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A Cidadania Portuguesa como Cidadania Estratégica – Limites e Potencialidades

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A CIDADANIA PORTUGUESA COMO CIDADANIA ESTRATÉGICA – LIMITES E POTENCIALIDADES

José Saraiva Figueiredo

Relatório de Estágio de Mestrado em Migrações, Inter-Etnicidades e Transnacionalismo

Orientadores: Dulce Pimentel

José Carlos Laranjo Marques

setembro, 2022

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Relatório de Estágio apresentado para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Migrações, Inter-Etnicidades e Transnacionalismo,

realizado sob a orientação científica do Prof. Doutor José Carlos Laranjo Marques

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Resumo

O presente relatório tem como objetivo apresentar as atividades realizadas no âmbito do estágio curricular na Way to Portugal titular da empresa Come to Portugal. O estágio decorreu entre os meses de outubro a março, em regime híbrido, maioritariamente presencial e parte, em teletrabalho, devido à pandemia global COVID- 19.Tem também, por objetivo refletir sobre o modo da cidadania portuguesa poder ser uma mais-valia para os imigrantes em Portugal e para a própria sociedade portuguesa, promovendo uma melhor integração de imigrantes e portugueses em Portugal, contribuindo para o rejuvenescimento da sociedade portuguesa e a falta de mão de obra ativa e jovem em Portugal. O relatório iniciará com uma contextualização da cidadania estratégica e da sua evolução pelo mundo; em segundo lugar será realizada uma descrição dos principais grupos de imigrantes em Portugal, da estrutura demográfica e como estes contribuem para a demografia da sociedade portuguesa; no terceiro lugar apresenta-se uma breve explicação da nacionalidade, em específico da portuguesa, e dos novos caminhos que possam ser tomados para a mudança na política relativa à aquisição e atribuição da cidadania portuguesa e para uma maior integração dos imigrantes em Portugal. Por último, será relacionada a minha experiência no estágio com a problemática inicial e a integração de imigrantes.

Palavras-Chave: Cidadania Estratégica, Imigrantes, Nacionalidade Portuguesa, Integração.

Abstract

This report aims to present the activities carried out within the scope of the curricular internship at Way to Portugal, owner of the company Come to Portugal. The internship took place between the months of October and March, in a hybrid regime, mostly in person and partly in telework, due to the global pandemic COVID-19. It also aims to reflect on how Portuguese citizenship can be an asset for immigrants in Portugal and for Portuguese society itself, promoting a better integration of immigrants and Portuguese in Portugal, contributing to the rejuvenation of Portuguese society and the lack of an active and young workforce in Portugal. The report will begin with a contextualization of strategic citizenship and its evolution around the world; secondly, a description will be made of the main groups of immigrants in Portugal, the demographic structure and how they contribute to the demography of Portuguese society; in the third place, a brief explanation of nationality, specifically Portuguese, and of the new paths that can be taken to change the policy regarding the acquisition and attribution of Portuguese citizenship and for a greater integration of immigrants in Portugal is presented. Finally, my experience in the internship will be related to the initial problem and the integration of immigrants.

Key words: Strategic Citizenship, immigrants, Portuguese nationality, Integration.

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Índice

Lista de Abreviaturas ... 6

Introdução ... 7

Apresentação da empresa e da estrutura do relatório de estágio ... 9

A Cidadania Estratégica ... 10

Origens ... 10

A mudança global em direção à dupla cidadania ... 13

Migração e as Visões que rodeiam a dupla cidadania ... 15

A Cidadania como forma de integração ... 16

A cidadania estratégica num contexto de mobilidade global ... 18

Portugal um país recetor de imigrantes ... 19

Imigração e Demografia ... 20

Análise da composição dos imigrantes em Portugal ... 23

A Nacionalidade ... 24

A Nacionalidade e Cidadania na Europa: as principais tendências e os seus impactos ... 24

Aquisição da nacionalidade por descendência (ius sanguinis) ou por nascimento no território (ius soli)... 27

Aquisição por naturalização ... 28

Perda da Nacionalidade ... 28

Nacionalidade Portuguesa ... 29

A atribuição da nacionalidade portuguesa ... 30

O acesso a nacionalidade portuguesa ... 31

Perspetivas Futuras ... 34

As dificuldades de imigrar – A criação de uma nova carreira ... 36

Estágio na Way to Portugal ... 38

Atividades desenvolvidas ... 38

Principais dificuldades enfrentadas durante o estágio ... 40

Conclusão ... 42

Bibliografia ... 45

Outras Fontes Consultadas ... 47

Anexos ... 48

Gráfico 1: Aceitação da dupla nacionalidade por regiões ... 48

Gráfico 2: Percentagem da população com 65 e mais anos de idade, nos países da União Europeia (UE27), a 1 de janeiro de 2011, 2019 e 2020 ... 48

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Gráfico 3: Pirâmide etária da população de nacionalidade portuguesa e estrangeira, no ano de 2019 (%) ... 49 Tabela 1: Nados-Vivos de mães residentes em Portugal, segundo a nacionalidade da mãe, entre 2011 e 2020 ... 50 Gráfico 4:Taxa de endogamia* na população em coabitação com mais de 15 anos, segundo a naturalidade, nos países da União Europeia, em 2016 ... 51 Gráfico 5: Composição de imigrantes em Portugal (2020) ... 51 Gráfico 6: Stock por Continente de imigrantes em Portugal (2020) ... 52 Gráfico 7: Percentagem de aquisições da nacionalidade no total da população estrangeira residente nos países da UE28, em 2006. 2016. 2018 e 2019 ... 52 Tabela 2: Atribuições de nacionalidade portuguesa (nacionalidade original), entre 2011 e 2020 ... 53 Tabela 3: Aquisições de nacionalidade portuguesa (nacionalidade derivada), entre 2011 e 2020 ... 54 Gráfico 8: Atribuições e aquisições da nacionalidade portuguesa, entre 1996 e 2020 ... 55 Gráfico 9: Processos entrados e findos de concessão da Nacionalidade Portuguesa, entre 2001 e 2020 ... 55 Gráfico 10: Tipologia dos pedidos de nacionalidade portuguesa (2020) ... 56 Tabela 4: Aquisição da nacionalidade de residentes em Portugal, por principais nacionalidades de origem, em 2011, 2019 e 2020 (%) ... 57 Gráfico 11: Aquisições da nacionalidade portuguesa segundo a residência, entre 2008 e 2020 ... 58

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Lista de Abreviaturas

RNH – Residente não habitual

SEF- Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

GEPF – Gabinete de Estudos, Planeamento e Formação TR – Títulos de Residência

UE – União Europeia

CEN – Convenção Europeia sobre a Nacionalidade

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Introdução

O presente relatório de estágio insere-se na componente não letiva do Mestrado de Migrações, Inter-Etnicidades e Transnacionalismo, tendo como objetivo utilizar os conhecimentos e métodos adquiridos na componente letiva e articulá-los com novas capacidades práticas entretanto desenvolvidas. Neste relatório descreve-se, também, a minha experiência enquanto estagiário numa empresa dedicada ao auxílio e à consultadoria em processos relativos à aquisição da nacionalidade portuguesa.

Sendo a minha experiência prévia em trabalhar com esta temática nula, os conhecimentos adquiridos tanto na universidade como fora desta, não me impediram de optar por um estágio durante a componente não letiva do mestrado. Foi precisamente por esta razão, que escolhi o estágio, dado que possibilitava uma oportunidade excelente para pôr em prática a aprendizagem já adquirida, num contexto empresarial e trabalhar em equipa. Considero que a experiência prática é sempre muito importante em qualquer área académica, pois esta completa os conhecimentos teóricos interligando-os à prática, e preparando o indivíduo para o mercado de trabalho.

