• Nenhum resultado encontrado

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS"

Copied!
134
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

HAYANNE ROSELINE OLIVEIRA BARBOSA

TRABALHO E DESLOCAMENTO PENDULAR: UMA ANÁLISE SOBRE AS TRAJETÓRIAS DE MULHERES EM TRÂNSITO

NATAL/RN 2020

(2)

HAYANNE ROSELINE OLIVEIRA BARBOSA

TRABALHO E DESLOCAMENTO PENDULAR: UMA ANÁLISE SOBRE AS TRAJETÓRIAS DE MULHERES EM TRÂNSITO

Dissertação apresentada ao curso de Pós- graduação em Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciências sociais.

Orientador(a): Prof(a). Dr(a). Irene Alves de Paiva.

NATAL/RN 2020

(3)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA

Barbosa, Hayanne Roseline Oliveira.

Trabalho e deslocamento pendular: uma análise sobre as trajetórias de mulheres em trânsito / Hayanne Roseline Oliveira Barbosa. - 2021.

133f.: il.

Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais,

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, 2021. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Irene Alves de Paiva.

1. Trajetórias - Dissertação. 2. Experiência - Dissertação. 3. Deslocamentos pendulares - Dissertação. I. Paiva, Irene Alves de. II. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 316:331-055.2

(4)

TRABALHO E DESLOCAMENTO PENDULAR: UMA ANÁLISE SOBRE AS TRAJETÓRIAS DE MULHERES EM TRÂNSITO

Dissertação apresentada ao curso de Pós- graduação em Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciências sociais.

Aprovada em: _____/_____/_____

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________ Prof(a). Dr(a). Irene Alves de Paiva.

Orientador(a)

____________________________________________________ Prof(a). Dr(a). Cimone Rozendo de Souza

Membro interno ao programa

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

____________________________________________________ Prof(a). Dr(a). Maíra Samara de Lima Freire.

Membro a instituição

Universidade Estadual da Paraíba - UEPB

____________________________________________________ Prof. Dr. Cesar Sanson.

Membro externo ao programa

(5)

Cada trajetória de vida reflete uma história e cada história um contexto. Assim cada trajetória merece ser explorada ao máximo. Dedico esta dissertação, cada linha e cada palavra as mulheres, trabalhadoras e conterrâneos/as que compartilharam sua histórias de vida refletidas nos em cada letra descrita ao longo desse texto.

(6)

AGRADECIMENTOS

É chegado o momento de agradecer há tantos e tantas que participaram dessa trajetória para obter o titulo de mestre. Foram dois anos de trabalho, dedicação e por vezes incertezas sobre a concretização dessa dissertação, vitorias e angústias ocultas nas linhas deste texto, porém tão presente nas minhas lembranças e daqueles que nos pior momento dessa trajetória optaram por continuar ao meu lado, mesmo quando não acreditava na força que guardava dentro de mim.

Se na trajetória da vida ou nossas histórias são construídas a partir do estoque de experiencia a que temos acesso, posso afirmada que sou privilegiada por ser mulher da comunidade de Capela e mesmo em meio a tantas dificuldades ter conseguido chegado até esse momento. Como costumo dizer a amigos e a familiares, que a construção do conhecimento não reflexo apenas da leitura de milhares de livros de literatura culta, essa é de suma importância, no entanto na realidade as maiores fonte de aprendizados são desenvolvidas na vivencia cotidiana, sobre o olhar sensivel de pesquisadora/o que questiona o mundo ao seu redor, nesta perspectiva a sensibilidade é crucial para compreender o eu e o outro. O eu como parte da totalidade que também partilha experiencias de vidas com os outros a nossa volta, os outros por fazerem parte dessa complexidade que são as relações humanas.

Filosofias pessoas a parte, a escrita desta dissertação não foi solitária, muitos foram os que me acolheram, ensinaram, inspiraram na construção de cada linha e paragrafo deste texto. Desta forma, está etapa de agradecimento se faz a cada pessoa em cada momento dessa longa viagem esteve comigo.

Primeiramente a mim por ter desafiado as estruturas que delimitavam enquanto mulher, filha de cortador de cana-de-açúcar, analfabeto e trabalhadora do lar, meu destino estava pré-estabelecido, sendo esse o de seguir os padrões das mulheres da minha família e origem de uma vida dedicada aos cuidados dos filhos e dependência dos maridos. Respeito a trajetórias de cada uma e a essas agradeço principalmente a minha mãe Ivone e minha avó Francisca vocês são exemplos de mulheres fortes.

Aos meus pais e irmãos que fizeram se importantes na trajetória da minha vida. Vocês são parte indireta dessa construção.

(7)

mão em momentos difíceis, bem como nos períodos felizes Raphaella Calixta, Daniel Bento, Thiane Garcia e Roque Chianca imensa gratidão e amo vocês. Ao Maycon que no inicio dessa trajetória me deu total apoio e acreditou na minha capacidade intelectual asssim como tantos amigos, obrigada por enxegar em mim aquilo por vezes me foge ao olhar.

Aos amigos que conquistei nessa etapa do mestrado Antônia Carolina, Bruno Costa, Itamara Meneses e Cleylton Rodrigues, fomos apoio um dos outros ao longo dessa trajetória. Momentos de diversão e troca de experiência também fazem parte dessa história. A primeira professora que dentro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, acreditou no meu potencial Elisete Schwade. Aprendi muito a partir dos ensinamentos partilhados no projeto de pesquisa e extensão, a ter um olhar etnográfico, bem como as contribuições para construção dessa dissertação na leitura atenta realizada na minha pré- qualificação e posteriormente na qualificação.

A minha orientadora Irene Paiva pelo acolhimento, contribuições e principalmente aceitar ao desafio de realizar esse estudo junto comigo. Primeiramente gratidão por acolher uma orientada de área distinta do campo das ciências sociais e por todas as indicações literárias, bem como compreensão no período mais critico que foi a finalização dessa dissertação.

A Camille minha terapeuta tão importante e fundamental nessa trajetória.

As mulheres/trabalhadoras que compartilharam suas histórias de vida nessas linhas e a todos os meus conterrâneos e conterrâneas.

A CAPES, pelo auxílio-financiamento e ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais – UFRN. A cada servidor que trabalhar na UFRN, principalmente Ôtanio e Prima vocês são exemplos de profissionais.

Finalizo afirmando que um novo ciclo se abre com esse fim, este será cheio desafios e vitórias e com certeza serão momentos partilhados com aqueles que me amam.

(8)

Quimeras Latentes

No mapa secreto das palavras Elas vão contando suas histórias

Silenciosamente vão forjando primaveras livres Estão em todos os lugares,

São milhões, milhares E também são seculares,

Sobrevivem no sertão árido dos homens, Sonham com novos outubros,

Reproduzem-se na selva amazônica do capital São femininas, elementares

E, ainda sim, são plácidas, Nascem das desigualdades

E, por toda vida lutam

Contra a violência da carência fatigada Fustigada por sinistras cantilenas Têm corpos desertos e desejos obsoletos Vontades subalternizadas, passivas de novas lutas Onde arrefecer está no campo das impossibilidades

Invisíveis vão tecendo no orvalho da manhã Quimeras de límpidos horizontes

E, silenciosamente, transformam-se em labaredas entre abertas numa encruzilhada

sem fim contra todo tipo de exploração Andam de peito aberto e olhar aguerrido

Trazem nos olhos páginas avulsas em branco Quem sabe, sonhando um dia escrever igualdades e liberdades num

mundo emancipado.

