São Paulo 2011
São Paulo 2011
Bases Conceituais da Implantação de Redes Elétricas
Inteligentes de Distribuição de Energia Elétrica
São Paulo 2011
Bases Conceituais da Implantação de Redes Elétricas
Inteligentes de Distribuição de Energia Elétrica
Tese apresentada à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo para obtenção do Título de Doutor em Engenharia.
Área de Concentração: Energia e Automação.
Orientador:
Este exemplar foi revisado e alterado em relação à versão original, sob responsabilidade única do autor e com a anuência de seu orientador. São Paulo, de julho de 2011.
Assinatura do autor ____________________________
Assinatura do orientador _______________________
FICHA CATALOGRÁFICA
Cunha, Antonio Paulo da
Bases conceituais da implantação de redes elétricas inteli - gentes de distribuição de energia elétrica / A.P. da Cunha. -- ed. rev. -- São Paulo, 2011.
114 p.
Tese (Doutorado) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Departamento de Engenharia de Energia e Automa-ção Elétricas.
Ao Prof. Dr. Marcos Roberto Gouvêa, cuja orientação e apoio permitiram a realização deste trabalho.
As redes elétricas inteligentes significam um novo paradigma de fornecimento de enrgia, cuja concepção integra várias áreas de concentração, novas funcionalidades e funções até então não realizáveis, bem como uma pluralidade de tecnologias e a necessidade de infraestrutura de apoio para a sua realização.
A transição das redes elétricas atuais para o modelo de rede inteligente constitui-se num processo complexo, que envolve aspectos técnicos, econômicos, regulatórios e sociológicos.
Esta pesquisa visa contribuir significativamente para a solução dessa questão pela proposição das bases conceituais para realizar efetivamente um plano de implementação, respeitando condições vigentes e impostas por cenários de outros setores.
O modelo proposto, centrado na expansão da automação, lança as bases para a análise dos impactos da rede elétrica inteligente, para a formulação, análise e seleção de alternativas de implementação.
É introduzido o conceito e forma de avaliação de uma rede por meio da definição de um índice de inteligência de uma rede elétrica, composto de vários indicadores, de forma a expressar padrões de eficiência energética e operativa, aspectos de gestão de ativos e da qualidade do serviço.
A proposta de alternativas para evolução da automação se baseia em um conjunto de funções pré-estabelecidas, que melhoram os indicadores de desempenho e apresentam custos e benefícios quantifícáveis.
The smart grids mean a new paragon for energy supply, whose concept integrates several areas of concentration, functionalities and functions non achievable up to now, as well as a plurality of technologies and the need of supporting infrastructure for its accomplishment.
The transition of the present electrical networks to the smart grid model constitutes a complex process, which involves technical, economical, regulatory and sociological aspects.
This research aims to contribute significantly to the solution of this issue by proposing the conceptual basis for effectively perform an implementation plan taking into account the constraints imposed by scenarios from other sectors.
The proposed model, focused in automation expansion, launches the basis for the impact analysis of Smart Grid in order to formulate, analyze and selection alternatives of implementation.
The concept and evaluation method of grid through the definition of a grid intelligence index, composed by several indicators is introduced in order to express standards of energy and operational efficiency, asset management and quality of supply.
The proposal of alternatives for automation evolution is based on a set of pre established functions, which improve the performance indicators and present valuable costs and benefits.
Tabela 1- Etapas para evolução das redes elétricas. ... 19
Tabela 2– Esquema de organização conceitual das características das REI. ... 27
Tabela 3 – Atributos de algumas tecnologias de telecomunicações. ... 43
Tabela 4- Percentual de domicílios atendidos por tipo de serviço. ... 51
Tabela 5 – Número de consumidores por empresa (dados de 2008). ... 55
Tabela 6- Indicadores de continuidade de serviço do ano de 2008. ... 56
Tabela 7- Analogia entre a expansão da distribuição e plano de automação. ... 69
Tabela 8 - Funções e níveis de complexidade. ... 76
Tabela 9 – Dados de uma concessionária com dois SES. ... 89
Tabela 10 – Resultados dos índices de redes inteligentes. ... 89
ABRADEE Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica
ADA Advanced Distribution Automation
AMI Advanced Metering Infrastructure
AMM Advanced Metering Management
AMR Advanced Metering Reading
ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica
BAU Business As Usual
BPL Broadband Power Line
CAPEX Capital Expenditures
CDC Common Data Class
CIM Common Information Model
DEC Duração Equivalente de interrupção por unidade Consumidora
DIC Duração de Interrupção por unidade Consumidora
DMIC Duração Máxima de Interrupção por unidade Consumidora
DMS Distribution Management System
DOE Department Of Energy
DTS Distributed Temperature System
EMS Energy Management System
END Energia Não Distribuída
EPRI Electric Power Research Institute
ERAC Esquema Regional de Alívio de Carga
ERP Enterprise Resource Planning
ESB Enterprise Service Bus
EUA Estados Unidos da América
FEC Freqüência Equivalente de interrupção por unidade Consumidora
FIC Freqüência de Interrupção por unidade Consumidora
GD Geração Distribuída
GIS Geographic Information System
GPRS General Packet Radio Service
GPS Global Positioning System
HAN Home Area Network
IED Intelligent Electronic Devices
IHM Interface Homem Máquina
LAN Local Area Network
LED Light-Emitting Diode
MAN Metropolitan Area Network
MEMS Micro-Electro-Mechanical Sensor
NRECA National Rural Electric Cooperative Association
ONS Operador Nacional do Sistema
OPEX Operational Expenditures
PLC Power Line Communications
PNAD Plano Nacional por Amostragem de Domicílios
PRODIST Procedimentos de Distribuição
PROINFA Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de energia elétrica
REI Redes Elétricas Inteligentes
REIDE Redes Elétricas Inteligentes de Distribuição de Energia
SCL System Configuration Language
SDAT Sistema de Distribuição em Alta Tensão
SDBT Sistema de Distribuição em Baixa Tensão
SDMT Sistema de Distribuição em Média Tensão
SED Subestações de Distribuição
SIN Sistema Interligado Nacional
SOA Service Oriented Architecture
TI Tecnologia da Informação
TIR Taxa Interna de Retorno
TUSD Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição
TUSDg Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição para Geração Distribuída
TUST Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão
VMU Valor de Mercado em Uso
VPL Valor Presente Líquido
XML Extensible Markup Language
WACC Weighted Average Capital Cost
WAN Wide Area Network
1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS ... 14
1.1. Histórico ... 14
1.2. Objetivos ... 16
2. ANÁLISE DO ESTADO DA ARTE ... 17
2.1. As redes elétricas do futuro ... 17
2.2. Definições e conceitos associados às redes elétricas inteligentes... 23
2.3. Áreas de concentração das redes elétricas inteligentes ... 26
2.3.1. Infraestrutura avançada de medição ... 27
2.3.2. Automação avançada da distribuição ... 30
2.3.3. Recursos distribuídos de geração e armazenagem ... 35
2.3.4. Conservação de energia ... 39