Este relatório não descreve apenas as atividades concretizadas num contexto profissional relacionado com os processos de apoio à aquisição da nacionalidade portuguesa, como também analisa o desenvolvimento da aquisição de uma segunda nacionalidade. Esta torna-se, frequentemente, uma cidadania estratégica para aqueles que procuram obter uma nacionalidade que lhe permita a abertura a novas oportunidades. O relatório analisa, também, os possíveis caminhos a serem tomados no desenvolvimento da cidadania portuguesa.

A cidadania (ou nacionalidade)1 é o motor institucional da vida política que define os seus membros e participantes, revela-se como “o estatuto que cria a ligação legal entre um indivíduo e um Estado, e estabelece direitos e obrigações para os indivíduos por relação a esse Estado. Sem os indivíduos que pertencem a um Estado (em função da sua nacionalidade), o Estado não pode existir, tornando-se, por isso, a cidadania a instituição a partir da qual cada Estado se constitui e reconstitui” (Oliveira, 2021:332).

1 “Os termos cidadania e nacionalidade são frequentemente usados como sinónimos ou de forma

indistinta” (Jerónimo, Vink, 2013:23-50).

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Sendo assim, a instituição da cidadania é um vínculo político-jurídico que um cidadão tem com o Estado de onde este é nacional, através desse vínculo adquirem-se direitos e contraem-se deveres. A cidadania já sofreu, e ainda continua a sofrer, mudanças na sua composição legal, nomeadamente os elementos que a definem.

Durante o século XX, os Estados exigiram, normalmente, lealdade exclusiva dos seus cidadãos (ou nacionais) e proibiram a sobreposição de membros (Harpaz, Mateos, 2018:1-2). Contudo, tudo isto começou a mudar no final deste século, mais precisamente em 1990. A partir deste ano, vários países mudaram as suas leis para ser permitida a dupla ou múltipla nacionalidade. À medida que o número de cidadãos com dupla ou múltipla nacionalidade aumentava, apareciam novas conceções de filiação nacional que ganhavam visibilidade e legitimidade, e que redefiniram o princípio base da filiação ao Estado, o qual passou de exclusivo e territorial para sobreposto e portátil.

Esta mudança trouxe implicações de longo alcance para o estudo da migração, globalização, desigualdade económica e identidade nacional (Harpaz, Mateos, 2018:1- 2).

Face à situação atual é possível ver o aumento mundial de práticas instrumentais relativas à aquisição e uso da cidadania, em conjunto com uma atitude estratégica para com a nacionalidade, a isto dá-se o nome de cidadania estratégica (Harpaz, Mateos, 2018:2). Este termo veio redefinir um novo campo de investigação que examina essas mudanças, nomeadamente, nas estratégias de aquisição de nacionalidade, nos seus usos instrumentais e nas diferentes perceções com que esta é vista (Harpaz, Mateos, 2018:2).

Assim, a cidadania como forma tradicional, vista como um emblema sagrado, imutável de identidade nacional e enraizamento territorial, passa para uma cidadania que destaca a procura por um status melhor e uma melhor mobilidade global. Assim, a hierarquia global das nacionalidades mundiais fornece o contexto dentro do qual os indivíduos procuram uma segunda cidadania, procurando aceder à cidadania que lhes proporcione vantagens económicas, de mobilidade global, uma sensação de segurança e até mesmo um status social mais elevado (Harpaz, Mateos, 2018:2).

O passaporte português foi considerado, em 2022, o quinto passaporte mais poderoso do mundo (sendo os cinco primeiros postos considerados passaportes excelentes), sendo, por isso, alvo de uma forte procura (DN, 12 de janeiro 2022).

Assim, é importante analisar e perceber como Portugal pode utilizar este elemento a seu favor, contribuindo para que os indivíduos escolham Portugal e a sua cidadania como

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uma segunda oportunidade, aliando esta com as migrações para o país e para o aumento da população jovem e ativa que este carece.

Apresentação da empresa e da estrutura do relatório de estágio

A Way to Portugal2 é uma empresa especializada no serviço de apoio ao investimento e à imigração. A Way to Portugal presta assessoria completa e contínua em todas as fases do processo de investimento e imigração, de forma a garantir que o cliente tenha os resultados desejados.

A Way to Portugal é constituída por uma outra entidade empresarial, a Come to Portugal, dedicada ao processo de obtenção de vistos de entrada (visto de estudante, de trabalho e o designado visto “gold”) e estadia em Portugal e, ainda, à prestação de apoio à obtenção da cidadania portuguesa por parte dos seus clientes estrangeiros. Foi nesta entidade empresarial que decorreu a minha atividade no estágio.

Visto ser uma empresa de apoio ao investimento e à imigração a Way to Portugal envolve muito mais do que a parte de vistos e cidadania portuguesa. A Way to Portugal é responsável também pela abertura de empresas de estrangeiros em Portugal, assim como, pelo investimento imobiliário feito pelos clientes no âmbito do regime de Autorização de Residência para Atividade de Investimento (comumente conhecido por

“vistos gold”), ou no contexto do regime fiscal aplicável a residentes não habituais (regime que oferece benefícios fiscais a cidadãos de qualquer nacionalidade, incluindo portugueses, que tenham residido no exterior, que transfiram a sua residência tributária para Portugal). Faz, ainda, a representação do cliente em Portugal em diversos assuntos.

Durante o estágio tive a oportunidade de assistir e desempenhar várias tarefas.

Estas incluíram o serviço de apoio ao cliente, onde esclarecia as dúvidas destes através de e-mail ou das redes sociais, preparação dos documentos essenciais para os processos (depois de aceite a representação ou os orçamentos apresentados pela empresa) em conjunto com o cliente, a revisão dos documentos e algumas traduções, nomeadamente em espanhol, para as redes sociais da Way to Portugal. Portanto, o presente relatório

2 A Way to Portugal é uma empresa que teve o início da sua atividade profissional em 2019, sendo uma

empresa de apoio à imigração, conta com três escritórios, sendo estes, em Lisboa (sede), Porto e Aveiro ( https://waytoportugal.com/pt/ ).

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incide sobre esta experiência e aborda os problemas enfrentados durante as tarefas realizadas e os constrangimentos que resultaram do estágio ter sido em regime híbrido, presencial e teletrabalho.

O relatório inclui uma parte de cariz teórico que faz uma contextualização da cidadania estratégica pelo mundo e a sua evolução. Analisa-se aqui a mudança global do pensamento da cidadania e o caminho que esta percorre em direção à dupla cidadania, as migrações e visões que rodeiam a dupla cidadania, as perspetivas para o futuro da cidadania estratégica num contexto de mobilidade global, assim como, os seus impactos. Analisa-se também, o caso específico de Portugal e a sua cidadania, e a forma como novas mudanças estão a ocorrer e como estas podem vir a mudar a forma como a cidadania portuguesa é atribuída, relacionando-as com as migrações efetuadas para Portugal. Segue-se uma descrição das tarefas executadas no estágio, que servirá, também, de exemplificação e possível confirmação dos temas discutidos anteriormente.

Por fim, no capítulo relacionado com a minha experiência prática serão também apresentadas as principais dificuldades enfrentadas aquando do desempenho destas tarefas e algumas observações sobre a forma de corrigir estes problemas.

A Cidadania Estratégica

Origens

A instituição da cidadania moderna nasceu com a Revolução Francesa. É um culminar de um processo gradual em que a complexa gama de direitos e privilégios corporativos e individuais pré-modernos foi substituída por um sistema nacional unitário de direitos iguais (Harpaz, Mateos, 2018:3).

A partir desse momento, um processo gradual associado ao surgimento do liberalismo produziu mais duas mudanças importantes nos princípios de organização da atribuição de cidadania: 1) Uma mudança no final do século XIX da cidadania como um bem imutável para toda a vida e como “lealdade perpétua” a um status eletivo (mas ainda exclusivo); 2) Uma segunda mudança no final do século XX de filiação nacional exclusiva para a sobreposição, que está no foco desta questão especial (Harpaz, Mateos, 2018:3).

