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A interferencia do discurso religioso na formação do sujeito : um estudo de caso na zona rural da mata do vale do Guapore-RO

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(1)

a

CENTRAl-.(

JONES FERREIRA VlCENTE

A INTERFERÊNCIA DO DISCURSO RELIGIOSO NA

FORMAÇÃO DO SUJEITO:

UM ESTUDO DE CASO NA ZONA DA MATA DO VALE DO

GUAPORÉ-RO

Orientador: Dra. Eni de Lourdes Puccinelli Orlandi

UNICAMP

Instituto de Estudos da Linguagem 2001

(2)

JONES FERREIRA VICENTE

A INTERFERÊNCIA DO DISCURSO RELIGIOSO NA

FORMAÇÃO DO SUJEITO:

UM ESTUDO DE CASO NA ZONA DA MATA DO VALE DO

GUAPORÉ-RO

Dissertação apresentada ao Curso de

Lingüística do Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística

Orientador: Dra. Eni de Lourdes Puccinelli Orlandi

UNICAMP

Instituto de Estudos da Linguagem 2001

(3)

BIBLIOTECA IEL - UNICAMP

Vicente, Jones Ferreira

V662i A interferência do discurso religioso na formação do sujeito: um estudo de caso na zona da mata do vale do Guaporé-RO I Jones Fer:eira Vicente.-- Campinas, SP: [s.n.], 2001.

Orientador: Eni P. Orlandi

Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

I. Religião e linguagem. 2. Igreja e universidade. 3. Fé e razão. I. Orlandi, Eni P.-H. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Li~agem. III. Título.

(4)

BANCA EXAMINADORA

ORIENTADOR: Profa. Dra. Eni de Lourdes Puccinelli Orlandi

Profa. Dra. Suzy Maria Lagazzi Rodrigues

Profa. Dra. Claudia Regina Castellanos Píeiffer

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(5)

Este trabalho é dedicado inteiramente,

- à minha família: SUELENI SUELEN

(6)

AGRADECIMENTOS

À minha família, pela paciência e compreensão da minha presente

ausência durante este curso.

À Profa. Dra. Eni, pela forma carinhosa e profissional ao me ouvir e

me orientar nesta dissertação.

Às examinadoras Profa. Dra. Suzy Lagazzi e Dra. Claudia Pfeiffer,

pela leitura dedicada e pelas sugestões -

necessárias ao

entendimento deste trabalho.

Ao Pastor da Igreja Assembléia de Deus em Rolim de Moura- o Sr.

Manoel Ângelo Chagas, pela confiança e a seriedade dispensada na

produção deste trabalho.

À Dorcas e

à

Bianca, pelas entrevistas concedidas.

-

À todos os Professores e Funcionários da Pós-graduação do IEL, pelo

respeito e pela dedicação dispensada.

À CAPES, pela bolsa concedida.

Ao diretor do Campus da UNEMAT em Pontes e Lacerda - prof.

Heitor, pela amizade e a confiança.

(7)

SUMÁRIO

Resumo: ...

13

Palavras-chave: ...

14

Introdução: ...

15 H . t' . 1.

1s onco: ...

19 1.1. Rolim de Moura ... 19

1.2.Universidade Federal de Rondônia- UNIR ... 23

1.3. Igreja Assembléia de Deus em Rolim de Moura ... 31

2. Enunciação do Discurso Religioso ...

35

2.1. A Fé na Enunciação do Discurso Religioso ... 39

2.2. O Silêncio na Enunciação do Discurso Religioso ... 53

2.3. O Silêncio da Fé ou Silenciamento pela Fé:? ... 65

2.4. A mulher na Enunciação do Discurso Religioso: ... 71

3. A Verdade para o Sujeito Religioso ...

81

4. A Relação entre a Igreja a Universidade e o Sujeito ... 85

5.

A Interpretação da Bíblia como Lugar Ideológico? ...

95

6.

Considerações finais: ...

111

(8)

RESUMO

Neste trabalho, procuramos entender o conceito de Universidade difundido no discurso da Igreja Assembléia de Deus na região da Zona da Mata do vale do Guaporé-RO. Isto, devido a um grande número de membros desta Igreja que cursam até o segundo grau e não "se mostram interessados" em freqüentar uma Universidade. Ou, ainda, quando alguns (as mulheres em maior número) entram na Universidade, são disciplinados ou excluídos da Igreja.

Para entendermos estes acontecimentos, consideramos alguns efeitos pragmáticos do discurso da Igreja em questão e nos inscrevemos na proposta da Análise de Discurso para procurar compreender o processo de constituição dos sentidos desses discursos em suas relações.

Ao analisarmos as entrevistas concedidas pelo Pastor e alguns membros da referida Igreja, bem como parte do material de doutrinamento da mesma, observamos que o sujeito da Igreja Assembléia de Deus, através deste doutrinamento, tem a Universidade como "lugar de contaminação", lugar que leva este sujeito a "outros caminhos".

(9)

Através da Universidade, o sujeito resiste a um ensino que julga ser "doutrina de homem", e nesta resistência, o sujeito submete-se mais à "Palavra de Deus". Nesse sentido, o sujeito ouvinte do discurso da Igreja Assembléia de Deus, ao entrar na Universidade, vive um espaço de conflito. Conflito entre fé e razão, ou, conflito de significação. Assim, entendemos que o sujeito, no antagonismo fé/razão vive nesse conflito de significação, não abandona a Igreja, mas também não aceita passivamente o doutrinamento da mesma. Ou ainda, só aceita o que entende ser "doutrinamento bíblico", em outras palavras, o que é bíblico é indiscutível.

Nesse doutrinamento da Igreja, a Universidade significa "lugar de

contaminação", ou seja, o lugar que desencaminha o sujeito da Igreja Assembléia de Deus. É um "a:ndar a pós", como é denominado pelo pastor da Igreja.

PALAVRAS-CHAVE: l.Religião e linguagem. 2. Igreja e universidade. 3. Fé e razão.

(10)

Introdução

Cheguei a Rondônia, então Território Federal, num pau-de-arara, em dezembro de 1969, quando a região da Zona da Mata do Vale do Guaporé era de fato só mata, não havia um município sequer. A partir do ano seguinte, ou melhor, na década seguinte, Rondônia começou a ser povoada por imigrantes saídos do Sul, Sudeste e Nordeste do país. Atraídos pela possibilidade de adquirir terra fácil e por um anúncio do tipo: "quem derruba a árvore é dono do toco", o que favoreceu o rápido desmatamento naquela região.

Rondônia começou então seu desenvolvimento. A região da Zona da Mata foi uma das mais procuradas pelos imigrantes devido à boa qualidade da terra. Com a chegada dos imigrantes chegou também à região um grande número de religiões denominadas evangélicas ou vulgarmente chamadas de "protestantes" ou "crentes". Entre estas Igrejas, a Igreja Assembléia de Deus foi a que mais cresceu nessa época, espalhando-se por todas as linhas vicinaís daquela região.

(11)

Alguns anos depois, quando eu estava terminando o Curso de Letras na Universidade Federal de Rondônia - UNIR, Campus de Rolim de Moura, comecei a dar aulas no 2° grau da Escola Cândido Portinari, na mesma cidade. Na época, entre os alunos, havia um grande número de membros e filhos de membros da Igreja Assembléia de Deus.

Posteriormente, quando comecei a trabalhar na Universidade Federal de Rondônia- Campus de Rolim de Moura, encontrei lá muitos desses que foram meus alunos no 2° grau, mas não aqueles da Igreja Assembléia de Deus.

Encontrando no comércio com alguns daqueles ex-alunos do 2° grau, indaguei a respeito deles não terem ido para a Universidade. Alguns se firmavam na necessidade de trabalhar, já outros, diziam coisas como: "estudo dos homens é loucura pra Deus", "a Universidade não é lugar de crente", ou ainda, "a gente tem que buscar a Deus em primeiro lugar".

