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2011 CARDOSO JUNIOR - OFENSAS AO PRINCIPIO DA LEGALIDADE EM ENUNCIADOS CIVEIS DO FONAJE

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR CAMPUS DE CACOAL

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DO CURSO DE DIREITO

SABINO JOSÉ CARDOSO JUNIOR

OFENSAS AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE EM ENUNCIADOS

CÍVEIS DO FONAJE

Trabalho de Conclusão de Curso Monografia

Cacoal - RO 2011

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OFENSAS AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE EM ENUNCIADOS

CÍVEIS DO FONAJE

Por:

SABINO JOSÉ CARDOSO JUNIOR

Trabalho de conclusão de curso apresentada à Universidade Federal de Rondônia - UNIR – Campus de Cacoal, como requisito parcial para grau final de Bacharel em Direito elaborada sob a orientação do Professor Mestre Telmo de Moura Passareli

Cacoal - RO 2011

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SABINO JOSÉ CARDOSO JUNIOR

OFENSAS AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE EM ENUNCIADOS CÍVEIS

DO FONAJE

Esta monografia foi julgada aprovada para obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR – Campus de Cacoal, mediante apresentação à Banca Examinadora, formada por:

___________________________________________________ Prof. Ms Telmo de Moura Passareli – Orientador/UNIR

__________________________________________________ Profa. Esp. Ana Clara Cabral de Souza Cunha - Membro/UNIR

_________________________________________________ Profa. Ms Thais B. Maganhini - Membro/UNIR

Cacoal – RO 2011

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Agradeço a Deus por me permitir fazer parte da história desta instituição.

Agradeço também à minha família que sempre me incentivou, em especial ao meu pai, Sabino José Cardoso, e à minha mãe, Erionita Hartekopff Cardoso.

Agradeço também aos professores e amigos que fizeram parte desta importante fase da minha vida.

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RESUMO

CARDOSO JR, Sabino José. Ofensas ao princípio da legalidade em enunciados cíveis do

FONAJE. 73 folhas. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal de Rondônia –

Campus de Cacoal – 2011.

O princípio da legalidade é um dos mais importantes do sistema jurídico brasileiro. Este princípio impede arbitrariedades e confere estabilidade às relações em sociedade. O tema do presente trabalho é justamente avaliar algumas posições emitidas pelo Fórum Nacional dos Juizados Especiais (FONAJE) que aparentemente colidem com a legislação. Toda lei em fase inicial de aplicação pode gerar dúvidas, com a Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995) não foi diferente. Aproximadamente dois anos após a criação da lei dos juizados especiais foi criado o FONAJE. A entidade nasceu do movimento de magistrados devido às dúvidas e dificuldades de interpretação resultante da pouca produção doutrinária referente aos juizados e à jurisprudência, que ainda era muito divergente. Com o passar dos anos os enunciados do FONAJE alcançaram influência sobre a interpretação legal no âmbito dos juizados, facilitando a uniformização de procedimentos e aplicação da lei. O presente trabalho tem como objetivos analisar estes enunciados e suas contradições com o princípio da legalidade. Determinar se essas contradições são aparentes ou se de fato existem. Analisar o porquê de tais contradições, uma vez que os integrantes do FONAJE atuam diretamente na área dos juizados especiais e entender a relação e função dos enunciados dentro do sistema jurídico brasileiro. Foi utilizado o método dialético para a elaboração do presente trabalho, confrontando as informações reunidas para alcançar uma conclusão. O tema foi desenvolvido por meio do método dialético. Foram feitas pesquisas bibliográficas, doutrinárias, jurisprudenciais, legislativas, bem como artigos científicos pertinentes ao assunto. Como as discussões acerca do tema são relativamente novas foi necessária uma pesquisa jurisprudencial para conhecer o entendimento atual sobre os enunciados mais controversos. O trabalho é iniciado fornecendo alguns importantes conceitos para que o leitor tenha as ferramentas necessárias à reflexão sobre os pontos críticos em questão. Primeiramente são expostos os aspectos históricos sobre a criação dos juizados especiais e do FONAJE. Em seguida são explicados os conceitos jurídicos de princípio, lei, princípio da legalidade, devido processo legal. Em seguida, munido destas informações, é iniciada a exposição dos aspectos controversos desta monografia.

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ABSTRACT

CARDOSO JR, Sabino José. Injuries to the principle of legality in the civil FONAJE statements. 73 pages. Completion of course work. Federal University of Rondônia - Campus from Cacoal - 2011.

The principle of legality is one of the most important of Brazilian legal system. This principle provides stability and prevents arbitrary relations in society. The theme of this paper is to evaluate some positions issued by the National Forum of Special Courts (FONAJE) that apparently conflict with the law. Every law in the initial application can generate questions, with the Law No. 9.099/95 (BRAZIL, 1995) was no different. Approximately two years after the creation of special courts of law was created FONAJE. The organization was born of the movement of judges due to doubts and difficulties of interpretation resulting from low production doctrine concerning the courts and case law, which was still very divergent. Over the years FONAJE reached the statements of the influence on the legal interpretation in the courts, facilitating the standardization of procedures and law enforcement. This paper aims to examine these statements and contradictions with the principle of legality. Determine whether these contradictions are apparent or if in fact exist. Analyze why such contradictions, since the members of FONAJE act directly in the field of special courts and to understand the relationship and function of utterances in the Brazilian legal system. We used the dialectical method for the preparation of this work, comparing the information gathered to reach a conclusion. The theme was developed through the dialectical method. Literature searches were made, doctrinal, jurisprudential, legislative, and scientific articles relevant to the subject. As the discussions on the subject are relatively new research was needed to meet the jurisprudential current understanding about the most controversial statements. The paper starts by providing some important concepts for the reader to have the tools necessary to reflect on the critical points in question. First outlines the historical aspects of the creation of special courts and FONAJE. Then explains the legal concepts of principle, law, principle of legality, due process. Then, armed with this information, starts the exposure of controversial aspects of this monograph.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 08

1 BREVE HISTÓRICO SOBRE A CRIAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS... 10

1.1 ESBOÇO SOBRE A CRIAÇÃO, ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO FONAJE.11 2 CONCEITOS JURÍDICOS... .13

2.1 PRINCÍPIOS... .13

2.2 LEI... 14

2.3 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE... 15

2.4 O PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL... ..17

2.5 O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO DIREITO PENAL... .19

2.6 O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO DIREITO ADMINISTRATIVO... 20

2.7 O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO... 22

2.8 COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR... 23

3 OS ENUNCIADOS CÍVEIS DO FONAJE E ALGUNS CASOS ESPECÍFICOS DE CONFLITO COM A LEGISLAÇÃO... .25

3.1 ENUNCIADO 141 (ALTEROU O ENUNCIADO 110)... .25

3.2 ENUNCIADO 135 (SUBSTITUIU O ENUNCIADO 47)... ..28

3.3 ENUNCIADO 5... ..31

3.4 ENUNCIADO 13... ..39

3.5 ENUNCIADO 58... .42

3.6 LIMITAÇÕES RECURSAIS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS... ..49

CONCLUSÃO... ...56

REFERÊNCIAS... ..58

OBRAS CONSULTADAS... ..61

ANEXO A ENUNCIADOS ATUALIZADOS ATÉ O XXIX FORÚM NACIONAL DE JUI-ZADOS ESPECIAIS 25, 26 e 27 de maio de 2011 – Bonito/MS... 62

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por tema a análise das ofensas ao princípio da legalidade em enunciados cíveis do FONAJE.

