INDIGESTÃO VAGAL EM MINI-BOVINOS NO ESTADO DE PERNAMBUCO Vagal indigestion in mini cattle in the state of Pernambuco
Huber RIZZO1; Lucas Leandro da Silva SOARES1; Carla Cristina Moura de OLIVEIRA1; Jefferson Ayrton Leite de Oliveira CRUZ1; Mayumi Santos Botelho ONO1; Pollyanna Cordeiro
SOUTO2.
1Universidade Federal Rural de Pernambuco. DMV. hubervet@gmail.com, lucasleandrovet@gmail.com, carla_moura18@hotmail.com, jefersonairton@hotmail.com, mayumi_sbo@hotmail.com,
Introdução
A Síndrome de Hoflund ou indigestão vagal é um distúrbio digestivo, relacionado ao comprometimento do nervo vago, seja por lesão total, parcial, compressão ou inflamação, uma vez que o mesmo é responsável pela motricidade dos pré-estômagos devido sua inervação, do ramo direito, em retículo, omaso e abomaso, e esquerdo no rúmen (DIRKSEN et al., 1993). Dentre as possibilidades de desenvolvimento da indigestão vagal estão quadros de reticuloperitonite traumática (RPT) (AQUINO NETO et al., 2010), aderências abdominais (ROMÃO et al., 2012; SIMÕES et al., 2014), linfossarcoma (FERNANDES et al., 2008), aspectos nutricionais (BORGES et al., 2007; CAMÂRA et al., 2009; COSTA et al., 2013) gestação avançada (CAMARA et al. 2009) e genéticos e/ou anatômicos, a bovinos miniaturas (FIDELIS JUNIOR et al., 2011; AMORIM et al., 2011).
Material e Métodos
Relata-se a ocorrência de indigestão vagal em dois bovinos miniaturas machos, atendidos no Ambulatório de Grandes Animais da Universidade Federal Rural de Pernambuco (AGA/UFRPE) nos anos de 2013 e 2014.
Os proprietários foram submetidos a anamnese, para esclarecimento da evolução dos casos, e os animais, examinados clinicamente segundo Dirksen et al., (1993). Foram coletadas amostras de fluido ruminal, via sonda orogástrica, e sangue,
mediante punção da veia jugular, sendo esses encaminhados ao Laboratório de Patologia Clínica de Grandes Animais da UFRPE, onde realizou-se a análise de fluido ruminal e o eritrograma e leucograma.
Resultados e Discussão
Os bovinos miniaturas foram atendidos no mês de setembro de 2013 (B1) e 2014 (B2) e eram oriundos de propriedades localizadas nos municípios de Vitória de Santo Antão, a qual já havia ocorrido um quadro de timpanismo recidivante em outro touro miniatura, e Bezerros no estado de Pernambuco respectivamente. Eram criados no sistema semi-intensivo com livre acesso a alimentos volumosos no pasto como capim Pangola (Digitaria decumbens) e capim Elefante (Pennisetum purpureum). Em nenhum dos casos havia histórico de mudança brusca ou introdução de alimentos ricos em carboidratos, leguminosas e/ou de baixa digestibilidade que poderiam levar ao quaro de timpanismo (CHENG et al., 1998; CÂMARA et al., 2009; COSTA et al. 2013).
O paciente B1, de 10 meses de idade e 115Kg (Figura 1), apresentava timpanismo recidivante há 10 dias, antes do atendimento no AGA/UFRPE. Na propriedade, o bovino foi submetido a tratamento, com medicamento oral a base de silicone a 30% suspenso em metilcelulose (Ruminol®), além de rumenocentese, com utilização de trocater e agulha calibre 40x12mm. Ao exame físico,
realizado no momento do atendimento no AGA/UFRPE, constatou-se frequência cardíaca de 44bpm, respiratória de 16mpm, ruminal de 5mov./5 min., temperatura retal de 37,4°C e escore corporal de 1.
