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Jornal O Galvanópolis (1931-1932): gênero e cultura no Rio Grande do Norte.

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Academic year: 2020

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JORNAL O GALVANÓPOLIS

(1931-1932): GÊNERO

E CULTURA NO RIO

GRANDE DO NORTE*

MANOEL PEREIRA DA ROCHA NETO**, LAÍS KARLA DA SILVA BARRETO***, ISABEL CRISTINE MACHADO DE CARVALHO****

INTRODUÇÃO: JORNAL O GALVANÓPOLIS (1931-1932)

E

ste estudo nasceu do desdobramento da pesquisa “Uma busca nos arquivos: a história da imprensa norte-rio-grandense (1832-1950), projeto de pesquisa que tinha entre seus objetivos traçar perfis de jornais e jornalistas do Rio Grande do Resumo: o presente artigo tem como objetivo analisar o jornal Galvanópolis, folha noticiosa que circulou na cidade de Currais Novos, no Seridó do Rio Grande do Norte. Na pesquisa aborda-mos a importância histórica do referido jornal, inclusive a presença de anúncios publicitários e enfatizando a contribuição da jornalista Maria do Céu Pereira Fernandes, figura de relevo na vida pública brasileira, pois foi a primeira deputada eleita do Brasil. O jornal O Galvanópolis é considerado um jornal inovador e com discurso de modernidade vigente na década de 1930, além do seu conteúdo que registrava a vida social, política e cultural da sociedade desse município norte--rio-grandense. Em seu primeiro ano, circulava quinzenalmente e com quatro páginas. A partir da edição número dois, do segundo ano, ele passou a ser mensal e dobrou o número de páginas. Circulou de 30 de março de 1931 a 15 de novembro de 1932, publicando ao todo quarenta e três números registrando os primeiros anos da década de 1930 no Seridó potiguar.

Palavras-chave: Imprensa. História. Gênero. Modernidade.

* Recebido em: 22.03.2016. Aprovado em: 19.09.2016.

** Doutor e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professor na Escola de Comunicação e Artes da Universidade Potiguar e no Mestrado Profissional em Administração da UnP. Docente consultor das Faculdades Leão Sampaio (CE) e Vale do Salgado (CE). E-mail: manuneto@yahoo.com

*** Doutora e Mestra pelo Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Docente no Mestrado Profissional em Administração da Universidade Potiguar. E-mail: laisbarreto@unp.br

**** Mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora nos cursos de Comunicação Social da Escola de Comunicação e Artes da Universidade Potiguar. E-mail: isabelcristine@unp.br

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Norte, preservar sua memória, construir sua história, disponibilizar material de pesquisa para professores, pesquisadores, historiadores e estudante de Jornalismo, além de fomentar a pesquisa na área da Comunicação Social. Tínhamos como objetivo de pesquisa apenas catalogar os periódicos encontrados buscando construir um banco de dados capaz de bali-zar o trabalho dos historiadores e dos cientistas da comunicação no Rio Grande do Norte, dentro do período das comemorações dos 200 anos de imprensa no Brasil.

A descoberta desses materiais jornalísticos deixou rastro de curiosidade e inquietação. Tínhamos a imensa sensação de que algo no futuro deveria ser realizado com aqueles exemplares.

Portanto, achamos oportuno a realização desta pesquisa com o objetivo de ampliar o aprendizado acadêmico por meio do conhecimento desse jornal que marcou o percurso da imprensa local. De acordo com Capelato (1994, p.13):

É fascinante ler a história através dos jornais. Em cada página nos deparamos com aspectos significativos das vidas de nossos antepassados, que permitem recuperar suas lutas, ideias, compromissos e interesses. Manancial dos mais férteis para o conhecimento do passado, a imprensa possibilita ao historiador acompanhar o percurso dos homens através dos tempos.

O advento e o transcorrer da chamada Primeira República (1889-1930) trouxeram uma imprensa que se diversificava. A política mantinha seu espaço, mas o crescimento urbano propiciava o ímpeto de se reportar novos focos de notícia, fosse aquele bordão republicano “O Brasil Civiliza-se” ou as diferentes práticas culturais de uma sociedade em busca do pro-gresso. Nas primeiras décadas do século XX, no Brasil, emergiam jornais de diversas facetas: periódicos noticiosos, literários, oficiais, comerciais, agrícolas, religiosos, esportivos e assim por diante. Seguindo a tendência nacional, no Rio Grande do Norte, em Currais Novos, surge O Galvanópolis:

Na alegria matinal desta radiante manhã impregnada da benéfica unção religiosa que lhe imprime o grandioso acontecimento que a cristandade cultua, esvoaçam as primeiras folhas desse novo periódico. O ideal dos que dirigem O Galvanópolis, tendo como guia o espírito fulgurante e belo de Maria do Céu, é o engrandecimento desta pequena, mas generosa e boa terra (O GALVANÓPOLIS, n. 1, ano 1, 30 mar. 1931, p. 1).

Com a direção de O Galvanópolis nas mãos de Maria do Céu Pereira Fernandes assiste-se ao triunfo da vanguarda feminina transformadora, do seu papel marcante na vida social, política e cultural da sociedade curraisnovense (BARROS; SANTOS, 2004).

Em seu texto, intitulado “Porque não recusei”, publicado no 1º número do jornal, em 30 de março de 1931, na primeira página, Maria do Céu apresenta aos seus leitores os motivos pelos quais resolve aceitar a direção do jornal:

A bondade do povo de minha terra deu-me idoneidade para o honroso encargo que me quis confiar; viu-me asseosa para desempenhá-lo; criou em mim uma personalidade que está muito além do meu valor intrínseco, sob o nome de dever, combateu com a minha imperícia e venceu. Que me resta fazer? Aceitar a incumbência? Fi-lo. Ao povo do Gal-vanópolis, sobretudo aos que constituem o C. N. F. C., agradeço, do íntimo da alma

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o modo fidalgo com que me distinguiu, a bondade que será incentivo para a realização deste grande empreendimento.

