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ARENA PÚBLICA EM TORNO DA POLÍTICA INDIGENISTA NO BRASIL: AVANÇOS E RETROCESSOS

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ARENA PÚBLICA EM TORNO DA POLÍTICA INDIGENISTA NO BRASIL:

AVANÇOS E RETROCESSOS

Nara Lis Pimentel Gomes (IFB)

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RESUMO

Este artigo tem como objetivo apresentar os resultados de uma pesquisa avaliativa sobre a política indigenista no Brasil - particularmente no que concerne o seu processo de construção. O percurso metodológico empreendido pode ser definido como de matriz axiológica e alinhado ao pragmatismo, bem como ao pós-positivismo, ao assumir os valores, os argumentos e arena pública como material primordial de pesquisa. Neste sentido, a avaliação se volta à própria arena construída em torno da temática em questão, assumindo a sua própria dimensão valorativa e, portanto, política. Como objetivo avaliativo, buscou-se identificar os diferentes matizes de argumentos que estruturaram a arena ao longo do tempo, modelando o conjunto de instrumentos de políticas públicas que dela emergiram. Argumentos e valores foram reconstruídos a partir dos atores e de suas interações discursivas. Como resultado avaliativo, observou-se uma forte correlação entre altas disputas discursivas e baixa produção de instrumentos de políticas públicas. INTRODUÇÃO

Este artigo é fruto de um trabalho de conclusão de curso do Departamento de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de Brasília, concluído em julho do ano de 2018. A essência deste artigo surge a partir da experiência de ensino e extensão da matéria de Estudos Regionais do Instituto de Ciências Humanas, mais especificamente do Departamento de Geografia, conjuntamente com o Instituto de Biologia e a Faculdade de Educação, ambas também da Universidade de Brasília, que implementaram um expedição a Aldeia Taquara Guarani Kaiowá, localizada no estado de Mato Grosso.

Desde então o esboço de pesquisa monográfica ecoaram ao som do grito: Terra, Vida Justiça e Demarcação. Ainda que os caminhos metodológicos e teóricos tenham se modificado, os esforços foram sendo construído desde então, passando pelo que chamaremos de pré-pesquisa, estágio na Fundação Nacional do Índio no Centro de Formação em Políticas Indigenista e como Voluntária no Acampamento Terra Livre de 2017, bem como também da enriquecedora aula, ministrada pelo Prof. Mestre em Antropologia Felipe Tuxá, Cultura, Poder e Relações Raciais do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares.

1 Bacharela em Gestão de Políticas Públicas GPP/FACE/UnB. Graduanda em Gestão Pública pelo IFB. Especialista em Teoria Democrática, Políticas Públicas e Participação (UFMG). Bolsista EXP CNPq Escola Livre em Gestão Social. Graduanda em Gestão Pública pelo IFB. E-mail: naralispimentelgomes@gmail.com

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Do ponto de vista ontológico, esta interação para com o objeto de estudo se torna central, não só para o desenho da pesquisa, mas do ponto de vista pós-positivista, o posicionamento da/o autor/a também modifica a condução da pesquisa e seus resultados. Assim, para discutirmos sobre a política indigenista, uma área de políticas públicas tão complexa, é necessário se discutir concepções do que se compreende como políticas públicas, arenas públicas, problemas públicos, argumentos... Estes pontos são centrais do ponto de vista do arcabouço teórico metodológico, pós-positivista e pragmatista, concernido dentro do campo de estudos de políticas públicas.

Compreendendo que estes conceitos moldam de forma contínua o objetivo de estudo, o artigo está subdividido nas concepções conceituais (Esfera Pública e Arena Pública, Problemas Públicas, Questão Indígena, Argumentos e Política Pública); método e Teoria; Construção da história da Arena Pública; Compreendendo a Arena Pública da Política Indigenista; Resultados; e Conclusão . Foram utilizadas como instrumentos de pesquisa: Análise Bibliográfica, Entrevista em Profundidade com Roteiro, Análise Documental (incluindo áudio-visual) e por fim, Análise Cruzada. ESFERA PÚBLICA E ARENA PÚBLICA

Por meio do destrinchamento do que compreendemos da discussão de arena pública e esfera pública, trazendo por aqui e compreendendo o seu caráter formal e informal, sua interação estadocêntrica e, por fim, trazendo e (re)pensando a sua relação da esfera pública em que a gestão social (GS) contribui e tem contribuído, este trabalho se debruça em pensar a arena pública no âmbito da política indigenista. O campo em construção da gestão social tem abrido portas para a reflexividade sobre a gestão e em especial a sua orientação tão fortemente ligada ao conceito de esfera pública. Em que França filho (2008) define GS como:

Corresponde então ao modo de gestão próprio às organizações atuando num circuito que não é originariamente aquele do mercado e do Estado, muito embora estas organizações entretenham, em grande parte dos casos, relações com instituições privadas e públicas, através de variadas formas de parcerias para consecução de projetos. Este é o espaço próprio da chamada sociedade civil, portanto uma esfera

pública de ação que não é estatal. ( FRANÇA, 2008, p.3) ( Próprio grifo)

Do ponto de vista conceitual a esfera pública abre caminhos de se repensar o que vem se o espaço de força entre atores em que as cenas e os bastidores são tão importantes, ao repensar a esfera privada, em contraponto com uma esfera pública mais restritiva, tão criticadas por Teorias Feministas (PHILLIPS, 2011) ou ainda e de pesquisadores mais próximos das Teóricos das Deliberativas (FARIA, 2012), em suas críticas em especial a teoria deliberativa de a Jürgen Habermas.

A arena pública para de Daniel Cefaï (2017) em seu texto traduzido é “um lugar de exercício de ritos e mitos de instituição pelos quais são expressados, sublimados, formulados e encobertos alguns conflitos” (p.33). Apresentando de forma mais aprofundada, a arena pública pode ser compreendida na metáfora dramatúrgica como palco e, de certa forma, como espaço em dois momentos: em 2007 ele já dizia “uma arena pública é uma ‘constelação de cenas que se sobrepõem umas às outras, que abrem para bastidores de geometria variável, em que os graus de publicidade são determinados pelos enquadramentos dos atores e cujos auditórios mudam ao sabor das performances’. ” (CEFAÏ, 2007 apud IBIDEM, p. 36)

Assim, arena pública para Daniel Cefaï (2017) em seu texto traduzido é “um lugar de exercício de ritos e mitos de instituição pelos quais são expressados, sublimados, formulados e encobertos alguns conflitos” (p.33). Apresentando de forma mais aprofundada, a arena pública pode ser compreendida na metáfora dramatúrgica como palco e, de certa forma, como espaço em dois momentos: em 2007 ele já dizia “uma arena pública é uma ‘constelação de cenas que se sobrepõem umas às outras, que abrem para bastidores de geometria variável, em que os graus de publicidade são determinados pelos enquadramentos dos atores e cujos auditórios mudam ao sabor das performances’. ” (CEFAÏ, 2007 apud IBIDEM, p. 36)

PROBLEMAS PÚBLICAS

No que diz respeito a problemas públicos, como uma alternativa de análise dentro do campo de estudos de políticas públicas, pode ser mais ou menos compreendido a partir de sua coletividade em detrimento de seu aspecto individual, em especial no que concerne o surgimento do problema público. Para Dewey, em seu Livro “O Público e seus Problemas”, publicado em 1927, ele diferencia o que vem a ser público, como algo diferente de social principalmente pelas suas consequências indiretas, exemplificando com ações orientadas pela individualidade, que podem afetar uma comunidade inteira, ou parte dela, em detrimento da complexidade de transações.

