem do arquiteto-construtor, que produziu grandes obras e monumentos de destaque na História. A �gura do arquiteto não estava tão ligada a pequenas obras, que cabiam ao saber popular, enquanto que ao arquiteto-construtor cabiam as grandes obras públicas e representativas de poder governamental, religioso ou econômico. Talvez seja daí que venha sempre a imagem do arquiteto elitista, que atende a uma minoria rica. As qualidades e competências do arquiteto podem ser observadas em dois momentos distintos: quando somos jovens secundaristas que desejam ingressar na pro�ssão, baseado no que conhecemos como a produção do pro�ssional de arquitetura e urbanismo; E quando ingressamos na vida acadêmica, que reforça essa produção. A re�exão sobre a desconstrução dessas características elitistas e até supé�luas tem lugar no “papel social do arquiteto”. Ora, se aprendemos na Universidade como projetar espaços abe�os e fechados que garantam qualidade de vida à população, por que trabalhar para uma pequena porcentagem mais rica e detentora do poder econômico na cidade? A mesma academia que dá uma base, de�ciente muitas vezes, para o entendimento de projetos de cunho coletivo, não reforça a impo�ância de um debate mais amplo e complexo sobre sociedade e as questões diretamente ligadas ao papel do pro�ssional em questão nesse meio, incentivando muito mais a produção mercadológica - arquitetos para atender somente ao mercado. O que provoca ainda mais o sentimento de insatisfação é perceber que o mercado não acaba por ser somente a consequência de um sistema em que estamos inseridos, mas que existe uma ampla formação de pro�ssionais alienados à ética e o gênesis da pro�ssão. Um pouco se re�ete na produção dos trabalhos de Conclusão de Curso, onde vemos trabalhos monumentais, um des�le sem �m de Centros de Reabilitação, Clínicas, Centros Poliespo�ivos, Centro Culturais, Museus, Reso�s in�uenciados pelos projetos contemporâneos,

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onde demasiadamente caixotes de vidro continuam sendo construídos sem levar em consideração os princípios de confo�o ambiental, de qualidade térmica na construção e da sustentabilidade envolvida em todo o processo. As Universidades estão formando pequenos robozinhos que sabem fazer as mesmas coisas e devem pensar de maneira uniforme, o desenho prevalece sobre a arquitetura. Mais vale uma maquete eletrônica bem renderizada do que realmente entender a dinâmica da sociedade. Ás vezes alguns saem do padrão e pa�em para o urbano, com intervenções, planos de bairro, parques e praças. Raramente um estudante se interessa por um projeto de interesse social. Pela lógica e dogmas enraizados, o arquiteto é aquele que deve projetar grandes obras, não sendo interessante se preocupar com quem não tem

condições de custear os seus serviços. A retomada do papel do arquiteto enquanto promoção da cidadania e direito à cidade é feito por atividades de extensão dentro de poucas Universidades ou por escritórios- modelos, mas ainda são atitudes tímidas, que não agregam a maioria dos estudantes nem estão presentes em todas as Escolas de Arquitetura de Salvador.

Quanto à relação de trabalho e estágio, temos duas visões distintas das funções: O estudante que se dedica a funções dentro do ambiente acadêmico - como a monitoria, a iniciação cientí�ca, a pa�icipação em atividades de extensão e a pa�icipação no movimento estudantil, encabeçado pelos Centros e Diretórios Acadêmicos; E o estudante que procura vagas em escritórios de arquitetura, empresas privadas e órgãos públicos. Embora alguns poucos escritórios saiam do padrão e inovem o mercado com propostas

diferenciais e trazendo pra seus projetos e princípios uma conceituação mais humanitária da Arquitetura, o meio de contato mais constante com uma ve�ente mais crítica/cientí�ca e �losó�ca da pro�ssão acaba por

�car a cargo das poucas vagas dentro de projetos de extensão e iniciação cientí�ca da academia.Em contra pa�ida aos produtos e as formas mainstreamizadas de atuação, existem os que pensam diferente e que levantam a possibilidade de contribuir para a sociedade, elaborando e executando obras que fogem à lógica mercadológica atual. É impo�ante contemplar e estar atento a essas novas iniciativas de trabalhar

Arquitetura e Urbanismo, seja para ter exemplos de inovações, seja para levantar debates sobre essas novas propostas.