A partir dai comecei a desconfiar que a Universidade estava tendo um sentido muito singular para os membros da Igreja Assembléia de Deus. Mesmo assim, observei que alguns membros iam para a Universidade. Conversando com eles fiquei sabendo que, esses membros, na época, estavam em disciplina na Igreja.

Isto mostra que aparentemente existe uma concepção de Universidade sendo difundida no discurso da Igreja Assembléia de Deus, nesta localidade, que interfere significativamente na formação do sujeito desta Igreja.

(12)

Uma outra observação foi o fato de que, entre esses membros que foram para a Universidade, as mulheres eram em maior número, porquê? Será que elas rompem com o discurso da Igreja? Ou não são afetadas pelo discurso? Pensei na hipótese dessas mulheres serem rebeldes em relação à Igreja, ou, que elas viam a Universidade de outra maneira.

Com tudo isso, surgiu o interesse em pesquisar esses acontecimentos, primeiramente para entender se era a Universidade a responsável pela ausência dos jovens da Igreja Assembléia de Deus no curso superior, ou ainda, entender o que levava a Igreja a disciplinar àqueles que iam para a Universidade.

O primeiro desafio foi conseguir as entrevistas. Todos aqueles com quem eu havia falado antes, negaram-se a falar oficialmente sobre a Igreja comigo.

Outro desafio foi convencer o pastor responsável pela Igreja Assembléia de Deus naquela região a autorizar que alguns membros dessem entrevistas e de que o trabalho não faria juizo de valor.

Com muito trabalho, depois de conseguir algumas entrevistas, inclusive a do pastor, e alguns manuais de doutrinamento da Igreja, iniciei este trabalho. Considerando alguns efeitos pragmáticos do discurso da Igreja Assembléia de Deus, me inscrevi na proposta da Análise de Discurso para procurar compreender o processo de constituição desses discursos. Estaria a relação fé/razão, investida de sua história de antagonismos? É o que veremos a seguir no decorrer deste trabalho.

(13)

1. Histórico

1.1.

Rolim de Moura- RO

Rolim de Moura, um município situado na Zona da Mata do Vale do Guaporé no Estado de Rondônia (então Território Federal), nasceu de um projeto do INCRA em 1975, (saindo do papel somente alguns anos mais tarde). Neste período aconteceu uma grande migração de trabalhadores rurais de outros Estados para Rondônia e principalmente para a região da Zona da Mata, pois a qualidade do solo é propícia para a agricultura e a agropecuária.

O extrativismo vegetal (seringa, castanha) era uma característica predominante nesta região naquele tempo. Os seringueiros tinham então presença marcante na região, pois já estavam lá muito antes da formação

(14)

dos "patrimônios 1" e serviam como ponto de referência para a localização das chamadas "demarcações 2 " de terras que eram feitas pelos "grileiros a•

quando faziam seus "grilos 4 " nas terras "devolutas 5".

Esses grileiros faziam as marcações de terra que normalmente implicavam em derrubadas, plantio de bananeira, mamão, mandioca, etc., e depois vendiam-nas a ftm de obter recursos para fazer outros "grilos" (só que mais distantes) e então fixar morada.

O grileiro só era reconhecido como "posseiro6 " e regulamentado pelo INCRA quando tinha "serviço 7" no "grilo". Só então recebia a "carta de ocupação 8" que depois de várias vistorias teria o direito ao "título deftnitivo 9 ", caso contrário, a posse era concedida a outro irlteressado (desde que derrubasse o mato) inscrito no INCRA para receber terra.

O desmatamento exigido pelo INCRA acabou com o extrativismo vegetal, assim, o seringueiro foi perdendo o meio de sobrevivência e, ou deslocava-se para lugares mais distantes, confmando-se em um pequeno sítio, ou ainda tirlha a opção de morar nos pequenos patrimônios.

( I ) : Vilarejos novos : ( 2 ) : Ou marcação I esquadramenlo ; ( 3 ) : Marcadores de terra ; ( 4 ) : Terras marcadas ; ( 5 ) : Sem dono ; ( 6 ) : Morador sem posse legal ; ( 7 ) : Derrubada ; ( 8 ): I o documento emitido pelo INCRA (na época) ; ( 9 ) : Documento oficial do INCRA.

(15)

A última opção foi aceita por muitos com a promessa de receber do governo uma ajuda de custo que, segundo este, era destinada aos "soldados da borracha". Na ilusão de que seria aposentado em breve (o que não aconteceu), o seringueiro era encaminhado para o "patrimônio" onde ficava restrito a uma "data 10".

Por fim, a região da Zona da Mata do Vale do Guaporé foi totalmente habitada pelos "posseiros", em busca de uma vida melhor, ou seja, lutando pela sobrevivência buscavam um "pedaço de terra" para "plantar e colher" ( muitos sonhos ) .

Junto com os sonhos apareceram os problemas que não eram poucos, pois, abandonados em seus grilos e distantes dos patrimônios, os "parceleiros 11 " que tinham em suas terras a "madeira de lei" ou madeira nobre como a Cerejeira e o Mogno (madeiras essas que eram encontradas em abundância nesta região), foram forçados (pela necessidade)a entregá-las para as grandes madeireiras que apareceram rapidamente na região.

Essas madeireiras tinham autorização do governo para atuar na extração das madeiras citadas acima, pagavam um valor irrisório pela madeira e em troca prometiam fazer as estradas "vicinais 12", o que não acontecia; quando muito, faziam alguns "carreadores 13" que não suportavam o primeiro "período das águas".

( 10 ): Lote urbano; ( 11 ) : Proprietários de pequenos sítios; ( 12): Estradas secundárias; ( 13 ) : Estrada construída manualmente ; ( 14 ) : Viajante que carrega mercadoria nas costas ; ( 15 ) : Invólucro para carregar mercadoria.

(16)

Com isso, as "linhas vicinais" que foram projetadas (pelo INCRA) de 4 em 4 quilômetros, eram os carreadores por onde os "cacaeiros 14" caminhavam longas distâncias com "cacaios 15" às costas a fim de sustentarem suas familias.

Relegados ao abandono, os parceleiros distantes do " patrimônio" tomaram-se alvos para as "denominações" religiosas que apareceram em grande escala em todas as linhas vicinais da região e obtiveram muito êxito. Isto porque os parceleiros, por causa de suas necessidades, estavam receptivos a todo tipo de ajuda, principalmente espiritual, segundo eles.

Entre as vàrias denominações religiosas, as Igrejas "pentecostais" sobressaíram mais e, entre estas, a Igreja Assembléia de Deus liderou o crescimento, não só nesta região, bem como em todo o Estado de Rondônia.

Esse crescimento significou a presença do discurso da Igreja Assembléia de Deus em quase todos os segmentos governamentais, bem como a presença de seus representantes nas prefeituras, Câmaras municipais, Assembléia Legislativa e muitos outros órgãos ligados a administração pública.

(17)

1.2. Universidade Federal de Rondônia (UNIR)

"A Universidade Federal de Rondônia - UNIR, Fundação pública com personalidade jurídica de direito privado criada pela lei n° 7.011 de 08 de julho de 1982, é instituição oficial que integra o Sistema Superior de Ensino tendo sede e foro na cidade de Porto Velho e a atuação em todo Estado de Rondônia."

Esta é a certidão de nascimento da UNIR que se apresenta no artigo 1 o de seu estatuto aprovado pelo Conselho Diretor (alguns anos depois)

conforme a Resolução n° 015/CD, de 27 de outubro de 1987 e Portaria Ministerial n° 324 de 18 de maio de 1989.

