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A INSUFICIÊNCIA DAS POLÍTICAS DE CONTENÇÃO DA VIOLÊNCIA ESCOLAR NO CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO DO APRENDIZADO

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Academic year: 2020

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A INSUFICIÊNCIA DAS POLÍTICAS DE

CONTENÇÃO DA VIOLÊNCIA ESCOLAR NO

CONTEXTO DE CONSTRUÇÃO DO APRENDIZADO

Saulo de Castro Lima 1

RESUMO: A questão da contenção da violência nas escolas públicas tem sido um assunto de crescente relevância desde a década de 1990. Desde então, a escalada da violência tem alertado pais, professores, diretores e especialistas em educação para esse fenômeno que passou a figurar de modo infame entre os temas mais debatidos sobre educação, muitas vezes tornando-se o principal foco de atenção, acima mesmo de outras preocupações referentes à temática político-pedagógica. Este artigo pretende demonstrar, através de um estudo empírico, que a resolução dos conflitos violentos em âmbito escolar passa longe de figurar como a solução para o cenário decadente de esvaziamento de qualquer projeto pedagógico, e que por isso mesmo a resolução da violência escolar não deve ser considerada como um fim em si mesma.

PALAVRAS-CHAVE: Violência escolar. Educação pública. Aprendizado.

1 Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências, Campus de Marília da Universidade Estadual Paulista – UNESP e bolsista Fapesp. – Marília, SP – Brasil. E-mail: saulocastrol@yahoo.com.br.

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THE INSUFFICIENCY OF SCHOOL VIOLENCE CONTAINMENT POLICY WITHIN THE LEARNING CONTEXT ABSTRACT: The issue of violence containment in public school has been a subject of growing relevance since the 1990’s. Since then, the violence escalade has made parents, teachers, principals and education experts aware of this phenomenon which turned to appear on an infamous way among the most discussed education themes, many times becoming the main focus of attention, even above other concerns referring to the political-pedagogical theme. This article intends to demonstrate, through an empirical study, that the resolving of violent conflicts in school sphere is far from figuring as the solution to the decaying scenario of any pedagogical project emptying and because of this the resolution of school violence must not be considered as an end in itself. KEY WORDS: School violence. Public education. Learning.

INTRODUÇÃO

A

situação dos serviços públicos no Brasil constitui-se hoje fonte inesgo-tável tanto de indignação quanto de trabalhos que buscam refletir sobre alternativas plausíveis para uma efetiva melhoria desse quadro. O caso da educação pública é um triste exemplo, que se notabiliza muito além do que demonstram os indicadores sociais referentes à inclusão ou ao analfabetismo. Há problemas que escapam à óptica quantitativa e que se ocultam nas relações sociais que se desenvolvem dentro do ambiente escolar, até mesmo na organi-zação desse espaço.

Muitas são as questões observadas, levantadas e debatidas acerca dos inú-meros problemas verificados junto ao ensino público, e muito é discutido acerca das condições de trabalho dos professores, a indisciplina dos alunos, as precá-rias instalações das escolas, além de diversas questões relativas à elaboração ou implementação do projeto político-pedagógico, o desrespeito dos alunos para com os professores, a falta de preparo destes, etc. Os problemas não param por aí: não é incomum o acionamento da polícia militar para resolver questões mais graves ocorridas dentro da escola, como ameaças entre alunos, a professores, além de problemas reais referentes à posse de armas e drogas no espaço esco-lar. Uma deturpação total do que deveria ser e representar a escola, que passa a figurar quase que corriqueiramente nos noticiários policiais.

No estado de São Paulo, o mais rico da Federação, não é diferente.