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Para os estados liberais democráticos modernos, a cidadania consiste fundamentalmente num estatuto legal que denota e proporciona a pertença a um determinado Estado. Enquanto estatuto legal, a cidadania implica um conjunto significativo de direitos e deveres, os quais estabelecem hoje em dia o fundamento formal da igualdade entre todos os cidadãos. A imigração em grande escala constitui um desafio para os estados, na medida em que dá origem à presença nos respetivos territórios de populações constituídas por membros “parciais” da sociedade dotados de direitos e deveres também eles “parciais” (Aleinikoff, Weil, 2001:60).

Quanto à mudança ocorrida no século XIX, em que a lealdade perpétua a uma nacionalidade e ao governo do seu país de origem era um “dever”, esta passou a uma lealdade mais liberalizadora, sobretudo no contexto de contestação entre as nações europeias e os seus antigos domínios coloniais na América (Harpaz, Mateos, 2018:4).

Assim, foi-se desenvolvendo um consenso internacional, entre os países, sobre a dupla nacionalidade, deixando esta de ser considerada como algo negativo e que sujeitava os seus requisitantes a acusações de traição e, espionagem, entre outras atividades subversivas. Foi a partir de 1868 que Bancroft promoveu o que veio a ser conhecido como “Tratado de Bancroft”, que assentava numa série de acordos bilaterais entre os EUA e vários países europeus que envolviam o reconhecimento, por parte destes, do direito dos seus emigrantes se naturalizarem nos EUA. Esta naturalização ficava, contudo, sem efeito caso estes voltassem ao seu país de origem por um período de dois anos (Harpaz, Mateos, 2018:4).

A doutrina de cidadania exclusiva baseava-se em duas “leis de ferro” que impediam a dupla nacionalidade; renúncia e eleição. O primeiro significava que o preço da adoção de uma nova cidadania era o abandono da anterior; a segunda significava que os cidadãos com dupla nacionalidade por nascimento em território de um país diferente do seu pai tinham de escolher apenas uma das suas nacionalidades ao atingir a maioridade (Harpaz, Mateos, 2018:4).

Entre o final do século XIX e o início do século XX, a migração em massa de europeus para as Américas e a Oceânia, levou a que milhões de imigrantes tenham optado por naturalizaram-se nos países de destino, renunciando à sua cidadania original.

A integridade do sistema de estado-nação de Vestefália foi, assim, preservada ao

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garantir que a jurisdição territorial de um Estado correspondesse à população que residia nesse Estado (Harpaz, Mateos, 2018:4).

Com a chegada do século XX, e durante a maior parte deste, a dupla nacionalidade continuou a ser vista como fundamentalmente oposta à formação da nova ordem internacional. A maior preocupação continuava a ser o problema do recrutamento militar para os cidadãos de dupla nacionalidade (Harpaz, Mateos, 2018:4).

Com a chegada dos anos 70, durantes os quais ocorreu uma mudança global em direção aos direitos individuais e à igualdade das mulheres, começou a autorizar-se que as mulheres que se cassassem com um cidadão de outro Estado mantivessem a sua nacionalidade de nascimento (originária), isto permitia que os filhos de casamentos binacionais mantivessem, também, ambas as nacionalidades dos pais e do país onde nasceram (Harpaz, Mateos, 2018:5).

As migrações tornam as sociedades mais diversas do ponto de vista cultural e social. Permitem a vinda de novos talentos e novas energias, o alargamento dos horizontes criativos de todos os membros e a expansão da força de trabalho local.

Contudo, as migrações podem constituir também uma fonte de tensões e ansiedades. As políticas de cidadania podem constituir um instrumento importante para promover a inclusão harmoniosa dos novos membros. Qualquer política eficaz de cidadania deverá procurar conjugar um conjunto complexo de fatores e ter em conta questões tão fundamentais quanto as que dizem respeito à pertença, ao empenho e à integração política e social. Nos estados liberais democráticos, as políticas de cidadania deverão ainda pautar-se pelas normas de justiça e equidade, as quais assumem uma importância crucial para os ideais liberais democráticos contemporâneos (Aleinikoff, Weil, 2001:60).

As últimas três décadas assistiram a uma mudança drástica em direção à plena aceitação e promoção da dupla nacionalidade. Esta mudança ocorreu num contexto internacional caraterizado pela globalização, a ausência de grandes conflitos e o surgimento de um regime internacional de direitos humanos que, de alguma forma, tende a refrear o campo de ação do Estado-nação.

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A mudança global em direção à dupla cidadania

A dupla cidadania constitui um fenómeno cada vez mais comum no mundo atual, apesar do ordenamento jurídico internacional se opor formalmente a esse estatuto (Aleinikoff, Weil, 2001:64).

O principal motivo subjacente à proliferação da dupla (e múltipla) nacionalidade é já um lugar-comum: o mundo está cada vez mais conectado, em resultado de tecnologias que facilitam imenso as comunicações, os transportes, o comércio e o desenvolvimento de mudanças políticas cada vez mais propícias ao comércio e aos investimentos internacionais. Pessoas de qualquer classe socioeconómica podem hoje residir fora dos seus países de origem. Consequentemente, tem-se assistido a uma proliferação dos casamentos e uniões entre pessoas de diferentes nacionalidades – e as crianças nascidas no seio dessas famílias adquirem tipicamente a nacionalidade de ambos os pais. Mesmo no caso em que ambos os progenitores têm a mesma nacionalidade, a sua residência fora do país de origem pode conferir a dupla nacionalidade às crianças através da naturalização ou do critério de jus soli (Aleinikoff, Weil, 2001:64).

Com efeito, os pressupostos a favor da nacionalidade exclusiva são cada vez menos convincentes e, existem razões cada vez mais fortes que justificam que os Estados liberais democráticos contemporâneos aceitem a dupla nacionalidade. Em primeiro lugar, o reconhecimento da legitimidade da dupla nacionalidade justifica-se por uma questão de respeito pela ligação dos imigrantes aos seus países de origem. Ao pretenderem aprofundar a sua ligação ao país de acolhimento, os imigrantes raramente desejam, ou consideram necessário, cortar completamente os laços com o seu país de origem – para além de que muitos imigrantes que desejariam eventualmente naturalizar- se poderão optar por não o fazer se a aquisição da cidadania do país de destino implicar a renúncia aos laços legais que os unem ao país de origem (Aleinikoff, Weil, 2001:65).

Nas últimas décadas existiu um aumento evidente quanto à aquisição de uma segunda nacionalidade/cidadania. Este aumento é notável em países das regiões da América, Europa e Oceânia, onde a mudança para a permissão de uma dupla cidadania foi cada vez maior.

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Com base em dados de 68 países podemos verificar (pelo gráfico 1em anexo), a percentagem de países em cada região do mundo que permitem a dupla nacionalidade, identificando-se um aumento exponencial em todas as regiões de pessoas que obtiveram uma segunda cidadania. A maior parte da aquisição de outra cidadania deu-se através da naturalização, mantendo os cidadãos a sua nacionalidade de origem. Nesta figura, a Europa Ocidental inclui a UE15 (Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal, Suécia, e aqui ainda se incluía o Reino Unido antes do Brexit), bem como a Suíça, Noruega e Islândia (18 países). O grupo da América Latina inclui países da América Central e do Sul, além da República Dominicana, Cuba e Haiti (21 países). Os países da Europa Central e Leste incluem os membros pós-comunistas da UE, bem como a Rússia, Bielorrússia, Moldávia, Ucrânia, Geórgia, Azerbaijão, Arménia, Turquia e Malta (10 países em 1990, 25 em 2010) (Harpaz, Mateos, 2018:5).