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Foto: Bruna Oliveira

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Na cidade mais negra fora da África precisamos falar sobre nossas mulheres, e mais do que isso, sobre nossas mulheres negras, periféricas, que ocupam os locais mais problemáticos de nossa Salvador nas mais variadas escalas, onde a ocupação dos espaços públicos ocorre de maneira etnocrática e socialmente segregada. Mães que sobrevivem ao genocídio de seus �lhos, a habitação de má qualidade, a insegurança pública, o serviço mal remunerado e ao não reconhecimento. Precisamos falar sobre as mães de �lhos sem pai, que saem de suas casas para trabalhar em casas que não são suas e cuidar de �lhos que não são seus.

Precisamos falar sobre o empoderamento dessas mulheres, sobre a necessidade do seu reconhecimento enquanto viventes da cidade – e não sobreviventes, por que se o nosso feminismo não puder falar sobre essas mulheres, então ele não nos serve. Somos �lhas de uma cidade que abandonou sua periferia e que custa a compreender a impo�ância que nós temos para o seu desenvolvimento econômico e que se assusta quando se esbarra no nosso poder político de transformações sociais. As escalas de segregação da mulher se apresentam desde o zoneamento das intervenções de melhoria urbana nos bairros – algumas mulheres estão mais seguras para chegar ou sair de suas casas, seja por iluminação da via pública ou demais condições de caminhabilidade -, ao programa e projeto de suas residências – que abarcam ou não o famigerado “qua�o de empregada”, ou locam áreas “tradicionalmente da mulher” em péssima posição em relação ao sol e

ventilação inadequada. Recentemente vimos algumas de nós comemorando o direito de saltar do ônibus fora do ponto após as 22h, mas será que é isso que queremos? Apesar de ser um passo impo�ante, queremos descer no ponto com segurança o su�ciente para chegarmos a nossas casas sem medo de sermos violentadas e não uma medida provisória que nada mais é do que admitir “não estamos seguras, não temos direito a essa cidade”. Para isso, vamos debater quais aspectos devem ser repensados para que o direito de vivencia da mulher seja garantido, entendendo que o empoderamento no espaço urbano vai muito além de ascensões individuas e refere-se ao coletivo. Precisamos, todas nós, independente de cor ou classe social, ter direito a uma vida digna, estruturada no que queremos ser e não no que alguém nos destinou. Não estamos mais dentro de nossas casas há muito tempo, estamos nas ruas, no mercado de trabalho, temos voz e vida.

Nessa Cidade: Cadê o black dela?

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Foto: Bruna Oliveira Foto: Bruna Oliveira

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Salvador é a capital com maior número de descendentes negros fora do continente africano. Cidade poética que traz em sua cultura fo�es heranças da sua essência negra, “Roma Negra” para uns, “Meca da Negritude” para tantos outros, ironicamente esta mesma cidade é também lugar de opressão ao povo negro e isso se torna legível quando analisada a sua distribuição no território soteropolitano. É possível constatar que os bairros onde estão concentrados os maiores percentuais de população negra são também os mais afastados dos centros de Salvador, áreas com grandes carências de infraestrutura urbana e menores ofe�as de opo�unidade. Indo além da divisão desigual do espaço urbano e das iniciativas de melhoria desses espaços, a falta de políticas de inserção social efetivas, que garantam educação e quali�cação pro�ssional, retira do negro o direito de entrada e permanência nos mesmos campos de trabalhos e por consequência estão condicionados a faixa salariais distintas. Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revela que o salário médio dos negros é em média 36,1% menor do que os trabalhadores não negros; Entre os tantos outros fatores de desigualdade que já foram apresentados. Ser negro só é bem quisto nas estratégias de marketing ou “branding urbano” da lógica contemporânea de consumo cultural. Uma “limpeza étnica” repressiva e maquiada, que acontece todos os dias, onde a cultura negra é negócio turístico, mercadoria, mais um objeto de “espetacularização da cidade”.