(9)

Este estudo tem como tema central as trajetórias e agência de trabalhadoras em trânsitos, experiências e deslocamentos pendulares, partindo da perspectiva que os movimentos pendulares são estratégias acionadas por mulheres de cidades dormitórios, na pretensão de inserção no mundo do trabalho. Busca-se compreender e analisar as trajetórias e experiências de trabalhadoras oriundas da comunidade rural de Capela - Ceará-Mirim/RN, que trabalham na indústria têxtil de Extremoz/RN. Trata-se de uma investigação qualitativa, com orientação analítico-descritiva, mediante levantamento de dados do grupo e comunidade, observações participantes, diálogos, entrevistas semiestruturadas, com questões em aberto iniciadas após o consentimento das interlocutoras, levantamento. Os sujeitos participantes são trabalhadoras das fábricas de Confecção Riachuelo/Guararapes e Centro de Distribuições Riachuelo, oriundas de Capela. A intepretação do material coletado seguiu “análise de conteúdo”. As entrevistadas relataram as suas trajetórias sobre o horizonte de escolhas objetivas e subjetivas, omissões que resultaram no projeto vida adotado pelas interlocutoras. Trajetórias que evidenciam articulação de marcadores sociais como gênero, classe, raça e territorialidade. São mulheres que em meio a “simbiose” de sistema de poderes e dominação percebem os deslocamentos e trabalho formal espaços de disputas na pretensão de melhores condições de vida. As considerações finais evidenciam que as trajetórias a partir das experiências com as intersecções de marcadores sociais como gênero, classe, raça e territorialidade produzem desigualdades sociais, cabendo aos sujeitos, sob todas contradições produzidas pela simbiose de sistemas de opressão e dominação, acionar mecanismo de sobrevivência.

Palavras-Chave: Trajetórias. Experiência. Deslocamentos pendulares. Trabalho. Interseccionalidade.

(10)

This study has as central theme the trajectories and in transit workers agency, experiences and commuting, starting from the perspective that the commuting movements are strategies triggered by women from sleeping cities, in the intention of insertion in the work world. It seeks to understand and analyze the trajectories and experiences of workers from the rural community of Capela - Ceará-Mirim/RN, who work in the textile industry in Extremoz /RN. It is a qualitative investigation, with analytical-descriptive orientation, by collecting data from the group and community, participative observations, dialogues, semi-structured interviews, with open questions, initiated after the interlocutor's consent, collection. The participating subjects are workers from Riachuelo/Guararapes confection factories and the Riachuelo Distribution Center, from Capela. The interpretation of the collected material followed “content analysis”. The interviewees reported their trajectories on the horizon of objective and subjective choices, omissions that resulted in the life project adopted by the interlocutors. Trajectories that show the articulation of social markers such as gender, class, race and territoriality. They are women who are among of the “symbiosis” of the system of powers and domination, perceive displacements and formal work as spaces of disputes in the pretension of better living conditions. The final considerations show that the trajectories from the experiences with the intersections of social markers such as gender, class, race and territoriality produce social inequalities, and the subjects, under all contradictions produced by the systems symbiosis of oppression and domination, trigger a survival mechanism.

(11)

Imagem 1 – Ruinas do engenho Capela... 29

Imagem 2 – Casarões Do engenho Capela... 30

Imagem 3 – Rio da Ponte... 31

Imagem 4 – Croqui do território de Capela: contexto colonial e atual... 33

Imagens 5 – Novos loteamentos de Capela... 40

Imagens 6 – Principais ruas da comunidade de Capela... 42

Imagens 7 – Praça Maria Ozélita... 43

Imagens 8 – Praça Moacir Valera de Morais ... 44

Imagem 9 - Escola Municipal Alcides Câmara de Souza... 45

Imagem 10 - Unidade Básica de Saúde (Capela)... 47

Imagem 11 - Igreja católica (São Miguel Arcanjo) ... 48

Imagem 12 Igreja adventista do Sétimo dia (Capela)... 49

Imagem 13 - Garagem da empresa Riachuelo... 72

Imagem 14 - Início da Guararapes Confecção em 1970 em Natal/RN... 80

(12)

Gráfico 1 – Distribuição de trabalhadores/as em deslocamento por gênero... 85 Gráfico 2 – Distribuição da população, por cor ou raça no Brasil (2012 -2016) ... 109

(13)

Mapa 1 – Demarcação territorial de Capela ... 32 Mapa 2 – Região Metropolitana de Natal ... 67

(14)

Quadro 1 – Distribuição de quantidade trabalhadores/as por gênero e horário de

Deslocamento ... 73 Quadro 2 – Histórico da empresa a partir da trajetória da família Rocha .... 81

(15)

VLT Veículos Leves sobre Trilhos

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística RMN Região Metropolitana Natal

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica IDH Índice de Desenvolvimento Humano

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira Pnadc Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar Contínua

FIES Financiamento Estudantil

PROUNI Programa Universidade para todos

REUNI Restauração e Ampliação das Universidades Federais FIES Financiamento Estudantil

UBS Unidade Básica

(16)

1 INTRODUÇÃO ... 16

1.1. O percurso teórico-metodológico ... 22

2 Um mergulho etnográfico na extensão sócio-histórico da comunidade de Capela ... 29

2.1. Origem da comunidade de capela na perspectiva dos ancestrais ... 29

2.2. A comunidade de capela: uma visão sobre instituições e estruturas na atualidade ... 33

2.3. O regresso da moradora/pesquisadora à comunidade de capela: um panorama sobre as organização e instituições ... 38

2.4. Os deslocamentos como estratégia de enfrentamento ao desemprego ... 49

3 TRABALHO E DESLOCAMENTOS PENDULARES: UMA EXPERIÊNCIA ENTRE O ESPAÇO RURAL E FABRIL ... 55

3.1. significado do trabalho na vida de trabalhadoras em deslocamentos pendulares 55 3.2. A vida em trânsitos e deslocamentos pendulares: uma experiência de gênero entre o espaço rural e fabril ... 66

3.3. No espaço fabril: as experiências de trabalho no grupo riachuelo ... 76

4 TRAJETÓRIAS: UM OLHAR INTERSECCIONAL SOBRE OS PERCURSOS INDIVIDUAIS E HISTÓRIAS COLETIVAS ... 89

4.1. Deslocamentos e trajetórias: histórias de vida de trabalhadoras fabris... 93

4.1.1. Alzira, a auxiliar de produção na fábrica de confecção Guararapes/Riachuelo ... 93

4.1.2. Nísia, a costureira na fábrica de confecção riachuelo/guararapes ... 96

4.1.3. Zila, a auxiliar de logística no centro de distribuição Riachuelo ... 100

4.1.4. Relatos etnográficos de encontros e reencontros: os relatos de experiência de vida de mulheres trabalhadoras ... 103

4.2. Um olhar interseccional sobre trajetória e experiências de mulheres capelenses ... 106

4.3. Etnográfia em tempo de pandemia: as alterações e novas perspectivas em contexto de covid-19 ... 112

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 117

REFERÊNCIAS ... 121

(17)

1. INTRODUÇÃO

Refazer a história envolve uma negociação com as estruturas que produziram o indivíduo como agente da história. Gayatri Chacravorty Spivak, em Quem reivindica a alteridade, 1994, p.199.

Este estudo tem como tema central a trajetória e agência de trabalhadoras em deslocamentos pendulares, partindo da perspectiva que os fluxos e deslocamentos pendulares são estratégias acionadas pelas capelenses para inserção no mundo do trabalho e ao longo do percurso tornam-se vivencias diárias de mulheres entre o campo e o chão de fábrica. Nessa perspectiva, a investigação considera as historias de mulheres oriundas da zona rural de Capela que diariamente vivenciam os fluxos e deslocamentos pendulares para trabalhar em área urbana.

Trata-se de uma investigação etnográfica que busca entender em que medida a dinâmica dos deslocamentos pendulares de mulheres pertencentes à comunidade de Capela (Ceará-Mirim/RN) para trabalhar no chão da fábrica do grupo Riachuelo, localizado na cidade de Extremoz/RN, nesta perspectiva entende-se que os deslocamentos proporciona contato com novos processos de interações sociais e se esses contatos refletem novas experiências, vivências, assim como transformações intersubjetivas.