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Para Boullosa (2017), o problema público leva em consideração os atores envolvidos em sua pluralidade e organização, tendo em vista que “o problema público é uma destas tantas interpretações possíveis que justificam diferentes mobilizações de atores” (p. 76). Enquanto em outras palavras para Cefaï, em seu artigo traduzido na Revista Novos Estudos, em 2017, Público, Problemas Públicos e Arenas Públicas, “problemas públicos são melhor vistos quando nos aproximamos dos movimentos sociais” (CEFAÏ, 2017 p. 31 apud MAUSS, 1975), reforçando ainda assim uma perspectiva relacional com arenas públicas, conceito por ele proposto, pois “problemas públicos se constituem, fazendo e desfazendo mundos sociais e as jurisdições em que venham a ser definidos, tratados, regulados, resolvidos. ” (CEFAÏ, 2017, p.32).

Reforça-se que, dentro desta perspectiva de problemas públicos, pragmatista e pós-positivista dentro do campo de estudos de políticas públicas, esta noção tem sido construída de forma que a predominância tem sido de uma visão sociocêntrica, ao reconhecer seus processos de formação para além do que a administração pública mais restrita, percebendo as organizações e mobilizações ao redor das políticas públicas e transações discursivas tão importantes para os processos de políticas públicas. Deste ponto de vista, circunstâncias de relevância de análise como a formação do público referente ao problema, neste trabalho sendo trazido a questão indígena como rede de problemas público relativo aos indígenas em sua coletividade e/ou em sua individualidade e também a seu, indissociável, processo de tornar-se público: publicização.

Pensa-se em função dos problemas públicos não só como aqueles construídos em seu meio social, mas também inerente ao coletivo e a esfera individual. Dessa forma, percebe-se que, ainda assim, existem problemas na arena pública da questão indígena que não se desenvolveram em função de resolução pela configurações de sua arena como será melhor trabalhada mais a frente.

QUESTÃO INDÍGENA

Dentro da perspectiva de problema público, que foi trabalhado nesta monografia, em um direcionamento pós-positivista e pragmatista dentro do campo de estudo das políticas públicas, o que podemos chamar de questão indígena se configura como uma rede articulada de problemas, que se relacionam com as/os indígenas, em suas individualidades e coletividades, que são percebidos como tal por diferentes públicos, em potencial sentimento de mobilização, ou seja, se sentiriam público, de tal rede de problemas. Tal percepção se fundamenta na compreensão dos efeitos indiretos que tais problemas recairiam sobre este público, inclusive em termos de valores morais e éticos.

Com esta compreensão, assumidos que a questão indígena no Brasil é parte de uma forma de “etiquetação”, que engloba, de certa forma holisticamente, temáticas indígenas com um todo, mas sobretudo como forma de problematização dos povos indígenas. Esta ampla “etiqueta” resulta de um processo de publicização (construção de público) descontínuo e muito variado. Com isto, reconhece-se como problemas públicos o que se considera coletivamente como problema público e em função de sua capacidade de formação de público, lembrando que parte desta descontinuidade e variabilidade resultam de um reconhecimento impreciso do mesmo por parte da agenda pública governamental, seja ela no executivo que no legislativo. De forma mais objetiva, dentro desta rede de problemas que caracteriza a questão indígena, podemos encontrar desde Relatório da ONU de 2014, quando foi colocado que as populações se sentiam pressionados a retomar seus territórios, ou até mesmo sobre a interferência do poder legislativo, sobre as políticas indigenistas no Brasil, em exemplo a PEC 215. Ainda nesta rede, encontramos temáticas que emergiram no contexto dos eventos Terra Livre de 20171 e 20182, particularmente em educação, saúde, cultura, demarcação, meio ambiente, gênero. Há ainda outras fontes importantes, como a produção do documentário Índio Cidadão? (2013), tanto em nível de representação política no legislativo, e até mesmo em nível argumentativo, quando se coloca um posicionamento anti-indígena, à exemplo dos Projetos de Lei e Emendas Constitucionais. Outros problemas são relatados em documentos oficiais do poder executivo federal, mais especificamente os Relatórios de Gestão dos anos em exercício de 2014, 2015 e 2016, além Relatório do TCU de 2016 referente a Fundação Nacional do Índio. Trata-se de problemas como: discriminação da população local para com os indígenas (FUNAI, 2016 p.86); falta de capacitação dos servidores da Funai (TCU, 2015, p.41), paralisação ou morosidades de processos administrativos (FUNAI, 2016, p.45), (FUNAI,2015, p. 66); judicialização (FUNAI, 2016, p.164), dentre outros problema público.

Ainda assim a crítica é válida. Quando se pensa a questão indígena, é trazido à tona diversos aspectos que, em sua essência, são semanticamente distantes de uma qualidade positiva, para o entrevistado 2 por exemplo, do que vem a ser “indígena” ou mesmo coletivamente, indígenas ou povos indígenas . Esta lógica tem suas raízes, passando em um primeiro momento, pela lógica integracionista da destruição da alteridade, preconceitos e discriminações, podendo, até mesmo, ser apropriado de forma racista e xenofóbica ao definir que certos problemas são referentes à indígenas e outros não. Ou ainda, pode ter uma tentativa de unificar em torno de uma palavra o que existe uma diversificação infindável, como colocado pelo entrevistado quatro, de espectro do que pode ser reconhecido socialmente como problema.

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Esta rede de problemas, portanto, não possui uma delimitação de fronteiras evidente (e isto não se apoia somente na diversidade das populações indígenas brasileiras em diferentes biomas em regiões politicamente construídas diferentes), mas, de uma forma, parece apontar para uma certa delimitação quanto a natureza das suas formas, como utilizam seus repertórios de argumentos para defender suas pautas, haja visto a correlação com temas diversos que se aglomeram e se inter-relacionam em outras arenas. Assim como nos instrumentos de políticas públicos referentes a cada grande temática (saúde, educação, cultura, etc), requer-se um tipo de expertise e mobilização diferenciada a nível municipal, estadual e federal em cada região do país.

Observadas, assim, do ponto de vista da natureza dos problemas que compõem esta rede imprecisa e viva de problemas, toda a rede aponta, de alguma forma, para a insuficiência de reconhecimento público de suas partes, bem como dela como um todo. Em outras palavras, todo o conjunto de problemas ali contidos, e os que ainda virão a ser contidos, em tal rede que é a própria questão indígena passa aqui a ser interpretada como a própria falta de reconhecimento do status de público do problema, ou, nas palavras de John Dewey, simplesmente de “público”. A

questão indígena neste trabalho, portanto, refere-se às suas próprias dinâmicas de publicização, ou mesmo, de “não publicização” ou de

extrema dificuldade de reconhecimento do status de público desta rede de problemas.