O mesmo gráfico demonstra a mudança na aceitação da dupla nacionalidade pelos Estados: em 1990, menos de um terço dos países da Europa e das Américas admitiam a dupla nacionalidade; em 2010, foi aceite por quase quatro quintos desses países. Isso representa uma mudança drástica, em relação a um status, que até recentemente era considerado altamente problemático. No espaço de duas décadas, a permissão da dupla nacionalidade tornou-se a nova norma na Europa e nas Américas.

Quanto às outras regiões do globo é escassa a informação sobre o aumento da aquisição de dupla nacionalidade. No entanto, sabe-se que existiu também um aumento nessas regiões como o Leste e o Sul da Ásia, ou mesmo o Médio Oriente e a África, mas este aumento não foi tão drástico como nas regiões apresentadas no gráfico (Harpaz, Mateos, 2018:6).

Num contexto de um mundo global “a dupla nacionalidade traduz frequentemente a realidade das identidades e ligações complexas que caracterizam um mundo cada vez mais interligado. Em vez de ser sistematicamente vedado, o estatuto de dupla nacionalidade deverá ser expressamente aceite e gerido de forma ponderada”

(Aleinikoff, Weil, 2001:65).

Esta aceitação da dupla nacionalidade pelas diferentes regiões é uma prova de que a visão ou pensamento da forma como a cidadania é vista está sempre em constante

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mudança. Assim, é importante saber como as migrações têm impacto na forma como a cidadania é vista e que visões se vêm criando ao redor desta.

Migração e as Visões que rodeiam a dupla cidadania

Como já referi a cidadania é um vínculo político e jurídico entre um indivíduo e o Estado. Deste vínculo surgem direitos e deveres que devem ser respeitados por ambas as partes. No entanto, as migrações internacionais geram uma incompatibilidade entre o território e a cidadania, no sentido dos cidadãos do Estado emissor (os emigrantes) que vivam no estrangeiro e os imigrantes que se estabeleçam nos países de acolhimento, criando dois tipos de problema que têm de ser resolvidos.

O primeiro surge logo com o tema dos direitos e obrigações que estes cidadãos têm perante os Estados originários e recetores, e se estes podem afastar os seus nacionais sem interferir com o outro Estado (Bauböck, 2002:4).

O segundo é que a presença de cidadãos estrangeiros no território de um Estado cria outro conjunto de problemas associados a legitimações liberais e democráticas da autoridade política. Numa perspetiva liberal, o governo é legítimo apenas na medida em que garante igual liberdade e proteção a todos sob o seu domínio (Bauböck, 2002:4). A proteção externa para residentes estrangeiros por parte dos Estados de envio não é suficiente quando eles enfrentam legislação arbitrária que os discrimina no país recetor.

Duas soluções para este problema foram combinadas nas democracias liberais: os privilégios tradicionais de cidadania foram desconectados da nacionalidade, redefinindo-os como direitos humanos universais ou anexando-os à residência e ao emprego. A lista inclui liberdades civis e políticas, e direitos de bem-estar social, bem como direitos relevantes para os migrantes, como reagrupamento familiar ou imunidade de deportação (Bauböck, 2002:4).

Exceto os diplomatas, os cidadãos estrangeiros estão totalmente sujeitos à legislação do seu Estado de residência. No entanto, eles geralmente não estão representados na elaboração dessas leis. Uma discrepância deste tipo mina as razões destes de obedecer às leis. Existem assim duas soluções possíveis e mutuamente compatíveis: a) o Estado dominante (recetor) deve encorajar, acelerar e facilitar o acesso à cidadania através da naturalização ou do nascimento no território: b)

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geralmente, menos escolhida, passa por estender o direito do voto a residentes estrangeiros (Bauböck, 2002:4).

A discussão de tornar a cidadania mais inclusiva nas sociedades expostas à migração está longe de ser totalmente aceite quando se trata de reformas políticas. Neste âmbito, é examinada a questão da aquisição da dupla nacionalidade, nomeadamente, na Europa Ocidental e na América do Norte, onde existe um maior aumento de pedidos de nacionalidade, pois estas são regiões consideradas estáveis e progressistas, o que revela um sentimento de segurança e o desejo de cidadãos terceiros conseguirem estabilidade e melhores oportunidades. Isto desperta duas questões relevantes para as políticas dos Estados (Bauböck, 2002:5).

Em primeiro lugar, a aceitação da dupla nacionalidade por um país aumenta a probabilidade dos imigrantes se naturalizarem? Embora a resposta a esta pergunta seja positiva, é um pouco complicado de se explicar. Verifica-se que a cidadania original (de nascimento) dos imigrantes desempenha um papel ainda maior do que a política do país destino na determinação da probabilidade de naturalização. Os imigrantes de países de baixo rendimento são mais propensos a naturalizar-se do que os de países de rendimento mais elevado (Bauböck, 2002:6-7).

Em segundo lugar, os imigrantes naturalizados com dupla nacionalidade são menos “enraizados”? A literatura sugere provisoriamente que os imigrantes com dupla nacionalidade podem estar menos envolvidos emocional e politicamente às suas novas terras natais do que os imigrantes que só têm uma nacionalidade, no entanto, estes tendem a sair-se melhor economicamente (Bauböck, 2002:5-6).

A Cidadania como forma de integração

As comunidades de origem imigrante incluem tanto cidadãos como não- cidadãos. A integração política destas minorias étnicas depende não só dos seus direitos a título individual, como também das oportunidades e incentivos à participação na vida política. Os imigrantes podem enfrentar uma falta de representação nos países em que se encontram, o que leva à existência de obstáculos estruturais à participação ou de fenómenos de marginalização social das minorias étnicas, especialmente nos casos em que estas estão há muito instaladas no país de destino. A preparação ao nível da

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sociedade civil conduz os imigrantes para a participação política e proporciona-lhes a capacidade de influenciarem o processo de decisão política (Aleinikoff, Weil, 2001:71).

No entanto, estes imigrantes continuam a escolher estes países de destino porque as disparidades de rendimento entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento são tão grandes que os apoios sociais concedidos pelos países de acolhimento são muitas vezes superiores às oportunidades de rendimento existentes nos países de origem (Aleinikoff, Weil, 2001:75).

Em muitos países, a cidadania é um critério relevante no acesso ao emprego no sector público, como, por exemplo, em França em que, todos os empregos nos hospitais, caminho-de-ferro e serviços postais estão reservados a cidadãos da UE; A Alemanha impede todo e qualquer acesso por parte de cidadãos de países terceiros à função pública, incluindo os empregos em jardins-de-infância e nas empresas públicas de transporte (Aleinikoff, Weil, 2001:75).

No entanto, existem também motivos fortes para uma adoção de políticas mais inclusivas no que se refere ao acesso dos estrangeiros aos empregos no sector público.

Os imigrantes representam uma fatia crescente da força de trabalho e a sua exclusão da função pública constitui uma restrição ao acesso por parte do sector público a uma importante reserva de mão-de-obra e de competências (Aleinikoff, Weil, 2001:76).

Com a mudança demográfica proporcionada pelo aumento da imigração e para uma melhor integração, tem sentido incluir membros de minorias linguísticas (e outras) na função pública, de modo a promover uma melhor comunicação entre as comunidades de origem imigrante, as forças policiais, o sistema de ensino público, as repartições públicas, etc. Isto iria ajudar a ter abordagens mais inclusivas e fomentar a identificação dos imigrantes para com o Estado e a nação, em vez de promover a sua (auto) exclusão (Aleinikoff, Weil, 2001:76).

As regras de acesso ao emprego, assim como as regras de acesso à proteção social e aos serviços públicos, deverão ser concebidas de forma a promoverem a integração dos imigrantes permanentes e os Estados deverão implementar políticas de combate à discriminação, as quais, a par de mecanismos bem concebidos e adequadamente financiados de salvaguarda do respeito pela lei, poderão constituir

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instrumentos importantes para a proteção do direito dos imigrantes ao acesso ao emprego no sector privado (Aleinikoff, Weil, 2001:77-78).