Assim, o então recém criado Estado de Rondônia, ainda preso à

União pela mesma legislação que o criou, lei complementar n° 41 de 22 de dezembro de 1981, que lhe mantinha a tutela Federal por mais dez (10) anos, transformado em Estado através de decreto legislativo e ratificado por sanção presidencial sem ser submetido a consulta popular(plebiscito).

(18)

O primeiro govemador do Estado de Rondônia foi Jorge Teixeira de Oliveira, um coronel reformado, ocupava a dupla função de Executivo e

Legislativo, pois a essa altura ainda não haviam acontecido eleições para composição da Assembléia Legislativa, portanto não havendo Constituição Estadual o que leva o Estado a ser govemado por decretos.

Nestas condições a legislação funciona, de um lado, de acordo com a vontade do poder político, do outro, ignorando uma concepção modema de universidade. Assim, o poder central começou pelo aparentemente mais fácil, com cursos cuja efetivação não exigiriam altos investimentos e, ainda assim, proporcionando-lhes apenas o "essencial".

Quando falamos em ignorância quanto a uma concepção moderna de universidade, falamos do não ajustamento da universidade às questões regionais e âs necessidades da sociedade civil, ou seja, uma universidade que tem sua origem nos interesses de uma sociedade política que predetermina o que considera adequado ou não à área onde exerce influência política.

SA VlANI ( 1980) comentando o texto de Gramsci extraído do livro "L'Ordine Nuovo", acerca da classe que domina o Estado e a Escola diz o seguinte:

"Compreende-se então que as elites que controlam seja o aparelho govemamental seja o aparelho escolar,

(19)

uma tendência a relegar a educação a uma questão que diz respeito meramente ao senso comum (eufemisticamente chamado de bom senso). A esta posição cuja resultante é manter as massas ao nível do sincretismo que caracteriza o senso comum, contrapõe-se à filosofia da práxis. Com efeito a filosofia da práxis não busca manter os 'simplórios' na sua filosofia primitiva do senso comum, mas busca, ao contrário, conduzi-las a uma concepção de vida superior."

SAVIANI (1980 p.63)

Entendemos que a Fundação Universidade Federal de Rondônia, em virtude de desenvolver apenas mão-de-obra educacional, acaba não tendo participação direta no processo de exploração das riquezas naturais dando margem a uma espécie de dissonância em relação ao desenvolvimento regional, privilegiando o poder político individualista.

A universidade que entendemos adequar-se às particularidades regionais deve ser centro de debates, participar da construção da história própria ao povo e à região. Deve ser uma instituição pluralista onde a multiplicidade das idéias conviva com diferentes princípios ideológicos e filosóficos, onde as variadas concepções pedagógicas também coexistam com as diversas correntes de pensamento. Uma instituição que possa sair

(20)

de seus limites pondo-se a serviço da comunidade através de suas mais diversas funções.

Funções, neste contexto, tratada num sentido abrangente, como sendo o conjunto das práticas que faz a universidade mover-se, sentir e compreender as contradições que emergem do meio físico e social, ou seja, a própria capacidade que tem a universidade de flexibilizar-se, adequando-se ao espaço e às circunstâncias, assimilando e intermediando, através de um processo simbiótico, os conhecimentos empíricos e científicos, como instituição que descobre e redescobre novas formas de conhecer, de interpretar a realidade.

Uma realidade que não pode prescindir da sistematização do empírico e da divulgação do conhecimento científico e tecnológico, mas que deve também interpretar acontecimentos como: a extinção do extrativismo vegetal na região (castanha, seringa, etc.), bem como a fuga ou exclusão desses extrativistas que, aparentemente sofrem um forte embate quanto a suas identidades ao conviver nos centros urbanos.

Seu engajamento na luta em busca de possíveis soluções para os problemas é provavelmente, uma das maneiras mais eficientes de sua transformação numa instituição viva e dinâmica, todavia, não basta o engajamento apenas, é preciso que sejam criadas condições objetivas que possam permitir à universidade exercer soberanamente seu potencial, isto é, possa atuar, reunindo conhecimentos teóricos e práticos para sua

(21)

afirmação perante a sociedade e o meio, não ficando presa apenas aos interesses (eleitoreiros) do poder político.

"O desenvolvimento nas sociedades humanas se funda na elaboração de estratégias de ação, embora com níveis variados de consciência, isto porque tais sociedades agem sobre elas mesmas, constroem dinamicamente suas relações e sua organização social, ao jogo políticos de grupos e classes sociais. É nesse sentido que compreendemos as políticas que orientam as ações dos indivíduos na sociedade. Mas esse jogo político não se faz livremente, ao contrário, trata-se de relações de força onde grupos e classes sociais lutam pelo poder. E nesse jogo, também o saber que é poder não fica isento enquanto objeto de estratégias individuais e coletivas".

(Estudos e Debates- CRUB, 1985 p.17)

A UNIR surge primeiramente, com os propósitos políticos (eleitoreiros), com o seu desenvolvimento, ela foi respondendo realmente às necessidades da população, deixando seu aspecto mais diretamente eleitoreiro para adquirir um estatuto de instituição capaz de produzir e

(22)

Neste caso, a implantação da UNIR teve respaldo da população, uma vez que tendia a atender algumas necessidades desse então novo Estado, como fica explícito, a seguir, no artigo 4° do estatuto da Universidade:

"Artigo 4°- A UNIR tem como finalidade precípua a promoção do saber científico, e, atuando em sistema indissociável de Ensino, Pesquisa e Extensão possui os seguintes objetivos:

I - Formar profissionais que atendam aos interesses da região amazônica.

II- Estimular e propiciar os meios para a criação e a divulgação científica, técnica, cultural e artística respeitando a identidade regional e nacional.

III - Aplicar-se ao estudo da realidade brasileira para os problemas relacionados com o desenvolvimento econômico e social da região.

IV- Manter intercâmbios com as universidades e Instituições Educacionais, Científicas, Tecnológicas e Culturais, nacionais e estrangeiras, ou internacionais desde que não afetem sua autonomia, obedecidas as normas legais superiores".

(23)

Com base no parágrafo único do artigo 60 das disposições constitucionais transitórias da constituição federal de 1988, onde se estabelece que: "nos primeiros dez (10) anos de sua promulgação as universidades públicas descentralizarão sua atividades de modo a atender suas unidades de ensino superior às cidades de maior densidade populacional".

Sendo assim, a então administração da UNIR articulou junto ao MEC, autorização para que a Universidade Federal de Rondônia pudesse estender seus serviços também aos municípios do interior, dando assim a abertura do Campus da UNIR em Rolim de Moura em 1989 e nos demais municípios do estado, segundo a petição abaixo:

"O Magnífico Reitor da Universidade Federal de Rondônia - UNIR. Com objetivo de empreender projeto de interiorização que atendam a todo Estado no que se refere ao ensino, à pesquisa e a extensão, encaminha a este conselho pedido de autorização para funcionamento de cursos fora da sede".

(24)

Observa-se que a UNIR teve seu Estatuto aprovado pela Resolução 324 de 18 de maio de 1989, quando já havia uma petição para funcionamento de cursos fora da Sede aprovada pelo Conselho Federal de Educação em 23 de Janeiro de 1989, objetivando a autorização para funcionamento dos cursos, de n° 16/89, de 24 de maio de 1989, portanto seis (06) dias apenas após a aprovação do Estatuto da UNIR, ou seja, foi criada em 08 de julho de 1982 e aprovada pelo ministério da Educação em

18 de maio de 1989, ano em que estava iniciando alguns cursos fora da sede, como é o caso do Campus de Rolim de Moura.