O nome dado ao jornal representa o conflito de identidade que conduzia a reali-dade da população. Uma cireali-dade moderna não poderia ser reconhecida por um nome que associasse ao imaginário rural, no caso Currais Novos.

Currais Novos, ou antes Galvanópolis, que é nome que melhor se adapta à nossa aprazível cidade, já pela sua beleza estética, já pelo cunho estético de civismo e reconhecimento que encerra, é um dos recantos do Seridó que mais acentuadamente te recebido as auras vivificantes do progresso nas suas múltiplas e variadas emanações (O GALVANÓPOLIS, n. 1, ano 1, 30 mar. 1931, p. 1).

Por esse motivo, acatando uma sugestão de um dos fundadores da imprensa cur-raisnovense, Ulisses Telêmaco de Araújo Galvão, alguns intelectuais defendiam a ideia de que a cidade deveria ser chamada de Galvanópolis, uma alusão à família Galvão, responsável pelo povoamento do local. Contudo, o esforço desses intelectuais não surtiu efeito. O município continuou denominado de Currais Novos, mas como forma de compensação resolveram ba-tizar um dos seus jornais com o nome O Galvanópolis, em respeito aos seus ideais.

De acordo com Melo (1987), o jornal era dedicado à literatura, desportos e notí-cias. Em seu primeiro ano, circulava quinzenalmente e com quatro páginas. A partir da edição número dois, do segundo ano, ele passou a ser mensal e dobrou o número de páginas. Co-brava por assinatura anual seis mil-réis (6$000), semestral quatro mil-réis (4$000) e número avulso setessentos réis ($700). Circulou de 30 de março de 1931 a 15 de novembro de 1932, publicando ao todo quarenta e três números.

Surgia, então, o periódico, de quatro páginas, com três colunas em cada uma delas. Quase não apresenta seções fixas nem obedece a uma diagramação rígida. Porém, já existe alguma preocupação com o discurso gráfico, tendo em vista a variação e o tamanho do corpo (letra) em uma mesma página e a disposição dos textos em busca de equilíbrio visual.

A primeira página de O Galvanópolis permaneceu inalterada até a vigésima quar-ta edição, esquar-tando na parte superior da revisquar-ta, a daquar-ta de publicação, o número da edição, sua periodicidade e o nome da diretora do jornal: Maria do Céu Pereira. Logo abaixo, um cabeçalho para identificação formado pelo título em maiúsculas arredondadas; seguido do subtítulo Orgão Oficial do Currais Novos F.C. A partir do segundo ano em diante, substituiu o subtítulo por Órgão Independente.

IMPRENSA E HISTÓRIA

Investigar os jornais impressos como fonte histórica não é tarefa fácil. A cada página amarelada pelo tempo e pelo manuseio de pesquisadores, os jornais tornam-se fonte de pes-quisa histórica, pois nas suas páginas são relatados fatos e acontecimentos que registram uma época, um tempo, uma história.

Sobre a história da imprensa no Brasil, Bahia (2009, p.17) destaca que foi “sob o signo do oficialismo e com o atraso de três séculos que se inaugura a imprensa no Brasil, em 1808. A administração colonial portuguesa impede a tipografia e o jornalismo até à chegada

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de D. João VI”. Em maio do referido ano, foram montados os maquinários das oficinas da “Impressão Régia e, em setembro, inaugurou-se a imprensa produzida em solo brasileiro por meio do Jornal ‘a Gazeta do Rio de Janeiro” (BAHIA, 2009).

Nesse contexto histórico de tempo e espaço, destacamos que a trajetória do jorna-lismo no Brasil esteve sempre em consonância com uma imprensa opinativa que defendia a Coroa Portuguesa.

A existência de um público letrado e interessado em consumir notícias periódicas, a implantação de uma técnica - no caso, a tipografia - capaz de satisfazer, num âmbito maior do que o da comunicação oral ou manuscrita, esse interesse e a constituição de veículos para transmitir as informações são pré-requisitos da atividade jornalística em sentido estrito (ROMANCINI; LAGO, 2007, p.15).

Nos primeiros anos do Século XX, a imprensa dialogava também com a literatura. De acordo com a pesquisadora Buitoni (1986, p.38): “Literatos ora transformavam-se em jornalistas e vice-versa”. Outras publicações surgiram como, por exemplo, “A Estação (1879-1904). Com excelente figurino e bem impressa, é considerada uma das mais importantes revistas femininas do final do século XIX. Há ainda A Mensageira (1897-1900), de São Paulo e a Revista da Semana (1901), do Rio de Janeiro” (BUITONI, 1986, p. 38).

A autora assinala que a publicação Kosmos (1904), além de contar com grandes nomes da literatura em suas páginas, tinha excelente apresentação gráfica. “Três títulos críti-cos, O Malho (1902), Fon-Fon (1907) e Careta (1908), vieram introduzir novas formas de linguagem humorística. Calixto, J. Carlos e Nair de Tefé, sob o pseudônimo de Rian, faziam caricaturas da sociedade carioca” (BUITONI, 1986, p.42-3).