Diante desta construção mais teórica, o objetivo deste trabalho é compreender possíveis correlações entre as dinâmicas da sua arena pública e os instrumentos de políticas públicas que dela emergiram, bem como os seus desafios da publicização que permeia a questão indígena no Brasil. Esperando-se que, assim, possa-se contribuir para fortalecimento de seus próprios processos, ainda pouco densos de problematização, no contexto do campo de estudos das políticas públicas.

ARGUMENTOS E POLÍTICA PÚBLICA

A abordagem metodológica que se desenhou aqui tem um olhar cuidadoso com os processos de atorialização em torno de uma rede de problemas públicos, em sua arena pública, aqui compreendido como questão indígena em que as políticas públicas são vistas como argumentos. Há muitos modos de compreender o que são políticas públicas, mas, neste trabalho, adotamos a proposta de Frank Fischer, que compreende políticas públicas como um conjunto de argumentos [...](FISCHER, 2016). Para isto, ele se apoia no próprio conceito de argumento de Majone (apud FISCHER, 2016, p. 174) como sendo “tipicamente uma mistura complexa de declarações factuais, interpretações, opinião e avaliação”, que vão modelar e ser modelado por dados e informações, apontando para a necessidade em problematizar as conexões entre as normas sociais e julgamentos interpretativos e dados empíricos. (FISCHER, 2016).

À propósito, estes argumentos são mais do que racionalmente construídos, pois também são construídos a partir da experiência. Tratam-se de argumentos carregados de valores e disputados por atores que podem ou não influenciar Tratam-seus instrumentos, assim como o define em sua via de ação política. Desta forma, aqui, consiste além do que o governo decide fazer, mas abrange também o que ele deixa de fazer dentro de uma perspectiva decisional (DYE, 1972, p.1 apud BULLOSA 2013, p.72).

A partir desta assunção teórica, buscou-se apresentar uma breve reconstrução da política pública indigenista brasileira como uma história de argumentos, colocando a atenção sobre os valores que ensejam tais argumentos. Esta reconstrução se dará em duas direções complementares: nos argumentos presentes na literatura; e nos argumentos que emergiram nas entrevistas em profundidade realizadas. Ao final do capítulo, será a apresentada uma síntese da confluência do conjunto dos argumentos mapeados.

Dentro da perspectiva da política pública indigenista, o indigenismo carrega em sua discussão o cerne do que, como campo de estudo de políticas públicas, tem sido discutido ao longo do último século, e no Brasil, em especial nos últimos anos no que tange à centralidade ou não centralidade do Estado como promotor de ações direcionadas às populações indígenas . Entende-se como ação, assim, existem críticas da centralidade do Estado e como movimento social, Favre (1998), discute-se se é ciência e a sua ontologia. Desta forma, em uma perspectiva histórica, Favre (1998) identifica uma vinculação ao indigenismo no Brasil com uma forte correlação com as ações do Estado e menos vinculado aos próprios movimentos indígenas. Essa percepção aparece com clareza no livro Del indigenismo ao indianismo, de Gnerre e Bottasso (1986). Estes autores criticam o assistencialismo e passam a defender a importância do empoderamento das populações indígenas e dos seus movimentos.

Portanto, o Indigenismo tem sua importância dentro da análise da política pública indigenista, na perspectiva já posta, em direcionamento pós-positivista e pragmatista. Por trazer além do tradicional ação do Estado, pode em sua construção trazer aspectos supra governamentais e de aspectos políticos em um nível de ação e argumentação.

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Para (FAVRE, 1998, p. 7):

O indigenismo na América Latina, é para começar, uma corrente de opinião favorável aos indígenas. Se manifesta em torno da posição que tendem a proteger as populações indígenas e defendê-las das injustiças que são vítimas e fazer valer as qualidades ou atributos que se reconhecem. (Traduzido pela própria autora). (FAVRE, 1998, p. 7)

Se, para Favre (1998), o indigenismo pode se assemelhar a um movimento político, para Melo (2009, p.), o indigenismo seria “mais do que um conjunto de ideias, [pois] consiste em formas de ações, políticas e práticas, consubstanciadas nos atos, decretos, planos programas e projetos”, chegando, portanto, ao campo das políticas públicas.

Ambas as posições parecem assumir a centralidade do Estado nos processos políticas públicas para os indígenas. Posição diferente é possível de ser encontrada em Ramos (1998, p. 6), junto a outros autores que limitam o indigenismo à dominante política oficial relacionada às populações indígenas, afirmando, com Souza Lima, que indigenismo para ele concerne em “um conjunto de ideias preocupadas com a incorporação de povos indígenas nos Estados-nacionais” (tradução e grifo próprio). E assim, por reverberação da negação do indigenismo, o indianismo se mostra como uma visão diferencia-se das demais pela centralidade na população indígena na definição de suas próprias ações. A ideia aqui passa a ser incorporar uma camada excluída da população no interior do estado, que deveria, em princípio, ocupar-se também dela mesma.

Desta forma, esta diferenciação entre da abordagem indígena da abordagem indigenista também apareceu com clareza nas entrevistas, seja no que concerne à dimensão das políticas públicas, seja à dimensão do movimento social, como explicitado no capítulo anterior sobre o conceito de publicização.

Ainda explicando o indigenismo, Marroquín (1972 apud Gnerre e Bottasso, 1986 p. 13) afirma que:

Têm objetivos de serviço geral e de preservação; consolida o desenvolvimento da quantidade de poder que os grupos indígenas conquistaram. Como todas as políticas, o indigenismo deve apoiar-se (e de fato se apóia) em muitas ciências. ” (Traduzido pela própria autora)

Ainda assim, mais do que colocar que o indigenismo não é necessariamente um movimento, representa unicamente o pensamento indígena, por outro lado “ o indigenismo arrasta a má consciência que os conquistadores europeus [...] sentem frente aos índios”, assim, pode-se observar uma disputa tanto em nível de argumento como de ação, mostrando indícios de uma arena, entendida como de políticas públicas. MÉTODO E TEORIA

Método e teoria são indissociáveis. A partir desta compreensão, é importante ressaltar que esta pesquisa foi desenhada e conduzida no marco teórico metodológico do pragmatismo estudado no Grupo de Pesquisa Processos de Inovação e aprendizagem em Políticas Públicas e Gestão Social (PIAPPGS), do qual esta autora faz parte desde março de 2017. O pragmatismo é uma corrente filosófica do começo do século XX, nascida nos Estados Unidos da América, e apoiada, sobretudo, em John Dewey, Willian James, George Mead, além de Charles S. Pierce. Dentre estes, porém, para o nosso campo de estudo, o das políticas públicas, Dewey adquire maior importância devido ao seu livro seminal intitulado O Público e Seus Problemas. Não obstante, o campo se desenvolve de uma maneira bastante diferente do que propunha Dewey (BOULLOSA, 2013), o que explicaria a versão “pragmatista” da análise racional de políticas públicas, da qual este trabalho se distancia.

Assim, o pragmatismo que se apoia este trabalho, é um pragmatismo que volta às suas origens, sobretudo no que concerne a noção de público, segundo la sociologia francesa , como foi recuperado a partir dos anos 80.