2.4. Tecnologias de componentes e infraestrutura ... 39
2.4.1. Tecnologias aplicáveis a equipamentos e componentes de rede ... 40
2.4.2. Telecomunicações ... 42
2.4.3. Tecnologia da Informação ... 45
2.4.4. Ferramentas de simulação ... 49
3. SITUAÇÃO DAS REDES ELÉTRICAS BRASILEIRAS ... 50
3.1. Capilaridade da rede de distribuição ... 50
3.2. Oferta de energia elétrica por tipo de fonte ... 52
3.3. Sistema interligado de transmissão ... 53
3.4. Porte das distribuidoras ... 54
3.5. Qualidade do fornecimento ... 55
3.6. Perdas técnicas e comerciais das distribuidoras ... 57
3.7. Segurança patrimonial ... 58
3.8. Políticas de incentivo e iniciativas ... 58
3.9. Resumo e comentários ... 59
3.10. Barreiras e oportunidades ... 60
3.10.1. Regulação da distribuição ... 60
3.10.2. Estrutura do mercado de energia ... 63
3.10.3. Custos e fatores de escala ... 63
3.10.4. Infraestrutura para integração e interoperabilidade ... 64
3.10.5. Engajamento dos consumidores ... 64
4. FORMULAÇÃO DO PROBLEMA E DIRETRIZES PARA SOLUÇÃO ... 66
4.1. Conceitos e terminologia ... 66
4.1.1. Automação da Distribuição ... 66
4.1.2. Plano de Automação da Distribuição ... 67
4.2. Formulação do problema e proposta de diretrizes para solução ... 69
4.2.1. 1ª Etapa – Caracterização do sistema objeto ... 70
4.2.2. 2ª Etapa – Definição de cenários ... 70
4.2.4. 4ª Etapa – Portfólio de recursos de automação ... 71
4.2.5. 5ª Etapa – Formulação de alternativas ... 72
4.2.6. 6ª Etapa – Avaliação de alternativas ... 72
4.2.7. 7ª Etapa – Seleção de alternativas e elaboração do plano de automação ... 73
5. MODELO DE AVALIAÇÃO DE ALTERNATIVAS ... 75
5.1. 1ª Etapa – Caracterização do sistema objeto ... 75
5.1.1. Cálculo dos indicadores ... 77
5.2. 2ª Etapa – Definição de cenários ... 85
5.3. 3ª Etapa – Critérios de avaliação e aceitação ... 86
5.3.1. Exemplo de aplicação ... 88
5.4. 5ª Etapa – Formulação de alternativas ... 90
5.5. 6ª Etapa – Avaliação de alternativas ... 91
5.5.1. Custos, benefícios e externalidades ... 91
5.5.2. Modelo de cálculo ... 93
6. COMENTÁRIOS FINAIS ... 96
7. CONCLUSÕES E CONTRIBUIÇÕES... 98
7.1. Conclusões ... 98
7.2. Contribuições ... 100
7.3. Sugestões de prosseguimento da pesquisa ... 100
BIBLIOGRAFIA ... 102
ANEXO A – VISÃO GERAL DE NOVAS TECNOLOGIAS ... 105
A.1 Geração e cogeração... 105
A.2 Equipamentos ... 108
A.3 Sensores, transdutores e medidores ... 109
1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS
1.1. Histórico
Na maioria dos países o sistema elétrico de potência é operado por um grande número de empresas independentes, mas que cooperam entre si, através de interligações que permitem a troca de energia e sinergias técnico-econômicas. Estas características, além da sua vasta extensão geográfica e índices de confiabilidade elevados de um modo geral, tornam as redes elétricas sistemas únicos, cujos benefícios para a vida moderna são amplamente reconhecidos, a ponto de serem consideradas como uma das grandes realizações da engenharia dos últimos cem anos (1).
Todavia, os sistemas elétricos de potência existentes - em qualquer parte do mundo
– não são fruto de um planejamento perfeitamente pré-concebido e ordenado, mas sim o resultado de uma obra coletiva, empreendida por diversos agentes, a qual veio sofrendo diversas melhorias incrementais ao longo de mais de um século.
Não obstante, desde o seu início, no final do século XIX, e mais fortemente após sua consolidação a partir da segunda metade do século XX, o desenvolvimento e a expansão dos sistemas elétricos de potência, incluindo a geração, transmissão e distribuição, fundamentaram-se em esquemas pouco flexíveis e reservas de capacidade instalada, onde a geração é controlada de forma centralizada e a potência flui somente no sentido das cargas, com o despacho e o consumo necessariamente bem ajustados, com o objetivo de garantir a sua estabilidade e operabilidade, tanto nas condições normais, como de emergência.
As anormalidades, como instabilidades e faltas, são sanadas através do isolamento das partes defeituosas do sistema, consistindo basicamente no desligamento, com lógicas concebidas para afetar o menor número possível de consumidores, e seu religamento paulatino, após reparo da origem do problema.
contribuído para o avanço técnico e redução dos custos, essencialmente, não provocaram alterações na concepção original do sistema elétrico de potência. Este esquema se mostrou bem sucedido em universalizar o suprimento de energia para o conforto pessoal e desenvolvimento econômico, além de lidar adequadamente com controles que atuam de forma local e instalações distribuídas ao longo de distâncias geográficas significativas.
Mesmo assim, uma convergência de fatores tecnológicos, econômicos e sócio- ambientais despertaram as discussões para outro modelo de rede elétrica.
É conveniente considerar que a evolução do sistema elétrico de potência atual deve envolver, de fato, duas etapas (2).
A primeira delas, que já está em curso em algumas localidades ou é realizável num futuro próximo, consiste em adaptações sobre as redes atuais, que se tornariam
―mais inteligentes‖, enquanto que a segunda, de médio e longo prazo, representa a
mudança para um novo paradigma, chamado de Smart Grid, muito mais eficiente e confiável, compatível com um cenário de fontes de geração renováveis e alocadas em qualquer parte da rede, custos crescentes de produção e entrega de energia, uso extensivo de tecnologia de informação e interatividade com os consumidores. Nessa visão, muito do que tem sido apresentado recentemente como Smart Grid ou Rede Elétrica Inteligente (REI) consiste apenas em melhorias sobre a rede atual, por vezes chamada, em contraste, de Dumb Grid, tanto no sentido de não incorporar recursos com capacidade de processamento para operação autônoma, como pela inabilidade de seus elementos constituintes de se comunicarem entre si (ambos os significados da palavra dumb em inglês).
Como as mudanças envolvidas são vistas como uma resposta às pressões ambientais e fundamentais para a sustentabilidade econômica de grandes economias, elas têm sido apoiadas por órgãos governamentais (3) (4).
Todavia, o processo de transição para um novo modelo de redes elétricas, ainda apresenta diversas dificuldades de execução, o que requer pesquisas e desenvolvimentos adicionais.
1.2. Objetivos
Esta tese visa desenvolver as bases conceituais de um modelo para elaboração de um plano de automação para os sistemas de distribuição de energia elétrica, contemplando a incorporação de tecnologias de redes elétricas inteligentes.
O plano de automação da distribuição consiste no cronograma de implantação de
uma ou mais funções especificadas para aumentar o ―grau de inteligência‖ da rede, considerando-se os seus custos, benefícios e externalidades.
2. ANÁLISE DO ESTADO DA ARTE
A quantidade de publicações envolvendo o tema Smart Grids nos últimos anos é substancial e este trabalho não pretende ser exaustivo na sua análise.
Além disso, os termos smart e, mais recentemente também advanced, tornaram-se quase um prefixo para diferenciar as novas aplicações, dispositivos e tecnologias daquelas atualmente existentes, referidas como o ―negócio usual‖ (ou BAU de
business as usual). Isso reflete um posicionamento de mercado de diversos agentes como concessionárias, fabricantes de equipamentos, fornecedores de infraestrutura e aplicativos computacionais, sem necessariamente acrescentar informações relevantes ao estado da arte.