Com foco sobre a interseccionalidade e a reprodução do sistema sexo/gênero, procura-se descrever a biografia dessas trabalhadoras. A partir de suas experiencias vivenciadas entre a comunidade de Capela e o chão da fabrica. Na pretensão de compreender de que forma o trabalho assalariado impactam a vida das minhas conteraneas. De modo a percebe o trabalho assalariamento como campo fertil para acesso a direitos sociais dentro do sistema tão desigual como o sistema capitalista. O recorte espacial escolhido é a comunidade de Capela. Esta, pertence à extensão territorial da cidade de Ceará-mirim/RN, localizada a 28 km da Capital do Estado (Natal/RN), com aproximadamente dois mil habitantes, enquadrada como área rural de Ceará-Mirim, localizando-se há 7 km da sede da cidade, fazendo parte da Região Metropolitana de Natal. A escolha dessa localidade é parte de lembranças socioafetivas de pesquisadora desde a adolecencia passou a perceber os fluxos e deslocamentos como parte da questão social refletida em desigualdade socioespaciais presente na extensão territorial brasileira e

(18)

compreendendo que a realidade de deslocamentos expressões dessa desigualdade socioespacial.

Posto isso, os objetivos que norteiam essa investigação são os seguintes: objetivo geral: compreender e analisar as trajetórias e experiências de trabalhadoras oriundas da zona rural, que trabalham na indústria têxtil de Extremoz/RN. Assim, busca-se entender as relações sociais cotidianas dessas mulheres no que se refere aos deslocamentos pendulares, as relações familiares, de trabalho, de que forma esse o assalariamento reflete em suas trajetórias, bem como nas suas respectivas histórias de vida.

E, desdobra nos seguintes objetivos específicos: a) caracterizar a comunidade de Capela (campo empírico da pesquisa etnográfica), levando em consideração as discussões das novas ruralidades que descrevem a coexistência de aspectos rurais e urbanos em determinadas localidades; b) conhecer e descrever os deslocamentos pendulares de mulheres de Capela para o chão de fábrica, bem como o perfil dessas trabalhadoras; c) a partir dos dados coletados através de observações, entrevistas e conversas, descrever as trajetórias de vida dessas mulheres na perspectiva de identificar elementos a respeito da autonomia que o trabalho assalariado proporciona a essas mulheres.

O interesse pela temática e universo pesquisado foi despertado e materializou-se ao longo da minha trajetória de vida, sob a perspectiva que considero que as experiências sociais e vivências cotidianos são campo propícios para análises. Dessa maneira, coloco-me também enquanto investigadora e objeto investigado, tendo em vista que a comunidade foi meu espaço do crescimento e desenvolvimento, assim sendo essa pesquisa também significou retorno às origens.

Corrobora também para a escolha, o fato de em 2015 termos realizado análise para o trabalho de conclusão de curso em Serviço Social/UFRN, cujo título “Aqui não tem nada: movimento pendular do campo à cidade na expropriação de trabalhadores da comunidade de Capela (Ceará-Mirim/RN)”. Nesta ocasião, a pergunta que norteava a pesquisa era quais os principais fatores que levam os/as moradores/as a deslocar-se diariamente para trabalhar na cidade de Natal/RN.

Com relação aos interesses acadêmicos, a pesquisadora ao longo de sua formação acadêmica dedicou atenção especial às categorias trabalho, relações de gênero, questão rural e urbana. Também faz parte desde 2013 do grupo de pesquisa Gênero, Corpo e Sexualidade – GCS, ligado ao departamento de Antropologia Social da UFRN. Enquanto bolsista de iniciação científica CNPq realizou a pesquisa “Trânsito e deslocamento:

(19)

assentamentos rurais e imagens do urbano”. Nesse mesmo grupo participou do projeto “Semeando gênero na educação”.

Dentre as questões pessoais que motivaram a estudar dado fenômeno, destacamos o fato de a pesquisadora ter vivenciado a experiência dos deslocamentos pendulares, porém motivados por questões de estudo. Nesta ocasião, os constantes contatos com os trabalhadores proporcionaram inquietações a respeito da vida cotidiana dessas trabalhadoras.

Portanto a escolha por esse estudo cientifico dar-se imbricado “numa ciência, onde observador é da mesma forma natureza que o objeto, e o observador é, ele próprio, uma parte de sua observação” (LÉVY-STRAUSS, p. 215, 1975). Assim por tarta-se de uma pesquisa qualitativa etnografica realizada na minha própria comunidade alerto ao leitor que ao longo da descrições as observação são da cientista e participante das dinamicas dos fluxos e deslocamentos.

No entanto, os registros de campo realizados no Trabalho de Conclusão de Curso possibilitaram constatar algumas lacunas que precisam ser aprofundadas, dentre as quais a constatação que parcela significativa das mulheres da comunidade de Capela se desloca para trabalhar diariamente na cidade de Natal/RN. Na primeira pesquisa as narrativas das mulheres foram praticamente invisibilizada, principialmente por essas serem minorias nos transitos se comparados aos homens pertecentes ao grupo investigado no primeiro momento.

Nessa perspectiva, as perguntas norteadoras do presente estudo foram: a) Por quais motivos as mulheres se deslocam para trabalhar? b) Em quais empregos estão inseridas? c) Quais as trajetórias pessoais dessas mulheres e como essas vivenciam o cotidiano na comunidade e fora dela? d) Diante da inserção no mercado de trabalho, há mudanças nos papéis culturalmente definidos em relação a “ser mulher” no âmbito familiar? Diante das questões apresentadas tenta-se aqui lançar uma visão acerca do deslocamento e vivências das mulheres da comunidade rural de Capela.

Outras questões nos foram importantes na compreensão desse fenômeno social: I) Como estas mulheres percebem-se frente às transformações sociais ocasionadas pelos deslocamentos para trabalhar, assim qual a percepção acionada por outros moradores da comunidade? II) As mulheres deslocam-se da mesma forma e com os mesmos objetivo que os homens? III) Qual o perfil dessas mulheres?

(20)

de três principais grupos, cada qual com sua caracteristicas: o primeiro faz parte daqueles que se deslocam com o transporte próprio; o segundo grupo é composto por trabalhadoras que utilizam transporte público, neste caso os trabalhadores/as usam pelo menos dois meios de transporte para deslocarem-se para os seus respectivos trabalhos, o de Capela a Ceará-Mirim/RN e de Ceará-Mirim/RN a Natal/RN, em alguns caso chega mais de dois tranasporte; o terceiro grupo que participa dos deslocamentos pendulares é o que faz uso do ônibus da empresa Riachuelo para se deslocar ao trabalho.

Para responder as lacunas em aberto no trabalho “Aqui não tem nada: movimento pendular do campo à cidade na expropriação de trabalhadores da comunidade de Capela (Ceará-Mirim/RN)”. Na pretensão de desvendar essas questões escolhemos realizar a pesquisa com o terceiro grupo descrito anteriormente, mesmo compreendendo que cada grupo partilha experiencias comuns e particulares a opção pelo ultimo grupo levou em consideração a quantidade expressiva de trabalhadoras em detrimento de homens que fazem parte desse grupo. Assim sendo a investigação desenvolvida ao longo de dois anos debruçou-se com o universo de trabalhadoras que se deslocam para trabalhar no Grupo Guararapes/Riachuelo.

A escolha desse grupo foi realizada devido ao fato de que esse contém maior quantidade de mulheres que vivenciam os deslocamentos pendulares, trabalham em regime formal, ou seja, têm carteira de trabalho assinada e estão resguardadas pela Legislação Trabalhista, bem como pela inexistência de análise desenvolvidas com esse grupo local.

O primeiro grupo é composto por trabalhadores que obtêm melhor poder aquisitivo e por isso possui transporte próprio (seja motocicleta, carro). Já a dinâmica do segundo segmento apresenta-se da seguinte forma: os moradores saem da comunidade Capela em direção à Ceará- Mirim e, posteriormente, para Natal, sendo os transportes usados para essa finalidade carros de lotação, trem, veículos leves sobre trilhos (VLT), ônibus intermunicipal e, para aqueles que trabalham na zona sul da capital, transporte coletivo urbano. Dando ênfase nas mulheres, podemos concluir que os dois grupos apresentados são formados em sua maioria por trabalhadoras da área de serviços, como vendedores, empregadas domésticas e diaristas.