(25)

1.3. Igreja Assembléia de Deus em Rolim de Moura

A Igreja Assembléia de Deus em Rolim de Moura foi fundada em 1987 juntamente com a abertura da cidade, ou seja, assim que chegaram os primeiros moradores a Rolim de Moura, iniciou-se o trabalho dessa Igreja, em uma pequena congregação feita de lascas de madeira, assim como foram feitas as outras construções, pois não havia material para construção e nem serraria na cidade.

Pouco tempo depois foi construído um templo em madeira serrada. Nesta época, o responsável pelo trabalho era o pastor Fidélis, que hoje reside na cidade de Cacoal-RO. Depois passaram pelo comando desta Igreja as seguintes pessoas;

Evangelista Sebastião, que também reside em Cacoal-RO Pastor José Carlos Bezerra, já falecido.

Pastor Jamil, que pastoreou a Igreja por dois anos e meio Pastor Antonio Querenio.

Pastor Manuel Ângelo Chagas, iniciou seu trabalho em novembro de 1983 e está até a presente data.

A Igreja Assembléia de Deus em Rolim de Moura ficou responsável pelo campo eclesiástico da região da Zona da Mata do Vale do Guaporé que

(26)

é formado pelas cidades de Nova Brasilândia D'Oeste, Santa Luzia, São Felipe, Nova Estrela, Castanheira, Novo Horizonte, Migrantinópolis e as linhas vicinais que eram estradas feitas por toreiros1 •

O pastor Manuel Angelo Chagas assumiu em 1983 um campo eclesiástico com trinta e cinco (35) congregações e dois anos depois já contava com oitenta (80) congregações e cinco mil (5.000) membros, chegando a oito mil (8.000) congregados2 • Um número bastante expressivo considerando que nesta época o município de Rolim de Moura tinha aproximadamente 35.000 (trinta e cinco mil) habitantes.

Somente dentro da cidade de Rolim de Moura existem hoje treze (13) templos, tendo a Igreja sede ao centro e as demais circundando a cidade, a frm de facilitar o acesso dos membros junto às Igrejas.

- Caso 3 (pastor) " dentro da cidade nós temos uma faixa de . . . nós temos treze templos da Igreja Assembléia de Deus ... só aqui dentro da cidade ... em todas as periferia ... aqui do ... de Rolim de Moura ... nós temos templo ...

cercarrws a cidade de templos da Assembléia de Deus

... tem bairro que nós temos ... é ... duas congregações

"

1

Pessoas que trabalham na extração de madeiras, fazem estradas utilizando machado e motor serra. 'Pessoas que não são membros da Igreja.

(27)

O templo central tem a medida de 20x40 m., fora a galeria e as dependências como secretaria, tesouraria, sala de informática e gabinete pastoral. O templo tem capacidade para acomodar duas mil e quinhentas (2.500) pessoas assentadas, chegando a três mil (3.000) pessoas contando com a galeria.

Os obreiros (membros da Igreja envolvidos na obra do Senhor) que atuam em Rolim de Moura, entre pastores e evangelistas somam vinte e dois (22), noventa (90) presbíteros3 , cem (100) diáconos4 e cento e cinqüenta (150) cooperadores5 , isso em todo o campo da Igreja.

- Caso 3 (pastor) " ... e aqui dentro da cidade ... uma faixa de noventa presbíteros ... que ... biblicamente ... são ministros do evangelho ... "

O rápido histórico que esboçamos da Igreja Assembléia de Deus e da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) tem o objetivo de dar a conhecer algumas peculiaridades dessas duas instituições na região em que estou situando as minhas análises. Como poder-se-á observar na seqüência do trabalho, vou procurar mostrar a relação discursiva existente entre elas.

' Responsáveis pelo culto na ausência do pastor.

4

Responsáveis por trabalhos na lgr<tia como; distribuir santa ceia, arrecadar ofertas etc.

5

(28)

2 - Enunciação do Discurso Religioso

" ... o discurso verdadeiro- no sentido forte e valorizado do termo - o discurso verdadeiro pelo qual se tinha respeito e terror, aquele ao qual era preciso submeter-se, porque ele reinava, era o discurso pronunciado por quem de direito e conforme o ritual requerido; era o discurso que pronunciava a justiça e atribuía a cada qual sua parte; era o discurso que, profetizando o futuro, não somente anunciava o que ia se passar, mas contribuía para sua realização, suscitava a adesão dos homens e se tramava assim com o destino". FOUCAULT (1996 p.15)

Esta fala de Foucault que nos serve de epígrafe, encaminha-nos para a reflexão sobre o ritual da palavra. Vejamos como compreender isso analisando recortes de entrevistas como apresentaremos abaixo.

- Caso 3 (pastor) " ... a Igreja é inteiramente favorável ... o ... o crente ele ... participar da escola .. . desde o primeiro grau até .. . se formar . . . fazê a sua faculdade . . . porém ... nós ensinamos ... nós temos por exemplo a . . . as terça feira nós temos o ensino bíblico ... exclusivamente para os ...

(29)

para os crentes ... não só para os membros ... quer dizer ... para os crente ... e pessoas mais que quiserem vir ... as terça feira . . . nós falamos • .• damos estudos bíblicos ...

então nós preparamos ... o ... nosso jovem ... para que

eles estudem ... sem se contaminar ... sem ser drogado

. .. sem se prostituir .. . sem ... é ... andar após . .. ãs ...

coisas que são ensinadas ... que não é lícito ao crente ... ele sabe muito bem ... "

-Caso 2 (Bia*) " a pesar deu não ter sido criada nun lar evangéli. ..

nascida num lar evangélico . . . eu

fui

muito bem

trabalhada . . . na Igreja . . . na escola dominical . . . com o

evangelho ... nós estudamos a bíblia de Gênesis ao

Apocalipse ... de estudar mesmo ... de você conhecer ...

a bíblia . . . sabe . . . o que uma criança pode .. . na adolescência . .. aprender na bíblia . . . eu aprendi ... sabe

... então eu tenho uma base ... evangélica ... muito

fortalecida ... e isso me ajudou ... lá dentro ... "

Como podemos observar pelos textos acima, a enunciação do discurso religioso é fundamentada na Bíblia "sagrada", também considerada pelo sujeito religioso como "A palavra de Deus". Acreditar que

(30)

a Bíblia é "A palavra de Deus" já é em si um princípio de conversão do sujeito ao religioso, parte do ritual da palavra na relação com o sagrado.

O discurso religioso se faz significar no lugar do "livre arbítrio" do sujeito. Um "livre arbítrio" onde o sujeito é obrigado a escolher entre "dois caminhos", ou ainda, onde o sujeito é levado a acreditar que "só existem dois caminhos" e que um é "O caminho da salvação" (que leva ao Céu), o outro é "O caminho da perdição" (que leva ao infemo).

A relação entre os fatos ocorridos na história da humanidade e as profecias mencionadas na Bíblia é uma argumentação constitutiva no/do discurso religioso.

A certeza da salvação é uma necessidade e uma esperança de que o sofrimento daqueles que servem a Deus é só "aqui nesta vida", pois após a morte o "salvo em Cristo" não passará mais por necessidades.

Conhecer e acreditar na Bíblia, é uma condição necessária para o fortalecimento da fé. É também a forma encontrada pela pedagogia religiosa para que o sujeito religioso fique "protegido" de tudo que possa "contaminar" ou levá-lo a" ... andar após ... às ... coisas que são ensinadas ... que não é licito ao crente ... ".

Assim, o discurso religioso desperta no sujeito o "desejo de salvação" acompanhado pela necessidade e o desejo de submissão à "Palavra de Deus".

