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SOBRE OBSTÁCULOS E ERROS: A CONTRIBUIÇÃO DE BACHELARD PARA PENSAR O PAPEL DO PROFESSOR NO PROCESSO PEDAGÓGICO

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Academic year: 2021

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SOBRE OBSTÁCULOS E ERROS: A CONTRIBUIÇÃO DE BACHELARD PARA PENSAR O PAPEL DO PROFESSOR NO PROCESSO PEDAGÓGICO

Aurélia Lopes Gomes[1]

Paula Rosane Vieira Guimarães1

RESUMO: Este trabalho visa oferecer subsídios para pensar o papel do professor à luz do pensamento de Gaston Bachelard.

Parte de uma reflexão sobre os conceitos apresentados em sua obra que são indispensáveis para se compreender a formação do espírito científico, para analisar, também, a contribuição de suas idéias para as discussões atuais sobre as questões pedagógicas. Busca destacar aspectos referentes ao novo olhar que ele propicia sobre as problemáticas do erro e dos obstáculos, tanto nos processos científicos quanto educacionais.

Palavras-chave:–Obstáculo, Erro, Pensamento Cientifico, Processo pedagógico.

Este trabalho tem como objetivo oferecer subsídios para pensar o papel do professor à luz do pensamento de Gaston Bachelard. Parte da elucidação de conceitos criados por ele para compreender a formação do espírito científico para, em seguida, refletir sobre a contribuição de suas idéias para as discussões atuais sobre as questões pedagógicas.

Gaston Bachelard viveu na França entre 1894 e 1962, sua formação se deu na área das ciências naturais e da química, entretanto é no campo da filosofia e da epistemologia que grande parte de seus estudos vão se efetivar. Em 1938 publica o livro “A formação do espírito científico”, em que denuncia a precariedade do que chama de geometrização da representação, aquela idéia da ciência absoluta, linear e a-histórica proposta pelo Positivismo.

Anuncia a importância da abstração como caminho para a construção do novo espírito científico, propondo uma psicanálise do conhecimento científico e considera que “vai retraçar a luta contra alguns preconceitos” (BACHELARD, 1996, P. 13). Por isso, lança mão de argumentos polêmicos, dentre eles a idéia de obstáculos epistemológicos e de retificação do erro.

Este trabalho evidencia o seu conceito de obstáculos epistemológicos como aspecto fundamental para o progresso da ciência, pois segundo Bachelard, “é em termos de obstáculos que o problema do conhecimento científico deve ser colocado” (BACHELARD, 1996, p. 17), pois é a partir da superação destes obstáculos que possibilita o salto qualitativo e fecundo da ciência.

Relacionado a noção de obstáculo, Bachelard propõe também a necessidade da retificação do erro, trazendo à discussão a necessidade de perceber o erro não mais como um entrave do processo de produção do conhecimento, mas como algo intrínseco e, portanto, necessário. Essa posição permite pensar que nos processos de

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ensino- aprendizagem, tanto o erro quanto os obstáculos precisam ser considerados como elementos igualmente presentes. Considerá-los, portanto, seria uma atitude pedagógica adequada, na medida em que a análise dos erros e dos obstáculos possibilitaria o salto e sua superação em relação aos mesmos, na processualidade da produção do conhecimento objetivo.

SOBRE OS OBSTÁCULOS E O ERRO

Em sua obra, “A formação do espírito científico”, Bachelard denuncia a precariedade do que chama de geometrização da representação, aquela idéia da ciência absoluta, linear, cumulativa, neutra, que se demonstra pelo positivismo; anuncia a importância da abstração e do pensamento abstrato como caminho para a construção do novo espírito científico propondo uma psicanálise do conhecimento científico. Considera que este novo enfoque já foi inaugurado, por exemplo, pela teoria da relatividade de Einstein e resta, agora, às ciências sociais, fazer esta leitura para que possa ocorrer a evolução do conhecimento científico como um todo.

Sua tese determina que todo conhecimento passa por estágios que parte do estado concreto, o das “... primeiras imagens... exaltação da natureza... louvando... a unidade e sua rica diversidade”. O estado concreto-abstrato, “que acrescenta à experiência física esquemas geométricos e se apóia numa filosofia da simplicidade”. E por fim o estado abstrato “em que o espírito adota informações voluntariamente subtraídas à intuição do espaço real, voluntariamente desligadas da experiência imediata” (BACHELARD, 1996, p. 11).

