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A América Latina em face das transformações do estado e da ordem econômica internacional

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Academic year: 2017

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A AMÉRICA LATINA EM FACE DAS TRANSFORMAÇÕES DO

ESTADO E DA ORDEM ECONÔMICA INTERNACIONAL

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

Internacional Econômico da Universidade Católica de Brasília, como requisito para a obtenção do Título de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Maurin Almeida Falcão

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Dissertação de autoria de Liana Memória Cardoso, intitulado A América Latina em face das Transformações do Estado e da Ordem Econômica Internacional, requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito Internacional Econômico, defendida e aprovada em 12 de dezembro de 2008 pela banca examinadora constituída por:

Prof. Dr. Maurin Almeida Falcão Orientador – Universidade Católica de Brasília

Prof.ª Dr.ª Leila Maria Da’Juda Bijos

Membro Examinador Interno – Universidade Católica de Brasília

Prof.ª Dr.ª Inez Lopes Matos C. de Faria

Membro Examinador Externo – Centro Universitário Unieuro

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Ao meu avô, Moacyr Pompeu Memória, in memoriam, pela confiança e aposta no meu

potencial, desde o começo.

Ao meu pai, minha mãe e meu irmão, por acreditarem em mim, sempre.

Ao meu marido, Cid Furtado Filho, pela paciência e amor, sempre.

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Gostaria de expressar o meu profundo agradecimento ao meu orientador, Prof. Dr. Maurin Almeida Falcão, pelo apoio imprescindível à realização desta dissertação.

Aos meus professores de Mestrado, especialmente à Profa. Dra. Leila Bijos e ao Prof. Dr. Antonio Paulo Cachapuz que me proporcionaram o doce exercício do magistério por meio das aulas de monitoria, na condição de bolsista da Capes.

Ao Prof. Dr. Marcos Valadão, que me proporcionou, com o trabalho na edição da Revista de Direito Internacional Econômico e Tributário e na Revista Virtual do Mestrado em Direito, além de experiência, a continuação dos meus trabalhos acadêmicos.

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Cardoso, Liana Memória. A América Latina em face das Transformações do Estado e da Ordem Econômica Internacional. 153 folhas. Dissertação de mestrado em Direito Internacional Econômico e Tributário. Universidade Católica de Brasília, Brasília/DF, 2008

Esta dissertação analisa a inserção da América Latina nas transformações do Estado segundo as ingerências da Ordem Econômica internacional no contexto pós-anos setenta. Para tanto, estuda a evolução do Estado, como um todo, desde a concepção do Estado Moderno, com a Revolução Francesa de 1789, até o Estado pós-moderno do período seguinte à crise econômica internacional dos anos setenta, fruto da contestação do Estado intervencionista anterior. Analisa o novo papel do Estado insurgente, a influência dos organismos internacionais nesse processo e as transformações de ordem econômica, política, jurídicas e administrativas, que se processam para fins de inserção dos países tanto desenvolvidos, como em desenvolvimento, como os da América Latina, como suas peculiaridades históricas e suas especificidades político-econômicas, na ordem econômica internacional do século XXI.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Internacional Econômico. América Latina. Transformações do Estado. Ordem Econômica Internacional. Inserção.

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Cardoso, Liana Memória. Latin America in view of the Transformations of the State and the International Economic Order. 153 pages. Masters’ Dissertation in International Economic Law and Tax. Catholic University of Brasilia, Brasilia / DF, 2008.

This paper analises the insertion process of Latin America on the State transformations’ as the interferences of the international economic order in the post-seventies. To that end, studies the evolution of the state as a whole, since the conception of the modern state, with the French Revolution of 1789, until the post-modern period that followed the international economic crisis of the seventies, with to the crisis of the interventionist state. Analises the new role of the insurgent State, the influence of international organisms in this process and the economic, political, legal and administrative changes, which must include both developed countries, as developing countries, such as Latin America, and its historical, political and economic peculiarities, in the international economic order of the twenty-first century.

.

KEYWORDS: International Economic Law. Latin America. Transformations of the state. International Economic Order. Insertion

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• CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe • GATT – Acordo Geral de Tarifas e Comércio

• OMC – Organização Mundial do Comércio • ONU – Organização das Nações Unidas

• BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento • FMI – Fundo Monetário Internacional

• OIT – Organização Internacional do Trabalho

• FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação • OPEP – Organização dos Países Exportadores de Petróleo

• PIB – Produto Interno Bruto

• MERCOSUL – Mercado Comum do Sul

• BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

• CLAD – Centro Latino-americano de Administração para o Desenvolvimento • COPEI – Partido Social Cristão da Venezuela

• FARC – Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia • ELN – Exército de Libertação Nacional da Colômbia • MDB – Movimento Democrático Brasileiro

• ARENA – Aliança Renovadora Nacional

• IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas • M-19 – Movimento 19 de abril

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INTRODUÇÃO...03

CAPÍTULO I – O ESTADO 1..O Estado ...10

1.1. O Estado Liberal...11

1.2. O Estado Socialista ...20

1.3. O Estado Social-Liberal ...24

1.4. O Estado Neoliberal e a Passagem à Pós-Modernidade...32

1.4.1. A Soberania do Estado ...41

CAPÍTULO II – O PAPEL DO ESTADO NA SOCIEDADE PÓS-MODERNA 2. O Novo Papel do Estado e a Sociedade Pós-Moderna: o Advento do Estado Cooperativo e os Organismos Internacionais no Mundo Pós-Anos Setenta...52

2.1. Os Organismos Internacionais e o seu Papel nas Transformações Jurídicas, Políticas, Econômicas e Administrativas, decorrentes da Evolução da Sociedade Pós-Moderna, no Mundo Pós-Anos Setenta ...64

2.2. Das Repercussões Jurídicas da Ordem Econômica Internacional na Conformação de uma Nova Estrutura dos Estados no Mundo Pós-Anos Setenta...66

2.3. Das Repercussões Econômicas da Ordem Econômica Internacional na Conformação de uma Nova Estrutura Interna dos Estados no Mundo Pós-Anos Setenta...77

2.4. Das Repercussões Políticas da Ordem Econômica Internacional na Conformação de uma Nova Estrutura dos Estados no Mundo Pós-Anos Setenta...84

2.5. Das Repercussões Administrativas da Ordem Econômica Internacional na Conformação de uma Nova Estrutura Interna dos Estados no Mundo Pós-Anos Setenta...89

CAPÍTULO III – A AMÉRICA LATINA E A ORDEM ECONÔMICA INTERNACIONAL PÓS-ANOS SETENTA 3. A América Latina no Período de 1945 a 1973 - Intróito...102

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3.3. O Paradigma do Modelo Chileno e a Terceira Via na Ordem Econômica Internacional.

...131

4. CONCLUSÃO...138

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS . ...142

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INTRODUÇÃO

Planeta Terra. Início do Século XXI. Ainda sem contato com outros mundos habitados. Entre luz e sombra, descortina-se a pós-modernidade. O rótulo genérico abriga a mistura de estilos, a descrença no poder absoluto da razão, o desprestígio do Estado. A era da velocidade. A imagem acima do conteúdo. O efêmero e o volátil parecem derrotar o permanente e o essencial. Vive-se a angústia do que não pôde ser, e a perplexidade de um tempo sem verdades seguras. Uma época tudo: marxista, pós-kelseniana, pós-freudiana. 1

O Estado do século XXI está em transformação; rompendo com instituições do passado, diante da contestação do Estado-providência; e entre este e as forças de mercado, busca hoje uma terceira via, uma reorganização que conforme os interesses nacionais às injunções da ordem econômica internacional, ultrapassando o conceito de Estado Moderno2 e adentrando na era da pós-modernidade do século

XXI, onde o Estado assume a cooperação e a hipercomplexidade de relações como fatores a serem trabalhados em conjunto, definindo novos institutos, reformando velhas instituições e delineando antigos conceitos (como o de Soberania do Estado3,

por exemplo, e do poder de autodeterminação dos povos) para se inserir na nova ordem global.