O art. 5°, II, da Constituição Federal (BRASIL, 1988) preceitua que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Esse princípio é inerente ao sistema jurídico brasileiro e de qualquer estado democrático de Direito. Partindo dele serão analisadas algumas obrigações impostas no âmbito dos juizados que aparentam não possuir base legal.

A criação dos juizados especiais foi prevista pelo inciso I do artigo 98 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Sua implantação só ocorreu após a aprovação da Lei Federal n° 9.099/95 (BRASIL, 1995). Os juizados foram ganhando muita importância por serem mais céleres, muitas causas que demorariam meses eram resolvidas rapidamente. Grande parte delas através de conciliação.

Inicialmente os problemas relacionados à lei eram muitos, pois não havia jurisprudência e nem produção doutrinária referente ao tema. Aproximadamente dois anos após a criação da Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995) foi criado o FONAJE, justamente devido às dificuldades de interpretação e aplicação da lei. Esta entidade surgiu do movimento de magistrados que trabalhavam nos juizados especiais. Embora a entidade não tivesse vínculo com o judiciário o fato de todos os seus integrantes serem juízes lhe deu credibilidade. Seus enunciados servem de orientação em temas controversos.

Essa entidade se destacou por realizar um trabalho que envolve o acompanhamento direto de qualquer tema que envolva os juizados especiais: A uniformização de procedimentos; a produção de enunciados; o acompanhamento, análise e estudo dos projetos legislativos referentes ao tema; além de recomendações sugestões e pedidos de providência

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aos Tribunais de Justiça.

Em que pese o grande serviço prestado pelo FONAJE, algumas interpretações soam como arbitrariedade, pois aparentemente destoam da lei.

Feitas estas considerações surgem algumas dúvidas. Essas contradições são aparentes ou se de fato existem? Se existem, por que os debates sobre o tema são tão escassos? Que papel possuem essas interpretações (enunciados) no ordenamento jurídico brasileiro? Por que o FONAJE, entidade composta essencialmente por magistrados, aprovou alguns enunciados contrários à legislação infraconstitucional?

A motivação do presente trabalho resulta do interesse em torno de discussões surgidas no âmbito dos juizados especiais, referentes à interpretação dada pelo Fórum Nacional dos juizados Especiais a determinados pontos da Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995). O tema é justificado devido à importância do princípio da legalidade, fundamento de qualquer regime democrático e a sua supressão em alguns momentos.

O presente trabalho tem como objetivos analisar as ofensas ao princípio da legalidade em enunciados cíveis do FONAJE. Determinar se essas contradições são aparentes ou se de fato existem. Analisar o porquê das contradições, uma vez que os integrantes do FONAJE atuam diretamente na área dos juizados especiais, e entender a relação e função dos enunciados dentro do sistema jurídico brasileiro.

Foi utilizado o método dialético para a elaboração do presente trabalho, confrontando as informações reunidas para alcançar uma conclusão. O tema foi desenvolvido a partir da pesquisa de bibliografia, doutrina, jurisprudência, legislação, bem como artigos científicos pertinentes ao assunto. Como as discussões acerca do tema são relativamente novas foi necessária uma pesquisa jurisprudencial para conhecer o entendimento dos Tribunais sobre os enunciados mais controversos, se a aplicação dos enunciados é pacífica ou se gera divergências.

O trabalho é iniciado fornecendo alguns aspectos básicos para que o leitor tenha os subsídios necessários à reflexão sobre os pontos críticos do tema. Primeiramente são expostos os aspectos históricos sobre a criação dos juizados Especiais e do FONAJE. Em seguida são explicados os conceitos jurídicos de princípio e lei. Por fim é abordado o princípio da legalidade para então expor os aspectos controversos desta monografia.

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1 BREVE HISTÓRICO SOBRE A CRIAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

O Juizado Especial de Pequenas Causas, criado pela Lei nº 7.244, de 7 de novembro de 1984, foi o precursor do modelo atual dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Os Juizados de Pequenas Causas tinham a competência para o julgamento de ações de reduzido valor econômico, ou seja, causas que tratassem sobre direitos patrimoniais e decorressem de pedido que, à data do ajuizamento, não excedesse a 20 (vinte) vezes o salário mínimo vigente no País.

Inicialmente houve um pouco de resistência por parte dos advogados para a implantação do Juizado Especial de Pequenas Causas, pois a representação por advogado não seria obrigatória. A insatisfação de alguns por causa da implantação dos juizados de pequenas causas não encontrou eco porque, quando criados, o índice de conciliação e resolução de processos, em um curto espaço de tempo, foi muito elevado. O Judiciário não foi sobrecarregado com as novas ações como também aumentou o escoamento das ações que, antes, demoravam meses a mais para serem decididas. Causas que antes eram inviáveis para o cidadão, por fatores diversos, agora tinham um meio célere e gratuito de solução.

Devido aos anseios de doutrinadores e da população em geral a Constituição Federal (BRASIL, 1988) introduziu em seu texto a determinação para a criação dos Juizados Especiais que buscariam a solução de conflitos através da composição amigável, como uma resposta mais efetiva para as necessidades da sociedade, aumentando o acesso à justiça e facilitando o desenrolar dos processos em andamento.

Embora houvesse interesse por parte da sociedade e do judiciário a criação da Lei Federal que regulamentaria os Juizados Especiais Cíveis e Criminais só ficou pronta aproximadamente sete anos depois.

A Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995) criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. A própria Constituição trazia em seu texto a ideia geral que, agora, tomava corpo, conforme o artigo 98, inciso I (BRASIL, 1988):

Art. 98 - A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;

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Cíveis e Criminais fariam parte da justiça ordinária e deveriam ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados no prazo de seis meses contados do prazo de vigência da Lei Federal, embora não houvesse sanção expressa pelo seu não cumprimento.

A Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995) estabeleceu regras gerais de processo e procedimento. Respeitando as peculiaridades locais, a lei determinou que a instituição dos juizados e a elaboração de normas especiais ficassem sob a responsabilidade do legislador estadual que, é claro, deveria observar a legislação federal ao normatizar.

1.1 ESBOÇO SOBRE A CRIAÇÃO, ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO FONAJE

O Fórum Nacional dos Juizados Especiais (FONAJE) foi criado em 1997. Surgiu devido à necessidade de melhorar a prestação jurisdicional nos juizados especiais por meio de um diálogo de norte a sul do país, padronizando procedimentos, trocando informações, aplicando ideias que obtiveram sucesso em outros Estados da Federação.

O FONAJE é integrado por todos os magistrados que atuam na esfera dos juizados especiais. A instituição é administrada por um Presidente e um Vice Presidente, ambos são eleitos dentre os membros da instituição. O Vice Presidente atua em casos de impedimento e ausência do Presidente. O Secretário-Geral, que é indicado pelo Presidente, é o responsável pela lavratura das atas de reuniões (semestrais) e guarda de toda a documentação relativa às atividades do FONAJE. Também compete ao Secretário-Geral organizar a memória da entidade.

Os principais objetivos do FONAJE, conforme dispõe o seu regimento interno, são:

I – Congregar magistrados do Sistema de juizados Especiais Cíveis e Criminais dos Estados e Distrito Federal; II – Aperfeiçoar o sistema de juizados Especiais e promover a atualização de seus membros pelo intercâmbio de conhecimentos e de experiências; III - Uniformizar métodos de trabalhos, procedimentos e editar enunciados; IV - Analisar e propor projetos legislativos de interesse de juizados Especiais; V – Manter intercâmbio, dentro dos limites de sua finalidade, com entidades de natureza jurídica e social do país e do exterior.