Na década de 1910, surgiu no Rio de Janeiro a Revista Feminina (1914), que cir-culou até meados de 1936. Essa publicação foi o exemplo da vinculação imprensa/indústria e publicidade nascente, pois deve sua existência a uma bem-montada sustentação comercial, hoje defasada, mas que logrou êxito naquela época. É verdade que esses veículos de comuni-cação eram considerados de pequeno porte ou nanicos, ao contrário dos grandes jornais de agora. Todavia, suas editoras já estavam concatenadas com o espírito de modernidade e da industrialização da imprensa.

Recuperar a história da imprensa, segundo Barbosa (2007, p.15) é construir essa história tal qual “a escrita da história”, a autora ainda assinala; “É perceber a história como processo complexo, no qual estão engendradas relações sociais, culturais, falas e não ditos.” Sobre o Jornal como fonte a pesquisadora Luca (2005) diz que houve, entre os historiadores, uma forte resistência para reconhecer a história por meio dos jornais:

Não se pode desprezar o peso de certa tradição, dominante durante o século XIX e as déca-das iniciais do século XX, associada ao ideal de busca da verdade dos fatos, que se julgava atingível por intermédio dos documentos, cuja natureza estava longe de ser irrelevante. Para trazer à luz o acontecido, o historiador, livre de qualquer envolvimento com seu objeto de estudo e senhor de métodos de crítica textual, precisa, deveria valer-se de fontes marcadas pela objetividade, neutralidade, fidedignidade, credibilidade, além de suficientemente distanciadas de seu próprio tempo [...] (LUCA, 2005, p.115, apud LIMA, 2014, p. 823).

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O pesquisador Marcondes Filho (2000), por sua vez, em seu estudo intitulado Co-municação e Jornalismo, a saga dos cães perdidos, ao fazer uma classificação da História do jornalismo assinala as cinco etapas distintas do jornalismo no Brasil.

O jornalismo Pré-histórico (1631-1789), considerado artesanal; o Primeiro jorna-lismo (1789-1830), de teor político-literário; o Segundo jornajorna-lismo (1830-1900), denominado como imprensa de massa; o Terceiro jornalismo (1900-1960), assi-nalado como imprensa monopolista e, por fim, o Quarto jornalismo (1970-até os nossos dias), sendo este o jornalismo de informação eletrônica e interativa (MARCONDES FILHO, 2000, p. 48).

Seguindo a tendência nacional, no Rio Grande do Norte, na cidade Currais Novos, surgiu na década de 1930 o jornal O Galvanópolis, veículo que teve como mentora uma mulher, tornando este jornal como inovador e de vanguarda, em sintonia com o espírito de modernidade e com os desportos.

Na alegria matinal desta radiante manhã impregnada da benéfica unção religiosa que lhe imprime o grandioso acontecimento que a cristandade cultua, esvoaçam as primeiras folhas desse novo periódico. O ideal dos que dirigem O Galvanópolis, tendo como guia o espírito fulgurante e belo de Maria do Céu, é o engrandecimento desta pequena, mas generosa e boa terra (O GALVANÓPOLIS, n. 1, ano 1, 30 mar. 1931, p. 1).

Com a direção de O Galvanópolis nas mãos de Maria do Céu Pereira Fernandes assiste-se ao triunfo da vanguarda feminina transformadora, do seu papel marcante na vida social, política e cultural da sociedade curraisnovense (BARROS; SANTOS, 2004).

Em seu texto, intitulado “Porque não recusei”, publicado no 1º número do jornal, em 30 de março de 1931, na primeira página, Maria do Céu apresenta aos seus leitores os motivos pelos quais resolve aceitar a direção do jornal:

A bondade do povo de minha terra deu-me idoneidade para o honroso encargo que me quis confiar; viu-me asseosa para desempenhá-lo; criou em mim uma personalidade que está muito além do meu valor intrínseco, sob o nome de dever, combateu com a minha imperícia e venceu. Que me resta fazer? Aceitar a incumbência? Fi-lo. Ao povo do Gal-vanópolis, sobretudo aos que constituem o C. N. F. C., agradeço, do íntimo da alma o modo fidalgo com que me distinguiu, a bondade que será incentivo para a realização deste grande empreendimento.

O nome dado ao jornal representa o conflito de identidade que conduzia a reali-dade da população. Uma cireali-dade moderna não poderia ser reconhecida por um nome que associasse ao imaginário rural, no caso Currais Novos.

Currais Novos, ou antes Galvanópolis, que é nome que melhor se adapta à nossa aprazível cidade, já pela sua beleza estética, já pelo cunho estético de civismo e reconhecimento que encerra, é um dos recantos do Seridó que mais acentuadamente te recebido as auras

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vivificantes do progresso nas suas múltiplas e variadas emanações (O GALVANÓPOLIS, n. 1, Ano 1, 30 mar. 1931, p. 1).

Por esse motivo, acatando uma sugestão de um dos fundadores da imprensa cur-raisnovense, Ulisses Telêmaco de Araújo Galvão, alguns intelectuais defendiam a ideia de que a cidade deveria ser chamada de Galvanópolis, uma alusão à família Galvão, responsável pelo povoamento do local. Contudo, o esforço desses intelectuais não surtiu efeito. O município continuou denominado de Currais Novos, mas como forma de compensação resolveram ba-tizar um dos seus jornais com o nome O Galvanópolis, em respeito aos seus ideais.

De acordo com Melo (1987), o jornal era dedicado à literatura, desportos e notí-cias. Em seu primeiro ano, circulava quinzenalmente e com quatro páginas. A partir da edição número dois, do segundo ano, ele passou a ser mensal e dobrou o número de páginas. Co-brava por assinatura anual seis mil-réis (6$000), semestral quatro mil-réis (4$000) e número avulso setessentos réis ($700). Circulou de 30 de março de 1931 a 15 de novembro de 1932, publicando ao todo quarenta e três números.