O terceiro e último grupo que participa dos deslocamentos pendulares são as trabalhadoras da Guararapes/Riachuelo, consideradas por muitos da Comunidade como “privilegiadas”, tendo em vista que o translado desses é realizado via empresa contratada, pelo próprio grupo empresarial. A respeito desse assunto aprofundaremos ao longo do

(21)

trabalho. Nesse momento, destacamos que diariamente saem quatro ônibus da Comunidade com destino à fábrica/empresa, em horários distintos.

Os ônibus saem da Comunidade nos respectivos horários: às 4h30 com trabalhadores da Central de Distribuição Riachuelo – CD; às 5h30 com os trabalhadores/trabalhadoras da Fábrica 21, às 6h30min com aqueles que trabalham em horário comercial. Destaca que o primeiro e o último grupo trabalham em regime diferenciado dos demais (seis dias semanal e folga aos domingos, além de que suas férias são diferenciadas).

As relações de gênero são construídas a partir do parentesco, porém não se limitam a essa esfera, elas ocorrem igualmente na economia e na organização política, assim, a necessidade de investigar de forma ampla as questões que envolvem essas relações no mercado de trabalho, educação e na política é de fundamental importância para as ciências humanas e sociais.

Os estudos sobre a condição da mulher antecedem a categoria gênero. No primeiro momento, a pergunta principal era: tendo em vista que a subordinação da mulher não é justa, tão pouco natural, como se chegou a ela e como essa se mantém? Para Piscitelli (2002), o questionamento realizado pela corrente feminista ligada à teoria socialista a partir do livro de Engels A origem da família, propriedade e o Estado, afirma a desigualdade e opressão.

Os processos que afetam as relações de gênero, de geração e de família em contextos rurais exigem uma atenção específica que permita desvendar a vivência de uma ruralidade cada vez mais e emaranhada em complexas teias de poder e significado (SCOTT, 2010). Nesta, é possível notar que a vivência de ruralidade envolve relações de poder.

Os constantes deslocamentos também estão inseridos nestes jogos de poder, logo, a necessidade de considerarmos a interseccionalidade para pensar as vivências e experiências de mulheres em trânsitos e deslocamentos. Portanto, a investigação tem a pretensão de fortalecer as análises das categorias trabalho, sistema sexo gênero e interseccionalidade, no Rio Grande do Norte.

É vasta a literatura que descreve a inserção da mulher no mercado de trabalho, dentre está se destacam no Brasil as obras pioneiras de Heleieth Saffioti - A mulher na sociedade de classe: mito e realidade (1969) e Eva Alterman Blay - Trabalho domesticado: a mulher na indústria paulista (1978). Essas sociólogas realizaram análises

(22)

na busca de entender a condição da mulher trabalhadora na sociedade de classe, destacando questões como sistema capitalista, patriarcado e divisão sexual do trabalho, pensando o trabalho feminino por meio do cadastro de reserva.

Assim sendo, os estudos dessas sociólogas sobre a participação feminina no mercado de trabalho concluem que este se constitui enquanto novo espaço de opressão, tendo em vista que é para a mulher a demonstração de sua sexualidade subjugada, tendo em vista que a força de trabalho feminina é apropriada pelo capitalismo a baixos custos, assim como podemos considerar que, se comparado ao trabalho masculino, as mulheres submetem-se a condições de trabalho mais precárias, além de cargas horárias que extrapolam o âmbito profissional.

Por outro lado autoras como Angela Davis (2016), Djamila Ribeiro (2018) e Carla Akotirene (2018) usam a categoria interseccionalidades para pensar a sobreposição de identidades e sistema de opressão, na busca de compreender as lutas da mulher negra por direitos na sociedade. Na concepção dessas autoras as lutas das mulheres negras diferem das brancas, tendo em vista que os debates da segunda onda feminista excluem a discussão racial da sua agenda. Nessa perspectiva, o feminismo branco ocidental ditará as regras das lutas feministas, excluindo as mulheres negras da sua agenda. Portanto, as autoras concluem que existe diferença entre as lutas feministas negra e branca, pois enquanto uma mulher branca luta para ter os mesmos direitos de homens, as negras lutas para ter os mesmos direitos que as brancas.

De acordo com Piscitelli

O debate sobre as interseccionalidades permite perceber a coexistência de diversas abordagens. Diferentes perspectivas utilizam os mesmos termos para referir-se à articulação entre diferenciações, mas elas variam em função de como são pensados diferença e poder. (PISCITELLI, 2008, p. 267)

A interseccionalidade ao longo desse estudo será acionada como ferramenta teórica e metodológica para perceber a interação de diferentes formas de dominação e desigualdade social na vida das mulheres, relações desiguais de poder sob o horizonte de igualdade entre gênero, classe, raça e geração.

A análise referente à inserção da mulher no mercado de trabalho parte do pressuposto de que vicissitudes societárias envolvem transformações nas relações sociais, assim como na construção e reconstrução do sistema sexo/gênero. Na medida em que

(23)

consideramos os fatores histórico e sociocultural, podemos atentar que esse sistema é perpassado por rupturas e continuidades. Dessa forma, essas transformações são resultados de contextos articulados com aspectos da objetividade e subjetividade. Ou seja, temos a percepção que as experiências individuais e coletivas são cruciais na construção dos projetos de vidas.

A partir dessa constatação somos capazes de afirmar que as experiências das mulheres no âmbito profissional não perpassam meramente escolhas individuais, sendo também resultados da realidade objetiva expressa na conjuntura política, econômica e sociocultural da sociedade vigente. Além disso, as ações de mulheres refletem a busca por igualdade de gênero, autonomia, somadas à relação interseccional de classe, raça/etnia e geração.

1.1.O percurso teórico-metodológico

A presente investigação percorre os caminhos da pesquisa científica na perspectiva de construção de conhecimento partindo da aparência fenomênica sobre o horizonte de desvelar a realidade concreta. O procedimento para a investigação deste estudo abrange uma análise qualitativa, pois trata-se de uma pesquisa com pretensões etnográfica, método investigativo que possibilita a aproximação com determinados níveis da realidade social não quantificáveis (MINAYO, 2010). Dessa maneira, partindo do cotidiano de mulheres, ou seja, dos trânsitos e deslocamentos, estamos procurando chegar à realidade, no que diz respeito às trajetórias e experiências de trabalhadoras do grupo Guararapes/Riachuelo.

Diante desse desafio destaco como ponto de partida o fato de que enquanto pesquisadora, fazer parte do universo pesquisado, ou seja, sou mulher capelense que vivenciou os fluxos e deslocamentos. Partindo da premissa que pesquisador é parte do universo social investigado, recorre-se aqui ao clássico de Gilberto Velho Observar o familiar (1981).

Velho (1981) aponta que na tradição das ciências sociais existe a premissa na qual o investigador deve manter um distanciamento mínimo do seu objeto de investigação. “Uma das mais tradicionais premissas das ciências sociais é a necessidade de uma distância mínima que garanta ao investigador condições de Objetividade em seu trabalho”. (VELHO, p.123, 1981). Esse distanciamento no método qualitativo exige do pesquisador uma posição de imparcialidade e neutralidade. Portanto, esse se consistiria em conclusões

(24)

dedutivas e sobre a base de uma realidade limitada a diretrizes preestabelecidas.

Esse paradigma de neutralidade e imparcialidade no método qualitativo não é partilhado por toda a comunidade científica, principalmente quando se trata de pesquisa participante. “A antropologia, embora sem exclusividade, tradicionalmente identificou-se com método de pesquisa ditos qualitativos. A observação participante, a entrevista aberta, o contato direto, pessoal, com o universo constituem uma marca registrada.” (VELHO, p.123, 1981).