Um dos órgãos mais importantes do FONAJE é a Comissão Legislativa. Ela é nomeada na Assembleia de eleição da Presidência para funcionar durante o seu mandato. É composta pelo Presidente, Vice-Presidente e Secretário-Geral e por dois membros de cada região do país, indicados pelos respectivos representantes de cada região presentes na Assembleia.

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Conforme o artigo 6º do regimento interno do FONAJE compete à Comissão Legislativa: “§ 1º - [...] elaborar propostas, acompanhar e se manifestar sobre projetos de lei e emendas à Constituição Federal”.

Isto significa que a entidade procura fiscalizar tudo o que envolva a Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995). A elaboração de propostas, o acompanhamento e manifestação sobre projetos de lei, o envio de recomendações aos tribunais, entre outras ações, demonstra esse caráter ativo da entidade. Essa atuação confirma o interesse em manter a essência dos juizados especiais.

Deve ficar claro que o FONAJE não possui nenhum poder legislativo, quando se fala no caráter ativo desta instituição é necessário ter em mente que o trabalho feito pela instituição ocorre por meio de projetos de lei, propostas e manifestações que, em último caso, são decididas pelos parlamentares.

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2 CONCEITOS JURÍDICOS

Pra uma melhor compreensão do presente trabalho é essencial possuir alguns conceitos nele utilizados, uma vez que possuem uma carga significativa muito grande. Se estes conceitos não forem interiorizados a leitura e assimilação do tema poderá acabar prejudicada.

2.1 PRINCÍPIOS

A expressão “princípio da legalidade” possui um significado em seu conjunto. Entretanto os seus elementos, princípio e lei, serão estudados independentemente um do outro para, a partir daí, alcançar a compreensão do “princípio da legalidade” em seu todo.

Devido a sua importância para o entendimento das disciplinas jurídicas, o conceito de princípio geralmente é abordado nas matérias introdutórias ao direito. Após subir este degrau são apresentados aos estudantes os princípios que norteiam o direito. São diversos os autores que abordam o tema. Como ensina o professor Mello (2004, p. 841), no Direito, princípio é conceituado como:

Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.

Outra interessante definição para princípio jurídico é a do professor Carrazza (1995, p. 35), segundo ele:

[...] princípio jurídico é um enunciado lógico, implícito ou explícito, que, por sua grande generalidade, ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com ele se conectam. […] Nenhuma interpretação deve ser havida por boa (e, portanto, por jurídica) se, direta ou indiretamente, vier a afrontar um princípio jurídico-constitucional. […] Em suma, os princípios são normas qualificadas, exibindo excepcional valor aglutinante: indicam como devem aplicar-se as normas jurídicas, isto é, que alcance lhes dar, como combiná-las e quando outorgar precedência a algumas delas.

Os princípios podem ser explícitos (expressos na lei) ou implícitos. Servem como norteadores para as normas de hierarquia mais baixa, vinculando a interpretação e

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aplicação.

Assim o doutrinador Reale (1986, p. 70) define princípio jurídico:

Princípios são, pois, verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou garantia de certeza a um conjunto de juízos, ordenados em um sistema de conceitos relativos a porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas proposições que, apesar de não serem evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas como fundantes da validez de um sistema particular de conhecimentos, como seus pressupostos necessários.

Pode-se perceber uma linha de raciocínio constante em todas estas definições. A referência ao princípio como um axioma, um comando primário, um fundamento, uma norma a partir da qual todo o resto é construído. São os princípios que permitem a ligação e a estabilidade entre as normas de hierarquia maior e menor, que possibilitam a coerência em meio a complexidade do sistema jurídico. Os princípios vinculam a criação e interpretação das normas.

2.2 LEI

O que é lei? Segundo Montoro (2000, pg. 293-294), não há consenso sobre a origem da palavra. Ela pode vir de pelo menos três palavras originárias do latim. A primeira seria

legere, que significa ler. A segunda opção seria o verbo ligare, cujo significado é vincular,

obrigar. Por fim, há a terceira opção que seria eligere, entendida como escolher, eleger.

Conforme definição de Montesquieu (2007, p. 22), lei “são as relações necessárias que derivam da natureza das coisas”. Para o professor Reale (2005, p. 162), lei é “toda relação necessária, de ordem causal ou funcional, estabelecida entre dois ou mais fatos, segundo a natureza que lhes é própria”.

Nota-se em leituras de obras jurídicas que às vezes a palavra lei assume significados mais genéricos, às vezes mais específicos. Em outras publicações não relacionadas ao direito é empregada indistintamente para se referir a leis, decretos, portarias, resoluções, etc., sem muito rigor jurídico.

Em uma definição menos técnica costuma-se usar a palavra lei como as determinações provenientes do Estado que, por atos normativos (leis delegadas, medidas provisórias, decretos, resoluções), regulam a vida em sociedade.

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pelo professor Clóvis Beviláqua (apud DE PLÁCIDO E SILVA, p. 481), que conceituou lei como: "ordem geral obrigatória que, emanando de uma autoridade competente reconhecida, é imposta coativamente à obediência geral”.

Observa-se que nesta definição, mais técnica, há uma preocupação maior com a precisão do conceito de lei. Em outras palavras e, mantendo os elementos da definição de Clóvis Beviláqua, lei é uma norma geral e abstrata que prescreve para sociedade os atos e condutas tidos como corretos, justos e desejados. Essa norma carrega em si uma sanção para todos aqueles que não se adequarem a ela.

Nestes termos somente é considerado lei o ato normativo emanado do Poder Legislativo. Apenas há inovação de direitos e deveres em decorrência de lei entendida nos termos acima delimitados.

2.3 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Tomando por base os conceitos de princípio e lei acima citados, fica mais fácil assimilar a expressão “princípio da legalidade” e entender porque sua presença é marcante na Constituição Federal (BRASIL, 1988), como é possível verificar nos artigos 5º, inciso XXXIX (legalidade penal), artigo 37, caput (legalidade administrativa) e artigo 150, inciso I (legalidade tributária).

Entre os princípios integrantes do ordenamento jurídico o princípio da legalidade é um dos mais importantes. É um dos fundamentos do Estado de Direito, sendo inerente a ele. Vem expresso no inciso II do artigo 5º da Constituição Federal (BRASIL, 1988), dispondo, com exatidão e de maneira muito clara que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

De acordo com o professor Moraes (2003, p. 36 e 37):

O art. 5°, II, da Constituição Federal, preceitua que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Tal princípio visa combater o poder arbitrário do Estado. Só por meio das espécies normativas devidamente elaboradas conforme as regras de processo legislativo constitucional podem-se criar obrigações para o indivíduo, pois é expressão da vontade geral. Com o primado soberano da lei, cessa o privilégio da vontade caprichosa do detentor do poder em benefício da lei.

O princípio da legalidade, principalmente após o movimento Iluminista (século XVIII), vem influenciando o Direito, estabelecendo uma limitação ao poder estatal,

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objetivando com isso garantir direitos mínimos para os cidadãos. Um grande exemplo disso é que, hoje, somente é possível imputar um crime a alguém se houver uma lei criada anteriormente prevendo tal conduta e estabelecendo uma pena. Essa constatação parece tão óbvia e racional que não é possível imaginar como poderia ser de outra forma, como seria aceitável imputar um crime a alguém sem previsão legal. Mas nem sempre foi assim, tanto é que os participantes da Assembleia Constituinte de 1988, sentiram-se obrigados a gravar o princípio da legalidade na Constituição Federal (BRASIL, 1988).