A cidadania estratégica num contexto de mobilidade global

Com o avanço da globalização, a capacidade de movimentar-se livremente entre fronteiras tornou-se cada vez mais crucial. Atualmente estamos a assistir a novas vagas de pessoas que procuram uma dupla cidadania, esta vaga é caraterizada por ser, em grande parte, composta por pessoas da América Latina, descendentes de imigrantes europeus que querem “readquirir” a nacionalidade dos países de origem dos seus ancestrais, enquanto outros baseiam-se em antecedentes de migração ou o próprio local de nascimento para garantir a cidadania (Harpaz, Mateos, 2018:10-11).

As implicações na mobilidade decorrentes do status de dupla cidadania ultrapassam de longe os resultados do statusde residência permanente do migrante, uma vez que representa um “direito de readmissão” permanente e herdável em várias nações, não apenas no país que concedeu a cidadania, mas também em países terceiros, através da isenção de visto para viagens e espaços regionais de integração económica e laboral.

As desigualdades criadas por tais direitos de mobilidade assimétricos embutidos na cidadania foram mesmo classificadas em todo o mundo. O grau de liberdade de viagem inerente a um passaporte está intimamente relacionado à posição do país emissor nas hierarquias globais de desenvolvimento, estabilidade e prestígio (Harpaz, Mateos, 2018:11).

No caso de uma segunda cidadania de um país ocidental obtida por cidadãos de países não ocidentais pode ser descrita como “cidadania compensatória”: a cidadania secundária oferece vantagens globais que a primária do país de residência carece em termos de mobilidade, oportunidades económicas, segurança ou status. Ou seja, os migrantes que acedem a uma segunda nacionalidade, veem, frequentemente, o seu segundo passaporte como uma “apólice de seguro” (Harpaz, Mateos, 2018:11).

Isto significa que a camada superior de direitos de nacionalidade não está mais restrita a indivíduos nascidos ou residentes em países ocidentais. A dupla cidadania tem o potencial de aprofundar e consolidar as disparidades de classe e etnia de maneira que desafiam a igualdade fundamental e o destino compartilhado, onde estas estão

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associadas ao ideal de uma cidadania nacional. A dupla cidadania pode assim, contribuir, para a consolidação de uma elite global ocidentalizada enquanto aprofunda as desigualdades internas em países não ocidentais (Harpaz, Mateos, 2018:11-12).

Portugal é um dos países que beneficia desta cidadania compensatória, por ser um país europeu, ocidental, com boas políticas de imigração, seguro, com oportunidades económicas, com descendentes de portugueses pelo mundo e com um passaporte poderoso, tendo em 2022 chegado ao quinto lugar no ranking mundial (Passe/Porta, 2022).

Torna-se, por isso, relevante, saber se Portugal é um país recetor de imigrantes, a avaliação que os portugueses fazem da imigração, o contributo dos imigrantes para a demografia portuguesa (sobretudo para contrariar o baixo envelhecimento populacional e o aumento de mão de obra jovem ativa), e o modo como os imigrantes adquirem a cidadania portuguesa. É importante perceber, também, as dificuldades enfrentadas pelos imigrantes na obtenção da cidadania e que passos podem ser tomados para tornar a cidadania portuguesa mais estratégica tanto para estes imigrantes como para Portugal, tornando-a mais apelativa para estes e tentando corrigir os dois maiores problemas demográficos portugueses já citados, o envelhecimento e a falta de mão de obra ativa.

Portugal um país recetor de imigrantes

No século XXI, Portugal, passou a registar com maior intensidade a presença simultânea de dois fluxos nos movimentos migratórios. O primeiro, a emigração portuguesa para encontrar melhores condições de vida, nomeadamente, por razões económicas. O segundo de imigrantes que chegam a Portugal com o objetivo de alcançar, uma melhor estabilidade, segurança e/ou económicos. Este fenómeno coloca Portugal numa posição particular à escala da União Europeia, sendo simultaneamente recetor e emissor de migrantes. Assim, Portugal é caraterizado por ter um regime migratório misto (Costa, 2009:3).

De acordo com Costa (2009) “Portugal como Espanha, Itália e Grécia, tiveram uma transição de países de emigração para países de imigração, onde os fluxos imigratórios ganharam grande expressividade”. No entanto, Portugal destaca-se entre

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estes países, pois é o único a ser um país recetor de fluxos migratórios e ao mesmo tempo onde a emigração continua a ter grande expressividade (Costa, 2009:3).

Segundo o relatório estatístico anual de 2021, relativo aos indicadores de integração de imigrantes, em Portugal, até 2019, a população em geral tende a desvalorizar a questão da imigração, sendo que esta não surge como um problema principal do país. A partir de 2020 e 2021, existe uma mudança nesta perceção da imigração, passando a imigração a ser considerada uma questão principal. Portugal surge no grupo de países em que a imigração é considerada “boa” ou “muito boa” para o desenvolvimento do país, tendo pouca expressão o universo dos que consideram a imigração como “má” (12,1%) ou “muito má” (1,6%) (Oliveira, 2021:24-25).

Imigração e Demografia

Existem diversos fatores que condicionam a evolução numérica das populações, a sua dispersão e a sua estrutura etária, nomeadamente o número de nascimentos, os casamentos, os óbitos e as migrações. Os nascimentos são um dos fatores mais importantes, estes acrescentam população, rejuvenescendo-a. Os óbitos subtraem a população e podem envelhecê-la ou rejuvenescê-la conforme as idades em que a mortalidade tenha maior incidência. Por último, temos as migrações, que podem acrescentar (imigração) ou subtrair (emigração) à população, bem como rejuvenescê-la ou envelhecê-la consoante os grupos de idades mais envolvidos. As migrações são um dos principais acontecimentos demográficos, ditando o crescimento (ou não) da população, e estabelecendo a sua estrutura e distribuição (Oliveira, 2021:57).

Portugal destaca-se como um dos países mais envelhecidos do mundo, pelo que o tema da relação entre o envelhecimento e imigração manifesta-se como incontornável.

Para um país pode-se considerar três motivos do envelhecimento demográfico, sendo a retração do número de filhos; a diminuição da mortalidade ou controlo desta, levando ao aumento da esperança média de vida e o aumento do número de pessoas com idades mais avançadas; e os fluxos migratórios – a saída de pessoas, especialmente dos grupos em idade fértil e ativa, quando estes não são compensados pela entrada de imigrantes, o que leva ao aumento de uma população envelhecida no país e à menor taxa de nascimentos (Oliveira, 2021:61).

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Portugal encontra-se no grupo dos países europeus onde a fragilidade demográfica é grave, estando localizado no quarto posto dos países da UE27 com maior proporção de idosos, o que traz importantes consequências ao nível da evolução da população, como pode ser visto pelo gráfico 2 (em anexo).

Isto torna necessário que se procure equilibrar a estrutura etária da população, em especial nos seus grupos mais jovens, em idade fértil e em idade ativa, atenuando o envelhecimento da população portuguesa. No gráfico 3 (em anexo) é possível notar que a população de nacionalidade estrangeira tem tendência a ser mais jovem do que a população de nacionalidade portuguesa. A estrutura demográfica da população estrangeira residente em Portugal diverge consideravelmente da estrutura demográfica da população portuguesa. Com efeito, os estrangeiros relevam uma grande concentração nas idades ativas, entre 20-49 anos encontram-se 60,6% dos estrangeiros, em 2019, enquanto na população de nacionalidade portuguesa o valor dos que integram este grupo etário é de 36,6%. Nas idades mais avançadas (65 anos ou mais) a relação é inversa, encontrando-se 9,5% dos estrangeiros e 22,9% de portugueses neste grupo de idades em 2019 (Oliveira, 2021:70). Assim, observa-se o agravamento do envelhecimento demográfico português tanto pela base como pelo topo, resultante quer do aumento da população idosa, quer da diminuição da população jovem.