A etnografia enquanto método de pesquisa qualitativa proporciona um mergulho na vida do outro que permite conhecer áreas e dimensões múltiplas da realidade sociais. Nessa perspectiva, o envolvimento ao longo da pesquisa participante proporciona ao investigador inserir-se no universo do grupo observado. Adentre o universo investigado requer do etnólogo alteridade, afim de entender e compreender a complexidade dos distintos povos e culturas sem sobrepor julgamentos de valores, tal sensibilidade permite aceitação por parte do pesquisador e interlocutor.Tendo em vista que envolvimento entre sujeito/interlocutores ou mesmo o fato de o pesquisador ser pertencente à sociedade investigada desqualifica advogar por uma neutralidade e imparcialidade nas ciências sociais. E, partindo dessa perspectiva, considero que ao desenvolver pesquisa com mulheres em trânsitos e deslocamentos na comunidade de Capela perpasso uma realidade que também é partilhado por mim, ficando nítida esse compartilhamento ao longo do texto. Ao discutir o método etnográfico Fonseca (2005), afirma que essa metodologia proporciona o elo entre teoria e realidade. Para Malinowshi (1980) esse método de investigação exige um mergulho na vida social dos sujeitos investigados. Nessa perspectiva de investigação, torna-se fundamental a utilização de instrumentos como observação participante, conversas, entrevistas e o registro denso no diário de campo, incluído nesse, a descrição do discurso daquilo que é dito e não dito nos termos de Goffman (2011), do ambiente, dos atores presentes. Sobre o rigor teórico presente no método etnográfico Malinowski (1980, p.22) afirma:

Ao meu ver um trabalho etnográfico só terá valor científico irrefutável se nos permitir discutir claramente, de um lado, os resultados da observação direta e declarações e interpretações nativas e, de outro, as interferências do autor baseadas em seu próprio bom-senso e intuição psicológica.

A etnografia como método reúne um conjunto de concepções e instrumentos que permite ao pesquisador estabelecer a comunicação, o diálogo e mergulhar em situações

(25)

estranhas na busca de conhecer o seu próprio universo simbólico de investigação (FONSECA, 2005). Todavia, o universo pesquisado não é desconhecido, tendo em vista a posição de sujeito/objeto investigado que descrevo ao longo de toda investigação e descrição desse texto dissertativo.

A partir de uma reflexão sobre as regras para a aplicação do método etnográfico, Malinowski (1980) sugere que o sucesso da investigação depende da aplicação sistemática e paciente de determinados procedimentos e princípios científicos. Assim, o autor aponta três pilares fundamentais para uma boa análise etnográfica.

Os princípios metodológicos podem ser agrupados em três unidades: em primeiro lugar, é lógico, o pesquisador possuir objetivos genuinamente científicos e conhecer os valores e critérios da etnografia moderna. Em segundo lugar, deve o pesquisador assegurar boas condições de trabalho, o que significa, basicamente, viver mesmo entre os nativos, sem depender de outros brancos. Finalmente, deve ele aplicar certos métodos especiais de coleta, manipulação e registro da evidência. (MALINOWSKI. 1980, p.24).

A pesquisa empírica teve início com levantamento de dados concretos sobre a comunidade de Capela para descrever as principais características da comunidade. Assim sendo, catalogamos informações em livros, sites e vídeos para nos proporcionar entender a localidade. Frente ao reduzido número de pesquisas e registros sobre a comunidade, utilizaremos como referências os trabalhos de conclusão de curso de Barbosa (2015) e Andrade (2016), bem como informações de jornais e documentários. Além de reconstrução da história através do estudo da memória social nos termos de Le Goff, sendo esse “um dos meios fundamentais de abordar os problemas do tempo e da história, relativamente aos quais a memória está ora em retraimento, ora em transbordamento” (LE GOFF, 1994, p.426). As ciências humanas e sociais em suas investigações fazem uso tanto da memória escrita quanto da memória oral.

Para reconstruir a história oral da comunidade nesta dissertação realizou-se conversas com 4 homens e 4 mulheres que carregam memórias da trajetória da comunidade de Capela. Essas histórias contadas foram articuladas e retratados ao longo desse texto dissertativo. Bem como um vídeo produzido pela Escola Municipal Alcides Câmara de Souza com Dona Antônia, senhora já falecida que relata sua experiencia de negra no Engenho Capela.

(26)

condições favoráveis para a execução do trabalho. Para alcançar esses objetivos aplicou-se técnicas e estratégias com a pretensão de capturar a complexidade expressa nas relações sociais. Para tanto, acompanhou-se o cotidiano dessas mulheres que trabalham nas fábricas do grupo Riachuelo, localizadas na cidade de Natal/RN, há 32 km de Capela. Ao longo desta dissertação descrevemos as histórias das interlocutoras com nomes fictícios, inspirado em feministas norte- rio-grandenses, tendo por finalidade preservar a identidade das entrevistadas. Efetuou-se observações, conversas e entrevistas todas registadas no diário de campo.

Tanto os deslocamentos do trabalho/casa quanto na vivência cotidiana no lar das interlocutoras como os registros obtidos ao longo do processo etnográfico foram analisados a partir da construção de categorias definidas pelo objetivo almejado.

Realizamos, a priori, levantamento quantitativo, na busca de mensurar a quantidade de mulheres e homens que participam do fluxos e deslocamentos pendulares do campo para o chão de fábrica, sobre o recorte específico de mulheres que trabalham para o Grupo Guararapes S.A, localizada na Rodovia RN-160 – Área Especial Industrial – Extremoz/RN.

Fonseca (2005) e Oliveira (1998) afirmam que a análise etnográfica parte da relação entre investigador e sujeitos investigados, sendo a comunicação de fundamental importância em todo processo de investigação. A partir dessas afirmativas consideramos de fundamental importância o estabelecimento de diálogos que possibilitem as mulheres expressar suas narrativas, pois acreditamos que ninguém melhor que elas para relatarem suas experiências e trajetórias.

Após esse levantamento foram realizadas 02 (duas) entrevistas durante o primeiro trimestre do ano de 2019, além de observação e conversas com algumas trabalhadoras do grupo Riachuelo. No primeiro trimestre de 2020 foi realizado mais uma entrevista, neste período houve algumas modificações causadas ela pandemia de COVID-19, em decorrência de toda as mudanças que houve no mundo como distanciamento social e paralização das atividades não essências, surgiu o impasse de dar continuidade aos estudos etnográficos diante do isolamento e modificações da rotina de nossas interlocutoras. Frente a esse desafio imposto tanto pela Covid-19 quanto a impossibilidade acompanha-las, ao longo dos trajetos com destino ao trabalho, a proposta inicial de etnógrafa a realidade de mulheres em deslocamentos pendulares sofreu alterações, resultando assim em texto

(27)

analítico que descreve essa realidade a partir dos dados obtidos no campo.

Foram cerca de três meses de 2019 e de março a julho de 2020, observando em frente na igreja católica e na praça Moacir Valera de Morais, ambas ponto onde os trabalhadores da empresa Riachuelo/Guararapes aguardam os transportes com destinos a Fábricas têxtis e Centro de Distribuição.

Para observação, consideramos fatores do cotidiano dos sujeitos observados, para tanto, participamos no mês de janeiro de 2019 do dia-a-dia da comunidade, apenas uma vez foi possível acompanhar uma trabalhadora no translado entre casa/trabalho e, em eventos que ocorreram na comunidade. As dificuldades em acompanha os trajetos dar-se por ser transportes restritos aqueles que trabalham no Grupo Riachuelo, devidamente cadastradas/os, a minha ida neste dia deu-se a partir de negociação que minha interlocutora fez com o motorista.

As entrevistas seguiram semiestruturadas e direcionados a partir de cinco eixos, sendo: trajetórias, deslocamento, experiencias, relações de trabalho e as vivências familiares. Esses aspectos foram considerados com a pretensão de entender as convergências e divergências entre as trajetórias das interlocutoras. As três entrevistas apresentadas ocorreram na casa de minhas interlocutoras e as conversas etnográficas realizadas ao longo de eventos ou mesmo visitas que realizava a comunidade.

Para Schwade (2016) a realização de trabalhos etnográficos é um desafio, pois o antropólogo e etnógrafo é a todo tempo colocado em xeque sob aspectos e questões que permeiam a sua subjetividade no processo de observar, descrever, registrar e contextualizar.

Devido ao fato de a investigação ocorrer na comunidade à qual a pesquisadora por muito tempo fez parte, consideramos necessária a prática do estranhamento, ou seja, torna-se fundamental duvidar daquilo que apretorna-senta-torna-se como familiar e deixar pra trás as resposta tidas como verdade e pré-noções (DESCARTES, 2001).