Para tanto, para se estudar a evolução do Estado segundo as ingerências da ordem econômica internacional e situá-la no contexto pós-anos setenta, com a crise do intervencionismo estatal, é necessário delinear seu perfil histórico-sociológico,

1 BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos Teóricos e Filosóficos do Novo Direito Constitucional Brasileiro (Pós-Modernidade, Teoria Crítica e Pós-Positivismo). Cadernos de Soluções Constitucionais. Associação Brasileira de Constitucionalistas Democratas. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 150.

2 A Concepção de Estado Moderno, tal como conhecemos hoje e cuja gênese foi a Revolução

Francesa de 1789 e sua Constituição de 1791, engloba três fatores: povo, território e finalidade (o que determina sua natureza), bem como consagra a separação de poderes e atribuições entre Legislativo, Executivo e Judiciário e a noção de Soberania e autodeterminação dos povos. Bem diferente deste conceito, o que hodiernamente se apresenta no cenário global é uma nova noção desses conceitos, decorrentes da transformação do conceito de povo, com a livre circulação de trabalhadores e a criação de blocos regionais e supranacionais, por exemplo, a definição de novos espaços territoriais, o estabelecimento de finalidades em conjunto e em cooperação, um novo conceito de soberania, e uma reforma interna da divisão e das atribuições dos Poderes, para conformação da nova ordem econômica internacional.

3 Segundo Thomas Hobbes, em Leviatã, “No Estado, a soberania é uma alma artificial, pois dá vida e

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tomando-se como marco inicial a Revolução Francesa de 1789, no inaugurar da era moderna, e o sistema liberal econômico implantado a partir de então.

Em contraposição ao Estado liberal francês pós-revolucionário, estudar-se-á também o Estado socialista, cujo marco foi a Revolução Russa de 1917, e que dialeticamente oposto, propunha um Estado de economia planificada, controlada, onde ele era o distribuidor de bens e riquezas.

Várias críticas surgiram a uma corrente e outra, isto é, em defesa do liberalismo ou do socialismo, e essa divergência de pensamento significou a divisão do mundo em dois blocos, os dos países socialistas e os dos capitalistas, de teorias pró e contra o livre mercado, situação esta que perdurou até a falência da ordem socialista, em 1989.

A esboçar um dos lados dessas críticas, ad esempio, Hayek4, um dos

defensores do liberalismo, afirmou que o modelo com feições sociais determinou, na verdade, a extinção das liberdades e da igualdade, resultando na concentração de poder, na restrição legal, mercadológica e de expressão, à custa de uma propaganda de bem-estar coletivo5.

A questão central, então, da divergência entre as duas correntes está na garantia da liberdade com justiça social, da livre concorrência com o exercício da

4 HAYEK, Friedrich Auguste. O Caminho da Servidão. Tradução Anna Maria Copovilla, José Ítalo

Sette e Liane de Morais Ribeiro. Rio de Janeiro: Instituto Liberal/ Editora Nórdica, 1984, p. 48: ”Os autores franceses que lançaram as bases do socialismo moderno não tinham dúvida de que suas idéias só poderiam ser postas em prática por um forte governo ditatorial. Para eles o socialismo significava uma tentativa de ‘acabar com a Revolução’ por meio de uma reorganização intencional da sociedade em moldes hierárquicos e pela imposição de um ‘poder espiritual’ coercitivo. No que se referia à liberdade, os fundadores do socialismo não escondiam suas intenções. Eles consideravam a liberdade de pensamento a origem de todos os males da sociedade do século XIX e o primeiro dos planejadores modernos, Saint-Simon, chegou a predizer que aqueles que não obedecessem às comissões de planejamento por ele propostas seriam ‘tratados como gado’”.

5 Ibidem, p.106. “E mesmo grande número de economistas favoráveis ao socialismo que estudaram a

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igualdade, dentro de um sistema democrático de governo. A proposta deste trabalho é apontar de que forma o Estado evoluiu nas suas relações e de que forma se pode buscar a equalização da equação liberdade/justiça social no mundo pós-moderno, segundo as ingerências e transformações da ordem econômica internacional e segundo a atuação dos atores da cena internacional nessa ordem.

Nessa linha sociológica e histórica de evolução do Estado, analisar-se-á igualmente o Estado Social-Liberal, nascido em contraposição à planificação estatal, da crise do Estado socialista, inaugurando o intervencionismo estatal utilizando-se das políticas keynesianas do bem estar-social, dos anos trinta, e com o Plano Marshall pós-guerra, de soerguimento das nações envolvidas no confronto bélico.

Da contestação a este Estado-providência, intervencionista, pós-guerra, surgiu a ideologia neoliberal, apoiada nos estudos da Escola Austríaca, de 1870, da Sociedade de Mont Pelèrin, de 1947, e da Escola de Chicago, nos anos cinqüenta e sessenta, pregando uma intervenção mínima do Estado nas relações privadas e a preservação das forças de mercado.

No contexto histórico da evolução dos Estados, então, na era pós-guerras, de desenvolvimento e reconstrução das nações direta e indiretamente envolvidas nos confrontos, o mundo assistiu a um expressivo desenvolvimento das relações internacionais. E nesse cenário internacional pós-Segunda Guerra Mundial, a intensificação das relações interestatais determinou a necessidade da criação de organismos internacionais, para regulação e orientação da atuação dos Estados, para a garantia da observância de princípios como a soberania, a igualdade, o tratamento não discriminatório, a reciprocidade e para a aplicação de medidas de proteção como standards, a “cláusula social” ou as medidas compensatórias, dentre

outros, a fim de balancear as relações econômicas, facilitar o comércio e evitar o desequilíbrio entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.

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A introdução de novos atores internacionais, tais como os blocos regionais e supra-nacionais, dentre outros, induziu a reforma de institutos jurídicos, como a soberania, que sofreu uma evolução interpretativa do seu conceito, determinada pela modificação dos fatores econômicos e sociais. Hoje, não se pode dizer que se “abre mão” da soberania estatal em favor das ingerências externas, mas que se convenciona um modus operandi a atender os interesses da coletividade, do Estado,

com vistas à obtenção de maior reconhecimento e respeitabilidade, maior poder de barganha, maior atuação e imposição no cenário global.

Com a imprescindibilidade da atuação em nível internacional, determinada pelos pós-guerras, pelas sucessivas crises econômicas mundiais e pelo esfacelamento da ordem comunista/socialista, fez-se necessário a reestruturação interna dos países. Essa transformação deve dar-se em vários segmentos da sociedade, tais como no administrativo, no político, no econômico e no jurídico, a conformar os Estados às novas demandas externas e prepará-los, assim, a uma atuação no cenário internacional.

A reforma jurídica do Estado visa dar efetividade e eficiência às normas internas, conformando-as com a realidade das relações internacionais, com os interesses do país, possibilitando seu crescimento, sua integração, a cooperação com outros países e a inserção na ordem econômica internacional.

A econômica pretende coadunar a economia interna e suas políticas aos fatores da economia internacional, devendo funcionar ambas em harmonia e cooperação visando à inserção e a manutenção do Estado na rede de relações econômicas transnacionais.

A reforma política busca a implementação de novas políticas públicas, integradas às transformações econômicas, jurídicas e administrativas, por meio de uma atuação estatal transparente e que gere um ambiente de segurança das relações que vão ser desenvolvidas no ambiente interno e internacional.

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setores público e privado, a modernização do Estado e do modelo de regulação exercido, de forma a permitir maior fluxo de capitais e investimentos, enxugar gastos e erradicar a corrupção do setor público.

O novo Estado, com novos papéis, competências e objetivos, ganha novos contornos e as acepções dos conceitos de soberania, democracia e liberdade; a equalização das forças internas com as internacionais é o que vai ditar o sucesso ou o fracasso dessa “novíssima ordem mundial” e da terceira via entre a social-democracia e o liberalismo, a quebra ou o retorno à burocracia, a liberdade ou a centralização de poderes. Assim, conceitos que antes pareciam muito bem definidos, como regimes políticos, polarização – no sentido da divisão geopolítica e econômica -, soberania, democracia, ditadura, socialismo, liberalismo, esquerda e direita, passam por um processo de relativização às conjunturas econômicas; e já não subsistem os velhos significados do período pós-guerra, mas sim uma nova visão do processo político mundial.