Diante de tantos problemas elencados acima as conclusões são geralmente desanimadoras, parecendo revelar um enorme abismo entre as condições ideais e reais de trabalho: a sensação de trabalho desperdiçado por parte de todos

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que empenham suas carreiras profissionais na atividade escolar, além dos alu-nos, cuja falta de interesse também possibilita a compreensão de que, por livre e espontânea vontade, não estariam ali naquele momento, dedicando-se àquelas atividades, e assim, também, se sentem desperdiçando seu tempo. A escola está aquém das expectativas e interesses de ambas as partes. E tal situação não pa-rece longe do fim, ao contrário, papa-rece deteriorar-se dia após dia.

O entendimento no tocante ao papel da escola que alunos, professores e direção/coordenação possuem é muitas vezes divergente, o que cria a brecha para que não exista uma unidade no trabalho das partes, que fica geralmente evi-dente nas relações entre professor e aluno dentro de sala de aula. Porém, esse “desentendimento” entre as partes também pode ser visto em outros momentos da convivência, tanto nas relações entre professores, coordenadores e direção, como na relação desta com os alunos, e até mesmo dos alunos para com o am-biente escolar como um todo.

Talvez por estar no extremo mais sensível, e por constituir maior número, o alunado é o indicador mais eficiente dos conflitos existentes nessa relação que, diga-se de passagem, não fica circunscrita ao ambiente escolar: também pode ser verificada nas relações entre a escola e os órgãos superiores de supervisão e direção do ensino. Obviamente isso se reflete nas atividades ligadas ao ensino e ao desenvolvimento do papel da escola na sociedade de forma mais ampla.

Este artigo está dividido em três seções, além desta introdução. Na primeira são discutidos alguns conceitos e reflexões acerca do espaço físico da escola e também sobre a temática da violência escolar e seu impacto nas relações de aprendizagem. Na segunda seção são apresentados os resultados do trabalho empírico, realizado através da observação em uma escola estadual de ensino fundamental e médio da cidade de Marília, interior paulista. Na última seção estão presentes a conclusão e as considerações finais que, espera-se, possam servir a futuras reflexões sobre o tema.

ABORDAGEM DO TEMA: ESPAÇO FÍSICO E VIOLÊNCIA

A questão do espaço físico da escola é geralmente relegada a segundo pla-no quando se trata da interpretação e reflexão da problemática escolar, porém sua importância é incontestável: há determinados ambientes que são mais propí-cios para o aprendizado e desenvolvimento das relações sociais, em detrimento de outros que podem ser considerados até como inadequados. Basta imaginar que uma biblioteca é muito mais propícia ao estudo do que uma rua movimen-tada de comércio durante o fim de ano. Na escola ocorre a mesma coisa: sua determinação espacial pode favorecer ou não o aluno a determinadas atividades,

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assim como pode ser planejada com a finalidade de se obter comportamentos esperados, segundo expresso por Dayrel (2001, p. 147):

a arquitetura e a ocupação do espaço físico não são neutras. Desde a forma da construção até a localização dos espaços, tudo é delimitado formalmente, segundo princípios racionais, que expressam uma expec-tativa de comportamento dos seus usuários. Nesse sentido, a arquite-tura escolar interfere na forma da circulação das pessoas, na definição das funções para cada local. Salas, corredores, cantina, pátio, sala dos professores, cada um destes locais tem uma função definida a priori. O espaço arquitetônico da escola expressa uma determinada concepção educativa.

Essa “expectativa de comportamento” dos usuários é decisiva para a ela-boração dos espaços escolares, em termos de sua aplicabilidade e significados, pois determina qual a o tipo de relação que aquele espaço deve comportar. Penitenciárias e escolas possuem tipos de comportamento esperado diferente, ainda que algumas medidas de contenção à violência insistam em aproximar essas duas realidades, não de modo a aproximar a penitenciária da escola, mas o contrário. Sobre o tema, Faria Filho (1998) aponta a necessidade da elabora-ção espacial da escola produzir um lugar próprio para a prática educacional, ou seja, arquitetonicamente voltado para o desenvolvimento das atividades esco-lares, e que ainda possibilite um amplo controle das atividades de professores e alunos.