A escrita é outro momento da análise no qual devemos ter bastante cautela, pois é o momento em que o autor do texto deve dar voz aos atores que vivenciam a história. Dessa forma, são muitos os desafios no momento da escrita. Conforme Certeau (1982), o historiador ao escrever tem um lugar social, assim, por mais que o autor se encontre em constantes diálogos com o grupo, ele não faz parte desse.

Para Certeau (1982) o cientista ao realizar a investigação representa uma instituição científica, esta por sua vez detém interesses e valores que nem sempre estão em

(28)

consonância com os anseios dos seus interlocutores. Para o mesmo autor, os métodos de investigação não são capazes de expressar a dimensão do real, tendo em vista que parte dos dados coletados em campo são inseridos e descartados a depender dos interesses do pesquisador e instituições. Nesse sentido, os principais desafios que consideramos ao longo da produção escrita é dar voz aos nossos interlocutores e escrever o mais aproximado possível da realidade.

Portanto, a pesquisa etnográfica compreenderá três momentos: a) Aproximação com os moradores da Comunidade de Capela, considerando fundamental a prática do estranhamento do que é familiar; b) Entrevista/conversas face a face e observação com os sujeitos sociais investigados, levando em consideração o caráter histórico sobre suas trajetórias.

A aproximação do grupo investigado ocorreu sem muitos problemas tendo em vista que sou da comunidade, portanto bastante conhecida dentro do ambiente investigado, principalmente se considera-se que muitas mulheres/trabalhadoras tem idades aproximadas a minha, assim algumas foram minhas colegas de ensino fundamental e médio ou mesmo conhecidas por serem conterrâneas.

Vale ressaltar que a trajetória teórico-metodológica norteada por pesquisa etnográfica, a partir da ótica de trajetórias e experiências de trabalhadoras, tendo como centralidade entender em que medida a dinâmica dos deslocamentos pendulares de mulheres pertencentes à comunidade de Capela (Ceará-Mirim/RN) para trabalhar na nas fábricas do grupo Riachuelo são relações de agência dentro do contexto local.

Assim, a estrutura da dissertação está dividida em três capítulos e as considerações finais. O capítulo um apresenta, de forma sucinta, a comunidade de Capela, o contexto histórico de sua formação e desenvolvimento até o contexto atual, suas instituições. A perspectiva teórica adotada para trabalhar a perspectiva de novos contextos rurais de Wanderley (2020), Da Silva (1997), Abramovay (2020), Carneiro (2008) e a respeito de Capela recorre-se aos textos de Andrade (2016); Barbosa (2015) e o levantamento de dados etnográficos.

No capítulo dois, debruça-se sobre aspectos do mundo do trabalho no modo de produção capitalista e classes sobre a perspectiva de autores da base crítica dialética como, Karl Marx (2013); Marx e Engels (2007), Lukács (2015), Mézaros (2006); contemporâneos como Castel (2009) e Boschetti (2009), sobre o salário como meio de acesso a seguridade social, somado à discussão em torno no Grupo Riachuelo, aos

(29)

movimentos pendulares como meio de inserção no mercado de trabalho, com a etnografia dos fluxos e deslocamentos na comunidade de Capela.

O capítulo três destina-se a analisar as experiências e trajetórias (BOURDIEU, 1998) de trabalhadoras do Grupo Riachuelo. Nesse sentido, são descritas de forma suscinta as histórias de vida de Alzira, Nísia, Auta, Clara e Zila, através da perspectiva teórica da interseccionalidade, Akotirene (2018), Bhah (2006).

Nas considerações finais, buscou-se fazer as sínteses do percurso da pesquisa, apreendendo o objeto em sua totalidade e localizando os processos de trânsitos e deslocamentos pendulares nas trajetórias de vidas das trabalhadoras do Grupo Riachuelo. Há, porém, lacunas postas pela pesquisa que não foram tratadas no espaço limitado dessa dissertação, merecendo outros aprofundamentos, desdobramentos e futuras pesquisas.

(30)

2. UM MERGULHO ETNOGRÁFICO NA EXTENSÃO SÓCIO-HISTÓRICO DA COMUNIDADE DE CAPELA

Começo esse capítulo a partir do local que considero como ponto de partida dos meus estudos e origem. O presente texto traz relatos de memória individuais e coletivas a respeito de experiências e percepções sobre a comunidade de Capela – (Ceará-Mirim/RN). Dessa forma, convido os leitores a realizar um mergulho etnográfico sobre o horizonte daqueles que pertencem a essa comunidade e, enquanto pesquisadora/moradora, solicito prudência para a necessidade de dispor de pré-noções cristalizadas, tradicionais e estereotipadas a respeito de como se estrutura uma comunidade rural.

É provável a escuta do termo comunidade rural. Alguns leitores associam o termo à visão dTe paisagens naturais ou mesmo de agricultores trabalhando em roçados. No entanto, é preciso esclarecer que essas comunidades rurais também são cenários de metamorfoses de mudanças individuais e coletivas ao longo do tempo. Neste sentido, não estou advogando em prol do fim desse ideário de ruralidade, mas evidenciando, a partir do contexto analisado, novos formas de ruralidade.

Para descrever e aproximar evidências sobre aspectos de práticas de uma nova ruralidade dentro da Comunidade de Capela recorro a evidências dentro desse próprio espaço, bem como a observações centradas nos atores, processos e instituições sociais. Assim, as descrições apresentadas ao longo do texto apresentam-se como ponte de linguagem, sendo traduções de experiências, na qual passado e presente cruzam-se em processos de construção e desconstrução ao longo do espaço e tempo. Desse modo, é preciso deixar claro que esse texto não narra experiências, ele traduz experiências, possibilitando ao leitor um olhar etnográfico sobre a comunidade, sob uma perspectiva onde presente e passado são traduzidos em cada parágrafo deste escrito.

2.1. Origem da comunidade de capela na perspectiva dos ancestrais

A comunidade de Capela tem sua origem datada no período colonial, através da resolução n° 837 de 09 de junho de 1882. Nessa data, a cidade de Ceará-Mirim/RN é elevada à condição de vila e por meio da Lei municipal n° 2, de 30 de novembro 1892 que estabelece Capela, Murú (sic) e Extremoz como distritos recém-cidade.

(31)

É provável que o nome da comunidade tenha relação com o antigo engenho, devido a sua importância socioeconômica no período1. Não irei adentrar nas discussões, pois os únicos registros desse período são frutos de histórias de ancestrais, transmitidas oralmente, de geração em geração. Ao longo do tempo essas narrativas estão sendo apagadas devido não serem registradas oficialmente, perdendo-se assim, com a morte anciãos da Comunidade.

Figura 1 – Ruínas do Engenho Capela

Fonte: Ferreira (2013)

Os relatos e histórias orais transmitidas pelos ancestrais sobre a comunidade descrevem sua a importância no cenário político colonial. No território onde atualmente Capela está localizada, no período de expansão colonial existia engenho, casa grande e cartório. Esses relatos também demostram a importância de Capela na região, pois alguns chegam até a narrar visitas de figuras importante do império, bem como a possibilidade de o lugar ser sede da nova cidade.

Quando conversava nas rodas com homens e mulheres de distintas gerações sobre as narrativas a respeito da comunidade eles destacavam o quanto a localidade foi importante para o desenvolvimento da cultura açucareira de Ceará-Mirim/RN. Eram rodas onde estava senhores e senhoras na faixa etária dos 80 anos dialogando com pessoas na

1 Mais informações sobre esse período disponível em:

https://franciscoguiacm.blogspot.com/2017/02/engenho-capela-em-ceara-mirim.html. Acesso em 13 de set. de 2020.

(32)

faixa etária dos 50 a 40 anos.

Nossas conversas não tinha dia ou hora marcadas naturalmente surgiam seja em um tarde ao encontrarem-se para colocar os papos em dias ou mesmo vistas, enquanto investigadora que buscava reconstruir a história de Capela sempre os questionava sobre a fundação e desenvolvimento do local ao qual pertencemos.

