• Nenhum resultado encontrado

Diálogos do cotidiano escolar : desafios e possibilidades para (re) pensar a prática docente

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Diálogos do cotidiano escolar : desafios e possibilidades para (re) pensar a prática docente"

Copied!
98
0
0

Texto

(1)

Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação

DIÁLOGOS DO COTIDIANO ESCOLAR: DESAFIOS E

POSSIBILIDADES PARA (RE)PENSAR A PRÁTICA DOCENTE

Brasília - DF

2014

Autora: Elsa Helena Almeida Silva Balluz

(2)

ELSA HELENA ALMEIDA SILVA BALLUZ

DIÁLOGOS DO COTIDIANO ESCOLAR: DESAFIOS E POSSIBILIDADES PARA (RE)PENSAR A PRÁTICA DOCENTE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Mestrado em Educação da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Educação.

Orientador: Prof. Dr. Luiz Síveres

(3)

B193d Balluz, Elsa Helena Almeida Silva.

Diálogos do cotidiano escolar: desafios e possibilidades para (re) pensar a prática docente. / Elsa Helena Almeida Silva Balluz – 2014.

95 f.; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2014. Orientação: Prof. Dr. Luiz Síveres

1. Educação. 2. Diálogo. 3. Autonomia. 4. Reflexão acadêmica. 5. Prática de ensino. I. Síveres, Luiz, orient. II. Título.

CDU 37.013

(4)

Dissertação de autoria de ELSA HELENA ALMEIDA SILVA BALLUZ, intitulada “DIÁLOGOS DO COTIDIANO ESCOLAR: DESAFIOS E POSSIBILIDADES PARA (RE) PENSAR A PRÁTICA DOCENTE”, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre no Programa do Mestrado em Educação da Universidade Católica de Brasília, em ___/____/____, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

__________________________________________________________ PROF. DR. LUIZ SÍVERES

ORIENTADOR

MESTRADO EM EDUCAÇÃO/UCB

__________________________________________________________ PROF.ª DRª. SANDRA FRANCESCA CONTE DE ALMEIDA

MESTRADO EM EDUCAÇÃO/UCB EXAMINADORA INTERNA

__________________________________________________________ PROF. DR. MARCOS AURÉLIO FERNANDES

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA EXAMINADOR EXTERNO

(5)

AGRADECIMENTOS

Ao Professor Doutor Luiz Síveres, pela rica contribuição de vida, pela paciente orientação e pelo testemunho de educador, com quem pude reabrir portas e janelas do conhecimento em grandes momentos dessa trajetória e a quem aprendi a admirar;

Aos professores do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Católica de Brasília por reacender em mim a chama inspiradora da força e do papel social da educação, dando-me coragem suficiente para retomar meu caminho como pedagoga;

Aos sujeitos desta pesquisa, pela aceitação em participar da mesma, tornando possível sua realização;

Aos meus amigos, a quem reverencio na pessoa de Therezinha Matos, que acolheram minhas preocupações, dando-me força e estímulos necessários para meu caminhar;

À Maria da Graça Oliveira, a Gracinha, pelo apoio no começo de tudo, ainda como aluna especial;

Aos meus colegas pedagogos, em especial à Caroline Barros Gondinho, minha querida ex-aluna e agora companheira de trabalho, pela assistência na fase final da pesquisa;

Aos meus pais, Elimar e José Antônio, pelo amor incondicional e apoio irrestrito, sobretudo pelo exemplo de integridade, força e fé na vida;

À Abelardo Balluz, que há 30 anos decidiu caminhar ao meu lado e me privilegia com seu amor cotidianamente;

A Camila e Carolina, minhas melhores produções, filhas queridas que me ensinaram a amar infinitamente, e, que compreenderam minha ausência, pacientemente;

(6)

Parte, deixa o ninho para se enriquecer com os costumes de outros lugares, aí ouvir palavras nunca antes proferidas.

Expõe o corpo ao vento e à chuva porque, para ser verdadeiramente educado, é preciso se expor ao outro, esposar a alteridade e renascer mestiço.

(7)

RESUMO

Referência: BALLUZ, Elsa Helena Almeida Silva. Diálogos do cotidiano escolar: desafios e possibilidades para (re) pensar a prática docente. 2014. 93 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2014.

Este trabalho teve por objetivo identificar os desafios e possibilidades que os diálogos no cotidiano escolar proporcionam para repensar a prática docente, averiguar o grau de importância dos diálogos no cotidiano e investigar a contribuição de uma atitude autônoma e reflexiva para a efetivação dos diálogos no exercício dessa prática. A estratégia metodológica desta pesquisa caracterizou-se por uma abordagem qualitativa, na perspectiva dos sujeitos envolvidos, todos professores do Ensino Fundamental, atuantes em escolas da rede pública e privada, no município de São Luís, estado do Maranhão. Foi utilizada a entrevista semiestruturada, gravadas e transcritas, para análise de seu conteúdo, procedimento escolhido para tratamento dos dados coletados. Com base nos resultados, inferiu-se que os desafios e possibilidades são muitos e se configuram como entraves, justamente pela ausência de diálogo no cotidiano que agrava o abismo geracional existente entre professores e alunos. Os respondentes evidenciam que são frutos de sua própria experiência discente aos níveis básico e superior e, como profissionais, sentem-se exigidos por uma nova práxis, por uma maior abertura, uma atitude autônoma, que não está clara e definida, pela prática reflexiva como possibilidade de conhecer quem são seus alunos, estes últimos, nativos digitais, geração marcada pela velocidade das informações, pela virtualização das relações e encurtamento das distâncias, fatores inerentes à era da informação, que trata o processo de aquisição do conhecimento de forma muito diferente da qual os próprios professores estão acostumados ou foram formados. O alargamento das matrículas e o acesso aos bancos escolares também se colocam como questões importantes, uma vez que não foram preparados os professores, nas instituições acadêmicas, para lidar com o universo de situações de tamanha complexidade, que compreende desde a percepção das fases do desenvolvimento humano, as influências sentidas pelo avanço tecnológico, quanto às demais situações que envolvem o professor, situações estas que extrapolam em muito o exercício da docência. Os desafios para implementação de um novo modelo de escola serão superados quando houver, por parte da docência, e seu protagonismo profissional, o desenvolvimento de um processo de adesão, ação e autoconsciência do professor, como dimensões decisivas para a postura reflexiva de sua forma de agir e conduzir sua práxis educativa, para, nessa perspectiva, desenvolver processos significativos de aprendizagem no cotidiano escolar, ao entender que a escola deva ser um ambiente de flexibilidade, adaptabilidade e construção coletiva.