Duas outras dimensões que podem contribuir, também, para a demografia portuguesa são a natalidade e a nupcialidade.

Os nados-vivos de mãe com nacionalidade estrangeira e residência em Portugal têm aumentado ao longo dos anos, sendo que entre 2001 e 2010 mais do que duplicaram, atingindo o seu valor máximo nesse último ano, onde estes nascimentos representaram 10,6% do total de nascimentos. Entre 2011 e 2015, os nados-vivos de mães deste grupo perderam importância relativa, justificando-se pelo decréscimo de população estrangeira residente em Portugal e a diminuição das entradas de população estrangeira, nomeadamente, em idade fértil. A partir de 2016, os nados-vivos de mães estrangeiras residentes em Portugal voltaram a crescer, sendo que neste ano representaram 8,8%; em 2017 para 9,7%; em 2018 para 11%; em 2019 para 12,7%

(11.105) e finalmente, em 2020, para 13,5% (11.439) (Oliveira, 2021:72).

Concluindo, observa-se na tabela 1 (em anexo) um aumento gradual de nados- vivos de mães estrangeiras residentes em Portugal desde 2016, atingindo a importância

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relativa mais expressiva da década em 2020, onde em 2019 e 2020, 13 em cada 100 nados-vivos foram de mãe estrangeira; quando apenas 6 em cada 100 residentes eram estrangeiros.

Quanto à nupcialidade (gráfico 4, em anexo), observamos que tal como em 2008, em 2016, Portugal surge entre os países onde a taxa de endogamia entre os naturais e os estrangeiros é menor. No entanto, esta menor prevalência de endogamia entre os nativos dos países europeus associa-se principalmente a países de imigração mais antiga, nos quais a percentagem de casais mistos cresceu com o aumento do número de filhos de imigrantes ou descendentes já nacionais desses países como a França (76,6% em 2008 e 74,1% em 2016) ou no Luxemburgo (62% em 2008 e 64,5%

em 2016). Na taxa de endogamia de nativos, Portugal apresenta uma tendência semelhante à observada em outros países de imigração recente: com taxas de endogamia entre cidadãos nativos de 94,9% em 2008 e 91,9% em 2016, similares às observadas em países como a Grécia (95,3% em 2008 e 96,9% em 2016) e a Espanha (94, 3% em 2008 e 93,7% em 2016) (Oliveira, 2021:75).

Examinado em maior pormenor os indicadores publicados pela OCDE, identifica-se que Portugal é um dos países da União Europeia com maior discrepância entre a taxa de endogamia de cidadãos nativos e de cidadãos imigrantes (nascidos no estrangeiro) (Oliveira, 2021:76).

A importância relativa de casamentos mistos em Portugal deve receber alguns pontos enquadradores: os casamentos mistos em Portugal podem esconder, na realidade, algumas situações de casamentos mistos entre cônjuges naturais do estrangeiro, isto é, entre cidadãos de nacionalidade estrangeira e “novos” cidadãos portugueses, isto é, naturais do estrangeiro que entretanto adquiriram a nacionalidade portuguesa que influencia outros casamentos mistos que compõem também casamentos entre cônjuges portugueses com descendentes de emigrantes portugueses já com outras nacionalidades (Oliveira, 2021:76).

Em Portugal, divergindo com a tendência da década anterior, desde 2011 (em especial entre 2013 e 2015) que os casamentos mistos (entre portugueses e estrangeiros) diminuíram: de 2011 para 2014, observou-se um decréscimo de -9,7%, recuperando gradualmente entre 2015 e 2018 (+1.293 casamentos mistos de 2014 para 2018), registando-se uma nova diminuição em 2019 (-134 casamentos mistos face a 2018) e

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particularmente em 2020 (-1.607 casamentos mistos face a 2019). Por sua parte, em 2020, existiu, também um decréscimo acentuado da endogamia, relacionando-se isto com o contexto atual pandémico de COVID-19, em que as medidas de contenção da pandemia, como o isolamento e confinamento de residentes, tiveram e têm impacto na vida dos cidadãos, ao nível, por exemplo, da mobilidade e do contacto social (Oliveira, 2021:77).

Análise da composição dos imigrantes em Portugal

Fazendo uma análise dos dados do SEF (gráfico 5, em anexo), da composição dos imigrantes em 2020, em Portugal, apresenta as seguintes caraterísticas (SEF/GEPF, 202:21):

 A nacionalidade brasileira continua no topo, sendo a principal comunidade estrangeira residente representando 27,8% do total. Verificamos também uma subida de posição do Reino Unido em relação a 2019 e em terceiro lugar temos Cabo Verde (SEF/GEPF, 2021:21).

 Outros países e cidadãos estrangeiros a destacar são países europeus como a Roménia, Ucrânia, Itália e França, que confirmam a atratividade de Portugal, como país seguro, bem como vantagens fiscais decorrentes do regime para o Residente não habitual (SEF/GEPF, 2021:21).

 Para finalizar destaca-se a China, Índia e Angola. Ainda que o número de chineses tenha decrescido continuam a ocupar o 7º lugar na população estrangeira residente em Portugal (SEF/GEPF, 202: 21).

Quanto à distribuição geográfica dos cidadãos estrangeiros residentes por continente (gráfico 6, em anexo), podemos notar um acréscimo generalizado, sendo da América do Sul a maior percentagem, devido ao Brasil (+21,2%) (SEF/GEPF, 202:22).

Este fenómeno acontece devido a diferentes aspetos, como os contextos económicos e sociais de Portugal e dos países de origem, a evolução legislativa, as relações históricas e culturais, e os impactos da operacionalização de políticas de imigração. Quanto ao nível económico a melhoria na taxa de crescimento real do PIB português e da evolução da população estrangeira, aliados a uma conjuntura económica favorável, observada nos últimos anos, especialmente o crescimento do emprego,

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potenciaram o crescimento da população estrangeira no período compreendido entre 2015 e 2020 (SEF/GEPF, 202:19-20).

A Nacionalidade

A Nacionalidade e Cidadania na Europa: as principais tendências e os seus impactos

A nacionalidade ou cidadania já foi considerada como sendo a base para todas pessoas: direitos civis, participação política, bem-estar social, identidade e reconhecimento, o bem comum e a consciência de comunidade. Formalmente, a nacionalidade é definida como o vínculo jurídico entre uma pessoa e um Estado, cabendo a cada Estado determinar, segundo a sua própria lei, quem são os seus nacionais. No entanto, com o desenvolvimento dos direitos humanos desde a Segunda Guerra Mundial, a tendência tem sido no sentido do reconhecimento do direito a uma nacionalidade como um direito humano e foi aceite que, em matéria de nacionalidade, os Estados também devem levar em conta os interesses individuais (Bauböck, Ersbøll, Groenendijk, Waldrauch, 2006:15-17). A nacionalidade não liga apenas um indivíduo a um Estado, mas também indivíduos ao direito internacional. Na UE, também fornece aos indivíduos o acesso a um conjunto específico de direitos dentro desta União supranacional (Bauböck, Ersbøll, Groenendijk, Waldrauch, 2006:15-17).

A nacionalidade numa perspetiva histórica é um fenómeno recente. Substituindo o sistema tradicional de senhor e súbdito, a nacionalidade não pode mais ser determinada como uma relação pessoal de fidelidade, mas sim como um status legal abraçando um conjunto de direitos e obrigações mútuos em relação a uma entidade que preencha certos requisitos para a existência de um Estado soberano (Hailbronner, 2006:35-37). Poderes soberanos, um território definido e a existência de uma nação são, geralmente, consideradas condições necessárias para a existência de um Estado no sentido do direito internacional público, incumbindo a competência e os poderes soberanos aos Estados (Hailbronner, 2006:35-37).