A estes três estados do conhecimento científico, acrescenta a existência de uma base afetiva, uma psicologia da paciência, que ele chama de alma pueril ou mundana: carregada de ingenuidade e assombro frente aos fenômenos; alma professoral: aquela que se envolve de dogmatismo, imóvel, enfim de verdades prontas: alma com dificuldade de abstrair e de chegar à quintessência como aquela que se aproxima do conhecimento ainda de forma imprecisa, mas com a certeza da importância da abstração neste processo.

A tarefa da filosofia é, assim, realizar a psicanálise da evolução do concreto para o abstrato, do natural para o humano, da alma pueril para aquela que se inquieta frente à possibilidade do conhecimento.

Traz um novo olhar sobre o problema da ciência ao determinar que nada começa do nada, o real empírico já está dado, com suas deficiências que devem ser superadas pelo olhar científico, sendo assim a opinião resultante do imediatismo do primeiro olhar deve ser superada. Deve-se abandonar a opinião sobre aquilo que não temos clareza e formular problemas para retirar do fenômeno as idéias fecundas, propondo assim, a precisão, a retificação, a diversificação e a dinamicidade no pensamento científico.

Em seus estudos, Bachelard discute a idéia de obstáculos epistemológicos, que se caracterizam como sendo os aspectos, fenômenos e situações que vão acontecendo no ato de conhecer, causando lentidões e estagnações no processo de desenvolvimento do conhecimento e se encontram dentro do próprio ato e não necessariamente, externos a ele.

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que vai lidar com as questões referentes à epistemologia. Superar estes obstáculos oportuniza saltos qualitativos e fecundos da ciência, ou seja, dão dinâmica ao ato de conhecer.

Bachelard identifica os obstáculos epistemológicos e dentre aqueles que são mais nocivos para o progresso do conhecimento ele cita o da experiência primeira, aquela que se dá numa primeira aproximação com o objeto do conhecimento, sem que se desenvolva a crítica e nem o aprofundamento sobre ele: o empirismo imediato. Chama a atenção para o fato de que os obstáculos se encontram mascarados no senso comum, no conhecimento vulgar, cotidiano, acrítico, ou seja, nossa experiência primeira.

O segundo obstáculo é o do conhecimento geral, em que se usa de generalizações para construir o objeto do conhecimento, que leva também aos equívocos da universalização do particular. Os dois extremos devem ser abandonados, mas as contradições e oposições que existem na relação entre eles devem ser trabalhadas, uma vez que daí vai ocorrer uma sistematização para além do imediato e sensível.

Embora estes dois sejam citados por Bachelard como sendo os mais fáceis de serem identificados no processo de produção da ciência, enumera outros, que vão também se interpor ao conhecimento científico, como os obstáculos: verbal; do conhecimento unitário e pragmático; substancialista; realista, animista, o mito da digestão, da libido e do conhecimento objetivo; conhecimento quantitativo.

É só com as luzes atuais que podemos julgar com plenitude os erros do passado, com o auxílio da interpretação racional, pois a razão leva a verdadeira experiência científica. Mas, ele esclarece, que sua proposta não é a morte do velho, do passado intelectual, ele deve ser conhecido como passado, mas que o novo deve ser traçado a partir de suas origens, deve ser questionador e problematizador do velho.

Para Bachelard, o conhecimento científico é questionador, onde a ciência não se faz de forma contínua e sim através de saltos, rupturas. O conhecimento se faz através de perguntas e respostas, sem perguntas não se tem pensamento cientifico e por sua vez não se tem questionamentos, nem critica, nem dúvida. É preciso fazer, desfazer, e refazer a pergunta sempre acompanhada de critica, ou seja, o movimento dialético, o ir e vir questionador.

A noção de obstáculo pode ser percebida, de acordo com esse pensador, no estudo da história da ciência e na prática educacional. Ao apontar os obstáculos epistemológicos como aspecto ativo na produção da ciência e determinar que a superação destes é importante condição para que ocorram saltos qualitativos no desenvolvimento da ciência.

Articulada a problemática dos obstáculos, Bachelard introduz a discussão de outro conceito que contribui para a compreensão do processo de produção do conhecimento, que é a questão do erro. A existência do erro que até então não era considerado no âmbito dos processos científicos, passa a partir de Bachelard a ser percebido como elemento importante para a formação do espírito científico. Isto é, ele cria a idéia do erro positivo, normal, comum, como aquele que ao ser retificado vai oportunizar o salto no conhecimento do objeto. A retificação do erro é outra condição desta teoria, no sentido de que é preciso que se dê especial atenção ao erro para que ele seja superado.