(8)

ABSTRACT

This study aimed to identify the challenges and possibilities that the dialogues of daily school life provide for rethinking teaching practices, to ascertain the degree of importance of dialogues in everyday life and to investigate the contribution of an autonomous and reflective approach to the realization of dialogues in exercising these practices. The methodological strategy of this research was characterized by a qualitative approach, from the perspective of those involved, all of whom are elementary school teachers, working in public and private schools in São Luís, Maranhão. Data collection consisted of semi-structured interviews that were taped, transcribed and analyzed. Based on the results, it was inferred that the challenges and possibilities are many, and that they become obstacles due to a lack of dialogue in everyday school life, aggravating the generational abyss which exists between teachers and students. Respondents show that they are the result of their own experiences as students at basic and higher levels of education and as professionals. They feel required by a new praxis for greater openness, and an autonomous attitude which is not yet clear nor defined. They also feel the possibility, though reflective practice, of knowing who their students, who are digital natives, part of a generation marked by the speed of information, the virtualization of relationships and the shortening of distances. These factors are inherent to the information age, in which the processes of acquiring knowledge differ greatly from those which the teachers themselves are used to or were exposed to. The increase of enrollment and greater access to school banks also pose significant issues, since teachers in academic institutions were not prepared to manage such complex situations, ranging from the perception of the stages of human development, the influences of technological advancement, to other situations involving the teacher which go beyond the practice of teaching. The challenges of implementing a new school model will be overcome when, through their teaching and in their professional roles, teachers develope a process of aceptance, action, and self-consciousness. These are the decisive dimensions for the reflexive attitude of the way in which they will act and execute their educational praxis as to develop meaningful learning processes in school life, to understand that school should be an environment of flexibility, adaptability and collective construction.

(9)

LISTA DE SIGLAS

CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior FMI – Fundo Monetário Internacional

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIRD - Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento

OCDE - Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe OERLAC - Oficina Regional de Educação para a América Latina

OIT - Organização Internacional do Trabalho

UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura

(10)
(11)

1 INTRODUÇÃO

A velocidade das transformações ocorridas no século XX e neste início de século XXI provoca intensa reflexão no campo acadêmico, causando uma profusão de pesquisas e trabalhos na tentativa de investigar e conhecer os fenômenos sociais e seus impactos no campo educativo. Um dos aspectos considerados de maior relevância, é que, em escala mundial, e principalmente no Brasil, percebe-se um aumento significativo do acesso à educação em dissonância com um vertiginoso abismo entre a formação profissional nos currículos universitários e a prática docente da escola contemporânea, além da já configurada desigualdade na distribuição de riquezas.

Os entraves que obstaculizam a educação básica sugerem toda sorte de situações, ligadas diretamente à docência ou não, em circunstâncias delicadas, dada a rede de relações que se constituem no cotidiano escolar, no chão da sala de aula, entre professores e alunos. O universo em questão, permeado pela ação humana, carece de um olhar através de uma lente de aumento, uma lupa, oferecendo uma visão melhor sobre o interior da escola e, mais adiante, dos processos de ação-reflexão, dentro e fora dela.

Nessa busca, impossível imergir nesse campo sem o rigor necessário a todo trabalho científico, baseado na escolha por um ponto de vista que direcione ou clarifique os estudos para a formulação de um ideal articulado com a realidade. Portanto, o conhecer para compreender deu-se pela opção em dialogar com os professores, em seu cotidiano, para extrair-lhes observações, não respostas, para compartilhar ideias, não ideologias, acerca dos desafios e possibilidades que se impõem aos educadores atuais.

(12)

Ao buscar compreender o espaço educativo, em sua dialogicidade, partiu-se de uma ideia primeira sobre o diálogo, dos seus significados, da sua importância, da sua presença e de sua validade. Então foi sendo tecida uma teia, percebidos os nós, observado o entorno, os sujeitos, o individual e o coletivo.

Mas, pesquisar a escola em seu cotidiano não parece uma questão inédita, diante do número de estudos e pesquisas sobre o tema. A originalidade está justamente na ousadia, na busca pelo novo no que já parece velho, desgastado, na leitura crítica da realidade sob o ponto de vista pessoal, ao permitir-se o pesquisador vivenciar suas próprias inquietações, de forma autônoma, criativa e rigorosa, como nas palavras de Severino (2007, p. 215), “em vista de sua relação com o universo envolvido”.

Vale ressaltar a riqueza de tantos trabalhos científicos e obras publicadas no intuito de esclarecer os paradoxos do processo educativo, assim como os paradigmas e teorias amplamente visitados por filósofos, pedagogos e psicólogos que se debruçaram sobre a problemática, a fim de entender e justificar seus princípios e concepções de homem e mundo. São temas introduzidos no corpo do trabalho, a partir de um processo dialético, diante da pujança de muitos estudos que buscaram e buscam conhecer a realidade educacional, por diferentes abordagens, não necessariamente divergentes, para entender o vazio geracional, entre os atores envolvidos, motivo este que insiste em colocar a educação em situação de crise.

Um exemplo disso, entre tantos estudiosos e autores, traz Victorio Filho (2002), Alves (2006), Garcia (2009), que tratam desta relação, na tentativa de identificar e circunscrever ações que, se não resolutas de todo, buscam minimizar este vazio, na proposição de novos currículos universitários, na ênfase da formação permanente e, mais recentemente, in loco, ou seja, na escola, campo de atuação dos profissionais professores, e que ainda, ressalta Imbernón (2009), são cobrados cada vez mais para resolver problemas sociais, aumentando, sobremaneira, o leque de atuação e solicitações, que exigem um aparato de conhecimentos nunca antes vistos ao colocar a educação no topo das críticas sociais, bem como na efetivação das ações e políticas públicas atuais.

(13)

confrontação que o real do trabalho é apreendido”, pois é expressão da relação com os outros, consigo mesmo e com a matéria do trabalho.

No entanto, o profissional docente precisa perceber-se como sujeito do processo educativo, e, para que isso ocorra, é necessário que o mesmo faça uma análise de sua atuação, de sua história de vida, em processo reflexivo, para entender-se como pessoa, e compreender-se para atuar como professor. Implica considerar que as transformações precisam vir de dentro, ou seja, pelos próprios professores, rompendo com o silêncio e a alienação, a fim de solapar a onda histórica de desqualificação profissional, pessoal e criativa, que só prejudica ainda mais o processo educativo, para extinguir o que caracteriza-se, segundo Imbernón (2009, p. 90), o “autismo pedagógico” vigente.

Ora, então como o professor de hoje, com um tempo significativo de carreira docente, pode perceber-se como indispensável ou agente no processo de mudança do país, se a ele, privilegiado, sim, por que teve acesso à escola, à universidade, foi oferecida uma visão míope da realidade? Como exigir uma postura autônoma desse profissional, se em sua formação universitária, não foi provocado a pensar reflexivamente sobre a realidade? Estes questionamentos subsidiaram o caminho escolhido para o estudo no cotidiano escolar – e nele, a presença do diálogo, ou a sua ausência – por considerar que a prática do professor tem início quando este observa a prática dos seus professores, evidenciando, portanto, que o processo formativo é de natureza social, desde sua origem, pois os professores se constituem como tal em atividades interpessoais, seja em seu período de preparação, seja ao longo da carreira.