Esta pesquisa é de natureza eminentemente qualitativa. A metodologia utilizada parte de uma análise qualitativa e de tipologia descritiva e explicativa, utilizando técnicas de pesquisa documental (escritas primárias), entrevistas não estruturadas, documentos secundários de pesquisas auxiliares e relatórios de organizações da sociedade civil nacionais e internacionais dos últimos anos, também considerando pesquisas acadêmicas, além de utilização a bibliografias que tenham relação com o campo de políticas públicas.

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Dentro da perspectiva pragmatista, a metodologia é estruturada na mesma direção da teoria, não se objetiva analisar de forma a se pensar como um conhecimento puro, em que as experiências não constroem puramente o que entendemos como verdade, mas sim se posicionar a partir da perspectiva da pesquisadora, dentro de um contexto, já explicitado, pós- positivista no campo de políticas públicas. Mais do que perceber o pragmatismo como método, é perceber que a busca por uma verdade única vindo de atores específicos, vai em contraponto da diversidade e da construção do conhecimento social, político e economicamente construído. Ainda assim, o que é valorizado é a experiência, e neste sentido pensa-se em passos de pesquisa, que aqui são entendidos como objetivos específicos.

O instrumento “análise bibliográfica” consiste na análise sistematizada sobre “toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo” (LAKATOS, MARCONI, 2003, p. 182). Nesta pesquisa, as fontes utilizadas foram tratadas a partir de um mapeamento inicial, considerando a relevância em relação ao conteúdo, relativo a construção da pergunta de pesquisa, bem como também a acessibilidade destes materiais e a possibilidade de leitura, tendo em vista a quantidade de textos que não se encontravam em língua portuguesa. Este mapeamento se deu a partir dos acervos da Biblioteca do Centro de Formação em Políticas Indigenista da Fundação Nacional do Índio, do portal de Periódicos da Capes, da Biblioteca Central da Universidade de Brasília, bem como da literatura trabalhada no Grupo de Pesquisa PIAPPGS, relativa ao aprofundamento dos aportes teóricos desta pesquisa. Foram ainda considerados como documentos secundários: o documentário Índio Cidadão? (2014), documentos do CIMI, em especial o Relatório de Violências contra os povos indígenas no Brasil - dados de 2016 (CIMI, 2017), Relatório da Missão ao Brasil da Relatoria Especial da ONU sobre os Direitos dos Povos indígenas (ONU, 2014).

O instrumento análise documental consiste em na análise sistematizada e orientada sobre documentos que interessam à pesquisa (LAKATOS, MARCONI, 2003, p. 174). São exemplo de documentos de fonte primárias Documentos finais do Acampamento Terra Livre de 2017, Relatórios de gestão da FUNAI, nos anos de execução 2014, 2015 e 2016. D, como o documentário Índio Cidadão? (2014), documentos do CIMI, em especial o Relatório de Violências contra os povos indígenas no Brasil - dados de 2016 (CIMI, 2017), Relatório da Missão ao Brasil da Relatoria Especial da ONU sobre os Direitos dos Povos indígenas (ONU, 2014).

Já o instrumento “entrevistas em profundidade” está voltado para a “obtenção de informações do entrevistado, sobre determinado assunto ou problema. ” (LAKATOS, MARCONI, 2003, p. 195). O objetivo destas entrevistas, portanto, foi mapear os argumentos que estivessem em diálogo relativo política indigenista e a questão indígena, assim como de acordo com pragmatismo, visando construir a história das políticas públicas indígenas a partir de visões de quem uma relação vivencial com a política indigenista, movimento indigenista e indígenas e suas interações com o Estado.

Foram entrevistadas cinco pessoas, com uma duração média de 40 minutos, que tiveram relação profissional com a política indigenista, tanto em nível de governo federal quanto a nível de organizações sociais que se vinculam a arena de política indigenista ,em que todas as entrevistas foram realizadas no ano de 2018, mais especificamente no mês de junho em Brasília. Um estudo prévio do roteiro permitiu que se

tivesse liberdade sobre o mesmo, e que as entrevistas alcancem a subjetividade dos entrevistados, em função da importância metodológica pragmática nos diferentes tipos de conhecimentos sociais.

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Quadro 1- Roteiro de Entrevista Semi-estruturadas

1. Por favor, poderia se apresentar e contar um pouquinho da sua história com a questão indígena no Brasil?

2. Utilizei a expressão questão indígena , mas gostaria de saber o que você acha dela. Você acha uma expressão correta ou tem alguma outra com a qual você se identifique mais?

3. Estou tentando entender a história da construção da política indigenista no Brasil. Você poderia me ajudar me contando como você enxerga tal história ? Então é possível dizer que temos, hoje , mais de um pensamento em disputa na arena indígena? Se sim, quais seriam estes? Você poderia me explicar melhor ?

4. Em sua narrativa , percebi que em alguns momentos (….)parecia que a coisa ia começar a andar . É isto mesmo? 5. Você acha que podemos falar de avanços e retrocessos, continuamente?

i. Se sim, porque você acha que isto acontece?

6. Qual foi o momento que você mais ficou satisfeita/o neste percurso da política indigenista?

7. Com isto, você acha que podemos dizer que a questão indígena tem relevância pública ? Tem quem construa e discuta suas pautas, mesmo na discordância ?

8. Como você enxerga o futuro desta questão no Brasil hoje? Sei que é muito vasto, tem o problema da demarcação, do genocídio histórico dos povos indígenas, da integração nacional, mas como você vê tudo isto? Tem algum tema que você ache que será mais importante que os demais a médio-prazo?

9. Por último, quais os atores , individuais ou sociais, que você acha que são mais importantes para se entender hoje a questão indígena?

Fonte: Própria autoria

Pôde-se, assim, observar pontos nas narrativas dos entrevistados que sobre a questão indígena e política indigenista no Brasil, bem como argumentos em/de políticas públicas em disputa, atores envolvidos e a formação desta arena. Mais do que isso, observar avanços e retrocessos dessa política em função da sua arena pública.

Quadro 2 - Entrevistados

Nº Posição Vínculo Observação Geral

1

Política cultural e saberes tradicionais- interface com

questão indígena - Visão a partir dos saberes e mais próximo à política cultural Ent_1

2 Membro Instituto Socioambiental Visão sobre a política indigenista e a história recente e atores sociais Ent_2

3 Consultor - Política de Saúde - Conhecimento e vivência de gestão e sobre a política de saúde indígena Ent_3

4 Servidor PúblicoFUNAI FUNAI Visão a partir da gestão, olhar sobre processos administrativo e judiciais Ent_4

5 Consultora/ antropóloga FAO Visão sobre a educação indígena e atores sociais Ent_5 Fonte: Própria autoria

COMPREENDENDO A ARENA PÚBLICA DA POLÍTICA INDIGENISTA

Quando neste trabalho se pensa a arena pública em torno da questão indígena. A partir das questões indígenas, já com recortes definido neste trabalho, é necessário em primeiro momento compreender seu devido ponto de recorte, o período histórico, o que engloba a arena de política indigenista, o seu público e seu processo de publicização. A arena pública da política indigenista na perspectiva brasileira precisa ser encarada em suas bases de colonização e seus processos (não)dialógicos com as populações indígenas e em consonância com o indigenismo.