O PAPEL DO PROFESSOR NA FORMAÇÃO DO ESPÍRITO CIENTÍFICO.

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pedagogia, tendo em vista que ele percebe o pensamento como pedagógico, quando leva a compreender que é necessário que a ciência se torne social e que esta socialização tem na escola um espaço importante.

Sendo assim, podemos verificar na sua epistemologia elementos de como o conhecimento científico deve ser trabalhado na escola, partindo do pressuposto de que ele deve ser problematizado, aparecer em forma de perguntas e não como respostas. O que traz em si a possibilidade do erro, que passa a ter nesta teoria um novo significado, ele não é mais o ponto de chegada, mas o ponto de partida no processo pedagógico.

Bachelard aponta o erro como elemento necessário à superação, diz que é necessário errar, se enganar para enriquecer sua experiência. Uma verdade superada passa a ser um erro superado. A verdade absoluta não é tida como ciência e sim como um erro a ser superado, é a idéia falsa, que barra o avanço do pensamento cientifico. Diz não ser possível existir ciência antes de existir um problema, um objeto.

Tudo isso acrescenta uma dinamicidade ao processo do conhecimento em que o essencial não é mais a apreensão de grandes respostas, mas a instauração da dúvida criadora. Os alunos entre si e com os professores passam a formar uma micro coletividade, em que o professor não é mais o facilitador, mas o complicador da aprendizagem. Segundo Silva: “complica a medida que desafia; a medida que propõe a análise de cada perspectiva. Quando provoca a exposição do erro de forma discursiva, complica o saber fácil, dificulta os juízos apressados ”. (1999 p. 138).

Na escola, quando o professor não vê o erro como parte integrante do processo de ensino/aprendizagem, mas somente o acerto com papel relevante, explicita uma postura tradicional, em que o conhecimento é concebido de forma estática, supondo que o aluno deveria recebe-lo sem questionamentos. Esta postura não permite o ir e vir, apenas uma direção professor–aluno. Exige que este aluno, para “provar” que entende, repita através de “provas” (avaliações) o conhecimento “aprendido”. Aquele que erra é “castigado” e, portanto vai “repetir” o conteúdo, a prova ou o ano (série) enfim.

O professor precisa abrir mão de sua “autoridade”, enquanto detentor do saber, e permitir um caminho de diálogo, a construção de novas idéias ao invés de apresentá-las prontas. Perceber que ensinar também é apreender, que o aluno necessita ser participante deste processo. Sendo assim, “o professor faz da dificuldade um estímulo, uma vontade de querer saber e não de receber verdades prontas. Faz da ansiedade de querer saber a intensidade do instante problematizador”, (SILVA, 1999, p. 138).

É necessário mostrar ao aluno que existem e são possíveis outros processos de construção do conhecimento, para que ele compreenda a necessidade de transformar o conhecimento cotidiano em conhecimento cientifico. O professor tem que ser o mediador, ele complica a ida fácil à resposta. A escola hoje necessita de novos métodos de ensino/aprendizagem que permitam tanto ao professor como ao aluno um entendimento mais próximo da realidade. É preciso se utilizar o verdadeiro conhecimento cientifico para atingirmos novas formas de pensar o mundo.

O ensino do conhecimento científico, assim entendido, não é apenas a transmissão do saber acumulado, não é através de repetições que se dá o conhecimento. Para Bachelard, o aluno já possui um conhecimento anterior, um saber que não é necessariamente vulgar. É preciso expor os conhecimentos para se fazer a ruptura, captar este saber estabelecido para através da crítica, da pergunta, da nova pergunta, do movimento dialético, do ir e vir questionador. Assim, este “saber estabelecido” será enfrentado e destruído dando origem a um novo saber. Evidencia-se, portanto,

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o conceito de ruptura, considerado fundamental por Bachelard para que a ciência possa progredir e seu desenvolvimento não se dê de uma forma retilínea como querem fazer crer os adeptos do positivismo científico. A ruptura, então, passa a ser valorizada no processo de conhecimento.

Podemos visualizar isso se dando objetivamente na sala de aula, quando o professor inicia sua aula partindo do pressuposto que seu aluno já traz uma experiência, que deve ser mudada pela via da apropriação do conhecimento científico. Isto é, pra que o novo se instale, há a necessidade de uma nova postura do professor: a capacidade de elaborar perguntas, problematizar este conhecimento. A partir daí se exige dele que realize coerentemente e de forma ativa e significativa a socialização desse conhecimento.

Referências

BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico: contribuições para uma psicanálise do

conhecimento. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996.

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