(31)

2.1-

A fé na enunciação do discurso religioso:

"No momento em que alguém diz "creio" em resposta a uma das perguntas no batismo, ou recita o credo, representa-se um locutor que se apresenta como aquele que se responsabiliza pelo que aí se diz. Ao apresentar-se como responsável por este dizer, tal locutor realiza o ato de afirmar sua crença. Ao fazer isso, ele se responsabiliza pela a.Irrmação que faz enquanto fonte da enunciação (enquanto L). E, ao se responsabilizar pela a.Irrmação, se responsabiliza pela verdade da crença do locutor enquanto pessoa (enquanto Lp)".

GUIMARÃES in ORLANDI (org.1987 p.85)

Nessa citação acima, ao observarmos a instância pragmática, no nível da formulação, notamos que é muito importante para o sujeito religioso dizer que acredita em Deus. Observamos através da exteriorização dessa crença que a performatividade do discurso da Igreja Assembléia de Deus, na região da Zona da Mata do Vale do Guaporé, vem produzindo como efeito (Perlocucional), o desinteresse pela Universidade por parte

(32)

desses jovens. Ao assumir publicrunente sua crença, o sujeito deve desprender-se das "coisas materiais" e assujeitar-se livremente às "coisas espirituais", à Igreja.

A partir da consideração desse efeito pragmático, nos inscrevemos na proposta da Análise de Discurso para procurar compreender o processo de constituição dos sentidos desses discursos em suas relações, na produção desse efeito.

Nesse sentido, podemos dizer que a fé é que sustenta a relação do religioso com o sagrado e é considerada como um dos muitos "Dons do Espirito Santo", sendo também a base do Cristianismo, citada inúmeras vezes na Bíblia (84 vezes, aliás).

No livro de Hebreus, todo o capítulo 11 trata da natureza da fé, que, sendo uma dádiva de Deus, é uma condição para a salvação da alma do homem e no Versículo 6 diz o seguinte: "De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, portanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que Ele existe e que se toma galardoador dos que o buscrun".

Crer que Deus existe e aproximar-se "Dele" é a primeira demonstração de fé. É um ritual público, precedido por um "apelo" (como é chamado nas igrejas evangélicas), que acontece no final da "mensagem" ou "pregação" que é feita por um "homem de Deus", pastor, bispo, presbítero ou dirigente.

O apelo é um procedimento comum nas igrejas denominadas "pentecostais", que são assim denominadas porque no momento em que

(33)

estão em oração falam em "línguas estranhas" (biblicamente chamadas de línguas dos Anjos).

As Igrejas pentecostais têm sua fundamentação em um acontecimento chamado de "dia de pentecoste", conforme a citação a seguir:

"Ao cumprir-se o dia de pentecoste, estavam todos reunidos no mesmo lugar: de repente veio do céu um som, como de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam assentados. E apareceram, distribuídas entre eles, línguas como de fogo, e pousou uma sobre cada um deles. Todos ficaram cheios do Espírito Santo, e passaram a falar em outras línguas, segundo o Espírito lhes concedia que falassem". BÍBLIA (Atos 2: 1-4)

O "novo convertido" diz em público que "aceita Jesus como seu único e suficiente salvador", aceitando livremente a sua submissão. É

assim, pois, que vemos a passagem da idéia de sujeição para a prática religiosa que assujeita, através de um ritual que significa e simboliza um novo nascimento, conf. João 3: 3 que diz; " Em verdade, em verdade te

digo que se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus".

A esse respeito é interessante observar o que diz um autor que trata de linguagem:

(34)

"A fé religiosa

f ... f

se sustenta na manutenção do objeto de desejo, mesmo e sobretudo se este objeto é incognoscível, do qual nada se pode dizer e é cego; logo, da permanência de um sujeito suposto saber que está sempre acima de todas as decepções, todas as contradições. Todas as provas contrárias e todas as perdas de esperança

I ... I

Deus, Cristo ou a Escritura são supostos tanto mais saber quanto o crente não compreende nada, não sabe nada e não vê mais nada.

MILNER in Haroche (1992 p.176)

Aparentemente, é sob a esfinge do pecado que se dá o discurso religioso, ou seja, articular o "medo da perdição" é o objetivo da pedagogia religiosa quando quer levar o sujeito à conversão, ou ainda, levá-lo para a Igreja, para Cristo, em outras palavras, "salvar a alma do sujeito pecador". A proposta inicial desse confronto

I

conflito está no "livre arbítrio" do sujeito para escolher entre, ser salvo e não ser salvo, ir para o céu ou ir

para o inferno, ou ainda, ser filho de Deus ou filho do Diabo. A condição é a

(35)

" Porque, como pela desobediência de um só homem muitos se tomaram pecadores, assim também por meio da obediência de um só muitos se tomarão justos."

BÍBLIA (ROMANOS 5.19)

Crer na "promessa da salvação" para não ir para as "chamas do inferno" é a única esperança para o "sujeito pecador". Pela fé o sujeito tem a certeza de que será recompensado pelo sofrimento "aqui da terra", quando receber o prêmio esperado, "o céu".

Ter a certeza da salvação também significa aceitar os sofrimentos, a contentar-se com o pouco, a não querer ter mais que o necessário, e assim, ser salvo. Qualquer coisa que leve o sujeito religioso para outro "caminho" que não seja o da salvação é pecado.

"Bom é guardar a salvação do Senhor, e isso em silêncio". Bíblia (Lamentações 3; 26)

-Caso l(Dora *) " ••• a nossa Igreja ... ela tem ... muitas regras ... e ... as regras só são para as mulheres ... ta ... eu questiono com

elas assim . . . a . . . assim a obediência . . . sem nunca

questionar . . . sem nunca tentar entender . . . porque ...

que eles ... criaram ... tantos obstáculos pra mulher

(36)

...

[

...

] eu não imponho . . . eu vou conquistando silenciosamente ... "

A fé leva o sujeito religioso a se significar pelo silêncio. Ao sujeito religioso é recomendado: " ... aguardar a salvação do Senhor em silêncio ... ", porém, esse silêncio é marcado por uma contradição, pela ilusão da consciência de si, ou seja, "estar em silêncio para aguardar a salvação", pois nesse silêncio que "aguarda" está, ao mesmo tempo presente o questionamento quanto à "obediência cega".

Com respeito à contradição face às doutrinas vale lembrar o que nos diz Haroche:

"A contradição não pode e não deve ser senão aparente, formal: admiti-la em um plano doutrinai é impensável; isto resultaria, com efeito, em reconhecer que existe não uma doutrina verdadeira, mas doutrinas diferentes, e mesmo contraditórias, no entanto, 'igualmente verdadeiras"'.

HAROCHE (1992 p.75)

Como vimos no caso 1 anterior, o questionamento é a exteriorização da ideologia do saber. O sujeito que "aguardava em silêncio" e "questionava com medo", através da Universidade, ele perde o medo de questionar, e através da ideologia religiosa permanece flrme na fé. Ele

(37)

assim, sabe que pode questionar sem perder a salvação, e, "consciente" disso, como podemos observar em nossas análises,não faz alarde, ou seja, questiona para alguns mas não põe em questão a Igreja.

O saber leva o sujeito da Igreja Assembléia de Deus a um "amadurecimento discursivo" que parece significar o seu "equilíbrio" entre fé e razão. Entretanto, é necessário dizer que o sujeito declara-se "amadurecido" quando é re-estabelecida sua comunhão com a Igreja, ou seja, a Igreja atribui cargos de responsabilidades àqueles que passam pela faculdade, o que faz com que o sujeito sinta-se comprometido com a "Palavra de Deus". Dessa forma, o sujeito declara-se amadurecido na fé a partir do discurso científico, sem deixar de colocar a fé como dominante. Ele coloca a ciéncia a serviço da fé.

Veremos no caso 1 a seguir, o discurso de um sujeito que já passou pela Universidade e já atua nos serviços da Igreja por cerca de cinco anos, já no caso 2, o sL\ieito está cursando a faculdade e retornando aos serviços da Igreja.