Figura 2 – Casarões Do engenho Capela

Fonte: Ferreira (2013)

Capela pode ser dividida em dois períodos ao longo da sua história: o colonial e o contemporâneo. No primeiro momento, no qual os moradores habitavam a região próxima às margens do rio que cruza a Comunidade, foram construídos casas e engenhos nas proximidades desse rio. Atualmente a tendência de construções distancia-se cada vez mais desse rio.

Ao escrever sobre esse contexto histórico e visitar esses espaços é impossível não recordar tempos remotos: lembranças das mulheres lavando louças e roupas no rio da ponte, ou mesmo das visitas que, quando criança, realizava nas ruinas do engenho Capela; o medo dos fantasmas; os trabalhos de crianças e mulheres descascando mandiocas para produzir farinha; as histórias contadas por meus ancestrais sobre a chegada à comunidade de Capela; as dificuldades diante das desigualdades sociais que naquele período pareciam tão normais etc.

Neste período todas as atividades econômicas giravam em torno da monocultura açucareira, sendo assim nessa região as formas da exploração de trabalho vão desde o regime escravocrata ao regime de trabalho assalariado. As atividades centravam-se em

(33)

trabalhos agrícolas, sendo heterogêneas as formas de contrato. O agricultor, junto com as plantações são os personagens principais e responsáveis por manter a visão de espaços rurais tradicionais.

Em relação aos contratos de trabalho dos trabalhadores rurais, em contexto de assalariamento, Ianni (2004) enumera as formas de contrato existente no meio rural, sendo esses os sitantes: pequenos proprietários de terras que trabalham diretamente na terra; os arrendatários, que alugam território para uso em determinado período, desenvolvendo atividade agrícola; os parceiros, fazendo uso da terra a partir da oscilação da produção; os empreiteiros, tendo o compromisso de realizar determinada tarefa ao longo da produção e por fim, os camaradas. Desses trabalhadores elencados anteriormente consigo identificar a existência na comunidade de Capela de sitiantes e arrendatários, bem como aqueles que trabalhavam em fazendas e, ao desenvolverem essas atividades, estabeleciam acordos e passavam a morar dentro da fazenda, junto com a família.

Certa tarde sai com destino ao sitio de Francisco senhor de aproximadamente 70 anos que antes de morar em Capela trabalhava e morava junto com a família em uma fazenda localizada próximo a Capela. Ele relatou que por muitos anos morou nesta fazenda com a família por motivos de trabalho, deitado na rede de balanço, o mesmo descrevia que tinha uma casa muito precária em Capela e que desejava mora só que para ter que mora com dele e da então mulher iam passa muita fome sem trabalho e terra para plantar na comunidade.

Outras histórias foram apareceram de trabalhadores que moravam em fazenda e posteriormente migraram para Capela, no entanto também havia aqueles que apresentavam histórias de sempre estiveram ali e desse lugar nunca tinha saído. O que todos mesmo partindo de trajetórias diferente era o sentimento de pertencimento ao lugar e as narrativas a respeito da comunidade.

(34)

Figura 1 – Rio da Ponte

Fonte: Barbosa (2019)

Esclareço que estou pontuando esse momento histórico por três fatores. O primeiro diz respeito à preservação das memórias dos ancestrais, segundo para demonstrar as mudanças que ocorreram dentro da comunidade e por fim descrever as origens da população para nos capítulos que seguem pensar as protagonistas dessa dissertação a partir da perspectiva interseccional.

2.2. A comunidade de capela: uma visão sobre instituições e estruturas na atualidade

A comunidade de Capela está localizada nas proximidades da RN-160 (Mapa do território de Capela 1. A primeira imagem ao chegar à comunidade é do acampamento Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ainda às margens da RN-160. Também tem a quadra poliesportiva, conselho comunitário, posto dos Correios e a Escola Municipal Alcides Câmara de Souza. Caminhando, encontramos praças, bares, campos de futebol, comércios, igrejas, unidade de saúde e, no tocante às paisagens naturais, a Comunidade possui rios e lagoas. Os territórios destinados para as plantações ficam aproximadamente a 2 ou 3 km do que considero como o centro do Distrito, por concentrar os espaços de maior quantidade habitacional.

(35)

Mapa 1 - Demarcação territorial de Capela

Fonte: Google Maps (2020).

De acordo com Andrade (2016) a comunidade de Capela tem aproximadamente 1.800 habitantes2. A região está dividida entre o espaço de moradia (área central) e os de plantação (roçados), contudo essa divisão não é estaque, dado que nos roçados também tem famílias que constroem casas. No centro encontramos casas de alvenaria, locais de lazer e serviços, em contrapartida, tem-se os roçados, lugares destinados às plantações.

As imagens que predominavam no período colonial não fazem mais parte do que atualmente é classificado de Comunidade de Capela. As antigas construções atualmente são ruínas e ao longo do tempo a localidade foi sendo reconstruída, agora não centrada as margens do rio, como aconteceu historicamente. A densidade populacional amplia-se e, como consequência, os espaços antes destinados às plantações tornam-se loteamentos de casas e granjas, tanto construídos por nativos do Distrito como forasteiros que veem na localidade a possibilidade de descanso e/ou lazer aos fins de semana.

(36)

Imagem 4 - Croqui do território de Capela: contexto colonial e atual

Barbosa (2020)

2

Dados referentes ao número de moradores cadastrados na Unidade Básica de Saúde da Comunidade Capela.

(37)

A ilustração supracitada mostra a divisão de Capela de acordo com período colonial e o atual, valendo destacar que nessa região antiga ainda existe ruínas dos antigo engenho e casas, algumas habitadas, a exemplo do antigo Cartório). A construção da infraestrutura da Comunidade não ocorreu de forma planejada. Assim, no território os proprietários de pequenos lotes de terras constroem casas para filhos e/ou parentes, ou mesmo vendem para ádvenas. Não temos aqui como datar esses acontecimentos, haja vista tratar-se de um processo dinâmico e de épocas remotas aos registros. Contudo, é evidente que esse processo de transformação não se trata meramente de mudanças estruturais, pois essas áreas anteriormente tidas como comunidade rural, de predominância agropecuária, tornam-se espaços de vivências de novas ruralidades.

O termo novas ruralidades surge justamente na perspectiva de repensar e questionar a visão cristalizada de espaços rurais, na qual a concepção que predominou por muito tempo foi associada às sociedades tradicionais

nestas sociedades tradicionais, tais como as consideramos anteriormente, as relações entre o meio rural e o meio urbano foram vistas, sobretudo, como relações de isolamento ou de oposição: o meio rural é identificado ao “meio natural”, lugar por excelência da agricultura e da vida social camponesa, distinto, portanto, da cidade, considerada como um “meio técnico”. (WANDERLEY, 2000, p. 91-92)

A partir da afirmação de Wanderley (2020) é possível destaca o paradigma de antagonismo refletido nas concepções de analises sobre rural e urbano, sendo o primeiro sinônimo de atraso e segundo de desenvolvimento. No entanto frete a todo desenvolvimento que o campo demostrando é incredível cristaliza as análises sobre ruralidade a essa dicotomia. Assim sendo diante do processo de transformações sofridas tanto no campo quanto na cidade apresentada por Wanderley (2020) torna-se cada vez mais retrógrado atribui atraso e progresso a espaços territoriais, pois esse paradigma é superado a medida que os espaços por transformações que aproxima-se e distancia do moderno e atraso, em contexto em que costumo afirma que o campo esta na cidade e a cidade está no campo.

Diante do fato de Capela não apresenta uma realidade economicamente ligada a agropecuária, tendo em vista que parcela significativa dos moradores usufruem dos deslocamentos como estratégia de inserção do mercado de trabalho, não consigo definir essa comunidade a partir de rural como ligado atividade primarias, no entanto também não posso afirmar que configura-se como espaço desenvolvido economicamente, talvez

(38)

aproxime-se do que Wanderley (2020) classifica de novas ruralidades.