Surgia, então, o periódico, de quatro páginas, com três colunas em cada uma delas. Quase não apresenta seções fixas nem obedece a uma diagramação rígida. Porém, já existe alguma preocupação com o discurso gráfico, tendo em vista a variação e o tamanho do corpo (letra) em uma mesma página e a disposição dos textos em busca de equilíbrio visual.

A primeira página de O Galvanópolis permaneceu inalterada até a vigésima quar-ta edição, esquar-tando na parte superior da revisquar-ta, a daquar-ta de publicação, o número da edição, sua periodicidade e o nome da diretora do jornal: Maria do Céu Pereira. Logo abaixo, um cabeçalho para identificação formado pelo título em maiúsculas arredondadas; seguido do subtítulo Orgão Oficial do Currais Novos F.C. A partir do segundo ano em diante, substituiu o subtítulo por Órgão Independente.

AS RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO: MULHER E IMPRENSA

No raiar do século XX, pensava-se que muitas transformações referentes à situação da condição da mulher estavam por concretizar-se. Achava-se que um novo tempo de igual-dade e equiigual-dade entre os sexos estava por vir. Todavia, as diferenças entre o gênero ainda se perpetuava, privilegiando o homem como protagonista da história, excluindo as mulheres, ou seja, a condição da mulher não era muito diferente de outrora.

As engrenagens de dominação como, por exemplo, o abandono dos homens em cer-tos empregos na Europa, como os escritórios, objetivavam desvalorizar determinadas profissões. Essa estratégia permaneceu vigente durante décadas no século XIX e século XX. O procedimen-to era utilizado como mecanismo de segregação e supremacia de poder masculino:

Quando as mulheres progridem numa profissão ou numa disciplina, os homens aban-donaram-na, ou já antes a tinham abandonado. Não é uma situação de rivalidade, nem sequer de justa concorrência, é um abandono silencioso. Essa fuga perpetua o afastamento estrutural das posições de homens e mulheres (LAGRAVE, 1991, p.506).

As posições de destaque eram exercidas pelos homens, enquanto as mulheres sem-pre ocupavam funções menos importantes. Essa dominação social não se fazia sem-presente

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ape-nas no mercado de trabalho. O sistema educacional da Europa, no início do século XX, também foi alvo dessa estratégia.

Na luta dos direitos das mulheres no Brasil dessa época, destaca-se a figura de Ber-tha Lutz, que após voltar da Europa, em 1918, assumiu o comando das campanhas de luta das mulheres brasileiras. Utilizava-se de táticas para avançar nas conquistas sociais. Segundo Soihet (2000, p.98), as mulheres brasileiras, como aquelas da Europa e dos Estados Unidos, reclamavam abertamente direitos, reagindo contra a condição a que estavam submetidas. Al-gumas se rebelaram abertamente, enquanto a maioria se valia de maneiras mais sutis na ânsia de subverter a situação. Lançavam mão de táticas que lhes permitiam reempregar os signos da dominação, marcando uma resistência.

Sobre táticas, Certeau (1994, p.41) frisa que elas tornam-se necessárias para des-vendar as sutilezas engendradas de forma criativa pelos dominados, com vistas a reagir à opressão que sobre eles incide. Para Thompson (1979, p.51), embora não estabeleça mulheres como objeto específico, dedica especial atenção às manifestações cotidianas de resistência dos subalternos, por meio do mecanismo das táticas. A noção de resistência torna-se, desse modo, fundamental nas abordagens sobre as mulheres e inúmeras historiadoras e pesquisadoras têm se baseado nesse referencial no esforço de reconstrução da atuação da mulher.

Cito como exemplo as obras Tecendo por trás dos panos (1994), de Rocha-Couti-nho, que trata da construção dos mecanismos para a conquista do espaço público através das atividades domésticas, e A pedagogia do espaço público pelas mulheres e a militância de Ber-tha Lutz, Soihet (2000) que, por sua vez, analisa a luta das mulheres na conquista do espaço público com as práticas da feminista Bertha Lutz.

Era pelo mecanismo de táticas que Lutz e um grupo de mulheres utilizavam-se de um discurso moderado. O cuidado de demonstrar seu discurso moderador estava presente na busca do direito do sufrágio feminino, negado na Constituição de 1891.

No contexto social dos anos de 1930, década que circulou o Jornal O Galvanópo-lis, de acordo com Rocha-Coutinho (1997, p.29), a mulher deveria viver para o amor, para a vida no lar: “amor aos seus filhos, a seu esposo, a sua casa. Para tanto, ela deveria se manter pura, distantes dos problemas e das tentações do mundo exterior - o mundo do trabalho -, que deveria ficar sob o encargo do homem”. A mulher deveria se resguardar no próprio lar, ficando longe de qualquer problema que viesse atingir seu espaço, em prol da família. Afirma também que elas eram “consideradas frágeis, emotivas, dependentes, instintivamente mater-nais e sexualmente passivas, instalando-se o “lugar feminino” de esposa e mãe centrado no espaço doméstico” (ROCHA-COUTINHO, 1997, p. 30-1).

Para entendermos a relação social de gênero a autora Santos (2004, p.88) afirma que “o conceito de gênero envolve pelo menos duas dimensões: o comportamento diferencia-do masculino e feminino observadiferencia-do nas sociedades e a distribuição desigual de poder entre o sexo”. Ainda sobre essa questão Sorj (1992, p.15) assinala que gênero é um “produto social, aprendido, representado, institucionalizado e transmitido ao longo das gerações.”