(14)

Decerto que a educação atual carece de novos propósitos, uma vez que já não mais atende até mesmo ao modo de produção vigente. O desenrolar de uma nova economia, em um processo de mundialização diante dos avanços tecnológicos, desemboca em um novo tipo de pobreza, agora de origem intelectual, ou info-pobres, como sugere Assmann (2011), que provocam um novo pensar na formação do professor, e em consequência, na reestruturação de sua atuação na docência, já que não se consente como apenas focada na transmissão de conteúdos, mas como profissional que possui visão ecológica e planetária do mundo. (RIVERO, 2004).

A “sociedade aprendente”, modelo que preconiza o estado de aprendizagem como condição para inclusão social, para Assmann (2011) funda-se no eixo da equivalência entre processo vital e conhecimento. Para este autor, a educação terá “um papel dominante na criação da sensibilidade social necessária para reorientar a humanidade”. (ASSMANN, 2011, p. 26).

Para Libaneo (2010), a educação implica diretamente o repensar na sala de aula, onde ações e decisões devem ser tomadas, no sentido de promover a aprendizagem dos sujeitos envolvidos, e em ato contínuo, prepará-los para agir criticamente e viver dignamente em sociedade. A responsabilidade ética e social, é pano de fundo para a atuação docente e seu agir pedagógico já que envolve o destino humano das pessoas. Determinante da condição de exclusão ou inclusão social deve ser ponto de partida, para desenvolver aprendizagens e saberes originados nas relações cotidianas e experiências socioculturais, isto é, a cultura da vida cotidiana.

Nessa direção, a escola, local de circulação e atualização de novos conhecimentos, adquire como consequência natural o caráter sócio-político desejado, constituindo-se canal de comunicação, essencial ao processo de construção e reflexão crítica, como argumenta Benassuly (2002), pautada no pensamento de Foucault, que prima pelo homem a partir de sua cotidianidade, e Habermas, através da hermenêutica e da dialética, onde a linguagem constitui-se como veículo de construção libertadora.

(15)

implica de modo algum que de agora em diante e por décadas ou séculos, os homens vão dizer e pensar a mesma coisa”. (FOUCALT, 2007, p. 167).

Em Habermas, vê-se que a interação entre indivíduos constrói as estruturas intersubjetivas de uma sociedade, enquanto os recursos dessas estruturas são mobilizados no agir comunicativo para formar o indivíduo. Segundo o filósofo, “a reprodução do mundo da vida é alimentada através das contribuições do agir comunicativo, enquanto a última é alimentada, simultaneamente, através dos recursos do mundo da vida” (HABERMAS, 2003, p. 162). Nessa direção, para o autor, a sociedade e o indivíduo constituem-se um ao outro reciprocamente, portanto, não diferentemente no cotidiano escolar, onde a linguagem exerce uma função pragmática essencial, fundante de um projeto educativo que apresente o diálogo, a interação e o entendimento, como formas indispensáveis a toda ação pedagógica.

A formação docente se configura como questão emergencial, não só pela necessidade de correção da disparidade entre teoria e prática tão presente na história da educação brasileira, mas pela função que assume de alavanca possível para o desenvolvimento, onde mais do que nunca, exige-se do país, ter uma população atenta para os novos rumos econômicos, quando, de forma inédita, são atraídos recursos e projetos de ordem internacional, que abrem portas para a mobilidade social em terras pátrias.

Segundo Linhares, apesar da ocorrência dessas aproximações, das quais participam toda a ordem tecnológica globalizante, que promovem ambiências de alta ambiguidade, é preciso considerar “[...] o multiculturalismo como uma condição inescapável do mundo ocidental, à qual se pode responder de diferentes formas, mas não se pode ignorar”. (LINHARES, 2011, p. 29). Para a autora, o engessamento da escola, encastelada na rotina de transmissão de conteúdos que banaliza toda e qualquer tentativa de relação dialógica, castiga as diferenças culturais, sob a égide de “desejar ser como os outros”, ao perseguir modelos educativos que se destacam nos rankings internacionais.

(16)

pior, perpetuando cicatrizes indeléveis de um quadro que não proporciona aos aprendizes o desenvolvimento da criatividade e da autonomia, pilares da competência da compreensão, condição para aquisição e usufruto pleno da cidadania.

Para Linhares (2011), cabe aos profissionais da educação revisitar Paulo Freire e Michel Foucault que convergem ao afirmar que o papel do intelectual ou do educador não é determinar o que tem de ser feito, mas empenhar-se juntos, desmitificando os obstáculos, entraves e dogmas instituídos, que constituem as situações opressoras, a fim de encontrar razões suficientes para acreditar no potencial da educação.

Nessa lógica, é preciso romper com o que está posto, ou universalmente prescrito, e aliar o conhecimento técnico, profissional, à prática inclusiva, experiencial, vivida, ou em outras palavras, na legitimização dos sujeitos envolvidos, e de seu próprio lugar, construir um saber social, dotado de capacidades para lidar com a diversidade, que se adquire a partir de uma concepção dialógica, reflexiva, autocrítica, que permita ao professor concretizar seu potencial educativo, por meio do processo investigativo da realidade.

A formação de ontem não dá conta dos desafios de hoje. É necessário repensar as ideias e ações, é preciso assumir uma formação contínua, progressiva, que alcance o amadurecimento pessoal e profissional, que conduz ao exercício do diálogo, da interação, à busca de sua própria autonomia, do compromisso e da responsabilidade pela transformação, pelo crescimento constante, legítimo papel da docência.

(17)

2 PROBLEMA

Nesse processo dialético, de ser e estar no mundo, é que se pode identificar a forma como se caracteriza a ação docente, reconhecendo a sua intencionalidade, mas principalmente, sua responsabilidade em trabalhar para construir a história de outros tempos e espaços.

Para Ferraço (2008), não há outro modo possível de pesquisar a complexidade da realidade educacional se não nos dispusermos a estabelecer relações com os saberes e fazeres que habitam as escolas. E, nessa linha de argumentação, há, segundo Pimenta (2008), o imbricamento entre ontologia e epistemologia, que se constitui como principal avanço nas discussões sobre a formação do professor e sua articulação com a escola, na compreensão da dimensão política do fazer educativo, e, por meio de relações dialógicas e dialéticas, investigar a percepção do profissional docente sobre a necessidade de (re)pensar sua prática em tempos e espaços contemporâneos. Sabedores da relevância social da educação formal, nos perguntamos por que a escola não se renova? Como avançar nas questões atuais sem dialogar com a geração que hoje ensinamos? São questões postas e discutidas. O que não podemos, certamente, é continuar a ser escola do século XIX, professores do século XX e alunos do século XXI.