Com base nas experiências passadas e nas perspectivas futuras, um novo perfil de relações internas e internacionais se delineia, um novo modelo de organização estatal é proposto, para fazer frente à demanda global por interação, da cooperação. A este modelo, seguem-se, logicamente, restrições, recomendações e cautelas, vitais para a manutenção da igualdade, da paz mundial, do equilíbrio e da segurança jurídica na “novíssima ordem” 6 e na revolução por esta instalada.

Essas restrições se aplicam na medida em que se apresentam as diferenças dos Estados em nível de desenvolvimento, como no caso dos países da América Latina que, por seu histórico e suas peculiaridades de crescimento e de inserção na ordem econômica internacional, devem adotar propostas adequadas a essas especificidades, mas buscando sempre a inserção na ordem global e evitando o isolamento. Abordar-se-á as dificuldades dos países latino-americanos de se inserir nas relações globais, algumas das políticas propostas pela CEPAL para a América

6 A “novíssima ordem” é o resultado da análise da ordem pós-Segunda Guerra Mundial e pós-anos

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Latina e o Caribe, apresentar-se-á paradigmas bem-sucedidos a serem estudados, na busca do desenvolvimento do Estado e da conformação às demandas da ordem internacional pelos países em desenvolvimento da América Latina, que se encontram em situação semelhante.

Em conclusão, o presente estudo, em traçando uma perspectiva histórica da evolução do Estado e da atuação de diversos atores no cenário internacional e suas conseqüências, busca demonstrar a necessidade da instauração de uma novíssima ordem econômica internacional, integrada, cooperativa, flexível e adaptável aos diversos fatores que surgirem no cenário internacional, demonstrando a falência da ordem positivista, o ultrapassar do Estado moderno e da Era das Codificações, na emergência desse novo mundo de relações complexas, o mundo pós-positivista, pós-moderno, em que já não é mais possível a atuação isolada dos países e que se busca uma solução conjunta para regular os acontecimentos e as relações, que, hodiernamente, transpassam as fronteiras estatais e que necessitam de regulamentos adequados a essa flexibilidade.

Assim, o presente trabalho se inicia traçando um perfil da evolução do Estado, desde a Revolução Francesa, marco da concepção moderna de Estado, até os dias atuais, destacando dois períodos em especial; o período pós-guerra, com o surgimento dos organismos internacionais e a ascensão do intervencionismo estatal; e o período pós-anos setenta, de crise deste intervencionismo estatal e gênese da concepção pós-moderna de Estado, com o renascimento das idéias neoliberais e a busca de uma terceira via, de um novo papel do Estado para fins de desenvolvimento e inserção na ordem econômica internacional do final do século XX e início do século XXI.

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No Capítulo terceiro, demonstra-se, por fim, as repercussões dessas transformações nos países da América Latina, cujos desafios encontram raízes históricas, frutos das colonizações dos séculos XV e XVI, e diversidades culturais a superar dentro do próprio espaço geográfico em que se encontram circunscritos, dificuldades estas que não encontraram outros países com relação aos seus vizinhos, em processos de relações internacionais, o que faz com que esta seja uma particularidade a mais a superar na América Latina, para fins de inserção na ordem global e para fins da busca de modelos efetivos e adaptáveis a sua realidade de desenvolvimento.

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CAPÍTULO 1 1. O ESTADO

Neste capítulo far-se-á uma abordagem sobre a evolução do Estado, desde sua origem contratualista e justificativa teórica, em Hobbes e Locke, no século XVII, à concepção moderna de Estado, introduzida pela Revolução Francesa de 1789, bem como analisando as mudanças histórico-político-econômicas que se seguiram no tempo, tais como o Estado socialista, em 1917, o social-liberal, nos Trinta Gloriosos (1945-1973), o neoliberal, da Escola Austríaca,7 da Sociedade de Mont Pélerin,8 até o Consenso de Washington em 1989,9 e o pós-moderno, após as crises do petróleo de 1973 e 1979 até os dias atuais, contextualizando cada um de acordo com as ingerências da ordem econômica internacional de cada época.

Também o conceito de soberania e o posicionamento dos Estados em face da Ordem Econômica Internacional e o relacionamento entre si será analisado, pois sofreu profundas mudanças, influenciando significativas alterações nos ordenamentos jurídicos pátrios e determinando um comportamento de maior cooperação jurídica entre os Estados e uma busca constante por parte destes da uma inserção internacional, evitando o isolamento econômico, político e diplomático.

A partir desta análise evolutiva do Estado, analisar-se-á, na seqüência dos capítulos, o papel do Estado e dos organismos internacionais no século XXI, as repercussões jurídicas, administrativas, econômicas e políticas da Ordem Internacional Econômica na formação do novo papel do Estado, bem como as dificuldades da América Latina em se conformar as essas mudanças do mundo contemporâneo.

7 Escola austríaca de economia fundada em 1870 por Carl Menger (escola liberal clássica) seria

seguida por Mises, Hayek e muitos outros defensores do liberalismo.

8 Organização, fundada em 1947, defensora do livre-mercado, onde se reúnem estudiosos sobre o

tema, de dois em dois anos. Hayek e Friedman estiveram em seus quadros.

9 Conjunto de medidas denominadas neoliberais, de abertura, sugeridas pelo economista John

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1.1 O ESTADO LIBERAL

Em uma noção propedêutica, interessam aqui examinar, os precedentes históricos de Hobbes e Locke, no século XVII, que funcionam como justificação do liberalismo político e da noção de Estado civil a que se assistiu surgir no século XVIII. Nas palavras de Diniz:

[...] para Locke a solução encontra-se a defesa de um Estado civil responsável e limitado, que pode tudo no interesse dos indivíduos-proprietários; para Hobbes, em perspectiva diversa, a saída consiste na criação de um Estado civil absoluto, dotado de poderes supremos com vistas a garantir a paz e a segurança coletivas.10

Se para Locke a noção de liberdade ou de individualidade era imperativa, ou se para Hobbes o poder deveria ser absoluto, dado considerar o “homem o lobo do próprio homem”, dependente de um controle superior, o fato é que ambas as teorias justificam uma organização em sociedade, regrada por um Direito, natural ou não, conferindo ao Estado o poder de controle sobre a vida coletiva e aos seus cidadãos. Muito embora a noção de povo, a de território e da finalística coletiva, senão a manutenção do poder econômico, tão somente, ainda não estivesse bem delimitada na época,11 razão pela qual neste estudo, se entende, ainda, não considerado, este período, como marco da idéia de Estado.

Para fins deste trabalho, todavia, considerar-se-á que marco inicial da concepção moderna de Estado, com as definições de povo, território e com seu elemento teleológico, deu-se com o rompimento social e econômico para com o regime absolutista, ou seja, com a Revolução Francesa de 1789, mais exatamente. Ainda que se possa considerar o evento do tratado da Paz de Westfália (1648), que estabeleceu um novo marco no conceito de soberania, dando contorno de estatais às formações urbanas de então anexações territoriais que se davam na época, como inovador, ou se possam, pelas teorias contratualistas, considerar algumas instituições absolutistas como de caráter estatal, o fato é que a definição do que seja povo e o estabelecimento de direitos mínimos, a delimitação de um espaço

10 DINIZ, Antônio Carlos de Almeida. Direito Estado e Contrato Social no pensamento de Hobbes e

Locke: uma abordagem comparativa. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 38, n. 152, out/dez, 2001, p. 162.

11 “Na concepção tipicamente liberal burguesa de Locke, o poder político destina-se a garantir a livre

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geográfico e a sua proteção erga omnes e a instituição de características finalísticas,

em prol de uma coletividade, como conhecemos hoje, só surgiu a partir da Revolução Francesa, que inaugurou o mundo moderno, institucionalizando-o, formalizando-o, positivando-o, razão pela qual é referência neste estudo.