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A partir da construção dos argumentos por meio do indigenismo, já se demonstra uma construção de uma arena pública por meio dos argumentos da política indigenista, na América Latina e no Brasil, em especial, no que se compreende o público engajado indigenista. Na arena da política indigenista ,observa-se a formação de públicos distintos, especificamente cinco.

O primeiro público é composto pelos próprios afetados, os/as indígenas, em toda sua diversidade regional, diversidade cultural, de saberes diversos, e de coletivamente organizada e também diferenciada, assim como tantas outras variáveis, que torna a etiqueta indígena quase insuficiente para a importância e centralidade como público.

O segundo, além dos indígenas, perpassa, os indigenistas, os quais são não-indígenas, brancos, negros, pardos, asiáticos, engajados em pautas indígenas. Englobam tanto em nível de organização e coletivos quanto personificados e, que do ponto de vista dos argumentos, se por um lado pode ser visto como aliado as pautas da questão indígena por outro, nesse processo tão árduo de colonização práticas, valores e discursos, passam a ser desafios a serem superados.

Em terceiro plano os integracionistas, que têm como objetivo integrar/civilizar os indígenas, em uma percepção que o “estado” de índio é transitório e deve ser extinto a longo/médio prazo. Os integracionistas em primeira vista podem ser facilmente confundidos com os indigenistas, ou vezes por genocidas, por isso os argumentos utilizados têm como ponto central de diferenciação, assim como suas pŕaticas.

O quarto é o público genocida, o qual enxerga que o indígena, pessoa ou grupo étnico, deva ser exterminado. Por mais que em um Estado democrático talvez esse tipo de grupos pareçam ser fora do padrão, ou pelo menos criminoso, esse grupo faz com que a arena da política indigenista tenha configurações extremamente peculiares, não só por comumente se utilizar de práticas argumentativas próximas aos integracionistas, mas pelas práticas de como esses grupos interagem na arena pública

Em quinto e em último o público não-especializado, o qual se configura com um público mais distante da realidade e pautas das questões indígenas, em que tem um papel fundamental no que tange a opinião pública justamente por ser um público genérico de grande quantidade, os quais acessos as pautas são mediados.

Assim, mais do que a etiqueta de público colocada aqui para se modelizar o público em torno da questão indígena, os públicos se consolidaram também em função dos seus atores e atrizes, alinham-se em função da percepção do problema e formas de ação coletivamente constituídas. CONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA DA ARENA PÚBLICA.

Do ponto de vista da arena pública em torno da política indigenista, pelo viés de problemas públicas pragmatista, já destrinchado na subseção de métodos, a questão indígena se torna central por ser um nó da análise que correlaciona a arena pública com a política indigenista. Se por um lado a rede de problemas relacionadas às/aos indígenas é atorializada e passa por um processo de formação de público, por outro, a política indígena segue em consonância com as disputas discursivas construídas em sua historicidade.

Neste ponto, traz-se como fundamental a demonstração da arena pública da política indigenista no Brasil desde seu processo de formação a nível nacional. Ainda que diversos registros mostrem como os povos indígenas, desde o Brasil Colonial, tenham sido atores de arenas públicas regionalizadas e de processos históricos muito relevantes, foi a partir da década de 60 que o movimento em nível nacional passou a se mostrar com expressividade, como explicita Gohn (2011) em movimentos sociais no Brasil, não só do ponto de vista indígena.

Neste momento, a arena pública se configurava em um órgão estruturado nos seios da ditadura militar brasileira, em 1967 a Fundação Nacional do Índio passou a ser o órgão responsável pelas demandas indígenas substituindo o antigo Sistema de Proteção dos Índios. Mais do que a criação do aparato administrativo, alguns indícios de como se configurava a arena pública se mostrou em Melo (2009), que desde antes deste momento a o público indigenista a nível internacional têm sido atores importantes para pautar e questão indígena. No caso específico, escândalos de exploração infantil indígena, dentre outros escandalos, foram fundamentais para que se fosse estruturado um órgão que, assim como o indigenismo, leva “ a má consciência que os conquistadores europeus [...] sentem frente aos índios”.

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Se a criação do órgão foi sintomático para uma compreender que a opinião internacional tem um papel na arena pública da política indigenista por outro, em contexto ditatorial, os casos de tortura prisão e “subversão” não foram exclusivos das populações negras e pobres no Brasil. Junqueira e Paiva (1967) já citava o Estatuto do Índio como material de subversão e, como não posterior a publicação, autora que foi exilada política até sua anistia. No Relatŕoio da Verdade, para a entrevistada 5, indica o número de mortos no período da Ditadura demonstram que compor uma arena como essa poderia custar anos de prisão, tortura ou até mesmo vida de seus atores e atrizes, o que deixou os principais afetados, com a maior centralidade de atuarem diretamente, nesta arena juntamente com organizações. Segundo os dizeres da entrevistada 5:

Garantir proteção contra o extermínio físico, mesmo assim muito relativo, porque em vários lugares, como [...] agora tem ai o Relatório Figueiredo, que é o relatório da Comissão Nacional da Verdade, da época de Vargas até o final da Ditadura, que você vê que tem várias estratégias que são as mesmas está tudo convivendo, a do século XVI e XVII e século XVIII, XIX e século XX. (Entrevistada 5)

Mais do que notar a consistência de direcionamentos de argumentos de políticas que se perpetuaram no tempo, na fala da Entrevistada 5, é compreender o quão grave era o cenário da política indigenista no período, ou ainda a dicotomia do considerado avanço com o processo de redemocratização e em seu reflexo no texto constitucional

No processo de redemocratização, a arena pública foi muito direcionada ao novo marco constitucional, em que diversos pontos foram vistos como avanços, e mais do que os vitórias nas disputas política e também discursivas em forma de lei, a arena pública esteve fortalecida, primeiro pelo em nível representativo em que Ailton Krenak foi um dos representantes dos povos indígenas na constituinte (SIQUEIRA, 2014), e o único parlamentar indígena a compor o quadro da Assembléia Nacional Constituinte e até 2019 único representante indígena eleito para ocupar cadeiras no legislativo brasileiro a nível nacional.

Para o entrevistado 2 foi o momento mais importante e de maior avanço para os povos indígenas na história recente, por quebrar o paradigma da tutela do estado para com o indígena para o Entrevistada 2. Para os Entrevistados 2 e 4 e 5 foi com o avanço da vitória do ponto de vista de direitos indígenas referentes à constituição, quando se assume o Estado nacional pluriétnico e/ou multicultural. Enquanto na fala da entrevistada 5,” Inaugura a possibilidade de políticas específicas para os povos indígenas”. Desta forma, é um momento de avanço nesta história de política indigenista que tem mais do que palavras escritas em um papel em forma de lei.