Desta maneira, o levantamento do estado da arte deste item compreende a análise bibliográfica relevante para as motivações para a mudança do paradigma vigente, os conceitos e definições de uma rede elétrica inteligente e uma proposta de organização das funções e tecnologias.
2.1. As redes elétricas do futuro
energia‖, de modo a torná-la sem falhas de suprimento, ―portátil‖ e centrada nas
necessidades do consumidor (7).
A partir de então, muitos trabalhos e estudos foram realizados, ampliando ou modificando os conceitos originais.
A visão das ―redes do futuro‖ apresentada pelo Departamento de Energia dos EUA
(3) considera três etapas:
a) até 2010, projeto e ensaios;
b) desenvolvimento de tecnologias e aceitação do mercado entre 2010 e 2020; c) fabricação e ganhos de escala a partir de 2020.
Por sua vez, cada etapa trata de assuntos referentes a cinco vertentes: a) projeto da arquitetura das redes de 2030;
b) desenvolvimento das tecnologias críticas; c) aceleração da aceitação das tecnologias; d) fortalecimento das operações de marketing; e) construção de parcerias.
Tabela 1- Etapas para evolução das redes elétricas.
Etapa I: Projeto e ensaios
Etapa II: Desenvolvimento
tecnológico e aceitação
Etapa III: Produção e aumento de escala
Arquitetura das redes em 2030
Projeto Protótipos Provas de campo
Provas de campo e demonstrações Desdobramento regional Desdobramento regional Rede nacional Desenvolvimento das tecnologias críticas Condutores especiais Armazenagem Monitoramento Eletrônica de potência
Provas de campo e demonstrações incluindo Geração Distribuída Desdobramento regional Expansão de aplicações nacionais e
internacionais
Aceitação das tecnologias
Transferência de tecnologias Educação e extensão
Técnicas de produção Canais de distribuição
e O&M
Infraestrutura de fabricação, de distribuição e serviços
Operações de marketing
Análise de mercados e sistemas Alocação e permissões
Reformas regulatórias
Questões de jurisdição Planejamento regional
Mecanismos de prevenção do mercado
de energia
Equilíbrio entre mercado e regulação
Construção de parcerias Coordenação federal Coordenação industrial Cooperação internacional Parcerias público-provadas com alta
alavancagem e compartilhamento de
custos
Parcerias público-privadas eficientes e
com alcance global
É interessante observar que, decorridos sete anos desse planejamento, a situação encontra-se ainda muito próxima da Etapa I.
A expectativa otimista, por analogia com a expansão da Internet, é que esta rede elétrica do futuro representará uma transformação no modo de vida das pessoas. Com respeito a esta comparação, conforme (2), a expansão da rede elétrica inteligente (REI) poderá ser fortemente impulsionada, à medida que exista uma aplicação de alta adesão pelos consumidores (killer application) como foi o caso do e-mail para a Internet.
A possibilidade da venda de energia de unidades de microgeração, instaladas nas casas dos consumidores, e a difusão de veículos elétricos plugáveis às redes, são apontadas como potenciais exemplos de killer applications, desde que envolvam custos competitivos e procedimentos simples e confiáveis que conquistem os usuários.
comum, são igualmente relevantes no processo de adesão aos novos conceitos pelos clientes, como, por exemplo:
a) o aumento da percepção do impacto dos hábitos de consumo, não necessariamente apenas de energia, no crescimento da poluição, na produção de gases estufa, quantidade de desmatamento, etc;
b) a limitação de recursos naturais, com necessidade de uso mais eficiente e reciclagem das matérias primas;
c) a importância da sustentabilidade dos negócios;
d) a disposição de contribuir com a preservação ambiental, de modo proporcional ao grau de conscientização e padrão de vida.
Por outro lado, para agentes como as concessionárias e órgão regulador, tal nível de mudanças tecnológicas precisa ser justificado por benefícios econômicos e não apenas pela sua inovação.
Embora as motivações econômicas sejam sujeitas a uma certa volatilidade, num horizonte de médio e longo prazo elas tendem a se tornar um fator de pressão para modificação da forma atual de produção, entrega e consumo de energia. Nesse contexto pode-se destacar:
a) a escassez de recursos energéticos convencionais nos países mais desenvolvidos, com perspectiva de elevação dos preços pela oferta reduzida de novas fontes;
b) as restrições a novas usinas nucleares em muitas partes do mundo;
c) o envelhecimento e obsolescência dos ativos instalados em grande parte das redes atuais, com a conseqüente discussão sobre a melhor forma de substituí-los;
d) a necessidade de eficiência para conter a expansão do consumo e redução da demanda num cenário de alta dependência da energia elétrica;
e) a manutenção da vanguarda tecnológica, com a criação de novos paradigmas que aumentem a competitividade global e a diferenciação entre as economias; f) o aumento do custo percebido das interrupções de energia, devido à
Cada um destes aspectos tem maior ou menor relevância, dependendo de características locais.
Assim sendo, nos EUA aparecem em destaque a redução da dependência energética de fontes fósseis, a liderança tecnológica e o aumento da segurança das redes elétricas a atos de terroristas pela maior distribuição de fontes de suprimento (8).
É relevante citar as medidas governamentais de incentivo à modernização do SEP norte-americano, com referências explícitas a técnicas e conceitos de REI, a saber:
a) 2005 Energy Policy Act o qual contempla:
i. medidores inteligentes e tarifas variáveis; ii. incentivos para a redução da demanda;
iii. tecnologias mais avançadas para transmissão.
b) 2007 Energy Independence and Security Act com diversos aspectos específicos referentes às REI:
i. apoio à modernização dos sistemas de transmissão e distribuição que caracterizem o smart grid;
ii. incremento do emprego de tecnologias digitais para melhorar a confiabilidade, segurança e eficiência das redes elétricas;
iii. otimização dinâmica da operação e recursos com segurança cibernética;
iv. desenvolvimento e integração de geração renovável;
v. incorporação de resposta à demanda e recursos eficientes do lado da demanda;
vi. disponibilização de tecnologias inteligentes para medição, comunicação e automação;
vii. integração de eletrodomésticos inteligentes;
viii. integração de tecnologias avançadas de armazenagem e redução de picos de demanda, contemplando veículos plugáveis, ar condicionado e armazenagem térmica;
ix. disponibilização tempestiva de informações aos consumidores; x. desenvolvimento de normas de comunicação e interoperabilidade; xi. identificação e redução de barreiras desnecessárias ou pouco
i. volume de financiamento de US$ 4,5 bilhões para smart grid e programas de redução de demanda;
ii. acima de US$ 30 bilhões controlados pelo Departamento de Energia em benefícios fiscais e garantias de empréstimo ao setor elétrico
d) 2009 American Clean Energy and Security Act:
i. estabelecimento de metas de redução de demanda para concessionárias;
ii. criação de um programa de identificação de eletrodomésticos inteligentes e de substituição daqueles ineficientes;
iii. planejamento da transmissão e distribuição para o impacto dos veículos elétricos;
iv. autorização de estímulo financeiro aos projetos;
v. incentivo a pesquisa interdisciplinar, em centros de pesquisa. e) American Clean Energy Leadership Act (proposta)
i. plano de otimização do planejamento e operação do sistema elétrico; ii. financiamento de projetos estaduais de eficiência energética.