Segundo os iluministas a vontade do homem, embasada racionalmente, seria o meio para se alcançar um Estado Racional. A destruição do antigo modelo era vista como condição essencial para que as novas cabeças pudessem começar suas atividades. O homem não viveria mais sob a arbitrariedade dos poderosos, mas sob o império da lei. O império e submissão à lei levariam o homem a uma situação de segurança jurídica.

Rousseau (ROUSSEAU, 2003), em sua obra “Do contrato Social” afirmou que a liberdade é inerente ao ser humano e que só pode ser limitado por um acordo de livre e espontânea vontade, um “contrato social” no qual cada um colocaria comunitariamente sua pessoa e suas energias sob a direção suprema da lei (vontade geral).

O conceito de liberdade para Rousseau não consiste em fazer o que se deseja, mas em fazer o que é justo. E o justo seria determinado pela vontade da maioria. Para isto deveria ser aplicado o poder coercitivo do Estado, pois aquele que recusa obediência à vontade geral atenta contra o bem comum e à liberdade do homem. Obedecendo à vontade geral o homem obedece a si mesmo e a mais ninguém. Rousseau concebia a vontade geral como expressão universal da razão humana.

Como ensina Jesus (1993, p. 51):

[...] O princípio da legalidade (ou de reserva legal) tem significado político, no sentido de ser uma garantia constitucional dos direitos do homem. Constitui a garantia fundamental da liberdade civil, que não consiste em fazer tudo o que se quer, mas somente aquilo que a lei permite. À lei e somente a ela compete fixar as limitações que destacam a atividade criminosa da atividade legítima. Esta é a condição de segurança e liberdade individual. [...] Assim, não há crime sem que, antes de sua prática, haja uma lei descrevendo-o como fato punível. É lícita, pois, qualquer conduta que não se encontre definida em lei penal incriminadora. Com o advento da teoria da tipicidade, o princípio da reserva legal ganhou muito de técnica. Típico é o fato que se amolda à conduta criminosa descrita pelo legislador. É necessário que o tipo (conjunto de elementos descritivos do crime contido na lei penal) tenha sido definido antes da prática delituosa. Daí falar-se em anterioridade da lei penal incriminadora. Assim, o art. 1o., do Código Penal, contém dois princípios: 1) Princípio da legalidade (ou de reserva legal) – não há crime sem lei que o defina; não há pena sem cominação legal. 2) Princípio da anterioridade – não há crime sem lei anterior que o defina; não há pena sem prévia imposição legal. Para que haja crime é preciso que o fato que o constitui seja cometido após a entrada em vigor da

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lei incriminadora que o define.

O princípio da legalidade significa que autonomia da vontade individual somente encontra seus limites nas fronteiras estabelecidas pela lei. Tudo o que não for proibido legalmente é automaticamente permitido para o cidadão. Este pensamento, que teve origem após a Revolução Francesa com o Iluminismo, veio ganhando força até os dias atuais. Pensadores da época consideraram o princípio da legalidade um marco decisivo no processo de evolução espiritual do ser humano.

2.4 O PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

A preocupação em proteger o homem das arbitrariedades estatais pode ser percebida no pós-guerra, na leitura do artigo 8º da Declaração Universal dos Direitos Humanos que estabelece que “toda pessoa tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei”.

Muito antes disso a Magna Carta, assinada em 1215 por João Sem Terra, delineava no seu artigo 39 a obrigatoriedade de um devido processo para que pudesse ser imposta uma pena. A Carta assegurava que nenhum homem livre seria preso, aprisionado ou privado de sua propriedade, ou tornado fora-da-lei, ou desterrado, ou de qualquer forma prejudicado ou seria alvo da coerção do estado, a não ser por julgamento legal dos seus pares, ou pela lei da terra.

O princípio do devido processo legal vem expresso no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal (BRASIL, 1988) declarando que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

O professor Barroso (2011, pg. 23), ensinando sobre o princípio do devido processo legal, explica que ele assegura a todos o direito a um processo com todas as etapas previstas em lei e todas as garantias constitucionais. O desrespeito a estas etapas acarreta a nulidade processual. É considerado o mais importante dos princípios constitucionais porque dele derivam os demais princípios.

A doutrina costuma analisar esse princípio sob os aspectos formal e material (CINTRA, DINAMARCO e GRINOVER, 2010, p. 46):

Chama-se direito processual (formal) o complexo de normas e princípios que regem tal método de trabalho, ou seja, o exercício conjugado da jurisdição pelo

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Estado-juiz, da ação pelo demandante e da defesa pelo demandado. Direito material é o corpo de normas que disciplinam as relações jurídicas referentes a bens e utilidades da vida (direito civil, penal, administrativo, comercial, trabalhista, tributário, etc.).

Pode-se concluir que o devido processo legal em sentido formal significa que deve haver o exato cumprimento das normas procedimentais que regulam o processo, das normas que orientarão a aplicação do direito material. Esse conjunto de normas e princípios norteará a atuação do juiz, do autor e do réu.

O devido processo legal material constitui o dever de observar o total das normas que se aplicam às relações jurídicas atinentes a bens e utilidades da vida (direito penal, trabalhista, comercial, tributário, civil). Não se trata apenas de aplicar a norma material ao caso concreto. Trata-se também de controlar o seu conteúdo com o fito de impedir o arbítrio do Poder Legislativo e a discricionariedade dos atos públicos. Por meio do princípio do devido processo legal é possível realizar uma avaliação sobre a razoabilidade e racionalidade de normas de direito e atos emanados do Poder Público.

Anteriormente, o princípio do devido processo legal não objetivava questionar a matéria ou substância de atos praticados pelo Poder Público. Era interpretado com a finalidade de garantir simplesmente o direito ao cidadão a um justo processo (sentido formal). Originariamente era relacionado unicamente ao direito processual penal, embora a constituição não o limitasse. Atualmente suas implicações são estudadas no direito processual civil e administrativo.

O professor Didier Junior (2009, p. 29, 30), corroborando com o presente raciocínio, comenta que o princípio em discussão consiste em um fundamento processual. Sua aplicação pode ser efetivada a tudo que disser respeito à vida, à liberdade, ao patrimônio e inclusive na formação de leis.

Continuando o pensamento, o professor Didier (2009, p. 29 e 30) explica que o devido processo legal é aplicado também às relações jurídicas privadas, seja na fase anterior ao contrato, seja na fase executiva, devido a Constituição do Brasil admitir através do seu conjunto axiológico a ampla vinculação dos particulares aos direitos fundamentais nela erigidos, de modo que não só o Estado como toda a sociedade podem ser sujeitos passivos desses direitos.

O professor Ferreira (apud, LENZA, 2011, p. 927), explicando sobre o devido processo legal sob o aspecto material comenta que:

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material. O segundo encontra fundamento nos artigos 5º, inciso LV, e 3º, inciso I, da Constituição Federal. Do devido processo legal substancial ou material são extraídos os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Não há repercussão prática na discussão sobre a origem do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, considerando-se que os mesmos tem status constitucional, e diante de tal situação todos os atos infraconstitucionais devem com ele guardar relação de compatibilidade, sob pena de irremissível inconstitucionalidade, reconhecido no controle difuso ou concentrado [...] A razoabilidade e proporcionalidade das leis e atos do Poder Público são inafastáveis, considerando-se que o Direito tem conteúdo justo.