Na passagem da ordem feudal, então, para a ordem moderna, verifica-se a importância do movimento intelectual, da reação ao absoluto, ao imposto. O movimento iluminista do final do século XVII, as artes e a ciência proporcionaram o fluxo de idéias, uma maior liberdade do pensamento individual e o princípio da contestação à legitimidade e infalibilidade do regime teocrático. Ainda que a repressão a tais expressões ainda fosse um fator de intimidação e a Santa Inquisição um fator de terror, o certo é que a mudança de mentalidade concorreu para provocar fissuras nesse poder, que mais tarde, com a falência do modelo político, econômico e social feudal, levariam a sua derrocada.

Com o enfraquecimento do controle feudal, o êxodo rural fez com que se formassem cidades e, nestas, as primeiras nuances de manufaturas na figura dos mestres artesãos, trabalho este cuja produção não mais se destinava ao senhor feudal, como paga a sua proteção, mas sim à venda, e ao lucro. O interesse por tais atividades e o rechaço à submissão ao senhorio, aumentou o fluxo migratório para os centros comerciais de tal forma que ocasionou a ruptura com o regime político anterior. Do trabalho de aprendiz às primeiras formas contraprestação de serviço, as relações entre mestre e aprendiz, entre proprietários e os fornecedores de mão-de-obra, foram surgindo, numa economia onde a liberdade, ideário daqueles que lutavam contra o absolutismo, era um princípio vital para o desenvolvimento das novas relações sociais e econômicas.

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absolutismo do rei e sua contradição com a liberdade moderna”. 12 De fato, o

absolutismo monárquico, investindo-se de legitimidade divina, centralizava todo o poder na figura do monarca, prática esta que impossibilitava o crescimento das individualidades.

A Revolução Francesa, de 1789, então, consectária do clamor pela liberdade, pela não centralização do poder, determinou a transição do Estado absolutista monárquico para o Estado liberal. Uma nova estrutura social se delineou e os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade representavam a vontade classe burguesa (que detinha os meios de produção e que deu azo à Revolução) na França. Da vontade desta classe, a necessidade de uma declaração de direitos civis individuais fez-se sentir.

Nas palavras de Leila Bijos,13 define-se bem a essencial do estado liberal e de sua ideologia enquanto política:

O liberalismo clássico é uma ideologia ou corrente do pensamento político que defende a maximização da liberdade individual mediante o exercício dos direitos e da lei. O liberalismo defende uma sociedade caracterizada pela livre iniciativa integrada num contexto definido. Tal contexto geralmente inclui um sistema de governo democrático, o primado da lei, a liberdade de expressão e a livre concorrência econômica.

Antes dela, porém, importante ressaltar, no continente americano, em 1787, a declaração dos direitos humanos da recém inaugurada Constituição Norte-Americana em libertação das colônias para com os ditames da metrópole inglesa, embora amoldada em contexto histórico e social diferente da revolução interna na França, terminou por influenciá-la quanto à forma positivada, escrita, de estabelecimento dos direitos. Foi, então, que uma Assembléia Constituinte Francesa foi reunida e uma declaração de direitos foi igualmente firmada antes mesmo da conclusão texto constitucional, carta política do futuro Estado francês.

A estrutura desse novo Estado francês fundou-se, então, numa carta de direitos, firmada por uma assembléia constituinte que iria, nos anos que se

12 BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. São Paulo: Malheiros, 2004, p.66. 13 BIJOS, Leila Maria Da’juda. Estado, Mundo do Trabalho e Neoliberalismo. [s.l.:s.n.], [2008?].

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seguiram, ratificá-la, positivando-a como a carta política da nação francesa. Da assembléia representativa do povo francês, estabeleceu-se uma democracia representativa, a separação de poderes entre Executivo, Legislativo e Judiciário, como elementos do novo contrato social que se firmava, com a finalidade de garantir as liberdades individuais e dificultar a centralização do poder, o absolutismo.

Nascia, a partir dessa convenção constitucional e administrativa, não a noção de soberania, como poder do Estado face aos demais (a qual já vinha sendo delineada desde o Tratado de Paz de Westfália14 – em 1648 – estabelecendo-se igualdade entre os Estados em face de suas soberanias), mas a de Estado de Direito, que elabora as normas, mas que a elas também se submete, o que implicava em controle de atos de império e gestão dos governantes e da administração em geral, para que a finalidade social da liberdade fosse alcançada.

Note-se que, até este momento, não se falava em bem-estar social como finalidade do Estado, mas sim de liberdade (como expressão da “felicidade”, posteriormente incluída no texto constitucional15), de ação, de contratação, de expressão e de comunicação. A sociedade pós-Revolução Francesa já não tolerava o controle de sua vida civil e essa liberdade era o mandamento primordial para a construção de uma “nova vida” em sociedade. Nas palavras de Bonavides:16 “A

revolução Francesa, por seu caráter preciso de revolução da burguesia, levara à consumação de uma ordem social, onde pontificava, nos textos constitucionais, o triunfo total do liberalismo. Do liberalismo, apenas, e não da democracia, nem sequer da democracia política. [...] Esta a alcançou depois, com novos derramamentos de sangue, o constitucionalismo do século XIX”. Os novos derramamentos de sangue clamavam também por direitos sociais dos cidadãos, os

14 Tratado Internacional que pôs fim à guerra pela conquista de territórios entre França e Espanha,

inaugurando as primeiras manifestações de soberania estatal e do princípio da igualdade entre as nações.

15 Segundo Bobbio, “À medida que tomou corpo a figura do Estado Liberal e de direito, foi

completamente abandonada a idéias de que fosse tarefa do Estado assegurar a felicidade dos súditos. A palavra mais clara e iluminadora foi dita por Kant, o qual – em defesa do Estado Liberal puro, cuja meta é permitira que a liberdade de cada um possa expressar-se com base numa lei universal racional – rechaçou o Estado eudemonológico, um Estado que pretendia incluir entre suas tarefas a de fazer os súditos felizes, já que a verdadeira finalidade do Estado deve ser apenas dar aos súditos tanta liberdade que lhes permita buscar, cada um deles, a seu modo, a sua própria felicidade”. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 103

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quais já gozavam de sua individualidade, mas que precisavam de garantias outras para a sua completa fruição.

Os desejos de liberdade e preservação de garantias individuais convolaram-se no texto da Constituição Francesa de 1791, convolaram-servindo-lhe de baconvolaram-se, por convolaram-se traduzir na forma de governo – liberal - escolhida pelo povo através de seus representantes, pelo seguinte intróito:

Os representantes do povo Francês, reunidos em Assembléia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos dos homens são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, resolveram expor, em uma declaração solene, os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que esta declaração, constantemente presente junto a todos os membros do corpo social, lembre-lhes permanentemente seus direitos e deveres, a fim de que os atos do poder legislativo e do poder executivo, podendo ser, a todo instante, comparados ao objetivo de qualquer instituição política, sejam por isso mais respeitado; a fim de que as reivindicações dos cidadãos, doravante fundadas em princípios simples e incontestáveis, estejam sempre voltadas para a preservação da Constituição e da felicidade geral.

Assim, a monarquia constitucional que se seguiu, teve como justificativa a observância dos limites constitucionais estabelecidos e das regras socialmente contratadas. Fora desses limites, imperava o direito à liberdade de um, de outro, de um em face do outro, do outro em face deste outro, significando dizer que os atos e contratos eram livres, mas que essa liberdade tinha alcance restrito ao início da liberdade de outrem.17 A economia de mercado era livre. A propriedade, tida como direito inerente ao homem,18 era privada. As relações se desenvolviam segundo as aptidões e desejos pessoais. As relações de trabalho se colhiam de livre contrato. Tudo em contraposição ao absolutismo. Restando ao Estado a função de velar por estes direitos individuais, resolver litígios com vistas a estes preservar, garantir a segurança, a livre economia e administrar a res pubblica.

17 Artigo 4º. da Constituição Francesa de 1791: “A liberdade consiste em poder fazer tudo o que não

prejudique o próximo: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não têm por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmo direitos. Estes limites só podem ser determinados pela lei”.