A nacionalidade determina o âmbito de aplicação dos direitos básicos e das obrigações dos Estados perante outros Estados e perante a comunidade internacional,

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como a jurisdição pessoal, a aplicação de tratados e a proteção diplomática. No direito interno, a nacionalidade é um requisito fundamental para o exercício de direitos políticos e reivindicações de proteção e deveres correlatos, como obrigações de serviço militar ou civil, que pode, no entanto, variar de acordo com a legislação nacional (Hailbronner, 2006:35-37). O Tribunal Internacional de Justiça descreveu a nacionalidade como “um vínculo jurídico tendo por base um fato social de vinculação, uma conexão de existência, interesses e sentimentos, juntamente com a existência de direitos e deveres recíprocos” (Hailbronner, 2006:35-37). Pode-se dizer que constitui a expressão jurídica do facto de que a pessoa a quem é conferida a nacionalidade diretamente por lei ou por ato das autoridades, está, de facto, mais intimamente ligada à população do Estado que lhe conferiu a nacionalidade do que à de qualquer outro Estado (Hailbronner, 2006:35-37).

Desde o século XIX, os Estados cooperam em questões de nacionalidade. Uma série de convenções bilaterais foram concluídas entre países de imigração e emigração, muitas vezes com o objetivo de resolver problemas relacionados com a dupla nacionalidade e o serviço militar. No século XX, uma série de convenções gerais internacionais e regionais sobre questões de nacionalidade foram concluídas. A Convenção de Haia sobre os conflitos de leis em matéria de nacionalidade (1930) foi o primeiro tratado multilateral sobre o direito da nacionalidade. Com a adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), foi reconhecido o direito de todos a uma nacionalidade (Bauböck, Ersbøll, Groenendijk, Waldrauch, 2006:21).

A nacionalidade como fator determinante nas relações internacionais está intimamente relacionado com o conceito de Estado soberano. Com a perceção da mudança de soberania, em resultado de um mundo globalizado, interdependente e integrado em regimes internacionais, a nacionalidade perdeu muito da sua função. A nacionalidade não pode mais ser considerada o único e exclusivo vínculo jurídico entre um indivíduo e um país de origem. O número crescente de cidadãos com dupla nacionalidade e a mudança de atitude dos Estados que lidam com a nacionalidade múltipla indica uma mudança nas perceções tradicionais de nacionalidade (Hailbronner, 2006:35-37).

A este título importa referir a Convenção Europeia sobre a nacionalidade que constitui um acordo internacional que visa estabelecer normas e princípios em matéria

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de nacionalidade de pessoas singulares, bem como as normas que regulamentam as obrigações militares em casos de pluralidade de nacionalidades, pelos quais os Estados Partes se deverão reger.

A Convenção Europeia sobre a Nacionalidade (CEN) é considerada uma das mais importantes convenções do Conselho da Europa. A influência da Convenção flexibilizou os requisitos para a aquisição da nacionalidade, nomeadamente em matéria de tolerância de múltiplas nacionalidades, evitando as situações de apátridas e igualdade de género em relação à transferência de nacionalidade às crianças. Em termos de medidas restritivas, a CEN assumiu um incentivo para alterações recentes levando à retirada da nacionalidade em casos de fraude ou conduta prejudicial aos interesses vitais do Estado (Bauböck, Ersbøll, Groenendijk, Waldrauch, 2006:21-22).

O artigo 2º desta convenção, começa por estabelecer várias definições como, nacionalidade, pluralidade de nacionalidades, menor e direito interno. Sendo que a nacionalidade “designa o vínculo jurídico entre um indivíduo e um Estado, não indicando, contudo, a origem étnica desse indivíduo” e a pluralidade de nacionalidades

“designa a posse simultânea, por um mesmo indivíduo, de duas ou mais nacionalidades”

(Acnur, 1997).

A Convenção Europeia, que descreve os princípios gerais relativos à nacionalidade, afirma, ainda que de forma cautelosa que as regras sobre a nacionalidade de cada Estado Parte devem basear-se nos seguintes princípios:

– Todos têm direito à nacionalidade;

– Apátridas devem ser evitados;

– Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade;

– Nem o casamento, nem a dissolução de um casamento entre um nacional de um Estado Parte e de um estrangeiro, nem mudança de nacionalidade por um dos cônjuges durante o casamento afetará automaticamente a nacionalidade do outro cônjuge (Hailbronner, 2006:52-54).

A Convenção confirma o princípio da soberania ao afirmar no art.3º que cada Estado determinará de acordo com sua própria lei quem são seus nacionais. Esta lei será aceite pelos outros Estados na medida em que seja consistente com as convenções

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internacionais aplicáveis, normas internacionais e os princípios de direito geralmente reconhecidos no que diz respeito à nacionalidade (Hailbronner, 2006:52-54).

O pressuposto é de promover a convergência de políticas de naturalização mais liberais, com o objetivo de incluir grandes grupos de imigrantes residentes permanentes.

A naturalização tem sido percebida e utilizada como um instrumento de apoio à integração de imigrantes. Assim, a aquisição da nacionalidade pela segunda geração imigrantes foi facilitada, os requisitos para naturalização por imigrantes de primeira geração foram reduzidos e a nacionalidade múltipla foi aceite (Bauböck, Ersbøll, Groenendijk, Waldrauch, 2006:23).

Aquisição da nacionalidade por descendência (ius sanguinis) ou por nascimento no território (ius soli)

A aquisição da nacionalidade por descendência de um nacional ou por nascimento dentro território estadual são os modos predominantes de aquisição da nacionalidade. Dificilmente existe qualquer disputa de que os dois critérios sejam sancionados por direito internacional como critérios comumente reconhecidos por outros Estados como base para aquisição da nacionalidade. Um levantamento da prática dos Estados leva à conclusão de que os sistemas jurídicos dos Estados são baseados no princípio do ius sanguinis ou ius sanguinis ou do ius soli. Os sistemas diferem apenas na medida em que ius soli ou outros critérios são aceites como modos igualmente válidos de aquisição da nacionalidade. Os sistemas também podem diferir na forma como o nascimento no estrangeiro pode limitar a aquisição de nacionalidade por descendência (Hailbronner 2006:54-58).

A aquisição da nacionalidade por nascimento no território (ius soli) é igualmente reconhecida como critério para a atribuição da nacionalidade. Em graus variados, as leis de um grande número de estados baseiam-se em ambos os princípios. Na Europa, o ius soli como motivo adicional para aquisição de nacionalidade pela segunda geração de migrantes tem recebido um apoio crescente (Hailbronner, 2006:54-58).

No entanto, o ius sanguinis continua a ser a regra dominante para a aquisição da cidadania em todo o mundo. É verdade que nas Américas o princípio mais forte é o ius

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soli, mas mesmo nesta região os nascidos no estrangeiro de pais cidadãos nascidos no país são reconhecidos como nacionais de nascimento (Bauböck, 2018:83).

Aquisição por naturalização

A naturalização, ou seja, a concessão de nacionalidade a um estrangeiro por um ato, é vista também como forma de aquisição da nacionalidade. Esta pode ser concedida de várias formas, variando de acordo com a lei interna de cada Estado. A naturalização pode ser concebida por serviços prestados a um Estado, por, afiliações étnicas, ou devido à residência continuada num Estado. Esta última é uma das razões mais comuns para a aquisição voluntária de nacionalidade (Hailbronner, 2006: 58-59).

Assim, os Estados utilizam a naturalização para uma melhor integração dos imigrantes nos seus países, possibilitando a naturalização através da satisfação de critérios como a residência prolongada, casamento, adoção e outros tipos de vínculo particular (Hailbronner, 2006:58-59).