Para que o devido processo legal em sentido material seja atingido, o professor Lenza (2011, p. 927) considera que devem ser preenchidos os requisitos da necessidade, da adequação e da proporcionalidade em sentido estrito. A necessidade, por alguns denominada exigibilidade, implica que a adoção da medida que possa restringir direitos só se legitima se indispensável para o caso concreto e não se puder substituí-la por outra menos gravosa. A adequação sugere que o meio escolhido deve atingir o objetivo perquirido. E por fim, a proporcionalidade em sentido estrito significa que em sendo a medida necessária e adequada, deve-se investigar se o ato praticado, em termos de realização do objetivo pretendido, supera a restrição a outros valores constitucionalizados. O professor Lenza conclui afirmando que deve haver a máxima efetividade e a mínima restrição.

A aplicação do princípio do devido processo legal no direito processual civil assegura o direito à citação, da ciência do teor da acusação, da publicidade do julgamento, ao contraditório, ao juiz natural e imparcial, à ampla defesa, ao duplo grau de jurisdição, à igualdade de partes, à proibição da prova ilícita e à gratuidade da justiça, dentre outros.

2.5 O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO DIREITO PENAL

O princípio da legalidade se manifesta de maneiras diferentes em outros ramos do Direito, como é o caso do Direito Penal, Direito Tributário e Direito Administrativo.

A legalidade penal vem expressa no artigo 5º, inciso XXXIX da Constituição Federal (BRASIL, 1988) com o seguinte texto: “Não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

É uma forma de limitar o Estado na área penal que, cumprindo a determinação acima, somente tipificará situações como crime ou estabelecerá sanções ou penas por meio de lei. O Estado não poderá imputar um crime a alguém e punir ainda que a conduta seja imoral e/ou prejudicial para a sociedade.

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Apenas a lei, em seu sentido formal, poderá tipificar um crime e determinar uma sanção. Vale a pena repetir a definição dada pelo professor Clóvis Beviláqua acerca da lei como "ordem geral obrigatória que, emanando de uma autoridade competente reconhecida, é imposta coativamente à obediência geral”. A “autoridade competente reconhecida” em questão é o Poder Legislativo. Somente ele poderá legislar sobre o tema.

Capez (2004, p. 39) comentando sobre o tema ensina que:

Somente a lei, em seu sentido mais estrito, pode descrever crimes e cominar penas. OBS: Medidas Provisórias e Leis Delegadas não podem ser consideradas leis para fins do princípio da reserva legal por não poderem tratar de matéria penal (Medida Provisória – EC32/2001 – art. 62, §1º, I, b; Lei Delegada – art. 68, §1º, II, CF). (…) nenhuma outra fonte subalterna pode gerar a norma penal, uma vez que a reserva de lei proposta pela CF é absoluta, e não meramente relativa. Nem seria admissível que restrições a direitos individuais pudessem ser objeto de regramento unilateral pelo Poder Executivo. Assim, somente a lei, na sua concepção formal e estrita, emanada e aprovada pelo Poder Legislativo, por meio de procedimento adequado, pode criar tipos e impor penas.

Fica evidente o caráter extremamente protetivo do princípio da legalidade na esfera penal objetivando proteger os cidadãos contra qualquer ato arbitrário do estado, criando limites para o combate e repressão de condutas penalmente típicas.

2.6 O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO DIREITO ADMINISTRATIVO

É comum ouvir as pessoas comentarem que “tudo o que não é proibido por lei é permitido”. Essa afirmação é verdadeira dependendo da área do direito em que se está aplicando, como será visto.

A lei concede uma margem de discricionariedade muito grande para que as pessoas façam tudo aquilo que a lei não proíbe, respeitando a autonomia da vontade individual. Essa ideia de autonomia individual citada é mais bem explicada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, nos seus artigos 4º e 5º:

Art. 4.º A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei. [...] A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene.

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pode fazer que a lei não autorize. A relação de subordinação é aparentemente mais forte do que em relação aos particulares (cidadãos). Aparentemente o princípio da legalidade impõe um ônus mais forte para o Estado do que para a sociedade em suas relações interpessoais. Qual a razão de ser disso? Dessa aparente diferença entre o princípio da legalidade aplicada no Direito Público e no Direito Privado?

Para responder a esse questionamento deve-se lembrar do que já foi citado anteriormente, das profundas transformações ocorridas após a Revolução Francesa acerca da concepção do Direito, do sistema jurídico. O Estado já não era, como outrora, confundido com uma pessoa. O caso do rei Luís XIV da França ilustra muito bem o pensamento que imperava antes. É atribuída a ele a famosa frase "L'État c'est moi", que traduzida para a língua portuguesa significa “O Estado sou eu”.

O Direito que surgiu após a Revolução Francesa dissociou a Administração Pública da figura do rei, do soberano. A partir daquele momento a concepção de Administração se tornou uma abstração jurídica, não mais dependendo da figura de um soberano, passando a ficar submetida necessariamente ao princípio da legalidade. Se não fosse dessa maneira as autoridades poderiam criar obrigações e impor proibições aos administrados sem qualquer lei. Assim surgiu a conclusão de que a Administração só pode fazer aquilo que está expresso em lei.

A respeito do tema o professor Meirelles (2005, p. 87) ensina que:

A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeitos aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.

Outro doutrinador que corrobora com esse entendimento é Mello (2004, p. 841) que ensina que:

[...] a Administração não poderá proibir ou impor comportamento algum a terceiro, salvo se estiver previamente embasada em determinada lei que lhe faculte proibir ou impor algo a quem quer que seja. Vale dizer, não lhe é possível expedir um regulamento, instrução, resolução, portaria ou seja lá que ato for para coartar a liberdade dos administrados, salvo se em lei já existir delineada a contenção ou imposição que o ato administrativo venha a minudenciar.

Diante de tudo o que foi colocado pode-se facilmente perceber o caráter protetivo do Direito que objetiva assegurar ao cidadão criando uma garantia jurídica baseada na obrigação do Estado em agir somente sob o amparo das leis preestabelecidas. Todo e qualquer ato da

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Administração Pública será válido apenas se estiver fundamentado na lei.

2.7 O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO

O inciso II do art. 5º da Constituição Federal (BRASIL, 1988) consagrou o Princípio da legalidade estabelecendo que ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Além desta proteção geral dada pelo ordenamento jurídico, existe a proteção específica, a chamada estrita legalidade tributária. O princípio da legalidade tributária está expresso no artigo 150, inciso I da Constituição Federal (BRASIL, 1988) determinando que sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.

Como resultado do que dispõe a Constituição Federal (BRASIL, 1988) no seu artigo 150, caput, pode-se concluir que os tributos serão criados em cada esfera por seus respectivos entes políticos, ou seja, os Municípios instituirão os tributos municipais, os Estados, da mesma maneira, criarão os tributos estaduais, a União instituirá tributos no âmbito federal e o Distrito Federal, por sua vez, os tributos distritais.

Deve-se observar também que não basta simplesmente a edição de uma lei pelo Poder Legislativo, permitindo que o estado imponha um tributo, para que a estrita legalidade tributária seja respeitada. O critério formal e material de elaboração deve ser respeitado.

A legalidade formal significa que deve haver o exato cumprimento do processo legislativo para a elaboração da norma tributária. Somente o Poder Legislativo competente pode criar a norma tributária.

Em relação à legalidade material Amaro (2008, p. 112) explica que o conteúdo da norma tributária deve observar os preceitos constitucionais para sua elaboração, devendo a própria lei definir todos os aspectos pertinentes ao fato gerador necessário à qualificação do tributo, devido em cada situação concreta, que venha espelhar a situação hipotética descrita na lei. Reforçando esse pensamento o professor Aires Barreto (1998, p. 137) ensina que não basta a exigência de lei, como fonte de produção jurídica específica; requer-se a fixação, nessa mesma fonte, de todos os critérios de decisão, sem qualquer margem de liberdade ao administrador.