Um ponto muito importante para compreender a política indigenista do Brasil é compreender que a demarcação de terras indígenas tem uma centralidade no que tange os discursos e na arena pública indigenista e em especial é um instrumento de política pública e na defesa da sua implementação. Dessa forma, o principal indicador de avanço e retrocessos é a própria demarcação de terra indígena, como visto no Relatório Violência contra os povos indígenas no Brasil (CIMI,2016), ou ainda na fala do Entrevistado 4:

A questão mais fundamental é sempre territorial, claro que quando a gente está falando de territorial é difícil, uma questão de licenciamento é territorial, por excelência, ta mexendo com a área da pessoa, para os povos indígenas, você não tem essa diferença entre a vida e a cultura, é até estranho se compartimentalizar essas coisas, a vida é terra.

Nos momentos pós-constituinte, após a euforia, não trivial, a “rebarba” foi uma continuidade de responsabilidades da questão indígena nos poderes militarizados, em especial o exército, neste sentido em uma continuidade de práticas dos governos da ditadura militar, trazida pelo entrevistado 2, como recorrente nas falas indígenas naquele momento.

A possibilidade de mobilização indígena após a constituição passa a ser de menor vulnerabilidade por meio da garantia de mobilização, e organização indígena, diminuindo a ideia de tutela, ou como a Entrevistada 5 coloca:

A partir da Constituição de 1988 inaugura, a possibilidade de políticas específicas para os povos indígenas e, também com a constituição de 88, uma coisa importante é que os indígenas passam a ser atores que podem ingressar judicialmente pelos seus direitos, então a ideia do relativamente incapaz[..] se a gente olhar no nível mais macro, tem uma mudança no momento em que eles mesmos podem interessar, são tidos como sujeitos de direito, como a gente, e cabe o Estado reconhecer.

As formas de organização se potencializam e, dentro deste contexto, argumentos ambientalistas agregaram fortemente a arena pública, em especial representada e construída na e para a ECO 92. Momento que para o entrevistado 2, de avanços pelo número, em comparativo, muito alto, como também demonstrado pelo CIMI (2016).

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Assim, A principal característica que foi observada nesta arena é a sua especialização, não obstante tenha se pluralizado um pouco em sua trajetória. Não se percebe, portanto, em seu processo histórico de publicização, uma difusão pública dos argumentos que os públicos indígenas e indigenistas especializados utilizam em seu cotidiano público. Os entrevistados, quando questionados sobre a relevância pública dos problemas públicos que conformam a questão indígena, posicionam-se, inicialmente, como de alta relevância. No entanto, em suas narrativas, transbordaram casos de crianças, prefeitos, ministros de Estado, presidentes da FUNAI, professores, além do público mais geral, que não compartilhavam de tal importância, pois os valores presentes em suas atitudes, falas e ações divergiam da gramática de justificação dos públicos indígena e indigenistas no que concernia ao suposto reconhecimento da dimensão pública de seus problemas.

Quadro 3- Homologação de Terras indígenas por gestão presidencial

Governo Período Nº de homologação Média Anual

José Sarney 1985-1990 67 13

Fernando Collor de Melo Jan. 1991- Set. 1992 112 56

Itamar Franco Out. 1992 - Dez. 1994 18 9

Fernando Henrique Cardoso 1995-2002 145 18

Luiz Inácio Lula da Silva 2003-2010 79 10

Dilma Rousseff Jan. 2011 - Ago. 2016 21 5,25

Michel Temer Ago. 2016 - Dez 2016 0 0

Fonte: Relatório Violência contra os povos indígenas no Brasil Dados de 2016. CIMI, 2016.

Para a arena pública da política indigenista, neste momento além da arena ser agregada fortemente por um público indigenista vinculada com a temática ambiental, os processos de justificação por meio de argumentos é alinhada com o com ideias aproximadas a sustentabilidade, biodiversidade e conservação ambiental.

Por mais que as práticas das comunidades indígenas sejam práticas de sustentabilidade e de preservação do meio ambiente em diversos povos, não só a partir da década de 90, neste momento foi muito construído mais fortemente. Conjuntamente com indigenistas ambientalistas, a opinião pública internacional teve, para o entrevistado 2, pelo processo de abertura comercial do mercado brasileiro foi um dos influenciadores para o aumento das demarcações de terras indígenas.

Já mais adiante, na segunda metade da década de 90, do ponto de vista dos instrumentos de políticas públicas, para os entrevistados 4 e 5 foram redesenhados, e repensadas coletivamente, em especial nas áreas de saúde, educação e cultura. Principalmente no segundo governo do Fernando Henrique Cardoso, do Partido Social Democrata Brasileiro (PSDB) e, posteriormente, mais instrumentalizado e com mais processos de gestão estruturados no primeiro Governo do Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT).

Nos governos Lula, em especial no primeiro, assim como no FHC os discursos de avanço são vistos com um considerável avanço, no que tange o fortalecimento de estruturas federalizadas, para tratar questões indígenas. Em especial nas falas dos entrevistado 1, 3 e 5, o desenho do Subsistema de Saúde Indígena, a Secretaria que a educação escolar indígena, no Ministério da Saúde, na SECADI, no Ministério da Educação.. Mais do que as partes responsáveis em cada órgão federal, do ponto de vista da arena pública, o contexto de criação e pressão para a criação se tornam muito relevantes dentro desse contexto de políticas públicas. No que tange, argumentos sobre avanços desse momento. pode se observar as seguintes falas dos entrevistados:

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Quadro 4- Avanços segundo os Entrevistados (1998-2004)

Tema Trecho Entrevistado

Saúde 99, 2000, 2001, os tempos que fiquei em áreas assim, foi muito fantástico, tanto localmente. [..]Meu conhecimento é fragmentado na área da saúde, acho que houve um avanço muito grande mesmo na

questão dos índices de saúde mesmo. Entrevistado 3

Terra

No momento atual, onde você reduz as parcerias internacionais: já houve mais dinheiro, já houve mais investimento, já houve mais preocupação, quanto menos dinheiro eles estão colocando, menos significativo é qualquer oposição que eles tenham, enfim você está vendo aí, crescendo os grupos de interesse por questão do arrendamento da terra indígena, da mineração em terra indígena, uma série

Entrevistado 4

Educação

São as licenciaturas do nível superior, ela é de final de 90, para 2000 já,[...]que já tinha comissão nacional de professores indígenas em 2004 que era uma comissão atuante no conselho nacional de educação com parecerista já.

Pensando os currículos, os anos 2000 já era caracterizado pela formação por ter bases curriculares e parâmetros curriculares para os povos indígenas, já é uma virada de uma outra compreensão do conteúdo na escola, e isso tudo em resposta da pressão do movimento indígena, e a demanda dos povos indígenas para uma escolarização que não seja destruidora da sua capacidade de manutenção da sua cultura

Entrevistada 5

Fonte: Própria autoria

Por outro lado, as nuances da perspectiva de avanços não são os únicos, se por um lado, no Documentário Índio Cidadão?(2014), a fala da liderança indígena de Valdelice Veron, guarani kaiowá do Mato Grosso do Sul, demonstra que dentro de um panorama de implementação de instrumentos de políticas públicas, e até mesmo no processo de desenhar os instrumentos, existem lapsos que que precisam ser melhor estudados. Por outro lado, há também casos que refletem uma história de sucesso, como o contado em “ Índios de papel: Etnicidade e associativismo frente a grandes projetos de desenvolvimento no Espírito Santo”, em que os interesses dos povos indígenas da região em alinhamento em uma conjuntura possibilitou arranjos políticos, culturais econômicos e sociais que para eles se mostrou favorável.