Embora haja tradicionalmente formas de classificar espaços e sociedades, as categorias rural e urbano estão sujeitas a constantes transformações socioeconômicas ao longo do tempo. Segundo Da Silva (1997), o resultado das transformações e reconfigurações dos espaços rurais é a diversificação de organizações e instituições. O autor, ao longo do texto, chama atenção para o processo de industrialização vivenciado nos meios rurais. No caso de Capela não é possível notar esse processo de industrialização, tendo em vista que a Comunidade tem os rebatimentos do baixo desenvolvimento econômico que a cidade sede, Ceará-Mirim/RN, convive. O falar de que é um local isolado ou de economia agropecuária é equívoco, tendo em vista que os moradores dessa localidade estão em constantes contato com áreas urbanas motivadas por relações de trabalho, saúde, lazer e jurisprudência.

No contexto contemporâneo o debate em torno da questão rural ganha novos dilemas. O termo rural passa a ser classificado a partir de termos como “novo rural” ou “novas ruralidades”, profundamente condicionados a traves de abordagem dicotômica e tipológica por cientistas renomadas/dos como Maria Nazareth Baudel Wanderley (2000), Maria José Carneiro (2012), José Graziano da Silva (1997) dentre outros.

Nesta perspectiva

está cada vez mais difícil delimitar o que é rural e o que é urbano. Mas o tema que aparentemente poderia ser relevante, não o é: a diferença entre o rural e o urbano é cada vez menos importante. Pode-se dizer que o rural hoje só pode ser entendido como um continnum do urbano, do ponto de vista espacial; e do ponto de vista da organização da atividade econômica, as cidades não podem mais ser identificadas apenas com a atividade industrial, nem os campos com a agricultura e a pecuária. Em poucas palavras, pode-se dizer que o meio rural brasileiro se urbanizou nas duas últimas décadas, como resultado do processo de industrialização da agricultura, de um lado, e, do outro, do transbordamento do mundo urbano naquele espaço que tradicionalmente era definido como rural (DA SILVA, 1997, p.1).

Neste contexto de análise Da Silva (1997) aponta o processo de urbanização e desenvolvimento dos meios rurais como fruto do processo de industrialização da agricultura. No entanto, no tocante à Comunidade de Capela a modernização da produção agrícola não ocorreu por parte daqueles que desenvolvem essa atividade: os poucos agricultores que cultivam milho e feijão ao longo dos anos ainda realizam de forma

(39)

bastante artesanal com uso da mão de obra de bois, tobata ou pequenos tratores.

O que pode ser considerado como processo de industrialização são mulheres microempreendedoras que montam pequenos ateliês de vestuário para atender a demanda de grandes empresas e grifes de confecções. São vários os grupos de ex-costureiras de fábricas que desenvolvem essa atividade em cômodos de suas próprias casas.

Historicamente a categoria ruralidade é usada tanto no campo sociológico como no geográfico para delimitar territórios habitados por pequenos grupos humanos com valores culturais mútuos, laços familiares estreitos e sentimento de pertencimento e forma de viver ao território. Essas características sofrem alteração diante do crescimento populacional e diversificação do espaço rural diante das modificações socioeconômicas.

A comunidade de Capela é classificada nos parâmetros do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como rural. No Brasil a delimitação do território entre o rural e o urbano se dá a partir da definição administrativa. Abramovay (2020) descreve que essa perspectiva considera três parâmetros principais, sendo

o rural é definido, ao menos em parte, ao arbítrio dos poderes públicos municipais, em que as conseqüências fiscais da definição acabam sendo mais importantes que seus aspectos geográficos, sociais, econômicos ou culturais; desde que haja extensão de serviços públicos a um certo aglomerado populacional, ele tenderá a ser definido como urbano: é assim que, no Brasil, as sedes de distrito com algumas centenas ou dezenas de casas são definidas como “urbanas”; e • o rural tenderá a ser definido, em princípio, pela carência, o que não pode ser considerado um critério adequado sob qualquer ponto de vista. (ABRAMOVAY, 2020, p. 4).

Esse modelo de classificação de fronteiras entre rural e urbano são demarcações que ocasionam insatisfação, principalmente por parte de especialistas, por considerarem que as áreas rurais ou urbanas vivem constantes metamorfoses.

Nesta perspectiva tradicional o rural é antagônico ao urbano. A exemplo, tem-se autores clássicos da sociologia, como Marx e Engels (2007), que ao analisar a divisão territorial na Inglaterra industrial, descrevem a dicotomia existente entre o campo/cidade. Assim, para esses autores na cidade está a concentração do desenvolvimento econômico, industrial e político. Em contrapartida, o campo está associado ao isolamento, ao arcaico, onde há a predominância de economias vinculadas a atividades primárias. Portanto, o rural e o urbano são vistos por clássicos da sociologia como conflito de duas realidades distintas.

(40)

aparatos teórico-metodológicos que propõem pensar novos horizontes a respeito da ruralidade experienciada nesse lugar. Acredito veementemente que a classificação dessa comunidade por área rural consiste em demarcação política, pois elementos que tradicionalmente delimitam o que vem a ser áreas rurais coexistem com aspectos de vivencias urbanas, elementos como grupos, organizações e instituições. Em síntese, é complexo definir o que vem a ser rural e urbano se considerarmos que aspectos dessas áreas coexistem. Fundamentada em Da Silva (1997), diria que o desenvolvido e o arcaico podem existir tanto em áreas urbanas como rurais e a existência de um não anula a outra.

Nas palavras de Abramovay (2020, p. 6), “as cidades não são definidas pela indústria nem o campo pela agricultura.” Para além dessa perspectiva cristalizada e dicotômica entre rural e urbano e, baseada em observações empíricas, somadas a conversas diria que a definição de rural no contexto da comunidade de Capela é também perpassada pelo pertencimento individual dos atores sociais, reconhecimento esse acionado quando explicamos nossa origem ou local de moradia.

A comunidade de Capela não se encontra isolada como os clássicos defendiam ao definir rural. Os processos de trânsitos e deslocamentos dos moradores e visitantes dessa Comunidade estabelecem redes de contato entre os espaços rurais e urbanos. Ainda que os movimentos pendulares de trabalhadoras entre Capela e a Guararapes confecções configure-se como processo de trabalho, a ocorrência desse fenômeno representa dinâmicas distintas das que tradicionalmente são atribuídas aos espaços rurais. Não se trata de migrações, afinal, quem vive ali gosta de morar ali. Muitas vezes, em meio as minhas conversas, ouvia relatos de mulheres e homens que alegavam não trocar o interior pela cidade, mesmo esses vivenciando diariamente deslocamentos.

2.3. O regresso da moradora/pesquisadora à comunidade de capela: um panorama sobre as organização e instituições

A apresentação de Capela considera duas dimensões: a primeira refere-se ao retorno e ao olhar de pesquisadora/moradora, tendo por horizonte observar e estranhar o familiar, Velho (1981). A segunda dimensão consiste sobre o olhar e trajetória das interlocutoras sobre a Comunidade, momento esse no qual realizamos visitas ao passado e presente a partir de conversas e observações.

Referências

Documentos relacionados

❒ Para obter mais detalhes acerca do tipo de papel que pode ser colocado na bandeja de papel opcional, consulte o Manual de Definições

2º Determinar ao servidor que providencie junto ao Setor de Patrimônio da Unidade Gestora, para que no prazo de vinte quatro horas, efetue a carga patrimonial através do inventário

Tese apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Doutor pelo Programa de Pós-graduação em Direito da PUC-Rio.. Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo

O objetivo deste estudo foi verificar se a angina instável pós-infarto (classe C de Braunwald) aumenta o risco de eventos cardiovasculares maiores (morte hospitalar, infarto agudo

assim como a seção inicial do diálogo foi escrita sob a perspectiva do verdadeiro filósofo, que busca a filo- sofia como iniciação para que, após a morte, sua alma tenha um

Em relação à participação de cada município na produção estadual, pode-se constatar que, em 1990, os municípios de Girau do Ponciano e Coruripe eram os líderes na produção

JD STA FÉ II – Ref.479, sobrado con- tendo no pavimento superior 03 dorms (01 suíte) e banheiro social, no piso tér- reo sala de estar, lavabo, cozinha, área de serviço

A divulgação dos resultados do processo de seleção será feita pela internet no endereço ( www.ppgac.propesp.ufpa.br ) por ordem decrescente de classificação.. a) A