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Os artigos 150, I e 5º, II, da Constituição vigente, referem-se à legalidade, como princípio necessário à instituição e majoração de tributos, tanto do ponto de vista formal – ato próprio, emanado do poder legislativo – como do ponto de vista material, determinação conceitual específica, dada pela lei aos aspectos substanciais dos tributos, como hipótese material, espacial e temporal, consequências obrigacionais, como sujeição passiva e quantificação do dever tributário, alíquotas e base de cálculo, além das sanções pecuniárias, dos deveres acessórios, da suspensão, extinção e exclusão do crédito tributário.

Pode-se notar que o princípio da legalidade está arraigado em sistema jurídico do Brasil, sendo possível perceber isso devido as suas formas de manifestação no Direito Constitucional, Penal, Administrativo e Tributário.

2.8 COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR

Conforme o artigo 22 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) “compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho”. (BRASIL, 1988).

Conforme Silva (apud MORAES, 2007, pg. 292):

A diferença que se faz entre competência exclusiva e privativa é que aquela é indelegável e esta é delegável. Então, quando se quer atribuir competência própria a uma entidade ou órgão com possibilidade de delegação de tudo ou de par-te, declara-se que compete privativamente a ele a matéria indicada [...] Mas a Cons-tituição não é rigorosamente técnica neste assunto.

Almeida (apud MORAES, 2007, pg. 292) por sua vez afirma que:

Não nos parece apropriado, no entanto, é extremar mediante o uso dos termos 'privativo' e 'exclusivo' as competências próprias que podem e as que não po-dem ser delegadas, como se 'privativo' não exprimisse, tanto quanto 'exclusivo', a ideia do que é deferido a um titular com exclusão de outros.

De qualquer maneira, as matérias citadas no artigo 22 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) demonstram preeminência da União em relação aos demais entes federati-vos. Como foi explicado acima a competência privativa difere da exclusiva porque a segunda pode ser exercida apenas por aquele a quem for atribuída. Não há a possibilidade de delega-ção e renúncia. A competência privativa por sua vez, embora seja característica de um ente federativo, pode ser delegada para outro ente.

Sobre o tema o professor Lenza ensina o seguinte (2011, pg. 391):

Indaga-se: apesar de ser competência privativa da União, poderiam aquelas matérias ser regulamentadas também por outros entes federativos? Sim, de acordo com a regra do art. 22, parágrafo único, que permite à União, por meio de lei

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complementar, autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias previstas no referido art. 22. Entendemos que essa possibilidade estende-se, também, ao Distrito Federal, por força do art. 32, §1º, da CF/88.

O artigo 22 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), no seu parágrafo único, estabelece que “lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo”.

Em relação à matéria processual a possibilidade concedida pela Constituição Federal (BRASIL, 1988) é de legislar sobre procedimento. Conforme o artigo 24 da Constituição Federal, inciso XI, compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre procedimentos em matéria processual.

Como exemplo de procedimentos tem-se forma destes atos, o lugar onde devem ser realizados, os prazos que devem ser obedecidos, horário de audiência, etc. Como exemplo de matéria processual é possível mencionar a citação, intimação, audiência de instrução e julgamento, etc. Estas informações são necessárias para saber se a esfera de competência da União, no tocante à matéria processual, está sendo invadida ou não.

Ver-se-á no capítulo seguinte, alguns enunciados emitidos pelo FONAJE e aplicados pelas Turmas Recursais que tratam de matéria já abordada no Código de Processo Civil (BRASIL, 1973) e na Lei nº 9.099/95, ou seja, competência legislativa privativa da União.

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3 OS ENUNCIADOS CÍVEIS DO FONAJE E ALGUNS CASOS ESPECÍFICOS DE CONFLITO COM A LEGISLAÇÃO

Neste capítulo serão analisados alguns enunciados do FONAJE que apresentam maior controvérsia na sua aplicação. Como o tema ainda não foi abordado especificamente em nenhuma obra, serão utilizadas como fontes as doutrinas, que indiretamente abordam o tema, alguns artigos publicados e a jurisprudência das Turmas Recursais, do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e do STF (Supremo Tribunal Federal).

3.1 ENUNCIADO 141 (ALTEROU O ENUNCIADO 110)

Enunciado 141 (ALTERA o Enunciado 110) - A microempresa e a empresa de pequeno porte, quando autoras, devem ser representadas, inclusive em audiência, pelo empresário individual ou pelo sócio dirigente. (Aprovado por unanimidade no XXVIII FONAJE – BA – 24 a 26 de novembro de 2010).

Essa exigência, como será visto adiante, não encontra respaldo no texto legal. Veja-se o que dispõe a Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995) em seu artigo 9º e parágrafo 4º do mesmo artigo :

Nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória. [...] O réu, sendo pessoa jurídica ou titular de firma individual, poderá ser representado por preposto credenciado, munido de carta de preposição com poderes para transigir, sem haver necessidade de vínculo empregatício.

A norma, como é possível perceber em toda a Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995), não restringe a representação por preposto nos juizados. O único ponto em que a lei faz menção ao tema é justamente para assegurar que as pessoas jurídicas ou titulares de firma individual possam ser representadas em audiência por preposição.

A lei fez questão de esclarecer que o réu (sendo pessoa jurídica ou titular de firma individual) pode ser representado por preposto. Em momento algum a lei impossibilitou que, a pessoa jurídica ou titular de firma individual, por estarem no polo ativo da ação, constituíssem um preposto para comparecer na audiência.

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entanto, seguindo o entendimento do enunciado nº 141 do FONAJE, isso não seria permitido. O artigo 277 do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973), no seu parágrafo § 3º, deixa expresso que “as partes deverão comparecer pessoalmente à audiência, podendo fazer-se reprefazer-sentar por preposto com poderes para transigir”. Esfazer-se entendimento foi fazer-seguido pela Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995).

Não há dúvidas de que o Código de Processo Civil (BRASIL, 1973) autoriza a pessoa jurídica ou o titular de firma individual a serem representados por preposto. O comparecimento pessoal é obrigatório, mas não sendo isso possível, a parte poderá constituir um preposto com poderes para transigir.

O fato de a lei permitir que a pessoa jurídica ou titular de firma individual sejam, enquanto réus, representadas em audiência por prepostos não deve ser vista como uma exceção, concluindo que a regra é o comparecimento pessoal. Se é permitido à empresa enviar um preposto (que não precisa ter vínculo empregatício com a preponente) enquanto está em condição menos favorável, pelo menos em tese, por que não seria possível enviar um preposto para uma audiência estando a empresa na qualidade de autora? Sem falar que nas ações, propostas por empresas ou titulares de firma individual, geralmente não há discussão de mérito, a maioria das ações são de execuções de títulos extrajudiciais, conforme dados do CEBEPEJ (Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais).

É perceptível a intenção de barrar parte da grande quantidade de ações que são propostas por empresas no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis que, conforme a pesquisa realizada, tem transformado os Juizados Especiais Cíveis em “balcões de cobrança”. Sem dúvida um empresário que é obrigado a largar todos os seus afazeres para comparecer nas audiências conciliatórias pensará duas vezes antes de ingressar com uma ação, pois será obrigado a largar a gerência de seu negócio por não poder constituir um preposto para representá-lo.