18 “Na teoria de Locke,a propriedade deriva do trabalho individual, ou seja, de uma atividade que se

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Tais princípios libertários e que ecoaram pelo mundo foram defendidos por notáveis estudiosos como Adam Smith, Stuart Mill, Mises e Hayek (este último, anos mais tarde), dentre outros que, viam no sistema de liberdades públicas, propriedade privada e na livre economia de mercado uma possibilidade de crescimento individual e do Estado soberano, gerando riquezas e igualdade entre as pessoas e entre os povos, que se regozijariam com o reconhecimento e desenvolvimento pleno de suas habilidades.

Enquanto economia, então, o liberalismo tinha como justificativa a livre concorrência, a livre economia de mercado, diferenciando-se, assim, da sua faceta política, da liberdade individual e dos direitos civis, pois só a liberdade econômica levaria à liberdade individual verdadeira ao final.

As teorias econômicas e livre-cambista de Adam Smith, autor de várias obras científicas do Século XVIII, dentre as quais “A Riqueza das Nações” e “Teoria dos

Sentimentos Morais”, exerceram influência no mundo que se libertava do

absolutismo e que, posteriormente, evoluiu para a revolução burguesa. Afirmava que: “a riqueza ou o bem-estar das nações é identificado com o seu produto anual per capita que, dada sua constelação de recursos naturais, é determinado pela produtividade do trabalho ‘útil’ ou ‘produtivo’ – que pode ser entendido como aquele que produz um excedente de valor sobre seu custo de reprodução – e pela relação entre o número de trabalhadores empregados produtivamente e a população total”,19

o que significa dizer que a economia deveria visar o lucro, o qual viria a contribuir, por último, para o desenvolvimento, crescimento, riqueza e poder do Estado. Adam Smith, na sua defesa do liberalismo, foi seu maior expoente.

Stuart Mill e sua teoria utilitarista que combinava a busca pela felicidade individual e o socialismo, como base do desenvolvimento social, como na sua frase: “Nosso ideal de desenvolvimento final vai mais além da democracia e nos classificaria decididamente sob a designação geral de socialismo. Consideramos que o problema social do futuro seja como reunir a maior liberdade individual de

19 SMITH, Adam. A Riqueza das Nações: Investigação sobre sua natureza e suas causas. São

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ação com a propriedade comum das matérias-primas do globo e uma participação igualitária de todos nos benefícios do trabalho associado”. 20 Na sua obra Principles

of Political Economy, expôs sua tese a favor da produção e não da distribuição de

rendas que, acreditava, não teria sucesso dada à massificação dos pensamentos da sociedade e do autoritarismo dos governantes.21

Ludwig Von Mises, no século XX, adepto ao pensamento da escola austríaca, pregava o liberalismo e já criticava o controle da lei econômica e a propriedade pública, bem como a falta de uma política baseada em fatores econômicos e sua previsibilidade, como já se esboçava na figura dos movimentos operários, nos seguintes termos:

Por outro lado, prova o que apenas recentemente foi aprendido com clareza: uma sociedade fundamentada na propriedade pública não é viável, uma vez que não permite previsão monetária e, consequentemente, não permite a ação econômica racional. O conhecimento econômico, portanto, representa um obstáculo às ideologias socialista e sindicalista que prevalecem em todo o mundo. E isto explica a guerra movida em toda a parte contra a economia e os economistas.

Hayek, dando continuidade ao pensamento liberal de Mises, igualmente defendia o funcionamento da concorrência plena, a propriedade privada, a liberdade de contratar, o sistema de preços e suas alterações e a eficácia da condução das técnicas mercadológicas pelos cidadãos ao invés do Estado, através de uma política dirigista. Uma de suas frases transcritas em sua obra “O Caminho da Servidão” 22

demonstra exatamente seu conceito de liberdade:

O Estado de Direito só teve uma evolução consciente durante a era liberal e é uma das suas maiores realizações, não só como uma salvaguarda, mas como a concretização jurídica da liberdade. Como disse Immanuel Kant (e Voltaire antes dele, quase nos mesmos termos), ‘o homem é livre quando não tem de obedecer a ninguém, exceto às leis’.

20 Disponível em

http://www.cofecon.org.br/index.php?Itemid=114&id=758&option=com_content&task=view Acesso em 26.nov.2008.

21 HEILBRONER, Robert. A História do Pensamento econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1996,

p. 126.

22 MISES, Ludwig von. O Caminho da Servidão

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Obviamente que não se tratava o liberalismo de uma anarquia, uma ausência de governo, mas de uma menor inferência na vida pública dos cidadãos. O governo, no regime liberal, existia sim, e legitimado pelo povo que o consentiu, instituiu e/ou elegeu seus representantes, mas sua função não era dominar a economia, a vida pública. Sua função era de coordenação e fiscalização. Foi pelo exercício desse poder que garantia a segurança jurídica e a igualdade das relações, na medida das suas desigualdades. Mas, decerto, era uma instituição falível, pois dependia da conduta e das intenções de quem a comandava, como em qualquer outro sistema político. “O Estado, que, em si, por sua natureza mesma, já é uma organização de domínio, pode, sob o leme de governantes ambiciosos e de vocação autocrática, destituídos de escrúpulos, converter-se em aparelho de abusos e atentados à liberdade humana, o qual exploraria, no interesse de sua força e de seu predomínio, aquela dependência básica do indivíduo, transformado, então, em mero instrumento dos fins estatais”, explica Bonavides,23 ao dissertar sobre a “politização da função social pelo Estado como meio de agravar a dependência do indivíduo, desvirtuar a democracia ou consolidar o poder totalitário”.

O liberalismo puro, desenvolvido no contexto pós quebra da ordem feudal e da recente implantação da ordem liberal burguesa da Revolução Francesa, sustentou uma postura absenteísta dos governantes com relação à vida privada dos governados, muitas vezes uma postura imperialista tão somente, mormente em face de povos menos desenvolvidos, exercendo-se um comando político centralizador e favorável àqueles detentores de poder, bem como mitigadora das forças do povo em geral com relação ao exercício de seus direitos.

Dessa forma, em nível interno, assistiu-se, em contradição aos ditames da Carta de 1789, a um acirramento das desigualdades sociais, econômicas e laborais da parte dos cidadãos que não tinham e não conseguiam desenvolver suas potencialidades, isto é, ao conflito capital versus trabalho, e que, então, reclamavam

intervenção estatal na vida econômica para contrabalancear essas desigualdades, com as suas três funções básicas: alocativa, redistributiva e estabilizadora. A crítica que se faz ao liberalismo puro decorre da própria evolução da sociedade, no

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usufruto de seus direitos. No confronto entre poderio econômico e proletariado, o liberalismo prega a existência de um “homo economicus”, motivado por forças econômicas e sempre à busca de lucros, mas o homem queria mais, queria seus direitos naturais, civis e sociais, queria a igualdade.

Nessa disputa, assiste-se ao desenvolvimento do Estado, dantes absoluto, para liberal e do liberal para o democrático,

[...] no qual os indivíduos que reivindicam o poder soberano são apenas uma parte da sociedade; depois democrático, no qual são potencialmente todos a fazer tal reivindicação; e, finalmente, social, no qual os indivíduos, todos transformados em soberanos sem distinções de classe, reivindicam – além dos direitos de liberdade – também os direitos sociais, que são igualmente direitos do indivíduo: o Estado dos cidadãos, que não são mais somente os burgueses, nem os cidadãos de que fala Aristóteles no início do Livro III da Política, definidos como aqueles que podem ter acesso aos cargos públicos, e que, quando excluídos os escravos e estrangeiros, mesmo numa democracia, são uma minoria.24

À parte da utópica expressão “transformação de indivíduos em soberanos”, como escrita por Bobbio e transcrita acima, o fato é que as conjunturas sociais, e as relações internas e entre Estados já haviam tomado dimensões mundiais. Assistia-se ao triunfo do Imperialismo, apoiado no livre comércio e na subjugação de povos menos favorecidos. As guerras napoleônicas tinham dado sinal disso. O gozo dos direitos individuais se via ameaçado pela prepotência de algumas nações.