Dayrell (2001) afirma que o isolamento da escola em relação ao mundo externo é acentuado pela presença de muros que servem exatamente para de-marcar onde começa ou termina a jurisdição da escola ou da rua. De modo quase que complementar, segundo Faria Filho (1998), o próprio espaço do pátio atende essa demanda, ao trazer os alunos para dentro da escola quando dos períodos “inativos” em sala de aula, quais sejam, horários de entrada e saída de alunos e intervalos, evitando o contato dos alunos com o meio externo, comu-mente associado a atividades perniciosas, como o uso de drogas, influência de estranhos, etc.

Ademais, corredores, áreas livres, o posicionamento de mesas e cadeiras fazem parte dessa organização do espaço voltada para um fim específico, so-bretudo a própria sala de aula é um espaço calculado e orientado para a ativida-de letiva tão somente. Tudo isso combinado entre as autoridaativida-des escolares para o desenvolvimento harmônico e organizado das atividades escolares, supondo-se o já citado comportamento esperado dos alunos, que devem teoricamente fazer o uso esperado das dependências da escola. Porém, estes muitas vezes

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adaptam os ambientes à sua maneira, ou simplesmente fazem usos diversos do proposto, apropriando-se dos espaços. (DAYRELL, 2001)

Esse planejamento dos espaços escolares serve inclusive como uma arma para o combate à violência escolar, ainda que não de maneira construtiva, mas meramente impositiva através de estruturas que coíbam a transgressão de re-gras escolares. Um bom exemplo para essa situação são os muros elevados e as grades presentes em muitas das escolas públicas do estado de São Paulo. É muito comum a crítica por parte de especialistas de que as escolas públicas (e até algumas instituições particulares também) têm cada vez mais assumido a fisionomia de penitenciárias, com a crescente adoção de grades, muros cada vez mais altos, vigilância reforçada por parte de professores e inspetores de corredor.

Segundo o conceito cunhado por Pereira (2002), essas são as “Escolas-presídio”; em alguns casos, somam-se às grades e muros câmeras de seguran-ça e alarmes, além de policiamento especializado em violência escolar. Todas estas são medidas repressivas que não atacam as causas do problema da vio-lência pela raiz, mas apenas contornam paliativamente alguns de seus efeitos, pois não levam em consideração a complexidade do contexto social no qual estão inseridos os alunos e professores.

Desse modo, a escola passa a ter um ambiente que não visa apenas propi-ciar o interesse no ensino e promover a educação dos alunos, mas também um ambiente que sirva como ferramenta para reprimir a indisciplina dos alunos em seus diversos graus, podendo variar de transgressões mais simples à violência. Portões de ferro que ficam fechados impedindo o acesso às salas de aula nos intervalos, grades nas janelas (mesmo quando em andares térreos, o que de-monstra que elas não estão lá para evitar acidentes) e outras medidas de contro-le à circulação e comportamento dos alunos visam dificultar as práticas que vão contra o código de conduta na escola.

Isso quer dizer que o “comportamento esperado” citado no início do texto tem se transformado e isso reflete na organização escolar como um todo. Não se espera apenas um aluno que vá assistir às aulas, mas também alunos que podem apresentar os comportamentos mais diversos, inclusive violentos. De acordo com Madeira (1999) o que acontece é que vivemos em uma crise de de-terioração dos códigos de convivência e de tratamento de tensões sociais, o que agrava o uso da força enquanto argumentação. E esse uso da força é adotado pelos dois lados, tanto como ação quanto como reação, descrevendo assim um círculo vicioso.