A figura do preposto é tratada no Código Civil (BRASIL, 2002) nos artigos 1.169, 1.170 e 1.171:

[…] O preposto não pode, sem autorização escrita, fazer-se substituir no desempenho da preposição, sob pena de responder pessoalmente pelos atos do substituto e pelas obrigações por ele contraídas. [...] O preposto, salvo autorização expressa, não pode negociar por conta própria ou de terceiro, nem participar, embora indiretamente, de operação do mesmo gênero da que lhe foi cometida, sob pena de responder por perdas e danos e de serem retidos pelo preponente os lucros da operação. […] Considera-se perfeita a entrega de papéis, bens ou valores ao preposto, encarregado pelo preponente, se os recebeu sem protesto, salvo nos casos em que haja prazo para reclamação.

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O Código Civil (BRASIL, 2002) impõe grande responsabilidade àquele que se candidata a atuar como preposto, podendo inclusive ser responsabilizado civilmente por perdas e danos. O preposto, conforme a lei, deve seguir de maneira estrita o exigido pelo preponente, representando-o nos exatos termos acordados, sob pena de ser responsabilizado. Diante desses dispositivos não há motivos para questionar o preposto enquanto representante da pessoa jurídica. Questionar sua importância, pois, como é possível concluir do texto legal, o preposto deve possuir poderes para transigir.

A exigência do comparecimento pessoal do empresário individual ou pelo sócio dirigente parece uma questão pequena, que poderia ser relevada, contudo esse posicionamento parece contrário à própria Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995), pois ela autorizou a promoção de ações por estas empresas e concedeu-lhes gratuidade processual, porque dispõe de poucos recursos financeiros e, consequentemente humanos. A contratação de funcionários é reduzida e geralmente o empresário individual ou sócio dirigente, além das funções de gerência, atuam na empresa realizando serviços comuns aos demais funcionários.

O próprio FONAJE, no seu enunciado de nº 20 estabelece que “O comparecimento pessoal da parte às audiências é obrigatório. A pessoa jurídica poderá ser representada por preposto”.

Em consulta aos bancos de dados criados pelos Tribunais foi possível encontrar um julgado, bem recente por sinal, em que um processo proposto por uma Cooperativa foi extinto porque estava sendo representada por um preposto na ocasião:

RIO GRANDE DO SUL. Primeira Turma Recursal Cível da Comarca de Viamão. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE

MÚTUO. AUSÊNCIA DE COMPARECIMENTO PESSOAL DA PARTE AUTORA, PESSOA JURÍDICA - COOPERATIVA - DIANTE DA IMPOSSIBILIDADE DE NOMEAÇÃO DE PREPOSTO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO 110 DO FONAJE E DOS ARTIGOS 9º, § 4º E 51, INC. II DA LEI 9.099/95. Ainda que se trate, a parte autora, de Cooperativa cuja natureza jurídica é a de sociedade civil, cuidando-se de pessoa jurídica e figurando no polo ativo da demanda, o comparecimento em audiência deve ser pessoal, sob pena de extinção do feito, independente dos termos de seu Estatuto. Recurso Inominado Nº 71003056157. Recorrente: Cooperpoa -

Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo. Recorrido: Jorge Luiz Prates. Relator: Marta Borges Ortiz. In. Diário da Justiça Eletrônico do Rio Grande do Sul. 01 de agosto de 2011. [Grifo nosso].

Nesse julgado em questão, a relatora Marta Borges Ortiz se manifestou no sentido de extinguir o feito sem o julgamento do mérito, fundamentando a decisão no entendimento do enunciado 110 do FONAJE e dos artigos 9º, § 4º e 51, inciso II da Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995). Na própria ementa do julgado consta a expressão “diante da impossibilidade

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de nomeação de preposto”, todavia, ao que parece, a lei não cria este obstáculo.

3.2 ENUNCIADO 135 (SUBSTITUIU O ENUNCIADO 47)

Enunciado 135 (substitui o enunciado 47) – O acesso da microempresa ou empresa de pequeno porte no sistema dos juizados especiais depende da comprovação de sua qualificação tributária atualizada e documento fiscal referente ao negócio jurídico objeto da demanda (Aprovado no XXVII FONAJE – Palmas/TO – 26 a 28 de maio de 2010).

Esse enunciado pode ser dividido em duas partes. A primeira referente à exigência de que a microempresa ou empresa de pequeno porte comprovem a qualificação tributária. A segunda referente à exigência de que as empresas apresentem o documento fiscal referente ao negócio jurídico objeto da demanda. São duas exigências que se cumulam. A empresa, segundo entendimento do FONAJE, deve comprovar sua qualificação e apresentar o documento referente ao negócio jurídico. Do contrário não poderá ingressar no sistema dos juizados.

Em relação à primeira parte não há o que discutir. A Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995) autoriza que as microempresas atuem perante os juizados especiais, conforme o artigo 8º, § 1º. As empresas de pequeno porte por sua vez foram autorizadas pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006:

Art. 74. Aplica-se às microempresas e às empresas de pequeno porte de que trata esta Lei Complementar o disposto no § 1o do art. 8o da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, e no inciso I do caput do art. 6o da Lei no 10.259, de 12 de julho de 2001, as quais, assim como as pessoas físicas capazes, passam a ser admitidas como proponentes de ação perante o juizado Especial, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas.

Basta que a pessoa jurídica comprove que se enquadra como microempresa ou empresa de pequeno para ingressar como autora nos juizados. Neste caso uma simples certidão (atualizada) emitida pela Junta Comercial serve para comprovar o enquadramento.

O ponto controverso surge na segunda parte do enunciado, no ponto em que o FONAJE estabelece como essencial a apresentação de documento fiscal referente ao negócio jurídico objeto da demanda.

A exigência de apresentação de nota fiscal sugere que esta seria a única forma de comprovar a compra e venda. Todavia, procurando na legislação nacional nota-se que não é

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bem assim. De fato, não há um dispositivo legal que afirme que a nota fiscal é a única comprovação da transação comercial.

O artigo 32 da Lei nº 9.099/95 (BRASIL,1995) declara que: “todos os meios de prova moralmente legítimos, ainda que não especificados em lei, são hábeis para provar a veracidade dos fatos alegados pelas partes”.

O Código de Processo Civil (BRASIL, 1973) permite, no seu artigo nº 401, a prova exclusivamente testemunhal nos contratos cujo valor não exceda o décuplo do maior salário mínimo vigente no país, ao tempo em que foram celebrados. Com o salário mínimo vigente a partir do dia 01/03/2011 o limite atingido é de R$ 5.450,00 (cinco mil quatrocentos e cinquenta reais).

Analisando o artigo 400, caput, e inciso II do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973), seria possível concluir que a prova testemunhal não poderia ser usada como meio de prova ante a ausência de nota fiscal: “A prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso. O juiz indeferirá a inquirição de testemunhas sobre fatos: [...] que só por documento ou por exame pericial puderem ser provados”.

Como a lei não dispõe de modo diverso e não há dispositivo legal declarando que a nota fiscal é o único meio hábil a comprovar o negócio jurídico não há razão para exigi-la. Silva cita alguns argumentos que corroboram com esta linha de raciocínio:

Se o reclamado for regularmente citado e não comparecer em audiência (não se defender e não pagar a dívida) é evidente sua revelia e a procedência da reclamação;

Trata-se de matéria de direito disponível e direito privado, cabendo à parte contrária argumentar tal desiderato, no caso, o devedor;

A apresentação de nota fiscal não é condição de procedibilidade para se ingressar com uma ação no juizado Especial devido à possibilidade da comprovação dos negócios jurídicos através de outros meios legais e idôneos;

Há outros meios de prova que podem ser perfeitamente produzidos (art. 401 do CPC e art. 32 da Lei 9.099/95), especialmente a produção da prova testemunhal, máxime em casos cujo valor da causa é baixíssimo e permitido pelo juizado Especial (art. 3.º, inciso I da Lei 9.099/95);

A exigência de nota fiscal é atribuição do Fisco Estadual ou Fisco Federal, dependendo do caso, e não Judiciário;

Exigir a juntada da nota fiscal em casos como o alinhado acima, seria o mesmo que ceifar o Livre Acesso ao Poder Judiciário, Cercear o Direito de Defesa da parte lesada, no caso, a credora, que está apenas tentando buscar seus direitos da maneira mais correta, legal e justa possível, bem como agredir os Princípios da Informalidade e Simplicidade.