Na constituição dessas relações a pesquisa pretendeu focalizar o profissional docente no Ensino Fundamental, a fim de identificar a percepção dos protagonistas sobre a importância do diálogo, na forma de atuar e ser professor, refletindo sobre a tessitura de sua trajetória, e nessa perspectiva dialógica, considerar seu contexto de trabalho, para que possam ser autores dos projetos de mudança, necessários para o (re) conhecimento de sua identidade docente e, em consequência, contributo para uma nova dinâmica de construção do conhecimento.

(18)
(19)

3 JUSTIFICATIVA

A superação dos entraves instalados na prática docente através da racionalidade técnica exige diversos mecanismos de mudança, com o objetivo de possibilitar ao professor entender a forma em que realmente se encontram as situações problemáticas e os desafios impostos, a fim de compreendê-los e servir como pano de fundo para a reformulação coerente por meio de critérios investigativos de sua ação no exercício da docência. (CONTRERAS, 2002; GHEDIN; ALMEIDA; LEITE, 2008).

Para McKernan (2009), as condições atuais de ensino nas escolas e faculdades de educação imprimem uma ênfase na sobrevivência, em constante dissociação do ensino com a pesquisa, ao categorizar ensino para a educação básica e pesquisa em nível universitário. Por outro lado, ainda segundo o autor, cabe aos professores da educação básica formar os jovens para um futuro desconhecido e imprevisível, e, para tanto, os atores sociais aqui envolvidos, professores e alunos, devem ser produtores de conhecimento, o que se efetiva na condução de uma prática comprometida social e politicamente. Em compasso com as novas exigências atuais, carece assegurar que a formação docente possibilite ao sujeito professor lidar com o processo formativo dos seus educandos na sua completude. Para Ghedin, Almeida e Leite (2008, p. 31), “[...] em todas as suas dimensões, ou seja, ir além da cognitiva, ao contemplar a afetiva, da educação dos sentidos, da estética, da ética e dos valores emocionais”.

A articulação necessária para a garantia dessas conquistas se estabelece na prática da pesquisa educacional, por meio do protagonismo dos sujeitos educativos como pesquisadores do novo paradigma educativo, agora pautado na aprendizagem, envolto em uma relação dialógica e colaborativa, outorgando um modus operandi diferente do que é até então praticado, como um direito democrático ou ato de responsabilidade cultural, no pleno exercício da docência, na ação conjunta e efetiva para criar oportunidades e condições de mudança, de construção e reconstrução social (FERRAÇO 2008; OLIVEIRA, 2008; MCKERNAN, 2009).

(20)

esfera macro, das políticas públicas e ações governamentais, seja nos processos gestores da escola, do currículo e, em menor escala, da sala de aula. (LINHARES, 2011).

Morin (2002) diz que o sujeito é levado à condição de construtor e reconstrutor de sua autonomia, aquele que inventa, modifica as realidades e participa das transformações sociais que são, por assim dizer, anunciadoras de um novo paradigma. Este novo professor, reflexivo e inventivo, deve buscar desenvolver suas práticas pedagógicas, reconhecendo-se sujeito histórico, ser pensante, pautado em concepções de homem e mundo que transcendam aos modelos impostos de sociedade, ressignificando o espaço escolar. Aliado a esse pensamento, como cidadão e sujeito de sua aprendizagem, Síveres (2011), define autonomia como processo que promove a potencialidade individual, social e artística, sendo cada uma, individual e coletivamente, a própria expressão de seu crescimento.

Ao entender que a realidade do processo educativo é movimento, fruto de interrelações pessoais e das experiências dos sujeitos envolvidos, em constante vir a ser, o professor deve questionar abertamente sua prática, e, na forma de diálogo em seu cotidiano, campo fértil de possibilidades e flexibilidade adaptativa, buscar a formulação de novas propostas que atendam ao conjunto de expectativas já anunciadas na virada do milênio, na concepção de homem inventivo e reflexivo, exigência do novo modelo societário. (ASSMANN, 2011; RIVERO, 2004).

(21)

4 OBJETIVOS

4.1 OBJETIVO GERAL

Identificar os desafios e possibilidades que os diálogos no cotidiano escolar proporcionam para repensar a prática docente.

4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Averiguar o grau de importância dos diálogos do cotidiano para a prática docente na concepção dos professores participantes da pesquisa;

(22)

5 MÉTODO

A estratégia metodológica desta pesquisa caracterizou-se por uma abordagem qualitativa, de caráter exploratório, que ao se constituir de material interpretativo, segundo Denzin e Lincoln (2006), coloca o observador no mundo, tornando-o visível, na perspectiva dos sujeitos envolvidos e suas significações. A fim de alcançar os objetivos elencados, o trabalho ocorreu no cenário natural onde o fenômeno foi investigado, oportunidade para explorar com alguma profundidade as experiências e motivações das pessoas, que, segundo Bauer e Gaskel (2002), surgem de forma espontânea e determinada pela naturalidade do discurso, dado como se expressaram os respondentes, em ato reflexo de suas próprias formulações, ainda que, no entender de Demo (2012), a qualidade da participação não promova uma volta no tempo, mas, promova uma possibilidade de evolução.

Surgida inicialmente no campo da Antropologia, nos últimos anos, a pesquisa qualitativa ganhou espaço nos estudos da Psicologia e da Pedagogia, com o objetivo de compreender os processos que ocorrem em uma dada instituição ou comunidade, sendo, por esta razão, classificadas como exploratórias ou descritivas, e seu estudo serve fundamentalmente à tríade: contribuição para a construção do conhecimento, sua utilidade para a prática profissional e para a formulação de políticas. (MARSHALL; ROSSMANN, 1989).

Nessa perspectiva, Alves (1991) coloca que a produção do conhecimento científico se desenvolve por meio da cooperação e da crítica, pois exige do pesquisador familiaridade com o objeto de estudo para que possa levantar e investigar as lacunas existentes no conhecimento sobre o estudo proposto. Segundo a autora, o pesquisador deve estruturar o foco do problema, tal como as questões do estudo, os procedimentos metodológicos, o aparato teórico e a unidade de análise, de forma que, antecipadamente, se estruture o próprio projeto de pesquisa, a fim de determinar as fronteiras da investigação, assim como a relevância das informações elencadas, e por último, sobre a pertinência das questões sugeridas no decorrer do processo de pesquisa.

(23)

pesquisador, no contexto a ser estudado, e o levantamento prévio do quadro conceitual sobre o tema em tela; (ii) a investigação focalizada, objeto dos roteiros de entrevistas (APÊNDICE A), e, por último, (iii) a fase de análise dos dados coletados e elaboração do relatório final de pesquisa.

A entrevista semiestruturada caracterizou-se por um conjunto de temas preparados anteriormente à entrevista, para vir a ser explorado com cada entrevistado. Apresentou-se sob a forma de um roteiro preliminar de perguntas, não rígido, segundo Ludke e André (1986), favorável às adaptações. Para Alves (1991), a antecipação da revisão de literatura poderá distinguir a priori dimensões e categorias introdutórias, assim como as relações intervenientes esperadas no processo de análise. O entrevistador tem liberdade de acrescentar novas perguntas, com o objetivo de aprofundar e clarificar pontos que considere relevantes ao estudo. (MONRA; FERREIRA; PAINE, 1998; NUNES, 2005).