A Primeira Guerra Mundial se seguira, os gastos com armamentos e as conseqüências econômicas dela decorrente, assim como a emergência da Constituição social de Weimar (1919) também abalou o modo de produção capitalista e liberal. O primeiro pelo legado de destruição e pelos gastos públicos que se fizeram; o segundo, pelo caráter social, resguardando direitos e revelando caráter intervencionista da sua nova estrutura pública administrativa positivados em na Carta Política Alemã.

A Revolução Russa de 1917, por sua vez, no continente asiático, contra o regime centralista, autoritário e despótico dos czares, se fez sob a alcunha de um novo regime político, o comunista, baseada na concepção de propriedade pública

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dos meios de produção e igualdade entre as classes, a possibilitar um regime social de governo, cuja finalidade precípua é ocasionar o bem geral de todos, não as liberdades individuais, que chegaram a ser consideradas “egoístas.” 25

O pensamento socialista, então, deu-se em antítese ao que acreditavam Mises e Hayek, e também destes recebeu duras críticas, sob a alegação de “servidão”, “dirigismo”, “inviabilidade”, posto que restringidas as liberdades individuais, pela ação onipotente, onipresente – e totalitária - do Estado em todas as relações sociais e econômicas, presença essa estruturada num sistema de planificação e centralização do poder.

Não obstante as críticas empreendidas, na escala histórica mundial, o momento pugnava por uma mudança, por uma intervenção estatal que, supostamente, eliminarias as desigualdades econômicas e propiciaria uma igualdade de condições, mormente no período que se seguiu à Primeira Guerra Mundial, em oposição à postura imperialista que a deflagrou. O Estado socialista seria o mentor, o executor e o tutor das políticas públicas e de desenvolvimento, interferindo, em nome do “bem-estar coletivo”, na administração dos bens e nas relações privadas também. Seria o detentor das propriedades e dos bens e poderia deles dispor para supostamente atender aos anseios da coletividade e manter o controle econômico. Assim propôs a doutrina de Marx, que influenciou diversas nações e as agrupou em dois blocos, o socialista e o capitalista, cujas divergências ideológicas fomentaram uma corrida armamentista para a defesa de seus mercados, suas influências.

1.2 O ESTADO SOCIALISTA

O desenvolvimento das relações liberais que se seguiram à Revolução Francesa e a sua Constituição, propiciou a expansão das cidades, a industrialização, a construção de ferrovias, tudo numa dinâmica de relações que visavam o lucro, a acumulação de riquezas, a liberdade de expressão e atuação na vida civil.

25 “Os direitos tutelados pela Declaração eram os direitos do burguês, do homem (explicava Marx)

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Este período desenvolvimentista, porém, não pugnou pela razoabilidade no trato social, e a ânsia pela obtenção de lucros e conquistas de espaços e territórios, gerou uma ausência de legislação social eficaz, um desregramento do regime liberal e um desrespeito para com as condições de trabalho do labor proletário. 26

Submetidos a condições desumanas e sem forças para resistir a estas imposições por parte dos empregadores, os trabalhadores começaram a se reunir em agremiações, associações e/ou sindicatos, a fim de reivindicar respeito a suas pessoas e famílias e melhores condições de trabalho. O movimento em agremiações representava os anseios do proletariado, que não conseguia tirar seu próprio proveito e atingir suas potencialidades no regime liberal e pugnava por uma regulação das relações de trabalho e pela a proteção do Estado, ante a incapacidade do mercado liberal em gerar o bem-estar coletivo.

O mundo pós-queda do absolutismo representou a “Era das Revoluções”, 27 a era do apogeu do liberalismo econômico e social, a era da consolidação dos poderes e definição dos limites territoriais dos países Europeus. A postura imperialista da época refletia o poderio das classes dominantes, mormente da burguesia, detentora do capital. As classes menos favorecidas se viam em intransponível situação de pobreza, violência e opressão; sua única opção era a de integrar os movimentos revolucionários e lutar pela igualdade de oportunidades, já que não poderiam consegui-la por si próprios.

A Revolta ocorrida na Rússia - país que recém se libertara da estrutura agrária e assistia ao êxodo rural e à formação de centros urbanos, como na Europa Ocidental, quando ocorreu o desmoronamento das economias, o agravamento das condições sociais e as greves dos partidos de esquerda foi um sinal do descontentamento com a política econômica liberal. A opção por um governo

26 Segundo Mises, referindo-se a falhas no disciplinamento legal: “Infelizmente, até o momento tem

sido negligenciado o estudo sistemático das instituições legais que farão o sistema competitivo funcionar de maneira eficiente; e com base em sólidos argumentos podemos demonstrar que graves falhas, particularmente com relação às leis de sociedades anônimas e patentes, não só levaram a concorrência a funcionar de modo muito menos eficaz como ainda causaram sua destruição em muitos setores”. MISES, Ludwig von. O Caminho da Servidão. Rio de Janeiro: Instituto Liberal/Editora Nórdica, 1984, p. 59.

27 HOSBAWN, Eric. AEra das Revoluções (1789 – 1848). Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 2. ed,

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comunista, um sistema socialista e uma economia planificada parecia ser o antídoto aos males do capitalismo, e que geraria igualdade entre os cidadãos russos.

O ideário difundido por Marx, em seu manifesto comunista28 determinou a

construção de uma doutrina política socialista. Duas correntes do pensamento comunista se destacaram: o socialismo utópico e o científico; o primeiro exaltar o comunismo e o trabalho rural,29 o segundo, dava ao comunismo uma noção real de luta de classes contra o poder da burguesia e a construção de um modelo político e econômico estatizado. A planificação de economia, a propriedade pública dos bens dos indivíduos, tudo colocava nas mãos do Estado, centralizador do poder e supostamente distribuidor de riquezas, as ingênuas esperanças do ideário de igualdade, em contraposição a separação de classes dada pelo capitalismo do final do século XIX.

Mas a igualdade, ao contrário do que apregoava a máxima socialista, não se faria transparecer, uma vez que o controle político e econômico exercido pelo Estado se transfigurara em autoritário, despótico, atendendo a interesses lucrativos de poucos, sob o pálio de estar atendendo a vontade coletiva. A manutenção de toda essa estrutura se fez debaixo de uma ditadura estatal, sob a cessação das liberdades, um “neofeudalismo”, uma servidão, onde a sociedade em busca de proteção e segurança, arruinada pelo fim da guerra e pela pobreza, aceitava o preço de uma “neo mais-valia”, trabalhando para o “patrão-Estado”, que a protegeria das garras da livre economia. A contradição entre planificação e liberdade e a rejeição das ciências econômicas como base de um regime político foram as críticas dirigidas ao “socialismo puro”, que reinou na União Soviética até à queda do Muro de Berlim, em 1989. Tais críticas foram previstas por Mises e Hayek; este último bem definiu a

28 O intróito do Manifesto Comunista assim dispunha: “Um espectro está assombrando a Europa – o

espectro do Comunismo. Todas as forças da velha Europa fizeram uma santa aliança para exorcizar esse espectro: o papa e o czar, Metternich e Guizot, os franceses radicais e os espiões da polícia alemã.” HEILBRONER, Robert. A História do Pensamento econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1996, p. 131.

29 “Como muitos dos reformistas do início do século dezenove, que relembramos como Socialistas

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política contraditória do socialismo e a sua pseudobandeira da igualdade, ao exclamar:

A certa altura, ela proclama, por exemplo, que todo o homem ‘terá direito de comprar e vender, sem quaisquer restrições discriminatórias, tudo aquilo que pode ser legalmente comprado e vendido’, o que é admirável, e em seguida anula o sentido da proposta acrescentando que ela se aplica apenas à compra e venda ‘nas quantidades e com as restrições que sejam compatíveis com o bem-estar comum’. Mas como, é claro, sempre se presume que todas as restrições impostas à compra e venda de qualquer bem sejam necessárias ao ‘bem-estar comum’, esta cláusula na realidade não impede de maneira efetiva nenhum abuso, nem resguarda qualquer direito individual.30

De fato, o estado socialista revelou-se uma utopia, uma vez que a distribuição de riquezas proposta não foi atendida, interesses particulares continuaram a ser privilegiados, as liberdades foram cerceadas e o acesso à informação sobre a realidade impedido, sem que se houvesse uma melhora nas condições de vida e sem que houvesse a igualdade de oportunidade proposta pelo governo que, no fundo se sabia e se revelou ditatorial, por essência.