Na Comunidade Européia, por sua vez, as aplicações de REI estão fortemente associadas com as preocupações com mudanças climáticas, declaradas no pacote de clima e energia (climate and energy package), sintetizado pelas diretrizes para 2020, com respeito ao nível de 1990, conhecidas como ―meta 20-20-20‖, isto é:
a) redução de 20 % das emissões de CO2, o que impacta fortemente a geração
termoelétrica;
b) aumento de 20 % da eficiência energética, envolvendo redução das perdas nos sistemas elétricos e cogeração;
c) incremento de 20 % nas fontes de geração renováveis, incluindo fontes eólicas off shore.
As REI são atualmente um conceito, sem que sua realização completa exista em qualquer país ou região.
a) substituição de mais de 30 milhões de medidores convencionais por outros inteligentes, com definição de novas tarifas, pela Enel na Itália (9);
b) SmartGridCity, na cidade de Boulder, estado do Colorado nos EUA;
c) diversas outras aplicações recentes de uso intensivo de geração distribuída de energia de origem eólica, vista como a mais madura das tecnologias renováveis, em diversos países (Alemanha, Espanha, Inglaterra, China)
d) incentivos à microgeração fotovoltaica (Espanha, Itália) e a veículos híbridos e elétricos em Portugal e nos EUA.
No Brasil, caracterizado por uma matriz energética com percentual elevado de fontes renováveis para a geração de energia elétrica, as questões de maior interesse associadas às REI não são de caráter ambiental.
Não obstante, existem benefícios que precisam ser avaliados nas condições específicas brasileiras, de modo a priorizar os investimentos e os impactos nas tarifas. Outro motivador para o presente trabalho são as oportunidades que podem advir do emprego das novas tecnologias, proporcionando soluções mais eficientes para os problemas atuais.
2.2. Definições e conceitos associados às redes elétricas inteligentes
A expressão em inglês Smart Grid é aplicável de um modo geral aos segmentos de Geração, Transmissão e Distribuição, bem como aos consumidores (cargas).
No entanto, esta tese é primariamente voltada à Distribuição de Energia Elétrica, considerada como sendo composta de:
a) sistema de distribuição em alta tensão (SDAT) e eventuais consumidores; b) subestações de distribuição (SED);
c) sistema de distribuição em média tensão (SDMT), com os respectivos consumidores;
Embora alguns conceitos gerais sejam também aplicáveis à Geração e à Transmissão, o tratamento dos tipos de funções, com seus custos, benefícios e externalidades, justificam a limitação do escopo.
Ao longo do texto a expressão Redes Elétricas Inteligentes (REI) tem abrangência geral, enquanto que Redes Elétricas Inteligentes de Distribuição de Energia (REIDE) referem-se aos segmentos SDAT, SED, SDMT e SDBT.
Por envolver uma série de novas funções, a definição de REI não é única e nem perfeitamente estabelecida.
Num dos livros voltados ao assunto (10) a definição é restrita a alguns aspectos
relacionados mais especificamente com Automação: ―a rede inteligente é a utilização de sensores, comunicação, habilidade computacional e controle [...] para melhorar a
funcionalidade geral do sistema elétrico de fornecimento de energia‖.
Segundo uma citação no trabalho do Comitê Consultivo de Eletricidade dos EUA (11):
―A Rede Inteligente utiliza tecnologia digital para melhorar a confiabilidade,
segurança e eficiência do sistema elétrico, da geração de grande porte, passando
pelo sistema de entrega de eletricidade aos consumidores e um crescente número
de recursos de geração distribuída e armazenagem‖.
Usualmente prefere-se definir as REI através de um conjunto de características ou portfólio de tecnologias e funcionalidades que as compõem.
No texto introdutório do Departamento de Energia dos EUA (2) apresenta-se o que pode ser considerada uma definição por atributos representativa da visão norte-americana, a qual considera a REI como:
a) inteligente, pela capacidade de antecipar sobrecargas e contingências e encontrar autonomamente uma forma de redirecionar o fluxo de potência; b) eficiente, ao atender aumentos de demanda sem adição de ativos;
c) flexível, ao prover a conexão de qualquer tipo de fonte de geração ou elemento de armazenagem;
d) motivadora, pela sinalização instantânea de preços aos consumidores;
e) criadora de oportunidades e de novos mercados através do canal de comunicação com os clientes;
f) orientada para a qualidade do produto e serviço, de forma consistente com a economia digital;
h) ambientalmente de menor impacto.
De um modo geral aceita-se que as redes inteligentes são também caracterizadas pelos conceitos que as diferenciam das redes convencionais, ou seja:
a) redes ativas, pela presença de geradores do lado da carga e operação em malha;
b) auto-restabelecimento de trechos da rede em caso de faltas;
c) auto-reconfiguração para atendimento de objetivos como a minimização de perdas, melhoria do perfil de tensão, etc;
d) elevada penetração de recursos distribuídos de geração e de armazenagem de energia;
e) alimentação de veículos elétricos;
f) comunicação bidirecional entre os dispositivos eletrônicos inteligentes (IED –
intelligent electronic devices) como medidores, sensores, relés e controladores de demanda e um ou mais centros de operação para supervisão e telecomando;
g) realização de monitoramento e diagnóstico dos ativos críticos, para planejamento da manutenção, utilização da máxima capacidade e substituições antes de falhas;
h) maior eficiência energética nos seus componentes;
i) infraestrutura de medição como unidade remota no cliente, capaz de operar com tarifas dinâmicas e funções de limitação de demanda e corte de consumo.
A realização prática das funções anteriores requer o uso intensivo e complementar de tecnologias já disponíveis ou emergentes, mas nem sempre integradas, como automação, medição eletrônica, geração distribuída, cogeração, veículos elétricos plugáveis à rede, armazenagem de energia, monitoramento e diagnóstico da condição dos ativos, telecomunicações e tecnologia da informação.
2.3. Áreas de concentração das redes elétricas inteligentes
Devido à multiplicidade de características possíveis para uma REI, é conveniente propor uma organização conceitual das mesmas em áreas de concentração, as quais sejam representativas de grupos de funcionalidades com afinidades entre si. Neste trabalho serão consideradas quatro grandes áreas de concentração:
a) infraestrutura avançada de medição; b) automação avançada da distribuição;
c) recursos distribuídos de geração e armazenagem de energia; d) conservação de energia;
Por sua vez uma funcionalidade compreende uma característica específica, a qual, porém, pode ser realizada com diversos graus de complexidade para atender as especificações desejadas. Na nomenclatura aqui adotada a característica mais específica de uma REI é uma função.
A implementação de uma função compreende, em geral, a utilização de várias tecnologias.
Não obstante, áreas de concentração, funcionalidades e funções distintas podem compartilhar as mesmas tecnologias, particularmente aquelas com características de infraestrutura de apoio às demais, como é tipicamente o caso de telecomunicações e tecnologia da informação.
Tabela 2– Esquema de organização conceitual das características das REI.