Segundo Galvão e Egreja (2009), o principal aspecto da entrevista é o respondente na sua vida cotidiana, não a expertise metodológica do entrevistador. Assim ela é aberta e variável, e de forma flexível, o entrevistador segue o curso que emerge no processo da entrevista diante do discurso dos sujeitos e da dinâmica que flui naturalmente no momento, em analogia a uma conversa, não a uma entrevista formal. Entrevistador e entrevistado partilham perguntas abertas, mas focalizadas, surgindo então a oportunidade de investigar crenças, sentimentos, valores, razões e motivos que se fazem acompanhar de fatos e comportamentos, numa captação, na íntegra, da fala dos sujeitos. (ALVES, 1991; BELL, 2008).

Nesse sentido, os respondentes estão no pleno exercício da docência, para que a realidade do contexto educativo e a organização da prática docente no seio das escolas ofereça caminhos necessários para o descortinar das questões fundamentais que se colocaram como objeto de estudo.

(24)

consistência, essenciais à conclusão da pesquisa de caráter qualitativo. Os respondentes foram identificados pela letra “P” na sequência de 01 (um) a 07 (sete). A faixa etária compreendida foi de 28 a 42 anos, todos com graduação em nível superior, tendo em comum experiência entre dez e doze anos de profissão docente, sendo três professores do sexo masculino e quatro do sexo feminino, o que foi considerado como equilíbrio de gênero.

A análise dos dados coletados teve como base a análise de conteúdo, método que pretende não somente apreender como uma mensagem é transmitida, mas também explorar o seu sentido, ou, nas palavras de Bardin (2011, p. 47), “não é unicamente, uma leitura “à letra”, mas antes o realçar de um sentido que figura em segundo plano”. Para uma aplicabilidade coerente do método, de acordo com os pressupostos de uma interpretação das mensagens e dos enunciados, a análise de conteúdo teve como ponto de partida uma organização em: 1. A pré-análise; 2. A exploração do material; e, por fim; 3. O tratamento dos resultados: a inferência e a interpretação. (BARDIN, 2011). Em analogia ao jogo de xadrez, o próprio autor (2011, p. 49) traz que “a análise de conteúdo tenta compreender os jogadores ou o ambiente do jogo num momento determinado, com o contributo das partes observáveis”.

Nessa perspectiva, explica Dalbosco (2007, p. 149), sobre “[...] o significado simbólico construído por cada ação individual que cimenta e dinamiza o todo social”. Para ele, o significado do todo social deriva das atividades dos indivíduos à medida que interagem entre si, portanto da concepção de mundo, radicada na vida espontânea e cotidiana dos atores, ou seja, a ação humana e suas interconexões. Para garantir tais aspectos, as entrevistas foram transcritas, na íntegra, oportunidade que o pesquisador teve de vivenciar novamente todo o processo. Grandes segmentos de fala foram divididos em categorias, e, por sua vez, subdivididos em pequenos grupos de eixo semântico organizados por similaridade, oposição ou contingência. (GALVÃO; EGREJA, 2009). O processo de análise foi concluído com a descrição e interpretação dos enviesamentos atitudinais ideológicos e subjetivos presentes nas falas, conforme destaca Gil (2009), apresentado no capítulo de resultados do relatório de pesquisa.

(25)

fenômenos, pelo potencial de inovação, as surpresas que nos prepara, a incrível capacidade de aprender” (DEMO, 2012, p. 101).

(26)

6 REVISÃO DE LITERATURA

O presente trabalho teve como tema central a percepção dos professores sobre o diálogo no cotidiano escolar, cenário e fonte de riquíssimas relações entre os sujeitos protagonistas do processo educativo, e na tessitura dessas relações, a relevância do diálogo como ponto de partida para a construção do conhecimento, no reconhecimento das experiências vividas pelos atores, favorecendo a integração das diferenças, aspecto fundante do respeito mútuo, portanto, ideal de uma educação crítica, humanista e emancipadora.

Importante ressaltar a tríade norteadora de todo o processo de pesquisa que se deu entre o diálogo, a autonomia e a reflexão como eixos provocadores de toda ação, tanto do pesquisador, pelo desejo de investigar a relação dialógica, quanto da natureza das respostas pelos professores, partícipes do projeto de transformação pela educação.

Da mesma forma, pensar o cotidiano exige enxergar além do senso comum, procurando entender as interrelações vividas neste contexto, que extrapola a etimologia da palavra que vem do latim, cotidie ou cotidianus, todos os dias, o diário, o comum, o habitual. Nessa direção, tratar do cotidiano escolar nos leva a pensar diretamente em ações, em hierarquias, em relações sociais de toda ordem, como propõe Heller (2008), ao afirmar que “a vida cotidiana não está “fora” da história, mas no “centro” do acontecer histórico: é a verdadeira “essência” da substância social” (2008, p. 34). Para a autora, “a vida cotidiana está carregada de alternativas, de escolhas”. (2008, p. 35).

Nessa tessitura, entende-se que o diálogo é o testemunho a abertura aos outros, é a presença da inquietude e curiosidade, atitude de compartilhar, e, sobretudo, relacionar os fatos da realidade histórica entre si, a partir de um trabalho coletivo, que entende a educação como ação emancipadora, o que pressupõe autonomia com responsabilidade.

(27)

Para Heller (2008), em consonância ao pensamento freireano, diz respeito ao comportamento consciente que exige “[...] a concentração de todas as nossas forças na execução de nossa escolha (ou decisão) e a vinculação consciente com a situação escolhida e, sobretudo, com suas consequências”. (HELLER, 2008, p. 41).

Isso significa que a práxis educativa é a prática consciente, que implica reflexão, intencionalidade, temporalidade e transcendência, onde os professores podem refletir sobre suas limitações e podem projetar a ação para transformar a realidade que os condiciona.

No arcabouço das discussões e leituras sobre a função da reflexão, no cerne pedagógico, o próprio Freire diz que “somos seres no mundo, com o mundo, e com os outros, por isso seres da transformação e não da adaptação a ele” (FREIRE, 2012, p. 37). Como colocar em prática essa afirmativa, essencial ao exercício da docência, sem a atitude reflexiva diante do mundo, dos acontecimentos, da realidade na qual estamos inseridos? Ele adiante responde que “a educação, “leitura de mundo” e “leitura da palavra”, se impõe como prática indispensável a essa reinvenção do mundo”. (FREIRE, 2012, p. 66).

Na busca por entender a escola em seu cotidiano, por meio da relação dialógica, parte-se da experiência do professor, também por acreditar que este se constitui como elo vital de reciprocidade, entre alunos (indivíduos) e escola (sociedade), na construção de objetivos comuns, que atendam aos anseios da coletividade escolar.