A arena pública da política indigenista neste momento se densifica, sendo agregada pelos novos vínculos das políticas de cuidados dos povos indígenas, com foi o caso do entrevistado(qual entrevistado) que trabalho diretamente na Criação da SESAI, entrevistado 3, ou ainda o entrevistado 4, que comenta em sua formação não ter tido tanta atividade em questões relacionadas a temáticas indígenas, mas que pela sua formação de antropólogo o mercado de trabalho se abriu neste direcionamento.

Após os governos Lula, a caracterização do Governo Dilma se deu pela tônica de retrocesso. Com a continuação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é a baixíssima taxa de demarcação de terras indígenas, como indicado no anterior Quadro Homologação de Terras indígenas por gestão presidencial do Relatório Violência contra os povos indígenas no Brasil Dados de 2016 (CIMI,2016).

Outro indicador recorrente na arena da política indigenista nas falas dos entrevistados 5 e 4 são as grandes obras implementadas nos governos Dilma. Percebe-se pelo documento final do Acampamento Terra Livre de 2013, uma mobilização de atores indigenista/genocidas, que se utilizam de instrumentos variados:

Para atingir os objetivos de ocupar e explorar os territórios indígenas, esses poderes econômicos e políticos aliados com setores do governo e da base parlamentar recorrem a instrumentos político-administrativos, jurídicos, judiciais e legislativos, conforme identificamos abaixo. (ATL, 2013) Com a chegada do Governo Temer (2016 - 2018) essa dimensão de retroceso se tornou ainda mais delineada. Para o Entrevistado 4, forte evidência é encontrada na diminuição dos recursos para este setor de políticas públicas, inclusive daqueles oriundos da cooperação internacional. Ainda, o entrevistado 4 dimensiona o retrocesso em comparação dizendo que: “se o governo Dilma foi ruim, o governo Temer foi ainda pior”. Ou ainda representado pelo entrevistado 1:

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Agora com esse corte, não sei como que vai ser, mas por outro lado, é um segmento que é muito aguerrido, e que tem um poder e uma capilaridade, um movimento estruturado, assim profundamente, muito bem estruturado, muito bem com as divisões de funções, hierarquias e pessoas muito atuantes. (Entrevistado 1)

A entrevista demonstra não só a noção de retrocesso observada. é salientada pelo entrevistado, mas também como os atores indígenas e indigenistas passaram a reconfigurar a arena pública com mais densidade, situadas em um cenário de contornos de retrocessos amplificados. Essa perspectiva se soma ao relatório final do Acampamento Terra Livre, em especial no trecho:

Completados 30 anos da Constituição Federal de 1988, que consagrou a natureza pluriétnica do Estado brasileiro, os povos indígenas do Brasil vivem o cenário mais grave de ataques aos seus direitos desde a redemocratização do país. Condenamos veementemente a falência da política 34 indigenista, efetivada mediante o desmonte deliberado e a instrumentalização política das instituições e das ações que o Poder Público tem o dever de garantir. (ATL, 2017 próprio grifo)

Emerge, então, uma trajetória que parece caminhar para a confirmação de uma perspectiva de retrocesso. Em especial, destaca-se o último nível, em que os instrumentos de políticas indigenistas, como o PAA (Escrever o que é PPA) para comunidades indígenas e o Conselho Nacional de Política Indigenista, foram instintos ou desestruturados, como são os casos das ações no Ministério da Cultura e Saúde (entrevistados 1 e 3). Estas observações são já possíveis de serem feitas, mesmo que alguns de seus impactos não possam ser avaliados tão profundamente pela proximidade temporal.

A política indigenista no Brasil vem sendo construída a partir de argumentos predominantemente integracionistas, com a emergência, mais recentemente, de argumentos pluriétnicos. Este conjunto de argumentos são ativados no contexto de uma arena razoavelmente diversificada de atores, que mostrou possuir uma organicidade maleável, possibilitando sua continuidade no tempo. Nesta arena, circulam atores que são indivíduos, organizações formais, organizações informais, movimentos nacionais, movimentos regionais, indígenas e não-indígenas, atores internacionais, movimentos sociais rurais, dentre outros.

A reconstrução da política indígena no Brasil foi marcada por avanços e retrocessos que a fazem parecer “morosa”, quando observada em perspectiva histórica. Os problemas públicos que conformam suas arenas dificilmente conseguem sair da esfera do interesse especializado, dificultando os processos de formação de público e, portanto, no sentido deweyano, de reconhecimento da qualidade de público para com os problemas que estruturam tais arenas, como um círculo vicioso e não virtuoso.

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Figura 1 -Redirecionamento da política indigenista

Legenda: IPPs- Instrumentos de políticas públicas, PP- Políticas públicas Fonte: Própria autoria

Percebe-se, contudo, que os retrocessos, em uma perspectiva de políticas indigenistas, são uma constante, como ilustrado pela Figura 3, e, que se os avanços foram poucos os retrocessos foram consideráveis, como tenta sintetizar o gráfico 6.

Por fim, o questionamento sobre o futuro do Brasil e da política indígena acabou, também, por mapear os argumentos dos entrevistados em suas relações com o atual contexto político, o que envolve também a questão indígena. Ainda que críticos ao momento político e social, a percepção de luta e resistência referente às questões indígenas já estavam presentes antes, sobretudo nas demandas de médio prazo. De fato, não obstante as percepções de que as pautas territoriais tenham sido predominantes, outros temas também o foram e emergiram, dentre eles educação, saúde, a gestão territorial, representatividade das mulheres indígenas e representação política.

RESULTADOS

Os principais resultados desta pesquisa apontam para duas frentes de trabalho: caso e método. No que concerne ao caso:

A existência de uma forte correlação entre altas disputas discursivas (em uma arena pública na qual circulam indivíduos, organizações formais, organizações informais, movimentos nacionais, movimentos regionais, indígenas e não-indígenas, atores internacionais, movimentos sociais rurais, dentre outros) e baixa produção de instrumentos de políticas públicas (trata-se quase de uma história de entraves sucessivos). Exemplo disso é visto como foram centrais a demarcação de terras indígenas na forma de um dos poucos instrumentos, para avaliação em nível temporal, como indicadores da política indigenista, juntamente com a taxa de mortalidade e em nível populacional. Ainda que seja um arena com níveis de conflitos distantes de argumentos democráticos, sobrecarregado de relatos de ataques institucionais e físicos aos povos indígenas, a baixa produção de instrumentos de políticas públicas, ou ainda o esvaziamento dos que já existiam, traz um cenário de ainda menos vulnerabilidade.