Área de
concen-tração
Funcio-nalidade Função
Tipos de tecnologias
E qu ipa men to s de r ed e C on du to re s ino va do re s E qu ipa men to s de s ec cion amen to e pr ot eç ão S en so re s e Tr an sd ut or es D is po si tiv os E let rô nic os In te lig en te s Ge ra çã o D is tr ibu íd a/ C og er aç ão A rmaz en ag em Mi cr og er aç ão V eí cu los e lét ric os Ilumina çã o ef ic ien te Tele co mun ic aç õe s Tec no log ia da In fo rmaç ão Infraestr. de Medição Medição Eletrônica
Consumo X X X X
Qualidade X X X
Serviços X X X
Automação
Operação
Autom. Alim. X X X X
Loc. Faltas X X X
Volt-var X X
Auto-reconfiguração X X X X X
Corte cargas X X X X X
Gerencia-mento
Monitoramento X X X X X
Diagnóstico X X X
Vigilância X X X X
Rec. Distribuídos
Ger. Distr. Média/grande X X
Microgeração X X X
Armazena-gem
Pequeno porte X X
Grande porte X X
Veículos Plugáveis X X
Vehicule to grid X
Conserva-ção
Cogeração Cogeração X
Edifícios Sustentáveis X X X X
Habitações individuais
Iluminação X X
Eletrodomésticos X X X
2.3.1. Infraestrutura avançada de medição
elétrica (como serviço e como produto) e, pelo menos potencialmente, a oferta de novos serviços.
As funções associadas são principalmente: a) medição remota do consumo;
b) corte e religamento da ligação de consumidores; c) gerenciamento do lado da demanda;
d) levantamento das curvas de carga características dos consumidores; e) venda de energia microgerada;
f) registro de indicadores de continuidade individuais (DIC, FIC); g) avaliação da qualidade do produto energia elétrica;
h) oferta de novos serviços ligados ao suprimento de energia.
Não é surpreendente que a medição do consumo de energia elétrica e o faturamento, pela sua importância no negócio de numa concessionária, venham sendo, ao longo dos últimos anos, objeto de melhorias e evoluções para torná-los mais eficientes, rápidos e de menor custo.
Embora os medidores eletromecânicos ainda sejam a grande maioria dos equipamentos instalados, foram realizadas sucessivas etapas de atualização da tecnologia nos últimos anos:
a) eliminação da mão-de-obra através da leitura automatizada de medição (AMR
– automated meter reading) com transmissão unidirecional dos valores medidos;
b) gestão da medição (AMM – automated meter management) onde intervenções e interrogações eram possíveis pelo emprego de comunicação bidirecional;
c) medição inteligente (smart metering ou AMI – advanced metering infrastructure) a qual contempla, além das características anteriores, tarifas dinâmicas e uma integração com a infraestrutura de TI.
um centro de medição, de forma a propiciar a adequação dinâmica das tarifas, bem como o envio de informações e outros serviços da concessionária aos clientes. A importância da AMI estende-se além dos medidores em si, pois propicia a integração de recursos de geração e armazenagem distribuída residencial, conexão de veículos elétricos plugáveis, bem como coopera com os controladores de cargas e os eletrodomésticos inteligentes (2).
O medidor inteligente atua, de fato, como uma unidade terminal remota no cliente e sua constituição básica inclui, no mínimo:
a) elemento de medição de energia elétrica (opcionalmente em quatro quadrantes, isto é, energia ativa e reativa em qualquer sentido, além de demanda ou incorporação de medição do consumo de gás natural);
b) disjuntor para seccionamento e religamento remoto; c) microprocessamento e memória local de dados; d) módulo de comunicação bidirecional;
e) interface de visualização ao usuário (IHM) com eventual conexão a eletrodomésticos inteligentes.
A medição inteligente é apontada em alguns trabalhos (3) como a primeira funcionalidade a ser implementada num processo de evolução das redes elétricas, uma vez que sua implementação requer uma infraestrutura de telecomunicações conectando os consumidores, que poderia ser vantajosamente utilizada para outras aplicações, além de permitir a comercialização da energia produzida em unidades de microgeração.
A primeira aplicação em larga escala de AMI foi realizada na Itália (9) contemplando 30 milhões de medidores e 350 mil concentradores de dados a um custo total de 2 bilhões de euros (ou cerca de 67 € por ponto).
Além da aplicação à rede italiana, o projeto, conhecido como ―Telegestore‖, gerou
Dentre as características do medidor utilizado, que pode ser monofásico ou trifásico, podem ser citadas: medição de energia ativa e reativa, vida útil de 15 anos, armazenagem do perfil das cargas com capacidade para cinco semanas com medições a cada 15 min, proteções anti fraude, configuração de tarifas múltiplas, desconexão remota com disjuntor interno e registro de dados de qualidade do suprimento.
Os benefícios esperados com a implementação da AMI são: (12) a) eliminação de leituras e erros associados;
b) redução do consumo pela possibilidade de acompanhamento dos gastos pelos clientes;
c) modulação do consumo, principalmente em horários de ponta, em resposta a níveis de preço diferenciados;
d) integração na rede de geração distribuída renovável de micro porte; e) redução de fraudes;
f) redução de inadimplência pela facilidade de corte remoto;
g) eliminação de custos de religamento de consumidores cortados; h) levantamento de curvas de carga reais;
i) monitoramento dos indicadores de continuidade individuais; j) aumento da comunicação com os clientes;
k) oferta de outros serviços ligados ou não ao consumo de energia;
2.3.2. Automação avançada da distribuição
No contexto das REIDE a automação da distribuição pode desempenhar funções avançadas autonomamente em intervalos de tempo impraticáveis para operadores humanos, constituindo-se na assim chamada Automação Avançada da Distribuição (ADA –advanced distribution automation). (13)
O primeiro deles compreende aspectos da operação de redes e subestações e está apresentado a seguir:
a) automação de alimentadores;
b) isolação e localização de faltas com auto-restabelecimento do serviço; c) reconfiguração de alimentadores;
d) análise de contingências e corte de cargas
e) controle dos níveis de tensão e reativos (conhecida como Var ou Volt-Var-Watt);
f) operação da distribuição em tempo real; g) parametrização remota de relés;
h) processamento inteligente de alarmes;
i) realização de medições que contribuam para a estimação de estados de toda a rede, com identificação de pontos com problemas;
O segundo subgrupo está associado com o gerenciamento da topologia das ligações elétricas, bem como o controle de grandezas importantes para a operação e para a condição dos ativos. Suas funções principais são as seguintes:
a) monitoramento do estado de dispositivos de seccionamento e proteção;
b) carregamento dinâmico de condutores e transformadores através do monitoramento de temperaturas;
c) diagnóstico da condição real dos ativos com medições específicas; d) vigilância remota de ativos e instalações.
Historicamente a automação nos sistemas de distribuição teve início com a introdução de sistemas de supervisão e controle (SCADA) nas subestações, com o objetivo de torná-las não assistidas. Tais sistemas permitiam a um operador localizado num Centro de Operações a execução telecomandada de ações de abertura ou fechamento de seccionadoras ou chaves de transferência, após a confirmação de dados de estado e valores medidos de tensões ou correntes.
Este nível de automação já apresentava interessantes benefícios de redução de custos operacionais e melhoria dos indicadores de continuidade do fornecimento de energia, tanto da subestação automatizada, quanto da concessionária como um todo.
Em termos de automação de alimentadores as aplicações tradicionais de religadores automáticos e chaves seccionalizadoras automáticas, originalmente com tecnologia hidráulica, tinham caráter de proteção, para evitar o desligamento desnecessário em caso de faltas temporárias, bem como isolar o menor trecho possível do alimentador. Todavia, essa aplicação tradicional diferencia-se da automação devido às seguintes limitações:
a) exposição desnecessária de várias partes do circuito a tantos esforços térmicos e mecânicos sucessivos quanto forem os religamentos em caso de defeito permanente;
b) inexistência de sensores de tensão e corrente que podem ser utilizados para registro, operação da rede e estabelecimento de lógicas de atuação locais entre dispositivos;
c) ausência de processamento de informações e registro sobre a falta que poderiam vantajosamente ser utilizadas para classificar e localizar o defeito; d) tempo mais longo de isolamento do trecho defeituoso;
e) falta de comunicações para operação com lógica centralizada ou telecomando para reconfiguração das redes.