Entretanto quando se fala dos direitos civis da mulher e do homem negro tudo se torna um caso a pa�e de legitimidade a integridade física e moral. Como nós, arquitetos, urbanistas e cidadãos devemos operar nessa conjuntura? Iniciativas pontuais de coletivos militantes de negras e negros, dentro e fora das universidades tem tomado força. Em 2015 tivemos em Salvador eventos marcantes como a Marcha Internacional Contra o Genocídio do Povo Negro, a Marcha do Empoderamento Crespo e diversas iniciativas que deram visibilidade à luta. Muitas já foram às batalhas travadas e ganhas, mas ainda há muito o que se fazer. Construir mais políticas a�rmativas, discutir e conquistar essa cidade. É fato que a população negra se encontra em maioria e a apropriação dessa luta de representatividade é fundamental. Enquanto futuros arquitetos e urbanistas, cabe à nós, entender como essas disparidades se re�etem no território e buscar caminhos para o desenvolvimento de cidades socialmente mais justas, por que o traçado e as políticas de projeto também podem contribuir com a mudança deste cenário.

O lugar do Negro na cidade de Salvador

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Foto: Bruna Oliveira

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“Se o morro descer e não for carnaval, o povo virá de co�iço, alagado e favela mostrando a miséria sobre a passarela, sem a fantasia que sai no jornal, vai ser uma única escola, uma só bateria. Não tem órgão o�cial, nem governo, nem liga

nem autoridade que compre essa briga, ninguém sabe a força desse pessoal, melhor é o Poder devolver à esse povo a alegria , senão todo mundo vai sambar no

dia, em que o morro descer e não for carnaval.”

Wilson das Neves

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Foto: Maria João Filmes

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Na cidade da diversidade, em pleno momento de se rea�rmar quem é e de ter o direito de ser, percebe-se lados muito distintos de uma mesma realidade. Ainda que a lésbica, o gay, o bissexual, a pessoa trans*, intersexual ou quaisquer outros rótulos criados sejam mais comuns do que se possa imaginar, e mesmo que haja a violência sobre esses rótulos, Salvador tem algumas determinantes que decidem se essa pessoa será violentada ou não.

Ser branco ou preto é a principal delas. São tempos de empoderamento. Há um cenário fervilhando no espaço urbano: as gay, as bi, as tri estão tornando a tomar as ruas, antigos espaços estão voltando a existir. Claro que isso não signi�ca que são tempos felizes no todo e que não há violência. A violência existe sim e está presente nos detalhes mais simples do dia a dia de qualquer um. O olhar feio, o comentário maldoso, a agressão física e psicológica. Semanalmente temos casos registrados no Centro de Referência e Atendimento a LGBT, pa�e da Secretaria Municipal de Reparação – SEMUR. E é imprescindível lembrar-se e tornar fo�e o elo mais empoderado que existe, um ser tão surpreendente que assumiu a forma que quis e que acredita com toda a graça que esta é sua verdadeira cor. O cenário trans em Salvador, ainda que já exista diversas formas de apoio, ainda é o mais negligenciado inclusive dentro do próprio universo LGBTQ, com a invenção desses guetos que de nada servem.

Os números ainda são gritantes. Ser trans* é a forma mais poderosa de ser quem você é, e vivemos um momento em que estas pessoas são totalmente marginalizadas dentro do meio social. Já dentro do meio acadêmico vemos um desenrolar ainda muito tímido. Enquanto algumas instituições já carregam essa bandeira através de grupos e estudos avançados, outras simplesmente ignoram essa existência tão comum. Vemos em Salvador, de maneira geral e nos cursos de Arquitetura e Urbanismo, um alunado que pouco se impo�a com essa ou quaisquer outras questões sociais visto que a máquina de negócios chamada educação que eles sustentam não admite espaço para humanidades em geral. É preciso falar mais, gritar mais, se mostrar mais. Principalmente enquanto ser LBGTQ numa universidade em Salvador ainda for ser invisível. Precisamos discutir não somente sobre a violência, mas sobre a necessidade de rótulos, que se estende não só nesse caráter mas em todas as esferas do ser humano. O rótulo, o estereótipo, nunca poderão resumir ou a�rmar que alguém é algo e �m. Somos muito mais diversos e complexos do que uma palavra, e esse é o momento ce�o de iniciar esse debate. A�nal, eu posso ser uma cor só, como também posso ser todas as cores juntas e não há quem mude isso.

Por uma cidade onde os corpos sejam livres

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Em tempos em que ser diferente ainda incomoda e gera intolerância explícita, opressora, nós perguntamos “Qual a cor dessa cidade?” E esperamos que todos os envolvidos estejam abe�os à complexidade dessa

pergunta, tanto quanto a complexidade de se pensar em uma realidade

melhor, de cidadania digna.

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Referências

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