-Caso l(Dora) " na Igreja ... eu sempre bat ... sempre questionei ... só que com medo .. . i ... quando eu tive a oportunidade de estudar ... eu perdi esse medo ... ce entende ... [ ... ] ... na Universidade ... todos os caminhos que eu percorri ... é ... me levaram a ser a mulher que eu sou hoje ... sabe ... aquilo que eu acredito .. . é verdade .. . baseada na

(38)

Caso 2 (Bia) "

palavra de Deus . . . tanto na vida secular como na vida cristã ... hoje a visão que eu tenho da Igreja ... a visão de Jesus ... é uma questão assim ... bem amadurecida ... e ... eu ... eu acredito que a ... a Faculdade tem uma certa influência porque ... ela questionou muito os valores que a gente tinha a tê então naquela época .. ."

então eu tenho uma base ... evangélica ... muito fortalecida ... e isso ... me ajudou ... lá dentro ... e que está me ajudando ainda ... sabe ... então eu ... ti ... eu já .. . eu .. . assim .. . você sempre vai preparada pra .. . pra uma coisa ... mas você nunca espera ... que seja aquilo que ... realmente acontece ... né ... mas eu ... fiz essa ... essa .. . esse propósito comigo .. . o que eu aprendesse

dentro ... que era bom pra mim ... ficaria comigo ... o que

não fosse eu deixaria de lado ... nê ... ( ... ] ... eu dou graças a Deus ... por ter uma história ... nê ... anterior ... de .. . evangelho .. . i .. . i por hoje eu consegui fazê .. . assim .. . juntar as duas coisas sem uma atrapalhar a outra ... até pra aceitar as coisas dentro da Igreja eu me sinto mais madura .. ."

(39)

O "equilíbrio" entre fé e razão de que falamos anteriormente pode ser percebido nos casos 1 e 2 quando o sujeito acha que "hoje tem uma visão mais amadurecida da Igreja e de Jesus". A "ilusão" de que é "consciente" "até para aceitar as coisas dentro da Igreja" é um discurso que, segundo FOUCAULT (1996), "nada mais é do que a reverberação de uma verdade nascendo diante de seus próprios olhos; e, quando tudo pode, enfim, tomar a forma do discurso, quando tudo pode ser dito e o discurso pode ser dito a propósito de tudo, isso se dá porque todas as coisas tendo manifestado e intercambiado seu sentido, podem voltar à interioridade silenciosa da consciência de si".

Chamamos de "ilusão" esse estado de "consciente equilíbrio" quando o sujeito afirma que: "até pra aceitar as coisas dentro da Igreja me sinto mais madura". Provavelmente seja "ilusão de si", pois o sujeito questiona, mas também se cala, e é nesse "silêncio" que percebemos a "força", ou, o quanto significa o discurso da Igreja Assembléia de Deus em Rolim de Moura para e nos jovens estudantes.

O constrangimento (sofrimento) porque passam alguns desses jovens da Igreja Assembléia de Deus que estão na Universidade e que são disciplinados serve de exemplo para os demais.

A disciplina ou correção é um ensinamento da pedagogia religiosa. Esse ensinamento, com fundamentação bíblica, tem o objetivo de preparar o sujeito religioso para suportar a correção da Igreja como sendo uma "correção santa", necessária para manter o mesmo no caminho da

(40)

salvação, como veremos a seguir. Para tal vamos aliar, em nosso recorte do corpus, um texto da Bíblia, uma fala do pastor e a de um membro da Igreja:

"Filho meu, não menosprezes a correção que vem do Senhor, nem desmaies quando por ele és reprovado; porque o Senhor corrige a quem ama, e açoita a todo filho a quem recebe. É para disciplina que perseverais (Deus vos trata como a filhos); pois, que filho há que o pai não corrige? [ ... ] Toda disciplina, com efeito, no momento não parece ser motivo de alegria, mas de tristeza; ao depois, entretanto, produz fruto pacífico aos que têm sido por ela exercitados, frutos de justiça".

BÍBLIA, (HEBREUS 12 :5 a 7 e 11)

Caso 3 (pastor) " ... tem uma comissão que analisa o caso ... e trás ... pra Igreja ... nós levamos pra Igreja que . . . é .. . pra assembléia geral . . . e ai a assembléia geral decide se disciplina ou exclui ... essa é ... a ... a ... os pontos de vista . .. que se leva a . .. a exclusão e também à disciplina ... "

- Caso l(Dora) " ... fiquei em disciplina ... foi um choque muito grande ...

(41)

chegava num lugar assim e as pessoas simplesmente paravam de conversar quando eu chegava . . . as pessoas da Igreja . .. que me . . . me ignorava ... passaram a me ignorar ... e daí ... então eu sofri muito ... sofri muito ... muito ... eu chorava muito ... muito ... as vezes eu ficava sozinha ... eu ficava cho ... eu chorava ... chorava ... perguntava mais . .. que cristianismo é esse ... que as pessoas não sabem te amar ... não sabem te respeitar . . . se você tomar uma decisão . . . uma decisão que é diferente da maioria . .. cê já não é a mesma pessoa ... cê já não tem valor mais .. ."

Entendemos que um sujeito que "sofre muito" com a disciplina é um sujeito ideologicamente determinado pelo discurso religioso, sendo que o lugar dessa determinação é a fé. Neste caso, "sofrer" significa estar afetado pela "ideologia da salvação" e a disciplina é o instrumento utilizado pela Igreja para evidenciar aos demais membros o sujeito que está em conflito, que está correndo o risco de perder a salvação. " ... os sábios serão envergonhados, aterrorizados ... "

A fé, que é a fundamentação do sujeito que crê é também a exteriorização ou confirmação do funcionamento ideológico religioso. Ou ainda, a constatação da fé é a evidência da performatividade do discurso religioso, que pelo efeito perlocucionalleva o sujeito a afirmar que: " ... eu

(42)

quis voltar ... eu achei que o caminho era Jesus nteSmD .. .", onde esse

"mesmo" vai muito além de um conflito. É, de fato, por causa dessa determinaçãojassujeitamento "mesmo" que o sujeito "sofre livremente":

" ... a idéia de determinação traduz uma certa concepção da relação do sujeito com Deus, uma subordinação maior ou menor do discurso humano ao discurso divino". HAROCHE (1992 p.99)

Isto se dá através da performatividade do

f

no discurso da "Palavra de Deus", que desperta no sujeito a necessidade de "arrependimento", sem o qual, ele está destinado ao sofrimento eterno, ao inferno.

Dessa forma, repensamos a maneira como o sujeito-ouvinte desse discurso é definido por Althusser (1974), para quem Deus é o sujeito e os homens são os seus interlocutores-interpelados, os seus espelhos, os seus reflexos (não foram criados á sua imagem?).

Indo mais longe, podemos considerar que o sujeito-ouvinte desse discurso é preparado para ser servo (eternamente), ou seja, salvar-se para louvar eternamente a Deus. Assim, sendo imagem, a sujeição a uma autoridade superior o deixa desprovido de toda liberdade, salvo a de aceitar a sua submissão, como diz Althusser (ídem).

(43)

"Mas graças a Deus porque, outrora escravos do pecado, contudo viestes a obedecer de coração à forma de doutrina a que fostes entregues; e, uma vez libertados do pecado, fostes feitos servos da justiça. Agora, porém, libertados do pecado, transformados em servos de Deus, tendes o vosso fruto para a santificação, e por fim a vida eterna".