Perda da Nacionalidade

As limitações à liberdade dos estados para determinar os seus nacionais são mais notavelmente reconhecidos na literatura e jurisprudência internacional sobre a perda e privação da nacionalidade. Em regra, a perda da nacionalidade pode ocorrer como resultado de uma declaração de renúncia de nacionalidade que, no entanto, é válido em qualquer caso apenas com a aceitação de o Estado (Hailbronner, 2006:67-69).

A situação jurídica relativa à perda da nacionalidade pode ser um pouco mais clara no que diz respeito à perda involuntária da nacionalidade. Há um uma série de razões que são claramente reconhecidas na prática estatal e codificada no art. 7, par. 1 da CEN:

– aquisição voluntária de outra nacionalidade;

– aquisição da nacionalidade por conduta fraudulenta;

– serviço voluntário numa força militar estrangeira;

– conduta gravemente prejudicial ao interesse vital do Estado-parte;

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– falta de vínculo genuíno entre o Estado-parte e o nacional que habitualmente reside no exterior;

– adoção de criança se a criança adquirir ou possuir a nacionalidade estrangeira de um ou de ambos os pais adotivos (Hailbronner, 2006:67-69).

No que se refere à questão da pluralidade de nacionalidades, que é o que nos interessa particularmente neste trabalho, estabeleceu-se que cada Estado é livre de decidir quais as leis que pretende aplicar e quais as suas consequências através do seu direito interno, chegando, assim, a um consenso no interesse da descoberta de soluções adequadas para as consequências da pluralidade de nacionalidades, abrindo espaço para que cidadãos possuíssem várias cidadanias. Desta forma, a CEN, definiu uma clara tendência para uma tolerância mais liberal de nacionalidade múltipla. Um grande número de estados europeus alteraram a sua legislação para aceitar a nacionalidade múltipla para determinados categorias de imigrantes, tendo em conta a ligações com o seu país de origem (Hailbronner, 2006:82-83).

Em Portugal, por exemplo, a nacionalidade múltipla é reconhecida e aceites e a posição do país de origem na dupla nacionalidade não é obstáculo à obtenção da nacionalidade portuguesa. Também não há exigência de renúncia em Espanha, exceto para nacionais de países que assinaram acordos de dupla nacionalidade com Espanha (Chopin, 2006:251).

Nacionalidade Portuguesa

Em Portugal, o quadro jurídico é tolerante à dupla e até múltipla nacionalidade.

Portugal não assinou quaisquer convenções internacionais destinadas a evitar dupla nacionalidade (Baganha, Sousa, 2006:435-437).

O artº. 14 da Constituição estabelece que os cidadãos portugueses que residiram temporária ou habitualmente no estrangeiro gozam da proteção do Estado no exercício dos seus direitos, e estarão sujeitos aos deveres que não sejam incompatíveis com sua ausência do país. O fato de um cidadão português viver no estrangeiro não põe em causa estes direitos. Os descendentes são portugueses de nascimento, se declararem que

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desejam ser portugueses ou se o nascimento está registado no registo português de nascimentos. Além disso, o cônjuge estrangeiro tem o direito de optar pela nacionalidade portuguesa, caso seja casado há pelo menos três anos, mas existem bases legais para o Estado Português se opor a isso. Se os residentes portugueses no estrangeiro estiverem registados no consulado para fins eleitorais, ou se encontrem em território português, podem votar e concorrer às eleições parlamentares e presidenciais (Baganha, Sousa, 2006:435-437).

As pessoas que adquiriram a nacionalidade portuguesa após o nascimento usufruem o mesmo status que aqueles que a adquiriram com o nascimento, exceto para a elegibilidade para ocupar o cargo de Presidente da República, uma vez que o artº. 122 da Constituição estabelece que apenas os cidadãos de origem portuguesa, ou seja, que tenham adquirido nacionalidade portuguesa de nascimento, são elegíveis como Presidente da República. Por outro lado, usufruem de medidas mais favoráveis no que diz respeito aos deveres militares, sendo estes dispensados do serviço caso adquiram a nacionalidade portuguesa aos dezoito anos ou mais tarde (Baganha, Sousa, 2006:435- 437).

A atribuição da nacionalidade portuguesa

Desde o ano de 2006 que Portugal tem sido reconhecido internacionalmente por ter passado a constar entre os países do mundo com melhor enquadramento legal para a aquisição da nacionalidade (Oliveira, 2021:333). Segundo a OCDE, o país, teve uma evolução muito positiva na promoção da obtenção da nacionalidade na sua população imigrante residente: “numa década, Portugal passou da cauda dos países europeus com menor importância relativa de “novos cidadãos”” por total de estrangeiros residentes, para o extremo oposto, com uma das maiores percentagens de aquisições de nacionalidade por total de residentes estrangeiros (apenas superado pela Suécia em 2016)” (Oliveira, 2021:333).

De acordo com os dados do EUROSTAT, em 2019 (gráfico 7, em anexo), Portugal continuou a posicionar-se entre os países com melhores resultados na aquisição da nacionalidade por total de residentes estrangeiros, mesmo sendo ultrapassado em 2019 pela Roménia e a Suécia (Oliveira, 2021:334).

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O ano de 2020 surge como o ano em que um maior número de cidadãos adquiriu a nacionalidade portuguesa (quase 104 mil num único ano) (Oliveira, 2021:334). Como pode ser verificado nas tabelas 2 e 3 (em anexo).

É de realçar, pelo gráfico 8 (em anexo), que de 2019 a 2020 houve um aumento exponencial da aquisição da nacionalidade, sobretudo, da aquisição da nacionalidade portuguesa por forma derivada, que entre 2006 e 2016, dominou o canal de acesso à nacionalidade portuguesa para a maioria dos novos cidadãos portugueses: “entre 401.669 novos cidadãos portugueses, para o período entre 2007 e 2016, perto de 60%

adquiriu a nacionalidade derivada, assumindo o ano de 2009 o valor mais elevado (73,4% das concessões de nacionalidade portuguesa). Entre 2017 e 2019, porém, observa-se uma mudança de tendência, verificando-se que as atribuições da nacionalidade (51,8% das concessões de nacionalidade) suplantaram as aquisições de nacionalidade (48,2%), refletindo um crescimento constante das atribuições que se verifica desde 2015. Em 2020, porém, volta a inverter-se a tendência, voltando as aquisições de nacionalidade portuguesa (nacionalidade derivada) a suplantar as atribuições de nacionalidade originária (42,5%) ” (Oliveira, 2021:336-337).

O acesso a nacionalidade portuguesa

A partir de 2006 a lei da nacionalidade portuguesa sofreu alterações profundas que visaram facilitar a aquisição desta, ganhando mais importância o princípio do ius soli para os estrangeiros nascidos em Portugal, tornando-se mais flexível e mais tipificado o acesso à naturalização; Em 2013, precedeu-se a nova alteração à lei, que estabeleceu um regime de naturalização para descendentes judeus de sefarditas; Em 2015, a sexta alteração à lei da nacionalidade veio, fixar novos fundamentos para a concessão da nacionalidade por naturalização e de oposição à aquisição à nacionalidade portuguesa. No mesmo ano, foi introduzida uma outra mudança ao nível da nacionalidade originária, que determinou que os netos de portugueses nascidos no estrangeiro passavam a poder pedir a nacionalidade; Em 2018, introduziram-se mais mudanças nos requisitos tanto para as atribuições como para as aquisições por via da naturalização, nomeadamente reduzindo os anos de residência e flexibilizando ainda outros requisitos para menores e descendentes de imigrantes e emigrantes; A alteração mais recente foi em 2020 com a Lei Orgânica nº.2/2020, de 10 de outubro, que destacou

Referências

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