Com relação aos territórios da segregação sexual estabelecida pelas convenções so-ciais, Perrot (1992) assinala: No século XIX acentua a racionalidade harmoniosa dessa divisão sexual (público e privado). Cada sexo tem a sua função, seus papéis, sua tarefa, seus espaços, seu lugar quase predeterminado. “Os papéis femininos limitavam-se ao lar. Muito embora a mulher frequentasse o espaço público, no caso a igreja, havia limitações e normas” (PERROT, 1992, p.178). Por sua vez, Almeida (1998, p. 43) diz que “gênero é um produto cultural

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ad-quirido e transmitido nas estruturas sociais”. Nessas estruturas da sociedade, na maioria das vezes, a mulher esteve em condição de desvantagem. Até mesmo no espaço a ela destinado vivia sob uma dominação invisível, articulada pelo pai ou pelo marido. Uma forma de violên-cia, mas de modo sutil e intrinsecamente exercida pelos homens. Essa violência que Bourdieu (1999) classifica de violência simbólica, está relacionada com a Dominação masculina.

Resultante da violência simbólica, violência suave, insensível, invisível as suas próprias vítimas, que se exerce essencialmente pelas vias puramente simbólicas da comunicação e do conhecimento, ou mais precisamente, do desconhecimento, do reconhecimento ou, em última instância, do sentimento (BOURDIEU, 1999, p. 7).

Contudo, mesmo sob o domínio masculino, algumas mulheres venceram barreiras e se confrontavam com as convenções sociais estabelecidas não aceitando, portanto, as nor-mas impostas pela sociedade da época. No tocante à presença de mulheres na cultura e na vida pública, a pesquisadora Duarte (2016, p. 14) assinala:

Quando as primeiras mulheres tiveram acesso ao letramento, imediatamente se apode-raram da leitura, que por sua vez as levou à escrita e à crítica. E independentemente de serem poetisas, ficcionistas, jornalistas ou professoras, a leitura lhes deus consciência de estatuto de exceção que ocupavam.

Na imprensa, muitas mulheres ocuparam papeis de destaque, assim como Maria do Céu Pereira Fernandes no comando do Jornal O Galvanópolis. Sobre a presença de mulheres nos jornais Duarte (2016, p. 14) destaca: “Mais do que os livros, foram os jornais e as revistas os primeiros e principais veículos de produção letrada feminina, que desde o início se confi-guraram em espaços de aglutinação, divulgação e resistência”. Espaço em que Maria do Céu Pereira Fernandes atuou e transitou em sua comunidade.

COLABORADORES EM DESTAQUE: A PRESENÇA DE MARIA DO CÉU PEREIRA FERNANDES

O jornal tinha colaboradores diversos. Ainda, na primeira página encontro poesias de autoria de Sinhá Coelho e Manoel Rodrigues de Melo. Esses sonetos de abertura disputa-vam espaço com o editorial e artigos. Escreveram para o jornal: Everton Cortez, Oton Filho, Tristão de Barros, Mário Domingues, Vicente Lima entre outros. Alguns deles utilizavam o uso de pseudônimos:

Os pseudônimos e o anonimato eram fartamente adotados entre os escritores e leitores. José de Alencar lançava sem assinatura no folhetim do Diário do Rio de Janeiro o romance O Guarani. Machado de Assis era outro exemplo disto; utilizava vários pseudônimos com os quais assinava suas crônicas nos jornais: Gil, Job, Dr. Semana, Manasses, Eliazar, Lélio e outros (MORAIS, 2002, p. 71).

Foi o que aconteceu com os colaboradores de O Galvanópolis. A exemplo de Ma-noel Rodrigues de Melo, cujos pseudônimos eram Rodrigues Filho e Juvenal Galeza, Everton

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Cortez, que usava G. Nerino e Tristão de Barros, com os pseudônimos Tob Jim e Cleto Jato-bá. Maria do Céu Pereira, entretanto, não adota tal recurso e sempre assina seus textos com seu próprio nome.

Os escritos de Maria do Céu Pereira registrados no jornal permitem ver as marcas de um determinado tempo condicionado às transformações que a sociedade brasileira vivia naquele momento histórico. Nos seus textos, registrados quase sempre na primeira página do jornal, identificamos sua preocupação em discutir o progresso da nação, a religiosidade, a condição feminina e a educação. Destacamos, respectivamente, os artigos relacionados às temáticas mencionadas: Comunismo, publicado no dia 7 de fevereiro de 1932; O atestado da religiosidade brasileira, registrado na edição de 11 de outubro de 1931, Semana Santa, de 30 de março de 1932, 02 de Novembro, de 8 de novembro de 1931 e Onde nosso campo de atividade, de 22 de novembro de 1931 e Livros, veiculado em 30 de agosto de 1931.

Nesse último artigo, Maria do Céu assume, portanto, uma postura em defesa de uma cultura letrada. Comprometida em orientar a juventude de sua cidade, mostra-se pre-ocupada com a relação desses jovens com os livros. Busca orientar e aconselhar seus leitores sobre a importância da prática de leitura dos bons livros, indispensáveis para a formação inte-lectual e moral. Dessa forma, Maria do Céu deixa no jornal vestígios de como se desenrolava a educação dos jovens.