BÍBLIA (ROMANOS 6: 17,18 e 22)

De acordo com O. Reboul (1980), a religião constitui um dominio privilegiado para observar o funcionamento da ideologia, dado, entre outras coisas, o lugar atribuído à palavra, com seu poder objetivante. O sujeito que faz uso desta (palavra), é denominado como "o homem de Deus que tem o Dom da palavra", sendo inclusive orientado biblicamente quanto ao cuidado com o ensino desta palavra, como veremos a seguir, no excerto que segue:

"Procura apresentar-te a Deus, aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade. Ora, é necessário que o servo do Senhor não viva a contender, e, sim, deve ser brando para com todos, apto para instruir, paciente; disciplinando com mansidão os que se

(44)

opõem, na expectativa de que Deus lhes conceda não só o arrependimento para conhecerem plenamente a verdade ... " BÍBLIA (2"TIMÓTEO 2:15,24 e 26)

Considerando então o que diz ORLANDI (1997 4ed): "na ordem do

discurso religioso, Deus é o lugar da onipotência do silêncio. E o homem

precisa desse lugar, desse silêncio, para colocar uma sua fala especifica: a

de sua espiritualidade. Isto significa que no discurso religioso, em seu

silêncio, o homem faz falara voz de Deus".

Assim, como vimos, o homem de Deus é aquele que "maneja bem a palavra da verdade". Deve ser um "obreiro" que consiga conquistar com suas palavras, ou seja, "não viva a contender".

A condição para a atuação de Deus através do "obreiro" é que ele também seja servo na submissão à "Palavra da verdade", ou seja, faça falar a voz de Deus; e depois, só é "obreiro" se "manejar bem" esta palavra, trazendo outros ao arrependimento e à submissão à "Palavra da verdade", o que o coloca na posição de sujeito espiritual à semelhança dos outros.

(45)

2.2.

O Silêncio na Enunciação do Discurso Religioso

" ... o silêncio, na constituição do sentido, é que impede o non sense pelo muito cheio, produzindo o espaço em que se move a materialidade significante (o não-dito necessário para o dito).

ORLANDI ( 1997 p.Sl)

No "pensar o que dizer" ou "pensar para dizer", houve entre os entrevistados algumas "pausas do/para dizer", ou ainda, houve "alguns silêncios" que no momento eram necessários, que significavam entre si na relação entre os entrevistados. O silêncio da resistência, da censura. Uma pausa que precede o que "pode" ser dito. Pausas que angustiavam os entrevistados quanto aos sentidos possíveis do dizer, que significavam a "preservação" e a "defesa" de um "bem comum", no caso, a farm1ia evangélica, afinal, irmãos em Cristo.

(46)

Segundo PARRET 1997, em uma perspectiva da semiótica, "o ser em comunidade, na vida prática das sociedades, só é possível a partir do desejo comum do obrigatório e é de fato esse desejo que pressupomos no outro quando devemos descodificar a significação de seu discurso e de seu comportamento".

A falta desse "desejo comum" talvez nos dê indicações a respeito do silêncio produzido nas falas dos membros da Igreja ouvidos. O dizer dos entrevistados é entremeado de silêncios. A presença do entrevistador significa por não pertencer à mesma formação discursiva dos entrevistados, ou seja, não é membro da Igreja Assembléia de Deus em Rolím de Moura.

Dessa forma, o entrevistador, ao propor o discurso ao entrevistado instaura também nesse discurso o lugar da interdição, provocando no sujeito entrevistado a ilusão de que, estando na origem do dizer, ele pudesse controlar o sentido, enunciando apenas o permitido.

Assim, nesse caso, entre o dito e o dizível aparece a "não-comunicação" que segundo Pêcheux é também constitutiva da linguagem, e essa não-comunicação se dá pela presença do entrevistador que não está na mesma formação discursiva (FUCHS, PÊCHEUX, 1975: o que pode e deve ser dito numa conjuntura dada a partir de uma certa posição do sujeito).

Isso provoca o "silêncio local" que, segundo ORLANDI (1990), é produzido ao se proibirem alguns sentidos de circular, por exemplo, numa

(47)

forma de regime político, num grupo social determinado de uma forma de sociedade especifica etc ..

" ... o silêncio constitutivo e o silêncio local parte do que chamamos política do silêncio, já que imprimem um recorte ( entre o dito e o não-dito ) no seu modo de significar, inscrevendo-se portanto no domínio do poder-dizer." ORLANDI ( 1990, p.50)

Não dizer, não por não ter o que dizer, mas por "elaborar" o que dizer, ou, não dizer, pela ilusão de controlar o dizer, de poder-dizer. Ilusão por pensar em poder dar "um sentido" ao dizer. Querer controlar os sentidos possíveis, provocou repetições instauradoras de silêncio que transformaram essas "pausas" em silêncios angustiantes, silêncios que significam "cumplicidade", "respeito" e "medo", como veremos no caso 1 a seguir:

- Caso l(Dora) " simplesmente vinha na Igreja ... e ... porque tinha ensinado que ali era verdade ... que era o certo ... então ... eu voltei ... eu ... eu tinha medo de sair .. ."

(48)

A presença do silêncio não ê significante pela ausência de palavras, ou seja, essa ausência de palavras se faz presente pela "intervenção" do silêncio, com seu modo próprio de significar.

" Impor o silêncio não ê calar o interlocutor mas impedi-lo de sustentar outro discurso. Em condições dadas, fala-se para não dizer ( ou não permitir que digam ) coisas que podem causar rupturas significativas na relação de sentidos."

( ÍDEM p. 105)

Casol(Dora) " ... então ... é ... e eu passei por cima dessas ... dessa ... dessas idéias ... e ... "

-Caso 2( Bia) " ... que o grande problema na Igreja ê este ... eu acho isto ... porque isto ... isto tá na bíblia ... isto é doutrina de homem

"

- Caso 3(pastor) "... tem membros que ele é disciplinado por . . . ê . . . por desobediência ... à bíblia ... à palavra de Deus ... "

No caso 1, o sujeito ao dizer "eu passei por cima" , coloca-se na condição de convicto do que está fazendo, ou seja, "passar por cima" está significando "atropelar", "pular'~ "ignorar".

(49)

Observamos aí um sujeito que se apresenta como dono do dizer, ou que está ciente do que está dizendo mas depara-se com uma impossibilidade (embora não saiba disso). Segundo Orlandi (1999), o sujeito não tem acesso direto à exterioridade que o constitui, o modo pelo qual ele se constitui sujeito só lhe é parcialmente acessível.

No entanto, este sujeito é aparentemente dono do dizer até o momento em que o silêncio se instaura ou atravessa as palavras, pela complexidade do que está sendo dito e do que vai ser dito, ou como Foucault (1970) disse: " ... uma profunda logofobia, uma espécie de temor surdo desses acontecimentos, dessa massa de coisas ditas, do surgir de todos esses enunciados, de tudo o que possa haver aí de violento, de descontínuo, de combativo, de desordem, também, e de perigoso, desse grande zumbido incessante e desordenado do discurso."

Assim, mesmo que "aparentemente" o sujeito se mostre consciente do que diz, o silêncio intervêm com o seu modo de significar onde o assujeitamento à ideologia religiosa funcionando pelo silenciamento, o do silêncio constitutivo, é que vai determinar o que "pode" ou "deve" ser dito, " ... passar por cima ... " de quê ? de quem ?. Neste caso, " ... dessas idéias ... " pode ter significações como :

- "passar por cima das idéias do pastor"

-"passar por cima das idéias da Igreja" - "passar por cima das idéias da Bíblia"

(50)

Nesse conjunto de paráfrases, podemos alinhar de um lado, do pastor, da Igreja e dos irmãos, enquanto "doutrina de homens", ao passo que, de outro lado, temos "idéias da Bíblia", como contraponto.

Segundo o exposto acima, " ... dessas idéias ... " pode ser paráfrase de "dessas doutrinas", e ainda, quando o sujeito diz "dessas" é para não dizer "A idéia" ou "A doutrina" como "Palavra de Deus" , mas " dessas idéias de homem" , ou "dessas doutrinas de homem", o que tem relação com o caso 2 a seguir.