De um modo geral, até meados dos anos 90 do século XX as restrições de sistemas de comunicação limitavam aplicações abrangentes de automação que incluíssem a rede primária.
Paralelamente os religadores e chaves automáticas, passaram a ser fabricados com tecnologias mais avançadas, confiáveis e econômicas, incorporando sensores de tensão e corrente, mecanismos de processamento e acionamento alimentados por baterias de longa vida útil, interrupção da corrente de curto circuito sob vácuo e isolação elétrica sólida.
Nos sistemas atuais muitas redundâncias, reservas de capacidade instalada ou fatores de segurança são adotados nos projetos como uma conseqüência do baixo grau de conhecimento da real condição da rede e seus ativos.
Assim sendo, o conhecimento do estado das chaves em tempo real contribui para a realização de simulações de carga e tensão mais fidedignas, bem como para uma análise das contingências.
O monitoramento em tempo real de alguns parâmetros de operação dos transformadores de potência, disjuntores, linhas aéreas e cabos pode aumentar a qualidade do serviço oferecido pelas concessionárias de energia elétrica, reduzindo as sobrecargas desconhecidas e limitando o número de interrupções no fornecimento de energia provocadas por falhas no funcionamento de componentes fundamentais para o sistema.
A variação destes parâmetros pode levar à detecção de possíveis mecanismos de falha e direcionar os trabalhos de manutenção preventiva, ou mesmo determinar o momento mais adequado para estas manutenções.
O caso acima corresponde às situações em que o monitoramento colabora também para o diagnóstico do estado operativo do equipamento.
O diagnóstico pode ser realizado de forma on-line, ou, mais frequentemente, com técnicas que exijam o desligamento do equipamento, ou ainda, de forma periódica pré-estabelecida, a qual não está associada a um monitoramento.
As técnicas de monitoramento e diagnóstico vêm encontrando aplicações cada vez mais disseminadas como forma de reduzir as interrupções, tanto não programadas, como programadas, em decorrência de permitirem uma estimativa da condição dos equipamentos, bem como criarem novos critérios de reposição baseados em riscos. Tanto para fins de controle das condições de operação dentro de limites estabelecidos como para gerenciamento da vida útil remanescente de componentes a temperatura é uma das grandezas chave a ser monitorada.
A operação das redes pelo controle da temperatura, ao invés da carga aplicada, é uma mudança conceitual que só pode ser realizada com sensores adequadamente distribuídos associados a algoritmos de cálculo que reavaliem a cada instante a situação frente aos limites térmicos, com uma adequada antecipação para a solução de sobrecargas evitáveis, com benefício tanto para as perdas técnicas como para a vida útil.
Além disso, para que a rede elétrica seja realmente inteligente, é necessária a adoção de técnicas e algoritmos computacionais para a identificação antecipada do comportamento do sistema e o fornecimento de informações para a tomada de decisão da automação com a integração dos equipamentos de seccionamento e interrupção - chaves seccionalizadoras e religadoras – através de uma rede de comunicações bidirecional.
Outro aspecto é o aproveitamento dos elementos de medição de tensão e corrente incorporados nos dispositivos de automação contemporâneos para o aumento do número de trechos e barras monitorados da rede.
A automação envolve todos os segmentos (Geração, Transmissão e Distribuição), bem como os consumidores, podendo-se ser adicionada ou incorporada a eletrodomésticos (smart appliances) ou iluminação predial.
A automação dentro de residências e edifícios comerciais, que contribua para o gerenciamento da demanda e eficiência energética também pode ser considerada parte das REIDE.
Como benefícios da Automação podem ser citados: (12)
a) o auto-restabelecimento mais rápido e de um maior número de consumidores em caso de faltas;
b) a redução dos custos de operação e manutenção;
c) a melhoria dos indicadores de continuidade coletivos (DEC e FEC) ou individuais (DIC, FIC e DMIC) e redução da energia não distribuída (END); d) a auto-reconfiguração para o atendimento de contingências ou, ainda com o
objetivo de otimizar níveis de tensão ou perdas em correspondência com as variações de carga;
e) controle dos níveis de tensão em qualquer condição de carregamento. f) melhor utilização da capacidade instalada;
g) localização de faltas inevitáveis mais rápidas e com menor tempo de restabelecimento;
h) diagnóstico da condição dos ativos;
i) prevenção de danos e furtos pela vigilância remota de instalações; j) controle da demanda residencial e comercial.
Notas:
FEC: freqüência equivalente de interrupção por unidade consumidora; DIC: duração de interrupção por unidade consumidora;
FIC: freqüência de interrupção por unidade consumidora;
DMIC: duração máxima de interrupção por unidade consumidora.
A abrangência da automação com o envolvimento no controle das cargas e ativos, utilização de infraestrutura de telecomunicações e tecnologia da informação, apresenta evidentes sinergias de implementação com as demais funcionalidades, justificando o seu papel central no conceito de REIDE.
2.3.3. Recursos distribuídos de geração e armazenagem
As funcionalidade envolvidas neste caso são: a) geração distribuída (GD);
b) armazenagem de energia;
c) veículos com algum tipo de conexão às redes elétricas.
Pelas suas características, estas funcionalidades apresentam uma complementaridade que justifica o seu enquadramento numa única área.
A falta de controle centralizado do despacho das unidades de geração distribuída, bem como o descompasso de algumas formas de GD com o perfil das cargas, requer a armazenagem da energia excedente. Por sua vez os veículos com propulsão elétrica dotados de baterias podem ser carregados nesses momentos, contribuindo para a redução dos investimentos em armazenagem energética.
Outras denominações por vezes utilizadas para a GD são geração embutida, geração dentro da rede ou geração do lado da carga ou, ainda, geração descentralizada.
Nos Procedimentos da Distribuição – PRODIST - a Geração Distribuída foi definida conforme abaixo (14):
―Centrais geradoras de energia elétrica, de qualquer potência, com instalações
De um modo geral admite-se que uma GD tem como características: a) potência baixa quando comparada com a geração convencional;
b) despacho não centralizado, muito embora possam vir a ser criados centros regionais;
c) conexão à rede de distribuição (SDAT, SED, SDMT ou SDBT);
d) não serem parte das previsões realizadas no planejamento das redes de distribuição (15).
A geração distribuída de energia vem sendo utilizada de forma cada vez mais intensa no mundo todo, por motivos como:
a) aproveitamento de fontes renováveis de energia, usualmente de menor porte que as grandes gerações centralizadas;
b) necessidade de novas formas de produção energética com redução ou eliminação da emissão de gases estufa;
c) esgotamento das fontes convencionais;
d) maior prazo de construção das grandes usinas com controle centralizado; e) redução do preço da geração por fontes alternativas, devido ao avanço
tecnológico e ganhos de escala; f) incentivos governamentais;
g) abertura do mercado de geração à participação de investidores privados.