Os traços esmerados da esferográfica cediam o lugar a uma diagramação mecaniza-da, possibilitada pelas máquinas rotativas, privilégio não só da imprensa oficial. Para Gomes (1999), ao mesmo tempo em que os jornais noticiosos cresciam, nas grandes cidades, organi-zando-se como empresas jornalísticas e incorporando avanços tecnológicos como o telégrafo, telefone, e a fotografia através do sistema de clicheria, outros periódicos brotavam nos muni-cípios menores, a exemplo dos jornais literários, estudantis, operários, femininos e esportivos. Sob a forte influência da efervescência dos jornais, O Galvanópolis deveria contar uma história de progresso e desenvolvimento, com a difícil missão de convencer a população da urgência na substituição dos antigos hábitos por outros, considerados mais civilizados. No primeiro número do jornal que circulou em 30 de março de 1931, a diretora Maria do Céu revela aos seus conterrâneos a alegria do grandioso acontecimento representado pelas primei-ras folhas desse novo periódico:

Elas vem com a singeleza e a timidez de quem ausculta ambientes desconhecidos, a re-clamar guarida no seio dessa boa e generosa gente para uma estação o mais duradoura possível. Elas estão despojadas de reclamos relumbantes e de apresentações pomposas. Visam é cooperar com todo o ardor, com todo o entusiasmo pelo engrandecimento geral da nossa terra e exaltar os méritos e o valor inconfundíveis da nossa gente. O nosso povo, já por um sentimento atávico, já impulsionado pela invasão irresistível das inovações su-blimes que nos apresenta esse decantado século XX, é arrebatado pelos mesmos frêmitos de amor aos nobres ideais que se concretizam em outras terras (O GALVANÓPOLIS, n. 1, ano 1, 30 mar. 1931, p. 1).

E complementa:

Estamos sendo animados por uma partícula dessa luz encantadora que acende nos nos-sos dias a flâmula brilhante de uma civilização sem símile em tempo algum. As letras e

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esporte são cuidados com desvelo e carinho para a consubstanciação do brocado: “cultive um espírito são num corpo são. Está aí um alevantado ideal que merece ser preconizado! (O GALVANÓPOLIS, n. 1, ano 1, 30 mar. 1931, p. 1).

Este editorial de lançamento do jornal nos revela o comprometimento do jornal: seria com as letras e o esporte. No que se refere às letras identificamos nos textos produzidos no Galvanópolis a prosa ou poesia. Crônicas, ensaios, notas, contos, colunas, entrevistas, editorial, ocupam mais da metade do espaço do jornal; enquanto a poesia, ficou em segundo plano. Quanto ao esporte, a temática merece lugar de destaque no periódico, sempre publi-cado na última página registrando os movimentos esportivos realizados na cidade de Currais Novos, a exemplo dos campeonatos de futebol que aconteciam regularmente tendo o time do município como ator principal:

O nosso time já defrontou com galhardia adversários fortes. O seu primeiro encontro verificou-se com o Cerro-Corá saindo vitorioso com a contagem de 1X0. Em seguida, enfrentou o Acary F.C. com o mesmo resultado. Ainda com o Acary jogou, saindo vencedor com o resultado de 5X0. No dia 3 de outubro do ano passado, tivemos a visita do Caicó F.C. em cujo jogo este clube teve a vitória de 2x0. Encontrámo-nos duas vezes como o Potiguar F.C. time local e triunfamos em ambos os encontros. Com o União F. C., de Lages, jogamos e empatamos (O GALVANÓPOLIS, n. 1, ano 1, 30 mar. 1931, p. 4). Os jogos entre os clubes da região dinamizavam as tardes de domingo em Currais Novos e sinalizavam o desejo de despertar nos jovens o culto ao corpo, através da prática de atividades físicas, particularmente o futebol. Na abertura do texto em que aparece a entrevista com o presidente do Currais Novos Futebol Clube, Maria do Céu transmiti aos seus leitores a importância dos exercícios físicos:

Todos os povos civilizados exigem, como uma condição precípua para evitar o depaupe-ramento físico da raça, a prática regular dos esportes. É louvável, portanto, o arrouba-mento que nos anime e o entusiasmo com que cultivamos esses salutares exercícios (O GALVANÓPOLIS, n. 1, ano 1, 30 mar. 1931, p. 4).

Além da temática esporte, pauta recorrente no jornal, outro assunto disputava espaço em suas páginas: a terrível crise climática, que ora atravessava o município e suas consequências. Dentre os males que afligem a zona sertaneja, avultam, sem dúvida, as secas que, periodica-mente infestam os estados do Nordeste. O sertanejo, embora despreparado, mas sempre forte, suportou o embate do tempo contra todas as intempéries das estações e escassez da época.

Terminou o ano de 1929, veio 1930 radiante das mais lisonjeiras esperanças frustradas por uma seca que consumiu todas as reservas acumuladas no ano anterior. Entrou 1931 e já lá se foram três meses sem que uma medida salutar viesse sanar ou, pelo menos, atenuar tal estado das coisas. Ao nosso ver, estradas possuímos com bastante suficiência, embora não comparáveis às do Sul, achando mesmo mais acertado a construção de reservatórios de água (açudes) que reguem os nossos campos e facilitem a vida nos tempos daquelas calamidades (OTON FILHO, 1931, p.1).

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Embora os fatos e comentários, que recheavam as páginas do jornal, fossem, em sua maioria, relacionadas às notícias de caráter próximos à realidade da região, em O Galvanópo-lis havia espaço para os acontecimentos que eclodiam na capital do País.

No intuito de ampliar os nossos serviços jornalísticos, acabamos de contratar no Rio de Janeiro a remessa quinzenal de reportagens, correspondências e notícias, de interesse geral. Brevemente iniciaremos a publicação desses comunicados, o que patenteia os esforços da direção de O Galvanópolis, no sentido de torná-lo cada vez mais atraente e noticioso. Com a inauguração desses serviços, desejamos apenas corresponder à preferência com que nos têm distinguido os nossos inúmeros leitores, não só desta cidade, como dos municípios vizinhos (FERNANDES, 30 mar. 1931, p. 4).