No caso 2 ( Bia ), o sujeito demonstra que conhece o problema na Igreja, e assim, como no caso anterior, o sujeito se apresenta como "transparente", livre para o dizer, mas, como quem tem que acionar o freio de um carro ao deparar com o sinal vermelho, caso contrário pode sofrer ou provocar um acidente, o sujeito neste discurso afirma :

1°- "existe um problema", pois o chama de "o problema" e não "alguns problemas".

2°- "existe um grande problema", conhece o problema e o qualifica

como "grande".

3°- "problema na Igreja" e não da Igreja, o que garante a soberania

(51)

Entretanto, no momento em que o sujeito vai "mostrar" ou "defmir" o problema quando afirma "é este", significativamente o silêncio irrompe, não porque falta o que dizer, não é um vazio, mas um espaço ideologicamente determinado do que "pode" ser dito, ou ainda, o "espaço do assujeitamento" que neste caso está significando pelo silêncio.

Vejamos como relacionar em Orlandi (idem) o silêncio fundador e o silenciamento:

" ... em face do discurso, o sujeito estabelece necessariamente um laço com o silêncio; mesmo que esta relação não se estabeleça em um nível totalmente consciente. Para falar, o sujeito tem necessidade de silêncio, um silêncio que ê fundamento necessário ao sentido e que ele reinstaura falando." / ... j "Com efeito, a política do silêncio se defme pelo fato de que ao dizer algo apagamos necessariamente outros sentidos possíveis, mas indesejáveis, em uma situação discursiva dada". ( ÍDEM p. 71 e 75)

Dessa forma, o sujeito que demonstrava um "controle do dizer", marcado pelo silêncio reinstaura o dizer, mas um outro dizer, um dizer que deixa a determinação " ... é este ... " e assume, atravessado pelo silêncio, a

(52)

indeterminação " ... eu acho isto " e é nessa aparente indeterminação discursiva que aparece a determinação ideológica.

Um assujeitamento que faz com que o sujeito tenha que ficar repetindo um dizer que "parece sem sentido", " ... eu acho isto ... porque isto ... isto ... ", a fim de silenciar um outro dizer

procurando desesperadamente o que "pode" ser dito;

" ... é este ... ",

-" ... o grande problema na Igreja é este ... é doutrina de homem ... " - " ... eu acho isto ... é doutrina de homem ... "

-" ... porque isto ... é doutrina de homem ... "

- " ... isto tá na bíblia ... ( não ) ... é doutrina de homem ... "

- " ... isto ... ( que não ) ... tá na bíblia .... é doutrina de homem ... "

Então, o que foi dito acima pode significar que: "o grande problema na Igreja é este", "o que não tá na bíblia", "isto é doutrina de homem"; ou

ainda, pode ser que o pastor não ache isto, que os irmãos não achem isto,

mas, o sujeito se apresenta ao dizer: - " ... eu acho isto ... "

Caso 2(Bia) " ... eu acho assim ... que o grande problema na Igreja é este ... eu acho isto . . . porque isto . . . isto ta na bíblia . . . isto é doutina de homem ... e doutri... porque doutrina

(53)

universal ... não pode aqui e não pode em lugar nenhum ... não é ? ... a doutrina que pode aqui na sede e não pode ali na congregação ... não é doutrina de Deus não ... é doutrina de homem ... e eu não concordo com este tipo de doutrina .. ."

Assim, observamos que, no caso 1, a formulação " ... dessas idéias ... "tem relação com o caso 2," ... doutrina de homem ... ". Então, se "é este o grande problema" é preciso, ou pode " ... passar por cima ... ", não está na bíblia, se estivesse na bíblia seria "A idéia", "A" "Palavra de Deus" e aí o sujeito não poderia "passar por cima".

"A doutrina liga os indivíduos a certo tipo de enunciação e lhes proíbe, conseqüentemente, todos os outros; mas ela se serve, em contrapartida, de certos tipos de enunciação para ligar indivíduos entre si e diferenciá-los, por isso mesmo, de todos os outros."

FOUCAULT (3 ed. 1996 p.43)

Então, o silêncio é o lugar determinado ideologicamente nestes discursos, que aí funciona como "antídoto" para afastar um possível "envenenamento da Palavra" ou da Igreja. O silêncio da razão religiosa

(54)

como afirma Foucault (ÍDEM), " Se é necessário o silêncio da razão para curar os monstros, basta que o silêncio esteja alerta ... " e na relação com os sentidos, o sujeito dispõe de signos, marcas, traços, letras. Mas, para manifestá-los, não precisa passar pela instância singular das palavras.

No caso 3 (Pastor), reencontramos o silêncio no dizer, um silêncio colocado sob o signo da "prudência", ou seja, o sujeito não apresenta "o pastor", apresenta a "bíblia" e como "reforço", reitera, " ... a palavra de Deus ... ".

Na pedagogia religiosa das Igrejas denominadas evangélicas, e neste caso, Assembléia de Deus, o pastor é, "abaixo de Deus" (dizer religioso), a maior autoridade, ele tem o "dom da palavra" e é "revestido pelo Espírito Santo. Por isso, o lugar do pastor aparece no discurso, ou melhor, é evidenciado quando diz; " ... ele é disciplinado ... " ao invés de " pode ser disciplinado".

Neste lugar, o silêncio é a busca de uma justificativa para a aírrmação anterior, ou ainda, a justificativa está no silêncio, que aí

significa o espaço da transferência da responsabilidade pela disciplina, ou seja, "o pecado original", o primeiro pecado, " ... por desobediência ... ", e

não é desobediência ao pastor ou a Igreja, " ... por desobediência à bíblia ... ", que não apresenta "doutrina de homem" e sim " ... a palavra de Deus ... ".

(55)

1 o- "... ele é disciplinado por ... " " ... passar por cima dessas idéias

"

2°- " ... ele é disciplinado por ... " " achar que a Igreja tem um grande problema"

3°- " ... ele é disciplinado por ... " " achar que a Igreja tem doutrina que não é da bíblia"

4°- " ... ele é disciplinado por ... " " achar que a Igreja tem doutrina de homem"

5°- "isto é desobediência" "desobediência à bíblia" "desobediência à palavra de Deus"

Acredito que o silêncio que entremeou os discursos acima, seja o "espaço da interdição do dizer", o lugar onde o sujeito vacila, afetado pela "obediência/desobediência", para então dizer. Ainda assim, segundo Foucault (ÍDEM), não se tem o direito de dizer tudo, não se pode falar de tudo em qualquer circunstância. Assim, as pausas que pareciam ser comuns ou simplesmente turnos conversacionais, é, neste caso, o lugar da tensão e da resistência do sujeito.

(56)

2.3

O

silêncio da

ou o silenciamento pela fé?

O texto que vamos analisar faz parte do doutrinamento da Igreja Assembléia de Deus em Rolim de Moura e poderia ser analisado junto a outros assuntos propostos neste trabalho, entretanto, para entendermos melhor como a pedagogia religiosa impõe o silêncio sem calar o interlocutor, apresentaremos o texto a seguir, que faz parte do nosso corpus:

" O cristão genuíno, que crê e confia no Senhor Jesus, aceita tudo pela fé sem discutir o porquê, mas o homem natural quer uma razão e justificativa para todos os fatos. Ele recorre então à füosofia ou à ciência, criando teorias, na tentativa de justificar o que não entende. Às vezes, as teorias são verdadeiros embustes, desacreditadas, salvo raras exceções. Os que pelo toque do Espirito Santo se convertem aceitam sem discussão a clareza dos fatos já justificados tal como são diante das evidências e não se preocupam com explicações fllosóficas. Conformam-se e

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