O paciente B2 (Figura 2), de um ano de idade e 120Kg, há 30 dias vinha apresentando timpanismo recidivante. Ao exame físico obteve-se frequência cardíaca de 48 bpm, respiratória de 20mpm, ruminal de 5mov./5min., 38,4ºC de temperatura retal, mucosa congestas e escore corporal de 3.
Em ambos os casos, observou-se aumento de volume na fossa paralombar esquerda e na região ventral da fossa paralombar direita, timpania grave e estratificações do conteúdo ruminal mal definidas. Os animais foram sondados, para alívio e eliminação de gazes, com progressão sem resistência da sonda orogástrica ou sinais obstrutivos no esôfago. O aspecto de “pera e maça” dos flancos direito e esquerdo, assemelham-se ao relatado em oito casos de indigestão vagal em bovinos miniaturas no estado de São Paulo (AMORIN et al., 2011; FIDELIS JÚNIOR et al., 2011).
Nenhum dos bovinos foram responsivos a provas semiológicas de pesquisa de dor abdominal, descartando assim a possibilidade da RPT (AQUINO NETO et al., 2010), corroborando com os achados dos exames complementares, do bovino B2, onde não foram observados alterações no exame hematológico, (8,42x106/µL hemácias, 9,9g/dL hemoglobina, 38% de volume globular, 35,62fL VGM, 33%
CHGM), principalmente em relação ao leucograma (leucócitos totais de 9800/µL sendo 21% de neutrófilos segmentados, 73% de linfócitos, 4% de monócitos e 2% de eosinófilos) (KANEKO et al., 2008), pois o aumento desses índices, remeteria a um processo infecioso ativo como observado, na RPT e em casos de aderências abdominais (ROMÃO et al., 2012). Fidelis Júnior et al., (2011) relataram leucocitose, associado a peritonite devido ruminocenteses em bovino miniatura com timpanismo recidivante, causando enfisema na região do flanco, alteração essa, que não observada no bovino B1. No entanto, não foi realizado o leucograma do mesmo, que devido a ruminocentese, poderia estar elevado.
O líquido ruminal encontrava-se com pH e características normais. Para confirmação, do quadro de indigestão vagal, foi realizada a prova de atropina, tendo resultado positivo em ambos os animais, caracterizando a bradicardia vagal (DIRKSEN et al., 1993).
Foram propostas duas condutas terapêuticas. A conservativa através da passagem de sonda orogástrica, a cada dilatação abdominal, afim da remoção do gás e a cirúrgica através da implantação permanente de fistula ruminal (MUZZI et al., 2009), sendo ambas paliativas, de serventia apenas para a administração do quadro de timpanismo. Os proprietários optaram pela conduta terapêutica conservativa, e com isso os animais receberam alta. Foi-lhes recomendado
atenção quanto ao manejo alimentar, priorizando o fornecimento de volumoso de qualidade, em pequenas porções divididas durante o dia, e redução do fornecimento de alimento concentrado.
Conclusão
Devido a conformação condrodistrófica de bovinos miniaturas, supõe-se que ocorra predisposição genética para o desenvolvimento da indigesto vagal, devido a compressão do nervo vago em uma cavidade abdominal pequena em relação a expansão dos compartimentos gástricos durante a vida do animal. Pesquisas mais amplas devem ser realizados com o intuito de confirmar esta teoria.
Referências Bibliográficas
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Palavras chave: bovinos, nervo vago, Síndrome de Hoflund, sistema digestório, timpanismo
Key words: bulls, vagus nerve, Hoflund Syndrome, digestive system, tympanism
Figura 1 – Bovino miniatura (B1) em decúbito latero-esternal, apresentando dilatação da região do flanco esquerdo devido quadro de timpanismo.
Figura 2 – Plano dorsal de bovino miniatura (B2) com quadro de timpanismo recorrente apresentando abdomen com aspecto “pêra-maça”.