A redação anterior do enunciado 135 não fazia a exigência específica da nota fiscal, como se pode perceber: “Enunciado 47 - A microempresa para propor ação no âmbito dos juizados Especiais deverá instruir o pedido com documento de sua condição (Enunciados

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atualizados até o XX Encontro Nacional de Coordenadores de juizados Especiais do Brasil, 29 de novembro e 1º de dezembro de 2006 – São Paulo – SP)”.

Há inclusive julgados fundamentados na redação anterior do enunciado em que os julgadores deixam claro que não há necessidade de nota fiscal para instruir o feito, conforme podemos ver na jurisprudência citada a seguir:

DISTRITO FEDERAL. Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. RECURSO INOMINADO - PRELIMINARES - REJEIÇÃO-

MÉRITO - VEÍCULO ZERO KM - DEFEITOS DE FABRICAÇÃO - VÍCIOS NÃO SANADOS NO PRAZO DE 30 DIAS - SUBSTITUIÇÃO DO PRODUTO QUE SE IMPÕE (ART. 18, § 1º DO CDC).18§ 1ºCDC1 - NOS TERMOS DO ART. 74 DA LEI COMPL EMENTAR Nº 123, AS EMPRESAS JURÍDICAS DE PEQUENO PORTE PODEM DEMANDAR EM SEDE DE JUIZADOS ESPECIAIS. NO CASO, A CONDIÇÃO DE EMPRESA DE PEQUENO

PORTE ESTÁ COMPROVADA NOS AUTOS COM A SUA INSCRIÇÃO NO SIMPLES (SISTEMA INTEGRADO DE PAGAMENTO DE IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES DAS MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE), ATENDENDO-SE AO QUE DISPÕE O ENUNCIADO 47 DO

FONAJE.2 - O VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA NA AÇÃO QUE BUSCA A SUBSTITUIÇÃO DO VEÍCULO NÃO É O VALOR DESTE, MAS A VANTAGEM FINANCEIRA A SER AUFERIDA, QUAL SEJA, A DIFERENÇA ENTRE O VEÍCULO ZERO KM QUILÔMETRO PRETENDIDO E O VEÍCULO QUE SE BUSCA VER SUBSTITUÍDO.3 - NÃO HÁ QUE SE FALAR EM COMPLEXIDADE DA MATÉRIA, PARA FINS DE AFASTAR A COMPETÊNCIA DO JEC PARA JULGAR A DEMANDA, SE A CAUSA NÃO DEMANDA INSTRUÇÃO COMPLEXA, NÃO EXIGE PROVA ORAL OU PERICIAL, LIMITANDO-SE À PROVA DOCUMENTAL, A QUAL SE MOSTRA SUFICIENTE PARA O EXAME DA QUESTÃO POSTA A JULGAMENTO.4 - P ARTINDO-SE DO PRESSUPOSTO FÁTICO, F ARTAMENTE COMPROVADO NOS AUTOS MEDIANTE PROVA DOCUMENTAL, QUE A AUTORA FOI OBRIGADA A RETORNAR COM O VEÍCULO À CONCESSIONÁRIA POR 5 (CINCO) VEZES, NO PERÍODO DE 52 (CINQÜENTA E DOIS) DIAS APÓS A RETIRADA DO VEÍCULO DA CONCESSIONÁRIA, SENDO O PRIMEIRO RETORNO COM APENAS 3 (TRÊS) DIAS DA ENTREGA DO BEM, CORRETA A SENTENÇA QUE CONDENOU A RÉ A SUBSTITUIR O VEÍCULO.5 - O ART. 18 DO CDC PREVÊ QUE O FORNECEDOR TEM 30 DIAS, CONTADOS DA APRESENTAÇÃO PELO CONSUMIDOR DO PRODUTO, PARA CORRIGIR O VÍCIO, SE NÃO O FIZER NESSE PRAZO, O CONSUMIDOR PODE PEDIR A SUBSTITUIÇÃO DO PRODUTO POR OUTRO DA MESMA MARCA E MODELO, OU AUSÊNCIA DESTE DE MARCA E MODELO DIVERSO - RECURSO IMPROVIDO. ACJ 154044420088070001 DF. 0015404-44.2008.807.0001. Apelante: ESAVE VEÍCULOS LTDA. Apelado: CASA DO PINTOR COMÉRCIO DE TINTAS LTDA. Relator: ARLINDO MARES. In: Diário da Justiça Eletrônico do Distrito Federal. Publicado em 08/10/2009, Pág. 154. [Grifo nosso].

Também deve ser observado que os títulos executivos extrajudiciais possuem autonomia, ou seja, são documentos que representam um direito originário, que não possui vínculo nenhum com a relação que lhe deu origem. Independem da relação comercial que lhe deu origem.

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O direito contido no título é um direito literal, porque seu conteúdo e os seus limites são determinados nos precisos termos do título; é um direito autônomo, porque todo o possuidor o pode exercer como se fosse um direito originário, nascido nele pela primeira vez, porque sobre esse direito não recaem as exceções, que diminuiriam o seu valor nas mãos dos possuidores precedentes.

A aplicação desse enunciado do FONAJE equivale a afastar a autonomia e executividade do título extrajudicial.

A Ordem dos advogados do Brasil, Seccional do Mato Grosso, entrou com um pedido de providências junto à Corregedoria-Geral da Justiça para que não fossem impostas restrições não previstas em lei às microempresas e empresas de pequeno porte para o ingresso de ações junto aos juizados Especiais.

Recentemente o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Estado do Mato Grosso, Cláudio Stábile Ribeiro, levou ao conhecimento da Corregedoria Geral de Justiça do mesmo estado algumas reclamações de advogados. Segundo informações, passadas pelos advogados atuantes nos juizados, o Juízo do Quinto Juizado Especial Cível estaria impondo algumas restrições não previstas na Lei nº 9.099/1995 (BRASIL,1995), mas fundadas no enunciado 135 do Fórum Nacional de juizados Especiais.

No ofício encaminhado Cláudio Stábile Ribeiro argumenta o seguinte:

Observe Douto Corregedor que o Enunciado em questão preleciona que o acesso da microempresa ou empresa de pequeno porte no sistema dos juizados especiais depende da comprovação de sua qualificação tributária atualizada. “[...] como se vê, o enunciado é bem claro, basta que as partes em comento apresentem a sua qualificação tributária e não a regularidade tributária, que são figuras completamente distintas”, ressaltou Cláudio Stábile.

O Desembargador Corregedor Márcio Vidal, em seu despacho, decidiu favoravelmente ao pedido e orientou ao Juízo que ao seguir o enunciado 135 do FONAJE deveria se ater a exigir os documentos que comprovem a qualificação tributária da empresa, documentos esses que a tornem apta (ou não) a litigar no polo ativo nos juizados. Não deveria ser exigido a sua regularidade tributária.

3.3 ENUNCIADO 5

Enunciado 5 - A correspondência ou contrafé recebida no endereço da parte é eficaz para efeito de citação, desde que identificado o seu recebedor.

Referências

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