Os Estados, em meio a essa divergência entre o sistema capitalista e o socialista, buscaram uma terceira via, na reconstrução do pós-guerra, acenando para um novo modelo econômico de cooperação internacional entre os Estados que poderia obter sucesso. Segundo Falcão:31

No bojo da reorganização política inscrita na Ordem de Versalhes de 1919, a cooperação social, cultural, e financeira entre as nações, passaram a fazer parte da agenda internacional e figuravam dentre os propósitos das nações de proporcionar uma nova era de paz e de crescimento econômico. [...] Sem dúvida, o período que se iniciava viria a lançar, embora de forma precária, as bases de um novo modelo de relação multilateral em um mundo dividido. O incremento do comércio e dos investimentos internacionais parecia demonstrar que a fase mais difícil da economia mundial, aquela que antecedeu a eclosão de Primeira Guerra Mundial, tinha ficado para trás. [...] Contudo, a crise dos meios de pagamento internacionais que, aliada aos problemas econômicos internos das principais economias e, ainda, às perspectivas de um novo conflito de envergadura mundial, contribuiriam para o retrocesso desse cenário otimista. Em conseqüência, os países se voltaram para os seus processos internos, dando origem aos nacionalismos, razão da débâcle do sistema criado a partir de Versalhes. (grifo nosso).

30 HAYEK, Friedrich Auguste. O Caminho da Servidão. Tradução Anna Maria Copovilla, José Ítalo

Sette e Liane de Morais Ribeiro. Rio de Janeiro: Instituto Liberal/ Editora Nórdica, 1984, p. 94.

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Desta divisão do mundo numa ordem bipolar, onde de um lado estavam os simpatizantes de economia capitalista e, de outro, os da política socialista, e o acirramento das disputas imperialistas entre ambos, somados à crise de 1929 e a necessidade de soerguimento das economias afetadas pelas guerras e aos nacionalismos exacerbados das ditaduras emergentes, é que eclodiu a Segunda Guerra Mundial.

As conseqüências advindas de duas guerras mundiais para a ordem social, determinaram o surgimento de um novo regime econômico, o “liberal-social”, cuja essência mistura livre comércio e intervenção estatal, para o bem-estar de uma coletividade.

1.3 O ESTADO SOCIAL- LIBERAL

Da crise do Estado Socialista, que não conseguiu contestar a contradição existente em sua própria gênese, ou seja, não conseguiu, via planificação e da publicização dos meios de produção e da propriedade privada, resolver o problema das desigualdades sociais e gerar o bem-estar de sua coletividade - tendo agido sob os mais despóticos atos e restringido as liberdades individuais dantes conquistadas -, outras teorias foram desenvolvidas-, a-, supostamente-, glosar as necessidades individuais e as coletivas, com o fito de proporcionar a comodidade da população, contraposta esta às externalidades negativas sistema capitalista individualista e a ditadura do socialismo.

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Dessa intervenção estatal, surgiu um novo modelo de sociedade, o social-liberal (ou social-liberal-social) onde, não obstante se tivessem liberdades e predominassem o livre-comércio, as forças políticas estatais conduziriam os rumos dessas relações e nelas interviria, para resguardar os interesses da população e do país, ocasionando, em última instância, o bem-estar destes.32

A ordem mundial do pós-Guerra, a exemplo da primeira, pugnava por uma reconstrução das nações, não só econômica, mas política, a permitir o soerguimento mercadológico das nações e entre elas, e a permitir a aplicação de uma política cosmopolita, ampliando a cooperação entre os Estados. Com o apoio dos Estados Unidos da América, que compunha o bloco dos países aliados, na Segunda-Guerra Mundial, e com a teoria de recuperação e reconstrução européia, proposta pelo então Secretário de Estado, George Marshall, ante, obviamente, a aceitação dos Estados Europeus em aderir a estas premissas de restauração estatal, a movimentação em torno de ajustes diplomáticos resultaram nas conferências de Bretton Woods, em New Hampshire, nos EUA, em 1944.

De Bretton Woods, organizações internacionais foram criadas, através de tratados internacionais firmados entre os Estados Interessados com a ONU (Organização das Nações Unidas, que veio a substituir a tentativa anterior consubstanciada na Liga das Nações, em 1919). Estes organismos internacionais serviram de base para a reconstrução das nações e a manutenção da paz, bem como para o desenvolvimento de políticas estruturais e de expansão comercial, com o pressuposto da igualdade entre os Estados. Importante destacar que surgiram vários organismos internacionais em todo o mundo, afora a ONU e que muitos deles há desmembramentos internos, segundo sua área de atuação. Há, por exemplo, a OIT, agência da ONU, especializada em assuntos relativos ao Trabalho. Há a FAO, da mesma forma, responsável pela agricultura e alimentação. Importante, não obstante, destacar o GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) entabulado em 1947 e que, embora não tivesse as prerrogativas de atuação e a força normativa,

32 “Com o término do conflito mundial em 1945 o modelo capitalista vitorioso suscita a presença de

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fiscalizadora e punitiva dos demais, funcionava como um foro comercial mundial, onde se propunham e se discutiam concessões, barreiras e compensações visando equilibrar essas relações; o GATT, em 1995, deu lugar à OMC, organização internacional responsável pelas negociações do comércio mundial.

Entretanto, para que todo esse aparato internacional pudesse ter eficácia, os Estados tiveram que assentir certa interferência desses organismos internacionais nos seus ordenamentos jurídicos pátrios. Ou seja, tiveram que soberanamente consentir que uma regra emanada de um outro sujeito de direito, que não o Estado, tivesse eficácia em seu território nacional. Mesmo aqueles mais extremistas, mesmo aqueles do pós-Guerra, em aceitando a ajuda e o direcionamento dos organismos internacionais, aceitaram uma regra internacional, uma intervenção no seu estado soberano, visando a recuperação e a paz.

Os organismos internacionais, como a ONU,33 fundada em 1945 através de um tratado internacional, e seus órgãos especializados, possuem não só a função de recuperação, mas também a função de fomento do desenvolvimento de seus países membros (que atualmente são 192). Para que tal ajuda possa ser fornecida, hão de ser cumpridos uma série de requisitos, através de uma análise seletiva e de desempenho do Estado, para que o FMI e o Banco Mundial (BIRD) possam investir recursos e implementar seus projetos de desenvolvimento para com o país que solicitou essa “atuação”. 34 Assim, a concessão de “empréstimos” ou de subsídios a

um país implica, com relação a este, na responsabilidade da correta aplicação dos recursos que lhe forem destinados, pois sob fiscalização do próprio organismo internacional.

A idéia difundida freqüentemente, quanto a atuação dos organismos internacionais, de agirem de forma imperialista e de exercerem uma intervenção anulatória da Soberania dos Estados, deixa dúvidas quanto a sua veracidade e extensão, uma vez que, mesmo admitindo-se uma indesejável imposição de regras

33 A Carta das Nações Unidas tem como objetivos “manter a paz e a segurança no mundo, fomentar

relações cordiais entre as nações, promover progresso social, melhores padrões de vida e direitos humanos.” Disponível em http://www.onu-brasil.org.br/doc1.php Acesso em 14.apr.2007.

34 “Atuação” no sentido de propor projetos e fiscalizar a aplicação dos recursos disponibilizados, em

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para com os Estados em Desenvolvimento, a ferir seu poder soberano, há de se levar em consideração que os próprios países são quem solicitam tal ajuda, e que deveriam estes observar a sua capacidade de endividamento ou reestruturar suas arestas a melhor aplicar o dinheiro e a dinamizar e moralizar suas estruturas políticas e econômicas para a otimização do emprego da verba, sem comprometer em muito, o orçamento nacional.