No entanto, para entender o professor é preciso considerar as suas experiências pessoais, o que inclui delimitar os processos formativos a que fora submetido, bem como o contexto social no qual atua profissionalmente. Para atender o primeiro ponto foram revisitados importantes aspectos da formação docente, e de sua responsabilidade educativa no contexto brasileiro. No entanto, não se pretendeu esmiuçar os graves e complexos problemas encontrados em todos os níveis do sistema educacional brasileiro, desde o macro – sistema educacional como um todo, ao micro, fragmento da sala de aula, mas, ao contrário, buscou-se entender onde estamos e como chegamos nesse processo formativo oferecido aos que hoje atuam na docência, nos reflexos deste processo na própria formação básica, desde a infância até a universidade, e a percepção destes atores sobre a herança educativa no cotidiano escolar.

(28)

aprendizagem, para que a educação se concretize no desenvolvimento de saberes e fazeres fundantes de uma prática humanizadora, criativa e reflexiva, essencialmente ética e solidária, em contraponto à escola submetida ao racionalismo técnico, recentemente assoberbada por um aparato tecnológico que estimula ainda mais a competitividade e a sobreposição de ideias. Por outro lado, alguns estudos colocam que o novo mundo das redes, via web, abre espaço para a configuração de novos projetos, inclusive pela impossibilidade de controle neoliberal, sinalizando um espaço para os indivíduos, coletivamente, trilhar seus caminhos, por uma nova compreensão de sociedade.

Nessa tessitura social, radicalmente democrática, a educação se configura como ato político, construto da autonomia, pilar para compreender uma escola aberta, cidadã, portanto, livre. A autonomia, aqui entendida, à luz dos pressupostos de Paulo Freire, é fruto de um trabalho profundo e sensível, sobretudo reflexivo, compartilhado, intersubjetivo, dinâmico, vivo, que promove o desenvolvimento global, critico e criativo dos sujeitos historicamente envolvidos.

A reflexividade, assim como a autonomia, deve estar presente na profissionalidade docente que se constitui em conjunto, no coletivo, pautada na tríade da experiência, da expressão e do diálogo. Logo, a função social da docência não se expressa apenas no espaço escolar, mas ao contrário, extrapola os muros da escola, o que subsidia o papel do professor como agente crítico e interventor no mundo, diante de uma realidade entrelaçada em um todo social.

(29)

Em síntese, são apontados aqui os aspectos históricos da formação de professores no Brasil, a fim de entender práticas atuais dos docentes a serem pesquisados, e seus reflexos no ambiente escolar e no todo social. Em seguida, a práxis dialógica como mediação nos convidou a refletir sobre a natureza do diálogo, como ação especificamente humana, como também humana a incapacidade de exercitá-lo, sob o viés pedagógico. Para entender a dimensão dialogal da autonomia para a prática docente parte-se do conceito de autonomia como responsabilidade, compromisso, como ação política, não partidária, como processo hermenêutico de escolha, fruto de um projeto coletivo de desenvolvimento da criatividade e da criticidade no espaço social que se concretiza a escola. No estabelecimento dessas relações, funda-se a função dialogal da reflexão na prática docente, como caminho ou suporte para o enfrentamento dos desafios e possibilidades que emergem no cotidiano escolar.

6.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA FORMAÇÃO DOCENTE

Ao longo da história da educação brasileira, marcas significativas do modelo pedagógico europeu, segundo Vianna (2004), podem ser verificadas ainda na atualidade no processo de formação docente, a exemplo do que foi herdado desde o período colonial no ideário jesuítico, desde o século XVI, como a distribuição dos alunos por níveis de aprendizagem que privilegiava, segundo Aranha (1996) a desvinculação da escola-vida, e a prerrogativa de ‘saber pelo saber’ de letrados e eruditos, próprios de uma sociedade que não valorizava a educação elementar e pretendia manter o domínio sobre uma população incapaz de exigir direitos e ações efetivas de seus governantes.

(30)

Segundo Cruz (2011), a década de 30 foi marcada pela Reforma Francisco Campos, instaurada por questões emblemáticas motivadas, de alguma forma, pelos ideais da Escola Nova e sobre a criação das universidades, sob a égide da Pedagogia como ciência, pautada no exercício da docência e da pesquisa, que logo em seguida, também contemplaria a formação do professor para atuar no ensino secundário, via Institutos de Educação. No entanto, o despertar do interesse pelo processo educacional, segundo a autora, visaria tão somente ao atendimento das demandas vigentes com a chegada da industrialização, e nesse formato petrificou-se em uma lógica organizacional excludente nas décadas seguintes, no início pela evidente escassez de mão-de-obra em território nacional, marcadamente agroexportador, nos moldes oligárquicos, mas já em declínio econômico, que agonizava com a imposição de modelo mercadológico distinto.

As reformas no ensino não foram suficientes, da mesma forma, para diminuir a defasagem gerada pelas dificuldades em adaptar as ideias pedagógicas estrangeiras à realidade complexa brasileira, inclusive pela permanência de grande quantidade de professores leigos por todo o país. (GATTI, 2009; VIANNA, 2004).

Apesar da Constituição de 1934 estabelecer que a educação é um direito de todos, entre outros aspectos relevantes, como a gratuidade do ensino e da escola pública, com a possibilidade de uma Lei de Diretrizes e Bases educacionais, seu efeito foi efêmero, pois de 1937 a 1945, estabeleceu-se a Era Vargas, período ditatorial que dissolveu todas as tentativas de sistematização de uma educação gratuita, laica e para todos. Segundo Santos Clo (2011), muitos dos pioneiros que acreditaram, a princípio, nos propósitos políticos de Getúlio Vargas, à época a frente do Governo Provisório, voltam a lutar pela escola pública, notadamente, o próprio Francisco Campos, antes ministro, Anísio Teixeira entre outros.

Em consequência, os reflexos desse período ditatorial marcaram a história da educação brasileira que se volta novamente à educação dos privilegiados lotados em uma escola acadêmica, e, em contraposição, às classes menos favorecidas, os cursos profissionais, pela via dos sindicatos e indústrias, sem oferta suficiente nas escolas públicas. (ALVES, 2006).

(31)

fundamenta os princípios filosóficos, políticos, administrativos e pedagógicos da educação brasileira, cuja vigência só ocorre a partir de janeiro de 1962, hiato que contribui para solapar o desejo fundante de uma base sólida visando à sistematização do ensino público, bem como na efetiva formação docente nos bancos universitários, notadamente desorganizada, “[...] imersos nas demandas expressas pelo contexto social da época”, segundo Cruz (2011, p. 37). Observa-se que, no período que compreende 23 anos de história, pouca coisa mudou na educação brasileira. Nesse ínterim, os movimentos populares de orientação cristã ou marxista, em contrapartida, ensaiavam novas práticas que exigiriam competências e habilidades políticas, mas, sem, contudo, influenciar transformações significativas na escola pública.