Em função de sua proximidade das cargas, com menores perdas de transporte e transformação, além de efeitos sobre a redução da ponta, o EPRI (15) afirma que 1 kWh injetado na distribuição vale aproximadamente o mesmo que 2 kWh de geração centralizada a longa distância.
No que tange aos benefícios ou impactos positivos da GD pode ser citados: a) regulação de tensão;
b) redução de perdas;
c) liberação de capacidade da transmissão e distribuição;
d) melhoria de confiabilidade e qualidade do fornecimento de energia; e) diferimento de investimentos de expansão;
g) e, principalmente na visão dos EUA, menor vulnerabilidade a ações terroristas e atentados quando comparada a uma grande planta geradora (8).
Existem, todavia, impactos críticos ou negativos para o sistema que devem ser adequadamente estudados e gerenciados quando da inserção de unidades de GD:
a) variações de tensão de curta duração devido a partida ou parada dos geradores;
b) controle de tensão em operação, uma vez que as formas de regulação convencionais assumem o fluxo de potência da subestação para as cargas apenas;
c) eventual aumento temporário de perdas em períodos de carga baixa em que a GD continue despachando;
d) ajustes nas proteções e incompatibilidade com religamento automático; e) harmônicos, nos casos de ligação com inversores;
f) problemas de estabilidade, em função da penetração da GD (percentual injetado em relação à carga suprida) e amortecimento dos circuitos;
g) riscos operacionais com geração ilhada.
Uma forma particular de utilização de geração distribuída de grande interesse são as microrredes, constituídas por sistemas ilhados com vários geradores de porte reduzido, mas com capacidade de atender cargas de padrão residencial, notadamente quando estes consumidores utilizem gás natural para fins de aquecimento e disponham de equipamentos e controladores que aumentem a eficiência energética e reduzam a demanda necessária.
Em função da utilização de geração fotovoltaica, existem propostas para microrredes em corrente contínua, com vantagens de eliminação das conversões para corrente alternada da energia gerada por inversores e alguma redução nas perdas.
então, com poucas exceções de instalações de usinas reversíveis, como processos produtivos perfeitamente just in time com o consumo, sem um estoque regulador para contingências.
Os veículos elétricos podem ser enquadrados nesta categoria, com a carga de suas baterias sendo realizadas em períodos convenientemente fora da ponta, para o armazenamento de energia que poderia vir a ser devolvida à rede em caso de necessidade.
Este último conceito corresponde ao chamado ―veículo para a rede‖ (vehicle to grid ou V2G) que aproveitaria o longo tempo em que, principalmente automóveis de uso individual, permanecem estacionados para tratá-los como um recurso de armazenagem.
Num horizonte de tempo mais curto, contudo, os veículos elétricos plugáveis (tanto aqueles cuja propulsão é somente elétrica como os híbridos, isto é com motor alternativo de combustão interna e elétrico, mas sempre utilizando a rede para recarga de baterias) são vistos como uma carga.
O tempo de recarga das baterias e o horário em que esta operação é realizada são determinantes para o impacto na demanda total da rede. Assim, recargas fora do horário de ponta podem contribuir para a melhoria da utilização das instalações, enquanto que cargas em tempos curtos próximas do horário de pico podem se constituir num acréscimo indesejável de demanda dependendo do tamanho da frota considerada.
Como avaliação inicial estima-se que demanda associada a um veículo elétrico é da mesma ordem de grandeza de uma residência cujo aquecimento seja feito com chuveiro elétrico (cerca de 4 kW).
Realizando-se uma comparação simples entre um veículo elétrico alimentado por baterias e outros a gasolina ou etanol resulta:
a) veículo elétrico: consumo de 0,2 kWh/km, custo de cerca de R$ 0,08 R$/km; b) veículo a gasolina: consumo de 10 km/l, custo de cerca de 0,25 R$/km; c) veículo a etanol: consumo de 6 km/l, custo de cerca de 0,27 R$/km.
2.3.4. Conservação de energia
Esta área de concentração não é foco principal do presente trabalho, mas devem ser mencionados os esforços para redução do consumo de energia em instalações industriais, comerciais e residenciais, através de funcionalidades:
a) cogeração;
b) edifícios energeticamente auto-sustentáveis;
c) eletrodomésticos, lâmpadas e sistemas de ar condicionado de alta eficiência; d) habitações ―inteligentes‖ no controle da demanda.
A cogeração consiste no processo de produção simultânea ou sequencial de duas formas de energia a partir de um insumo primário. Usualmente a cogeração é associada às gerações distribuídas com fontes não necessariamente renováveis e visa a produção simultânea de energia elétrica e frio para sistemas de ar condicionado.
Atualmente existe, em alguns casos, a trigeração que é o processo de cogeração que fornece simultaneamente energia, calor e frio.
A eficiência energética de iluminação tem se beneficiado de novos tipos de lâmpadas de baixo consumo como os LED (light emitting diode) e a iminente interrupção da produção de lâmpadas incandescentes, que já ocorreu em alguns países, foi apontado como o início de uma nova era para a utilização de energia. Existem sinergias dessa área com a de geração distribuída, porém ela também pode ser considerada separadamente, uma vez que muitas instalações apenas se preocupam com a redução da sua própria demanda, sem produção de energia excedente para injeção na rede elétrica.
2.4. Tecnologias de componentes e infraestrutura
algumas tecnologias já disponíveis, bem como a aplicação de outras em estágio emergente.
A enumeração e descrição de tecnologias envolvidas numa REI pode ser feita de diversas formas, dependendo da fonte consultada (7) (16).
Além disso, a prospecção tecnológica tem incertezas associadas ao sucesso ou não de pesquisas e desenvolvimentos e novas descobertas que suplantem as existentes com vantagens.
Por estes fatos e outros mais, a adoção de novas tecnologias é vista como uma oportunidade de solução mais eficiente dos problemas das concessionárias, mas também como uma ameaça à confiabilidade e modicidade tarifária. A solução usual para este conflito é a adoção gradual das tecnologias, aplicações piloto e seleção inicial daquelas mais maduras.
2.4.1. Tecnologias aplicáveis a equipamentos e componentes de rede
Os principais campos de aplicações de novas tecnologias estão citados a seguir: a) proteção;
b) supercondutividade; c) sensores e transdutores;
d) novas formas de geração de energia; e) armazenagem;
f) eletrônica de potência.
A melhoria nos sistemas de proteção visa dotar das redes elétricas de capacidade auto-adaptativa a situações variáveis, como as cargas e condições meteorológicas, de modo a limitar os desligamentos aos trechos estritamente necessários.
A supercondutividade ganhou impulso com o desenvolvimento de materiais de alta temperatura (isto é, temperatura do nitrogênio líquido), porém ainda não atingiu o estágio de substituir os condutores tradicionais, com resistência elétrica e perdas, nas aplicações convencionais.
futuro, com topologias em malha e unidades de GD que contribuem para elevação dos níveis de curto-circuito. A supercondutividade permite naturalmente que esses limitadores variem a resistência de um valor nulo em operação normal para um valor elevado após o início de um defeito.
A disseminação de automação e supervisão de redes deve aumentar sensivelmente o número de sensores instalados nas redes, justificando pesquisas para sua redução de custo, tamanho e princípios de operação.
Destacam-se os sensores passivos, isto é que não requerem fonte de alimentação própria, como os MEMS (micro electro-mechanical sensors) que podem ser aplicados para monitoramento de correntes ou outras grandezas, bem como sensores ópticos, com uma variedade de aplicações e a vantagem de serem dielétricos por natureza.