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a violência acomete o mundo contemporâneo em todas as suas ins-tâncias e se manifesta de variadas formas. Ela está presente em toda sociedade e não se restringe a determinados espaços, a determinadas classes sociais, a determinadas faixas etárias ou a determinadas épo-cas. É equivocado pensar que ela se vincula apenas e diretamente à pobreza, aos grandes centros urbanos, aos adultos e aos dias de hoje. Verifica-se, por exemplo, o crescimento das práticas da violência entre os jovens de classes médias e de segmentos privilegiados da socieda-de, nos seus diferentes espaços de atuação: na família, na escola ou na rua.

Aceitando-se os argumentos da autora, é ingenuidade acreditar que a violên-cia é algo localizado especificamente em certos segmentos da sociedade, ou que se mantém à parte de determinadas instituições, como por exemplo, a escola. Isso não é verdade, pois se sabe que a violência tem alcance cada vez mais am-plo, avançando por diversos setores da sociedade; e de modo mais específico, as causas da violência escolar podem ser muito amplas e possuir diversas origens, desde a família até o bairro ou cidade em que vivem os alunos.

Portanto há, em diversos graus, um contato com a violência que pode ser traduzido dentro da escola através das atitudes de determinados alunos, como comportamento violento e agressividade ou até mesmo apatia. Segundo a au-tora, a violência se manifesta nos grupos de sociabilidade, na família e também na escola. Relativamente à disciplina, esta sempre dependeu das relações de subordinação e dominação existentes no interior da escola, assentada na rígida obediência à hierarquia escolar. No momento em que essa hierarquia é erodida e não surgem novas formas de restabelecê-la por outros meios não-autoritários, a indisciplina foge ao controle e dá lugar à violência.

A existência de indisciplina revela uma não aceitação das regras do jogo por parte dos alunos, geralmente corrigida pelos professores através de outras medidas punitivas, criando-se um ciclo no qual a manutenção da disciplina torna-se o principal objetivo da educação, e não um meio para realizar a transferência dos conteúdos, de acordo com Carvalho (1996). Em um nível já mais avançado, podemos substituir as palavras “indisciplina” por “violência” e a principal objeti-vo escolar deixa de ser a educação e passa a ser a segurança. Assim sendo, “onde ocorre a ausência de proposta educativa, a escola não funciona como uma retradutora dos valores sociais e termina por permitir que os valores sociais pre-dominantes invadam o seu ambiente sem nenhum filtro educativo”. (CAMACHO, 2001, p.132)

Um dos problemas relacionados a essa questão colocada pela autora é re-lativo à alocação de verbas para a educação. Muitos dos recursos destinados

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acabam não sendo utilizados para o investimento em educação propriamente dita, ou seja, qualificação de professores, infraestrutura, livros, funcionários, e sim são empregados em obras como ampliação de muros, colocação de grades e circuito interno de vigilância, como já é o caso em algumas escolas públicas de São Paulo. Ocorre uma mudança de foco no papel da escola que não beneficia nenhuma das partes envolvidas, apenas pode ser considerada como paliativo para evitar complicações diretamente relacionadas à questão da violência. De acordo com Santos (2001, p. 111), uma saída interessante para o problema seria a compreensão deste dentro dos seguintes moldes:

reconhecer a conflitualidade e a agressividade, como elementos dinâ-micos do espaço escolar, significa propor intervenções sobre os atos de violência, as quais podem se dar pela satisfação de necessidades das crianças e jovens, criando um ambiente cooperativo e humanista, induzindo relacionamentos positivos e duradouros.

O autor defende ainda que essas medidas devem fazer parte de um pro-cesso de construção da paz, o que contraria as medidas repressivas e punitivas adotadas em muitas escolas, criando no ambiente escolar um espaço de constru-ção do conhecimento criativo e reflexivo, mediando conflitos de forma assistida. E como já vimos acima, esse espaço não pode ser criado a partir de uma estrutura que não preze pela edificação do conhecimento, mas pela punição ao que lhe escapa do comportamento previsto. É sobre o que é tratado a seguir, com base no período de observação.