Esses movimentos buscavam também a posteriori ampliar o espírito crítico e criador dos alunos, levando-os a pesquisar e a não aceitar passivamente o conhecimento recebido, notadamente a pedagogia de Paulo Freire, cujo projeto fora frustrado pelo regime militar autoritário que passou a vigorar no país, a partir da década de 60.

Estabelece-se, segundo Vianna (2004), o tecnicismo que traz o direcionamento para as necessidades da indústria e do comércio, determinando que as escolas existam para atender às necessidades de competitividade, para habilitação do domínio da técnica pela técnica, onde os docentes devem ser preparados para adequar a educação, considerada como capital humano, às exigências da sociedade industrial, capitalista, tecnológica, com economia de tempo, esforço e custos.

(32)

O contexto brasileiro, nesse todo social, já nessa época, difere da realidade de outros países, cuja preocupação aparece no panorama mundial por meio de uma discussão ampla sobre a relevância do papel do professor e o estudo da própria história pedagógica que, segundo Manacorda (2010, p. 443) compõem uma produção de “[...] fontes intermináveis que se multiplicam a cada dia”, por meio de documentos, fontes escritas, radiofônicas e televisas, bem como a proliferação de legislações e recomendações internacionais. Entre esses documentos, destaca Gatti (2009), a Recomendação OIT-UNESCO datada de 1966, que procura elencar as condições mínimas para elevar a carreira docente aos padrões exigidos para o seu exercício, constatada o seu compromisso com milhares de alunos.

De volta ao Brasil, nesse tempo, o intenso fluxo de licenciaturas, que surgem de forma desordenada, como sinalizam Alves (2006) e Cruz (2011), em faculdades criadas para as elites contribuem para alargar o abismo já existente entre teoria e prática, distanciam-se ainda mais de um propósito emancipatório, reclame popular, o que confirma a precariedade das condições na formação inicial dos docentes desde o início do ensino superior.

A partir dos anos 80, em contrapartida, em alguns centros acadêmicos no país, intensos são os debates, sobretudo, das teorias educacionais cuja abordagem crítica vão influenciar a literatura pedagógica, que segundo Santos (1995, p. 18), “[...] ultrapassaram a visão ingênua de que por intermédio da escola é possível mudar a sociedade”, pois visavam uma revolução educacional com o objetivo de mudar radicalmente a estrutura socioeconômica vigente, agente de tantas desigualdades, em prol dos interesses da classe trabalhadora. Influenciada pelo marxismo, defendia-se a formação docente aguerrida, em consequência, a ação do professor a partir da dimensão política de seu trabalho, no aporte gramsciano, ao atuar como intelectual orgânico, consciente de seu papel histórico e libertador, no cenário entre as relações de classe.

(33)

influenciando uma ampla reforma institucional, sobretudo na Itália, reestruturando interna e externamente a escola.

Aliada a uma concepção histórico-crítica, de viés socialista, somou-se, nos anos seguintes, referenciais teóricos mais ecléticos, segundo Santos (1995) que resultam em estudos que buscam analisar a realidade por intermédio dos aspectos microssociais, entendendo, contudo, o papel de agente-sujeito, agora nas questões culturais, construto de sua identidade profissional.

No entanto, o longo período ditatorial e o descaso intencionalmente político prejudicaram, em muito, a ascensão da educação brasileira a patamares mais dignos, ainda que, no período pós-ditadura, segundo Gatti (2009), esforços conjuntos foram engendrados pelo Governo Federal e estados, em destaque: (i) na esfera sócio-política, largo acesso à educação básica em números jamais vistos, (ii) na esfera econômica, a revisão do piso salarial para o exercício do magistério na educação básica, conquista liderada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), e (iii) na pedagógica, na exigência de formação superior para o exercício da carreira docente, nos programas de capacitação de associações de classe, secretarias municipais e estaduais de educação, mas que não são suficientes para corrigir equívocos que incluem também a qualidade do ensino superior, carente de uma reforma ampla, outra ponta do iceberg educacional.

A década de 90 e os primeiros anos do século XXI têm propiciado uma ampla discussão sobre a formação docente e suas implicações no cotidiano escolar. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394, datada de 1996 dedica um capítulo inteiro ao tema e traz de forma evidente a concepção da formação como a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço; aproveitamento da formação e experiências anteriores em instituições de ensino e outras atividades (BRASIL, 1996, art.61). Para Demo (1997), mudanças significativas são relacionadas ao processo educativo, dentre elas, de maior relevância, o compromisso com a avaliação; as mudanças na formação dos profissionais da educação e a valorização do magistério.

(34)

Desempenho de Estudantes (ENADE), ambos instrumentos de manutenção do paradigma educacional vigente, não oferecendo qualquer melhoria ou visando a empregabilidade, no desenvolvimento de competências e habilidades, e no pensar estrategicamente sobre a realidade, para o melhor desempenho profissional no país.

No governo de Dilma Roussef em 2011, foram mantidos todos os programas do governo Lula, além da ênfase na educação profissional com o Pronatec, lê-se Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego, alardeando dentre seus objetivos, melhorar o ensino médio e formar mão de obra qualificada. A profissionalização da gestão do setor educacional brasileiro se deu ao nível administrativo, financeiro e operacional. No entanto, a gestão acadêmica não atingiu, apesar de tantas reformas, mantendo-se heterogêneo e complexo, nas suas estruturas, processos e ações.

Algo deve ser feito e urgente. Os índices alarmantes deixam segundo Gatti (2009, p. 9) “[...] o país em situação de risco, em praticamente todos os sistemas de avaliação da educação, usados pelas principais agências nacionais e internacionais” que buscam medir o nível de ensino, como também a qualidade de vida e desenvolvimento humano.

Para efeito de registro sobre o tema, e não como resposta, Linhares (2011) rebate os resultados, pois, segundo a autora, essas agências que regulam e engessam as escolas em números e rankings defendem tarefas rotineiras, pautadas no modelo conteudista que atende exclusivamente ao padrão estabelecido nos testes e avaliações, desconsiderando toda e qualquer configuração sociocultural, bem como as desigualdades econômicas nas quais os alunos testados e, por conseguinte, seus professores vivem como é o caso da situação brasileira.

Nesse caminho, como o entendimento sobre a natureza do cotidiano que extrapola a ambiência escolar, pontuam outros tantos autores, onde novas relações pedagógicas se estabelecem, pois são consideradas as dimensões pessoal e profissional do professor, que toma para si sua formação, em ato reflexivo, e entende que nela está inserida sua própria experiência ao longo da vida estudantil. (ALARCÃO, 2010; NÓVOA, 2010; PERRENOUD, 2002).

(35)

permanente de todas as ideias e práticas educativas, levando em consideração as especificidades que se originam das diferentes interpretações da realidade vivida.