A partir da edição de 30 de agosto de 1931, os leitores do periódico passam a ser agraciados com notícias e reportagens oriundas do Rio de Janeiro. A exemplo da inauguração da estátua do Cristo Redentor, no dia 12 de outubro de 1931, no Rio de Janeiro; da reunião do Congresso Feminino, em setembro do mesmo ano e na mesma cidade, cuja discussão girava em torno do voto feminino; da exposição de cabeçalhos de jornais que aconteceu, no dia 16 de janeiro de 1932, durante a Quinzena do Livro Nacional, uma iniciativa da Coope-rativa Editora e de Cultura Intelectual de São Paulo ou ainda sobre o lançamento, no Rio de Janeiro, em fevereiro de 1932, de uma revista ilustrada de arte, literatura e interesses gerais da mulher sob o título Brasil Feminino, dirigida e fundada pela escritora carioca Iveta Ribeiro. O GALVANÓPOLIS: UMA FOLHA REPRESENTATIVA NA DÉCADA DE 1930

Os esforços dispensados pela equipe do jornal em seu primeiro ano de vida, pare-cem ter sido satisfatórios. No entanto, para eles ainda falta muito para atingirem as metas que se propuseram chegar. No aniversário de primeiro ano do jornal, Maria do Céu Pereira, ciente de sua responsabilidade, enquanto diretora do periódico agradece a todos que contri-buíram como o sucesso de O Galvanópolis:

Graças à bondade de que têm dado provas inconcussas os nossos assinantes, garças a cooperação assídua de quantos conosco trabalham, graças ainda à valiosa perseverança dos nossos colaboradores que sempre nos prestigiaram com seu apoio, que se dignaram iluminar as páginas simples do nosso humilde jornalzinho com o fulgor da sua inteligên-cia, vencemos o primeiro ano (O GALVANÓPOLIS, n. 2, ano 2, 30 mar. 1932, p. 1). Colaboradores do jornal também afirmam a vitória do empreendimento. Ewerton Cortês, em seu artigo intitulado A minha contribuição, publicado em 30 de março de 1932, ressalta que o aniversário do jornal é um dia de justas satisfações, não somente para a impren-sa, mas para a cidade de Currais Novos, uma vez que a imprensa vive do povo para o povo, isto é, quando ela está inteiramente na sua missão de servir a coletividade:

A nossa imprensa sempre tem sabido corresponder a sua bela finalidade. E com desen-voltura e interesse. Com estoicismo e dedicação. Para corroborar essa afirmativa estão aí as páginas de O Galvanópolis, o jornalzinho simpático e elegante onde Maria do Céu

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guarda com todo carinho e desvelo o melhor da sua inteligência e do seu coração de bondade (O GALVANÓPOLIS, n. 2, Ano 2, 30 mar. 1932, p. 2).

O colaborador reconhece, ainda, que apesar de ter sido um ano de luta, de sacrifí-cios e de canseiras de todas as matizes, ele representa um ano de vitórias, de completo triun-fos. Tais vitórias redundam em contentamentos, em plenas satisfações que apagam todas as contrariedades e animam novos combates. Deseja, por fim, a continuidade do jornal:

E O Galvanópolis, airosamente continuará sem interrupção a ser o farol donde rebrilhará com eloquência a mentalidade sadia, forte, decisiva de nossa mocidade sempre vibrante, sempre entusiasta para os superiores empreendimentos. Que sempre vença, são os meus prognósticos, é o meu anseio (O GALVANÓPOLIS, n. 2, Ano 2, 30 mar. 1932, p. 2).

Inicia-se, então, novos desafios e as mudanças surgem. A partir da edição número dois, de 30 de abril de 1932, o jornal passa por algumas transformações:

Por motivos diversos a publicação de O Galvanópolis será feita doravante mensalmente, obedecendo, porém, a um programa mais variado que será distribuído em oito páginas. Outrossim: o jornalzinho terá caráter independente. Circunstâncias fortuitas determi-naram a retirada do Órgão Oficial do Currais Novos Futebol Clube, entretanto jamais será retirada nossa solidariedade ao que concerne à prática dos esportes em nossa terra. O Currais Novos Futebol Clube terá sempre nosso apoio e pronta adesão (O GALVA-NÓPOLIS, n. 1, ano 2, 30 mar. 1932, p. 5).

Nessa nova fase do jornal, aparecem os anúncios. Apesar de tímidos, os seus re-gistros representam uma inovação no cenário da imprensa brasileira, visto que uma das ba-ses indispensáveis à sustentação da empresa jornalística ergueu-se, sobretudo, com a adoção sistemática da propaganda e publicidade. Nesses anúncios, palavras de conforto, moderna, elegante, enfatizam e revelam aspectos de renovação proposto pela modernidade:

Executam-se com perfeição e a preços módicos sob figurinos modernos: vestidos, tail-leurs, manteaux, enxovais para noivas etc. Aceitam-se encomendas pelo correio para o interior do país. Pede-se dizer as medidas do corpo e as cores preferidas. Cartas a O VESTIDO ELEGANTE, rua do Catete, 33 A. 1 andar, sala 1, telefone 5-2382, Rio de Janeiro. Responde-se imediatamente enviando-se o orçamento (O GALVANÓPOLIS, n. 2, ano 2, 30 abr. 1932, p. 6).