Infelizmente, alguns países, mal empregando suas verbas públicas, incluindo os empréstimos internacionais, se colocam perante a sociedade internacional, como vítima de organismos aos quais manifestou livremente sua adesão e a cujos préstimos e projetos recorreu sob a promessa de ótimo emprego dos valores e bem-estar da sociedade. Crítica a esta conduta, foi feita por meio da citação de Roberto Campos, por Almeida nos seguintes termos:

Uma das características dos países subdesenvolvidos é a contínua busca de bodes expiatórios para explicar as frustrações internas. A demonologia torna-se um esporte natural, para explicar a pobreza. É difícil reconhecer que a culpa está em nós mesmo e não nos demônios.35

Então, fato importante consiste no crescimento, na desorganização, desestruturação e em fatores políticos de condução de suas atividades sociais e da programação econômica dos países, no período pós-guerras, e com a implantação do dirigismo, na figura do pretendido Estado Social Liberal - onde as relações particulares e a economia em tese gozavam de liberdade, mas o Estado nelas intervinha para lhes garantir a escorreita atuação em vista do bem-estar da coletividade. Essa intervenção no domínio econômico delegou ao estado funções outras além da fiscalização, como a do Estado produtor, responsável pela infra-estrutura, e pela distribuição de renda a gerar a felicidade da população em geral, subsidiada por políticas sociais grandiosas (como a proposta de “eliminação” da pobreza e das diferenças entre classes – esta com cunho socialista), mas muitas vezes utópicas ou obstadas pela corrupção intragovernamental. Isso terminou por causar a crise do Estado-Providência, a sua insustentabilidade, o seu alargamento, a sua falta de controle, a sua incapacidade de gerência e o seu déficit.

35 CAMPOS apud ALMEIDA, Paulo Roberto; GIAMBIAGI, Fábio. Morte do Consenso de Washington? os rumores a esse respeito parecem muito exagerados. p. 07. Disponível em

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O alargamento das bases dos Estados determinou, ao final da década de oitenta, sua derrocada. Mas antes disso, vários fatores concorreram para a boa imagem deste regime social liberal, na idéia de uma igualdade pura.36 Desta forma,

os Estados foram avocando e acumulando funções, as máquinas administrativas foram crescendo a uma velocidade e extensão diretamente proporcional ao desejo de bem-estar do povo, mas inversamente proporcional a sua sustentação. Entre os anos cinqüenta e sessenta, essa superestrutura já era criticada, principalmente, pelos economistas da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, tida como conservadora, e que teve seu maior expoente na figura de Milton Friedman, como falível tendo em vista a possibilidade, via controle do Estado, de efeitos adversos, baseados no controle de preços, da moeda, das divisas, do câmbio, formação de monopólios, que levaria a inflação, mais se sustentando, a longo prazo, a intervenção na política econômica feita pelos governos sociais liberais, no controle da macroeconomia. Pregavam, pois, a liberalização econômica, no lugar do controle estatal sobre os agentes econômico como fator de desenvolvimento.

Mas, a despeito das advertências neoliberais dos “Chicago Boys”, os estados desenvolveram, cada vez mais, superestruturas, durante as décadas de setenta e oitenta, tanto na Europa quanto nas Américas e se utilizaram do Estado de Direito e da concentração de poderes, como formula de manutenção das idéias nacionalistas. Porém, nas sociais-democracias que se seguiram às quedas dos regimes ditatoriais, o regime concentrador de poderes no Estado foi mantido e o estado legitimado a dizer a vontade pública, embora regulando-a e restringindo-a.

Nos idos dos anos setenta, também as crises do petróleo, de 1973 e 1979 alertaram para um fim de década de impendia mudanças, alertaram para a falta de capacidade de auto-recuperação dos Estados, sustentada no tamanho dos mesmos. A elevação súbita e exagerada dos preços do petróleo pelos países membros da OPEP expôs a vulnerabilidade dos PIB’s dos países importadores de petróleo, que sofreram uma alta significativa nos níveis de endividamento interno e externo, alta da inflação para contrabalancear a economia nas quedas abruptadas causadas pelo Império Petrolífico Mundial (OPEP). Caso o tamanho dos Estados e os gastos

36 E não uma igualdade que oferecesse tratamento igual aos iguais e desigual aos desiguais, a

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públicos fossem mais modestos, decerto, as conseqüências seriam contornáveis e talvez não terminassem em crises econômicas. O Estado atingido por uma crise internacional, caso sua economia se sustentasse sem depender da intervenção estatal, teria condições de estimular as exportações de outros produtos e manter a balança de pagamentos positiva. Mas, o gigantismo dos Estados, à época, foi fator que influenciou vários deles nas suas recuperações econômicas.

Nos anos noventa, a especulação cambial e seus efeitos de fizeram sentir, após a crise da desvalorização cambial dos tigres asiáticos e das suas economias, pela desconfiança dos agentes do mercado financeiro com relação aos seus investimentos. Essa desconfiança, traduzida em fuga de capitais, abrupta, atingiu as economias dos países que comercializavam com os asiáticos e os investidores daqueles que temiam a perda de investimentos. O tamanho do Estado que tudo faz, tudo financia e pouca liberdade dá aos seus atores econômicos, se traduz na impossibilidade de se mostrar seguro, perante o mercado cambial, estimulando as exportações a sustentar eventuais quedas internas nas suas economias. A segurança jurídica pretendida pelos investidores, no mercado cambial, não pode ser garantida sem uma abertura comercial, a atrair divisas e a proteger o próprio país perante oscilações mercadológicas e cambiais. A avocação do Estado também do controle cambial, em moldes rígidos ou centralizador, impede a própria subsistência em crises.

Inaugurado o mundo pós-moderno com as mudanças que se seguiram à crise do petróleo, importante fato, que consolidou ainda mais a hegemonia do capital, foi a queda do regime socialista, cujo marco foi a queda do Muro de Berlim, na Alemanha, em 1989, que significou o rompimento das barreiras entre o mundo socialista e o capitalista, sob o triunfo desta última ordem. Não que a simples queda de um muro tenha feito ruir uma ordem como a socialista,37 o que se quer dizer é que este evento simbolizou o ruir de uma ordem que já falira, e junto com ela o ruir também de

37 “E ainda em termos midiáticos e ideológicos, a derrota do socialismo real aumentou a crença nos

valores neoliberais. Como se a queda do muro de Berlim, a glasnost e a perestroika confirmassem os supremos ideais da liberdade de mercado, aquele “efeito de demonstração” apontado por Perry Anderson, como segue: “o dinamismo continuado do neoliberalismo como força ideológica em escala mundial está sustentado em grande parte, hoje, por esse efeito de demonstração do mundo pós-soviético. Os neoliberais podem gabar-se de estar à frente de uma transformação sócio-econômica gigantesca, que vais perdurar por décadas”. Apud GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes.

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qualquer intervencionismo estatal, a crise do estado estava latente, houvera nova ruptura na história, a era do estado socialista, do estado social-liberal, do intervencionismo, era finda, explícita era a necessidade de um estado pós-moderno, de uma terceira via, de uma novíssima ordem, proclamada pelas crises que se seguiram à do petróleo e se fragmentaram em Berlim.

Se havia uma “nova ordem mundial”, como argumentam os cientistas políticos e os doutrinadores das relações internacionais, cuja gênese se deu após a Segunda Guerra Mundial, na maior troca comercial e maior cooperação entre os países, a partir da crise do Estado intervencionista e com a derrocada da ordem socialista, nasceu uma “novíssima ordem”, abandonada de quaisquer idéias socialistas, cujo fomento das relações entre os Estados passa a ter uma nova significação: fortalecimento, segurança, respeito, mas, acima de tudo, sobrevivência, dada à situação de interdependência mundial causada pela crescente transnacionalização de capitais estrangeiros, trocas comerciais, convenções, tratados e acordos de cooperação. Enfim, a ordem consolidada nos anos setenta, transnacional, ganhou contornos inexoráveis e determinou a queda de barreiras comerciais e políticas, de intensidade e amplitude antes nunca imaginadas.

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Tabela 1. Regulação Estatal. Modelo clássico versus privatizado.
Tabela 2. Brasil. Dados Macroeconômicos.

Referências

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