Durante a observação foram também colhidas importantes opiniões de estu-dantes, professores e funcionários, que ilustram e complementam o texto. A OBSERVAÇÃO EMPÍRICA

O período de observação foi realizado ao longo do ano de 2007, em uma escola estadual situada no município de Marília, interior paulista. À época, a es-cola atendia crianças e jovens, de 5ª série do Ensino Fundamental ao 2º ano do Ensino Médio, em sua maioria moradores das imediações, embora também recebesse alunos de locais mais distantes da cidade, em menor medida. Foram ouvidos alunos, professores, funcionários, coordenação e direção

Analisando-se o problema da violência no interior da escola, pode-se per-ceber que os casos são um tanto quanto raros e que, de modo geral, alunos, professores e funcionários têm uma boa convivência, embora algumas exceções pontuais possam ser apontadas ocasionalmente por falta de respeito verbal ou

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descumprimento de regras, sobretudo no tocante ao acatamento das ordens dos professores: ainda que praticamente não haja casos de violência física ou psicoló-gica na escola, não quer dizer que não haja indisciplina. Isso existe sim, e pode ser considerado como um grande problema enfrentado pela escola, já que boa parte dos alunos não manifestava qualquer interesse pelas aulas e pelas disciplinas.

De acordo com a auxiliar administrativa responsável, é fundamental que haja um canal de diálogo permanentemente aberto entre a escola e a família dos alu-nos, e que a escola também busque aproximar-se destes, dado que o aluno deve ser compreendido no contexto amplo de suas atividades, e não apenas quando dentro do espaço escolar, pois assim é possível acompanhar de perto seus pro-blemas e ajudá-lo a encontrar soluções. Ainda segundo a auxiliar, é importan-tíssimo que a escola não confronte o aluno, mas que procure cativá-lo, evitan-do assim a busca de alternativas perniciosas de autoafirmação por parte deles, como o uso de drogas e o próprio comportamento que manifeste violência. O relacionamento dos alunos para com a auxiliar pode ser considerado excelente, havendo um respeito e estima mútuos que colaboram para o bom funcionamento das atividades escolares.

Ainda que não pareça diretamente relacionado ao descrito acima, existe um outro fator na escola que se reflete nas palavras da auxiliar: a ausência de grades em excesso (existem grades, porém em número muito reduzido se comparado a outras escolas de mesmo nível), além de poucas estruturas de controle da violência no espaço escolar. Os muros não são excessivamente altos, os portões não são como portões de fortes militares, não há câmeras de vigilância ou ins-petores em número elevado. Corredores, pátios, áreas comuns e equipamentos escolares (mesas, cadeiras, murais) são caracterizados por seu bom estado de conservação e limpeza, com poucos sinais de depredação. Horários tais como intervalos e entrada e saída de alunos não são tumultuados ou marcados por brigas ou atividades suspeitas.

Tudo parece correr bem.

Mas vejamos um outro aspecto: segundo consta do projeto político pedagó-gico da escola, a violência não consta entre os principais problemas que a escola enfrenta: estes, quase que em sua totalidade são relativos à sistematização de conhecimentos e aprendizado por parte dos alunos, tais como desenvolvimento de raciocínio, problemas com leitura e escrita e domínio da língua portuguesa, embora já haja ocorrido casos isolados de consumo de drogas nas dependências da escola, informados pela auxiliar administrativa.

Ou seja, os problemas apontados são ligados à natureza do aprendizado es-colar, e não à conduta dos alunos em suas relações pessoais com colegas,

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pro-fessores e funcionários. Isso condiz com a realidade relatada acima de harmonia nos espaços de convivência escolar, e com a ausência de sistemas de controle e punição do comportamento dos alunos.