No entanto, nem os anúncios e as assinaturas do jornal foram suficientes para man-tê-lo circulando. Os anúncios não eram muitos e com o passar do tempo alguns assinantes deixaram de pagar pelo periódico. Nas edições publicadas nos dias 7 de setembro e 2 de outu-bro de 1932, são veiculadas notas oriundas da gerência do jornal que solicita encarecidamente aos assinantes em atraso, o obséquio de saldarem os seus débitos. Diante da dificuldade, O Galvanópolis deixa de circular no mês de dezembro daquele ano. Uma nota da redação avisa aos leitores e colaboradores sobre a interrupção:

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Avisamos aos nossos prezados amigos colaboradores e assinantes que, por justos motivos, vamos suspender temporariamente a publicação de O Galvanópolis. Agradecemos a todos que nos acolheram sempre benevolentes e esperamos que a nossa volta, encontraremos os mesmos corações benignos para nos receber (O GALVANÓPOLIS, n. 2, ano 2, 15 nov. 1932, p. 6).

Infelizmente, o jornal não voltou a circular. A última edição foi publicada no dia 15 de novembro de 1932. Além das dificuldades relativas aos poucos anúncios e dos atrasos no pagamento das assinaturas, identificados na leitura dos jornais, Barros e Santos (2005) afirmam que o jornal deixou de circular também porque Maria do Céu deixou a cidade de Currais Novos para residir em Natal, passando a dedicar-se à campanha política.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Seguindo o exemplo do historiador pernambucano, Alfredo de Carvalho, este ar-tigo tem como objetivo reconstituir o cenário social e intelectual da sociedade natalense por meio do Jornal O Galvanópolis (1931-1932), intensificando o seu uso por parte da comuni-dade acadêmica e da sociecomuni-dade em geral.

Desse modo, será possível preservar a memória daqueles periódicos que construí-ram a opinião pública e fortalececonstruí-ram a democracia no Brasil, como foi por exemplo a traje-tória do Jornal O Galvanópolis, folha em que foi cenário a presença da primeira deputada do Brasil, a potiguar Maria do Céu Fernandes.

Nesse contexto, as mulheres participaram da imprensa no Rio Grande do Norte. Os jornais femininos, apesar de surgidos sob o signo da literatura, eram veículos propagadores das inquietações das mulheres na busca de conquistas sociais.

Nas páginas dos jornais da época eram estampadas, taticamente e de modo sutil, as contestações e críticas à sociedade vigente e objetivava cada vez mais, incentivar as mulheres para elas não desanimarem na busca do seu crescimento social e intelectual.

A escrita como instrumento social para tornar pública suas ideias e aspirações, seus desejos e suas tensões, no contexto social da comunidade da qual as mulheres faziam parte, era um dos elementos da engrenagem da luta das mulheres do final século XIX e início do século XX.

Segundo a professora Morais (2000), no seu artigo intitulado Relações de gênero: um tema posto na mesa, o discurso dessas mulheres, visto como prática, é entendido como a matéria-prima da história e, a história cultural ganha prestígio ao realçar a importância da linguagem e das representações sociais, culturalmente constituídas: ou seja, a história cultural entre práticas, representações, apropriação e múltiplos significados, conforme análise de Roger Chartier.

Nessa compreensão, é possível investigar assuntos diversos, relacionados à mulher, sendo estes considerados sem importância, e combinar diversos enfoques, como a formação da mulher letrada, histórias dos impressos, a participação da mulher na imprensa, entre outros.

O presente trabalho possibilitou o desejo de aprofundar a análise do Jornal O Gal-vanópolis e, consequentemente a da sua editora. Suas práticas, seu comportamento e sua personalidade norteiam e ensejam o meu pensamento de vanguarda e de participação na imprensa do estado.

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Portanto, esse trabalho oferece sua parcela de contribuição à história das mulheres e vem somar com outros estudos já realizados a respeito da temática. Reforça, ainda, a afirma-ção de Capelato (1994) ao assinalar que os jornais oferecem vasto material para o estudo da vida cotidiana. Reconstituir pedaços dessa história foi e ainda é o grande desafio para nós que aceitamos desenvolver este trabalho.

Nesse contexto, acreditamos que o material de pesquisa produzido acaba por pre-servar sua memória e reconstrói sua história, ao disponibilizarmos material de pesquisa para professores, pesquisadores, historiadores e estudante de Jornalismo, além de fomentar o estu-do na área da Comunicação Social.

A história, como toda forma de conhecimento, procura desvendar, revelar e sistematizar relações desconhecidas e, nesse caso, pouco se sabe sobre O Galvanópolis. O recorte histórico do presente trabalho é marcado por mudanças que passavam o país. O início do século XX passa por momentos de intervenção na área urbana, transformando o ritmo de vida e valores da sociedade potiguar, principalmente na participação da mulher no espaço público.

NEWSPAPER THE GALVANÓPOLIS (1931-1932): GENDER AND CULTURE IN RIO GRANDE DO NORTE

Abstract: this article aims to analyze the Galvanópolis newspaper, news sheet circulated in the city of Currais Novos, in Rio Grande do Norte Seridó. In the research we address the historical impor-tance of the Journal, including the presence of advertisements and emphasizing the contribution of journalist Maria do Céu Pereira Fernandes, relief figure in Brazilian public life, it was the first elected Member of Brazil. The newspaper The Galvanópolis is considered an innovative and effective modern speech newspaper in the 1930s, in addition to its content that recorded the social, political and cultural society that North Rio Grande municipality. In its first year, circulated every two weeks and four pages. From the edition number two, the second year he became monthly and doubled the number of pages. Circulated from 30 March 1931 to 15 November 1932, publishing to all forty-three numbers recording the first years of the 1930s in the Potiguar Seridó.

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Referências

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