A armazenagem de energia tem sido realizada com bancos de baterias de diversos tipos, usinas reversíveis, magnetos supercondutores, volantes (flywheels), técnicas baseadas no uso de ar comprimido, etc. (17)
Cada técnica apresenta uma faixa de aplicação, vida útil e eventualmente inconvenientes ambientais no momento do descarte.
Em particular as baterias podem ser de grande porte (unidades de sódio sulfúrio, NaS) ou pequenas e leves como aquelas para utilização em veículos elétricos (íon de lítio, Li-ion).
As melhorias nesse setor devem permitir aumento do número de ciclos de carga e descarga para valores acima de 5000 e vida útil superior a 10 anos, com reduções de custo da ordem de 50 %. (18)
A eletrônica de potência tem uma variedade de aplicações para chaveamento estático, conversão CA/CC e CC/CA, injeção de reativos e outras, sendo um complemento natural de outras funcionalidades.
2.4.2. Telecomunicações
O setor de telecomunicações é frequentemente comparado com o setor elétrico em termos de inovações experimentadas nas últimas décadas, motivadas por fatores econômicos, bem como surgimento e a expansão da internet.
Os avanços significativos das comunicações envolveram diversas tecnologias de equipamentos e sistemas, com enorme melhoria das larguras de banda, latência e nível de serviço.
Mesmo assim, o nível de serviço de algumas formas de comunicação, ainda não se presta a algumas aplicações do setor elétrico - como proteção - o que justifica os investimentos das concessionárias em linhas e canais de comunicação dedicados. No conceito das REI as comunicações aplicáveis devem ser bidirecionais, mesmo que em algumas situação não permitam o trânsito simultâneo dos sinais em ambos os sentidos (isto é, podem ser tanto half duplex como full duplex).
Uma divisão básica entre os tipos de tecnologia classifica a forma de transmissão dos sinais:
a) sobre meio de transmissão: i. fibras ópticas;
ii. Power Line Communications (PLC)/Broadband Power Line (BPL) utilizando a própria rede elétrica;
iii. cabos de cobre coaxiais ou a pares. b) sem meio de transmissão:
i. celular GPRS/GSM ou 3G nas diversas bandas disponíveis; ii. rádio de diversas tecnologias e faixas de frequência;
iii. outras tecnologias como ondas na faixa do infravermelho.
Para entender a aplicabilidade das diferentes tecnologias a Tabela 3 apresenta uma breve comparação de alguns atributos. (19)
Adicionalmente aos atributos e utilização de meio de transmissão ou não, existem ainda questões de confidencialidade e segurança das informações, que requerem tratamento específico dos dados como a encriptação, autenticação e certificação digital.
Tabela 3 – Atributos de algumas tecnologias de telecomunicações.
Espectro Veloci-dade Alcance No. de nós Topolo-gia Aplicação Observa-ções
Celular 1900 MHz 824 a 60 a 240 kbps Variável NA Ponto a ponto
Teleme-tria e controle na última milha Radio mesh 900 a
2400 MHz --- --- --- Malha ---
WiFi 5,875 2,4 a GHz
2 a 248
Mbps 75 a 150 m > 100 Estrela
Teleme-tria e comunica-ção entre dispositi-vos
WiMax 2 a 66 GHz Banda larga 50 km NA Estrela
Teleme-tria e comunica-ção entre dispositi-vos Conexão entre SED IEEE 802.16
Bluetooth 2.4835 2.4 a
GHz 720 kps 1 a 100 m 8
Ponto a ponto
IEEE 802.15.1
ZigBee 2400 MHz 868 a 20 a 250 kbps 75 m 65000 Malha
Teleme-tria e comunica-ção entre dispositi-vos IEEE 802.15.4
IrDA 750 nm a 1 mm --- --- --- --- espaços Requer
abertos
PLC --- NA --- Estrela
Teleme-tria e comunica-ção entre dispositi-vos EN 50065-1
BPL Banda larga NA --- Estrela
Teleme-tria e comunica-ção entre dispositi-vos Fibra
óptica 160 a 500 MHz/km Banda larga 70 km entre SED Conexão
As redes de comunicação são classificadas como em função da área por elas abrangida como WAN (wide area network), LAN (local area network), MAN (metropolitan area network) e HAN (home area network).
Uma questão fundamental correlata às telecomunicações são os protocolos.
Com o intuito de garantir o princípio de interoperabilidade entre equipamentos e dispositivos de diversos fabricantes, foram dispendidos esforços nos últimos anos com o objetivo de conceber padrões de tráfego e interpretação de informações cuja forma de organização fosse mais intuitiva.
Como resultado deste esforço foi concebida a norma IEC 61850 , composta de várias partes, a qual vem ganhando adesão em aplicações de automação de subestações e considerável difusão no mercado de equipamentos e dispositivos voltados ao setor elétrico.
Basicamente, a norma IEC 61850 define o padrão para a criação de uma réplica virtual das instalações físicas existentes em uma subestação. Para entendimento da estrutura de dados utilizada por este protocolo é necessário o entendimento dos elementos que o compõem.
O ―sistema virtual‖ considerado pela IEC 61850 (20) é composto dos seguintes itens básicos:
a) dispositivo físico (physical device) o qual corresponde ao equipamento onde os dados estão armazenados (IED) e que pode ser desde um relé de proteção digital até controladores de bay microprocessados com funções de proteção incorporadas;
b) dispositivo lógico (logical device) que corresponde ao sistema controlado pelo IED, podendo ser um único disjuntor em casos em que o IED é um relé digital ou um bay da subestação quando o IED for uma unidade de controle de bay e assim por diante;
c) nó lógico (logical node) que significa o menor ―elemento lógico‖ existente, ou seja, a menor entidade cujos dados devam ser intercambiáveis com os demais nós lógicos e que representa os equipamentos primários (disjuntor, etc) ou uma determinada função (proteção, por exemplo).
Cada dado cadastrado para um nó lógico deve ter sua estrutura definida através de uma caracterização a qual se dá o nome de Common Data Class (CDC). Através do CDC os atributos de cada dado são caracterizados quanto a sua natureza e formato de leitura (texto, valor binário, etc).
Além disso, é necessária a definição de como se dará o acesso a este dado pelas lógicas implementadas nos diversos IED componentes do sistema de automação de determinada subestação.
Os diversos objetos definidos pela norma relacionam-se de forma hierárquica, na qual o nó lógico representa o dispositivo real. Acima dele estão os IED e endereço de rede de comunicações e abaixo dele os dados.
A modelagem de dados exposta, juntamente com o modelo de transmissão de dados e com os diversos serviços definidos e padronizados na mesma norma, define uma estrutura tal que permite a viabilização do ―plug and work‖ na inserção de novos dispositivos ao sistema.
Ademais, a norma define uma linguagem de parametrização - baseada em XML (Extensible Markup Language) - do sistema de automação de forma a garantir a interoperabilidade entre os dispositivos de diversos fornecedores, chamada SCL (Systems Configuration Language).
Tais recursos reduzem consideravelmente os custos iniciais de engenharia, assim como os custos de manutenção do sistema, que poderiam atingir valores extremamente altos com a inserção em larga escala de diversos novos equipamentos e dispositivos de automação nas REI.
A adoção de protocolos normalizados em todas as aplicações ainda está longe de ocorrer, mas apresenta vantagens inegáveis que tendem a impulsioná-la nos próximos anos.
2.4.3. Tecnologia da Informação