Ocorre que, dentro de sala de aula, todo o cenário presente nos espaços externos parece desmoronar: a indisciplina toma conta e o professor não possui meios de controlar a situação; as carteiras são depredadas, as paredes picha-das, o comportamento é péssimo e o aproveitamento escolar é baixo. Tanto que, como foi visto, os maiores problemas reconhecidos pela escola são pertinentes ao espaço da sala de aula. Por coincidência ou não, o acesso aos corredores onde se localizam as salas de aula são um dos poucos espaços delimitados por grades, o espaço é limitado e as salas são quentes, fatores que dificultam a ma-nutenção de um padrão de concentração por parte dos alunos, podendo causar a inquietação que se transforma em indisciplina. Sobre este tema, Carvalho e Silva (2002, p. 6) fazem uma observação pertinente:

é importante e necessário para o professor olhar a sua função como fun-damental para o envolvimento e relacionamento da liberdade humana, olhando para a questão social da tarefa de educar, pois a sua atividade sempre estará envolvida com a ética e, a partir do momento que ele negar esta realidade, estará exercendo um ato de violência sobre a vida do aluno.

Mas por que abordar o tema da violência em relação a uma escola que supostamente não sofre com esse problema? Qual é então a relevância deste estudo?

A resposta para tais questões reside em grande parte no seguinte: apontar que a busca de soluções para o problema da violência nas escolas não pode ser considerada como um fim em si, mas como apenas uma parte de um amplo processo de formação e educação, que afinal é a função social da escola nos parâmetros em que esta está estabelecida.

Nenhum professor afirmou ter sido vítima de violência, assim como não foi constatado nenhum caso entre os próprios alunos. Mas professores e alunos se queixam quanto aos rumos pelos quais a instituição tem seguido. Dos alunos questionados quanto ao que esperam do futuro, boa parte respondeu que espera futuramente estudar em um colégio particular para capacitar-se intelectualmente para a universidade. Isso indica que a escola não está sendo suficiente em aten-der a esta demanda mais básica dos alunos, que é prover-lhes educação e opor-tunidades. Os professores muitas vezes desistem de tentar trabalhar em determi-nadas salas de aula porque não mais conseguem executar nenhuma atividade.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de todos os percalços enfrentados, a opinião geral dos alunos é que gostam da escola, dos colegas e da convivência. Mas afirmam que os conteúdos trabalhados pelos professores são fracos, que não é possível aprender, ou que realmente não têm interesse em determinadas matérias, muitas vezes creditando a origem de seu desinteresse ao trabalho realizado pelo professor. Estes, por sua vez, acentuam em sua fala a decadência nas relações de respeito em sala de aula, entre eles e os alunos “que já não querem mais saber de nada”. Ou seja, há um certo embate entre professores e alunos.

A educação parece viver uma espiral descendente na qual professores e alu-nos não se reconhecem enquanto participantes de um processo construtivo, mas como partes opostas em conflito permanente. Buscou-se mostrar neste trabalho que esse impasse que em muitos casos beira o conflito não pode ser resolvido por meio apenas da ênfase que recai sobre a eliminação da violência escolar. Por isso, o tratamento do tema em relação a uma escola que não apresenta índi-ces significativos de violência, mas que apresenta outros problemas comumente encontrados quando se questiona a qualidade e a efetividade dos processos de ensino e aprendizagem.

A temática da violência nas escolas não deve ser apontada como algo em separado das diversas outras esferas da vida escolar, e sua condução não deve ser tratada como um fim em si mesmo, pois faz parte de um contexto muito mais amplo de realidades distintas que se entrecruzam no espaço escolar. Por isso mesmo o tema foi abordado em relação a uma escola que não sofre do problema da violência, mas que não é vista com muita satisfação por parte de professores e alunos do ponto de vista didático-pedagógico e isso ilustrou esta análise.

Por fim, vale lembrar que não cabe nos limites deste breve artigo enumerar ou debater de modo aprofundado os inúmeros problemas encontrados na escola pública, ainda que muitos dos aspectos observados merecessem uma dedicação especial, mas que perpassam os objetivos desta análise.

REFERÊNCIAS

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