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A arena em torno à questão indígena tem sido esvaziada. Segundo os entrevistados 2, 4 e 5, os públicos integracionistas e genocidas se utilizam de estratégias argumentativas para manutenção de lógicas que orquestram os instrumentos de políticas públicas, inclusive impedindo a sua implementação, como é o caso da Demarcação de terras indígenas para o entrevistado da Funai 4, ou das políticas de saúde para o entrevistado 3, ou ainda de cultura e educação para os entrevistado 1. Em outras palavras, por meio da avaliação argumentativa e de valores, percebeu-se que grande parte dos esforços de não ação em relação aos problemas que afetam o universo dos grupo de indígenas no país se concretiza em esforços de para esvaziar a arena pública. Neste contexto, os problemas públicos que compõem suas arenas dificilmente conseguem sair da esfera do interesse especializado (organismos internacionais, ambientalistas, antropólogos, servidores da FUNAI). Portanto, como já posto na construção da arena pública da política indigenista, o processo de publicização, e também o de formação de público, têm se configurado de forma a dificultar o engajamento e mobilização do público para com a questão indígena e seus problemas inerentes e mais detalhados.

Percebeu-se que, tanto os públicos genocidas quanto indigenistas possuíam e possuem ainda pautas que se apoiam, muitas vezes, em noções de desenvolvimentos de Estado. Alguns exemplos podem ser encontrados desde o século XX, como as construções das linhas telegráficas nas missões do Marechal Rondon, até 100 anos depois, com os impactos negativos das permissões governativas para a construção de hidrelétricas em territórios indígenas, bem como nas formas de coletividade a partir das quais os povos indígenas se organizam, nas suas tradições e noção de espiritualidade. E, mais do que isso, é perceber que a arena, ou as arenas, da política indigenista nunca foram harmônicas ou com simetria de públicos. Ao contrário, elas são extremamente desiguais em recursos e nas ativações de processos de publicização e problematização.

A questão indígena, aquela que modela o conjunto mais amplo de problemas públicas relacionados aos indígenas no Brasil, é a própria falta de reconhecimento do status de público do problema, ou, nas palavras de Dewey (1927), simplesmente de “público”. A questão indígena neste trabalho, portanto, refere-se às suas próprias dinâmicas de publicização, até mesmo de “não publicização”, ou de extrema dificuldade de reconhecimento do status de público desta rede de problemas, em especial para as os públicos não-especializados. Ainda que nas entrevistas todos os entrevistados reconhecem, assim como esta autora, que se trata de um problema de muita relevância, as falas de casos que desqualificam a questão indígenas foram observados:

Quadro 5 - Fala dos Entrevistados sobre a Dificuldade de Publicização da Questão Indígena

Trechos Entrevistado(a)

Existe aquela frase antiga de prefeitos que” índio bom é índio morto”, isso se ouviu muito da implementação, por isso os distritos não podiam ser geridos no município, muitos governantes, gestores eram donos de terras onde os índios estavam ali, do lado, nas fazendas nos municípios ali, isso era uma frase clássica.

Entrevistado 3

Tem gente pensando como se fosse uma questão menor, uma questão retificada, ela é entranhada na construção da nacionalidade, ela tá entretecida, tecida, igual a questão da escravidão, não existe Brasil sem os africanos, não existe o Brasil sem os povos indígenas.

Entrevistada 5

Dependendo da pessoa ela pode nem saber o que que é né? Que questão indígena é essa, é o que? é do genocídio que eles estão sofrendo, para um ruralista por exemplo, deve despertar, [...] para um membro da banca da bancada parlamentar da agropecuária, não sei enfim... vai depender da pessoa o que essa expressão vai suscitar.

Entrevistado 4

Acho que educação de um outro jeito, ainda não é a que está aí não, ainda é folclórica, ainda é para questão indígena, a [...] que legal que eles fazem, como eles comem, como eles bebem. Já vi muita criança perguntar: A você já foi em aldeia indígena, ainda é realidade? a eles são de verdade? ou eles são de papel

Entrevistado 3

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Por isso, a questão indígena é considerada não sendo um (conjunto de) problemas públicos. Não porque não exista atores, arena ou até mesmo relevância pública para os afetados diretamente da política, mas porque o processo de publicização é restrita, dialoga com movimentos diversos, mas não suficiente para uma difusão em escala ou de atores, em especial em relação ao público não especializado.

No que concerne ao método, neste artigo ao assumir o caminho da avaliação em lugar da análise, deu-se muito mais liberdade na compreensão da dimensão argumentativa, valorativa e, portanto, política desta pesquisa. Associa-se comumente à avaliação aos aspectos mais gerencialistas, bem como à tradição positivista no campo de estudos e práticas das políticas públicas. No entanto, este trabalho alinha-se aos esforços dentro da chamada tradução pós-positivista (FISCHER, 2016). Compreender a produção de conhecimento avaliativo como parte da arena pública onde se situa o próprio objeto de avaliação foi fundamental para defender a não neutralidade da ciência e do próprio campo de políticas públicas.

A reconstrução da política indígena no Brasil foi marcada por avanços e retrocessos que a fazem parecer morosa, quando observada em perspectiva histórica. Os problemas públicos que conformam suas arenas dificilmente conseguem sair da esfera do interesse especializado, dificultando os processos de formação de público e, portanto, no sentido deweyano, de reconhecimento da qualidade de público para com os problemas que estruturam tais arenas, engendrando um círculo vicioso.

CONCLUSÃO

A partir do objetivo deste artigo, de se apresentar os resultados de uma pesquisa avaliativa sobre a política indigenista no Brasil recente, principalmente a partir da constituinte em seu contexto da arena pública, o problema público foi compreendido por meio do conjunto de problemas públicos relacionadas aos povos indígenas, trazido aqui como questão indígena. Particularmente no que concerne seu processo de construção, com o objetivo de compreender possíveis correlações entre as dinâmicas da sua arena pública e os instrumentos de políticas públicas que dela emergiram, foi construído se utilizando de instrumentos de pesquisa, como entrevista, documentação primária e secundária.

Ainda que o objetivo tenha sido tenha sido alcançado, novos percursos avaliativos passaram a ter importância nesse cenário e carecem de estudos a nível de implementação dos instrumentos de políticas públicas, assim como estudos vinculando a racialidade, que trazem a tona uma série de outros tipos de problematizações, como a interferência de estruturas racistas no contexto da arena pública indigenista.

Nesse sentido, essa pesquisa tem uma perspectiva indigenista, desde o ponto de vista da pesquisadora, passando para a maior parte da bibliografia e até mesmo do ponto de vista dos/as entrevistados(as) que eram não-indígenas. Para densificar o trabalho, foram utilizados os Relatórios Finais de Acampamentos Terra Livre da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, em especial pela importância no diálogo das populações indígenas para com o governo Federal em diversas frentes.

Como esse estudo, limitou-se a política indigenista até junho de 2018, o cenário atual, com a primeira Indígena eleita desde a Constituinte no Congresso Nacional, Joênia Wapichana e, ao mesmo tempo, ataques contínuas as políticas para os povos indígenas. Nesse contexto, possibilidades de uma agenda de estudos com diálogo constante com o público diretamente afetado, as/os próprios indígenas se mostram potencialmente importantes, ensejando, nesse ponto, estudos não só com os povos indígenas como objetos de estudo. Sendo este um trabalho pós-positivista dentro do campo de estudos de políticas públicas, o olhar do pesquisador modifica o objeto de pesquisa, por isso, pesquisadoras e pesquisadores indígenas têm um papel fundamental para olhares de pesquisas com perspectivas descolonizadas.

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Referências

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