Com um breve histórico, não se pretendeu esgotar o panorama da formação docente em suas contradições e questionamentos levantados a partir de políticas públicas no país e/ou referenciais teóricos, e sua condição marcada por poucos consensos e muitas divisões, além da relação díspare com os movimentos internacionais. A intencionalidade desta proposta foi considerar essas contradições, para entender o arcabouço teórico incutido nas práticas pedagógicas, e, ao partir de uma análise sobre a importância do diálogo, junto aos professores, trazer à tona a possibilidade de elencar ações para conhecer os desafios impostos e buscar, de forma dialógica, o estreitamento das relações intervenientes no cotidiano escolar, ao repensar a prática docente, e por acreditar que a educação é mola propulsora para a convivência pacífica e cidadã.

A análise sobre a constituição do saber docente, no entendimento de Santos (1995), remete à cultura e ao cotidiano escolar, que são de extrema valia para o campo educacional, assim como, da mesma forma, alerta o autor, contribuem os novos estudos sobre a relação entre poder e conhecimento que visam elucidar que tipos de interesses estão sendo atendidos ou excluídos.

Historicamente, concluiu-se que os aspectos socioeducativos não podem ser pensados fora do contexto político e econômico, desde os idos coloniais até os dias atuais, dado o modelo pragmático racional e técnico imperativo, ainda que esboçadas algumas reações, principalmente na constituição de uma pedagogia histórico-crítica e progressista, mas que não proporcionaram mudanças significativas no processo educacional ao ponto de elevar os índices nacionais a patamares dignificantes.

(36)

Nesse sentido, na escola que queremos imersa em outra lógica social, os pressupostos pedagógicos devem ser pautados na dialogicidade entre os sujeitos históricos, no caráter emancipatório do conhecimento para a aquisição de uma visão autônoma e crítica de mundo, em um processo de ação-reflexão-ação, que visa prioritariamente uma sociedade mais justa e solidária.

6.2 O DIÁLOGO COMO MEDIAÇÃO NA PRÁTICA DOCENTE

As condições estruturais da sociedade dependem das relações intersubjetivas entre os indivíduos e as instituições socioeducativas que visam à aprendizagem no seu cotidiano para o desenvolvimento do potencial humano. Neste contexto é reconhecida a interação entre professores e alunos como fenômeno que acontece por meio das trocas entre os sujeitos envolvidos, partícipes ativos, construtores de sua própria concepção de ser e estar no mundo.

Ocorre que na sociedade contemporânea, midiatizada pelo aparato tecnológico emergente em velocidade surpreendente, o universo educativo impregnado pelo racionalismo instrumental que se alastra em todas as dimensões, clama por sentidos, não só pela visão dos alunos, educadores, pais, mas também pelos professores, na tentativa de encontrar cenários possíveis para os desafios impostos à educação nesse tempo presente, onde, mesmo que valorizada a criatividade, em uma ótica da competitividade e eficiência, já não responde satisfatoriamente aos processos de efetiva transformação no todo social, bem como no modo de se relacionar com o mundo.

(37)

A escola, lócus privilegiado das interações humanas, de fala e escuta em seu cotidiano, propicia aproximação com o outro, e, a partir desse entendimento, assume pela experiência do diálogo, uma prática reflexiva e libertadora. À medida que aumentam a experiência e a sensibilidade, emerge na ambiência escolar um significado compartilhado, em que as pessoas não se opõem umas às outras, mas ao contrário, buscam restaurar vínculos e valores humanos necessários para a aquisição de uma cultura de paz.

Paulo Freire (1921-1997), filósofo e educador brasileiro, defende a proposta que a docência deve ser antes de tudo uma postura humanizadora, pautada pela disponibilidade de estar aberto aos outros, à vida, ao desconhecido. O agir pedagógico se concretiza a partir da existência de relações entre seres humanos que, por meio da linguagem, buscam novos conhecimentos e refinam os que socialmente foram acumulados e considerados relevantes. A experiência fundante do ser inacabado, em uma relação ao mesmo tempo de inquietação e curiosidade, pela convivência dos sujeitos autores/atores, ocorre a partir de duas dimensões: a ação, para a transformação e não alienação, e a reflexão atrelada à conscientização crítica e não alienante.

O diálogo proposto por Freire (1993) como prática educativa não é vertical, autoritário, imposto pelos professores aos alunos, mas, horizontal, respeitando a historicidade dos sujeitos envolvidos. A experiência histórica nutre a relação dialógica e dialética, fonte de intersubjetividade e de convivência que deve existir no cotidiano escolar. Dialógica porque os sujeitos falam e escutam em paridade e igualdade, por interesses comuns, e, dialética, não pela sobreposição de teses, mas como espaço aberto para o debate reflexivo, de investigação conjunta e colaborativa, como práxis social que visa o desenvolvimento afetivo, cognitivo, intelectual e humano, logo emancipatório, que se concretiza como projeto coletivo de escola e de mundo.

Implica dizer que os professores devem sair da condição de experts, que, segundo Morin (2009, p. 32), “[...] tratam os problemas de modo isolado e esquecem que, nessa época de mundialização, os grandes problemas são transversais, multidimensionais e planetários”.

(38)

dialógica, às possibilidades do futuro. O docente, como aponta Feldmann (2009), diante da instabilidade e provisoriedade do conhecimento, deve agir, de forma investigativa, para compreender as transformações atuais, a realidade sua e a de seus alunos, reconhecendo o saber e o sabor da experiência vivida, como um convite ao acolhimento sobre a existência do outro que se revela através do diálogo, onde cada pessoa tem o direito à livre expressão, e, a partir desse exercício democrático, possa intervir de forma crítica e consciente na realidade.

Nesse sentido, Síveres (2011) demonstra que ao otimizar as relações intersubjetivas fundadas na proposição de que a educação é um encontro de aprendizes, portanto na relação do tipo Eu-Tu, ocorrem em recíproca presença. O que se dá diferente, na relação do tipo Eu-Isso, pois é submetido a uma ordem temporal. As categorias ou palavras-princípio Eu-Tu e Eu-Isso, são postulados de Martin Buber (1878-1965), utilizados para explicar a intersubjetividade, aqui exposta no contexto educacional. Nessa relação primeira, se constitui essencialmente o diálogo, atividade especificamente humana, que transcende o espaço físico da escola, à medida que novas presenças vão se incorporando ao processo pedagógico, no intuito de fazer pensar e refletir acerca das questões ligadas ao contexto social que se quer mudar por meio da conscientização-ação. A segunda, Eu-Isso, instaura o lugar e o suporte da experiência, do conhecimento, da utilização.

Para Buber (2009), o diálogo estabelece o vínculo entre a experiência vivida e a reflexão, entre o pensamento e a ação, portanto, é mediador para a compreensão da realidade humana. Para este autor, a relação dialógica efetiva o sentido da existência humana, e, a nível prático, é construtora de uma comunidade fundada nas relações inter-humanas, substrato das situações cotidianas e das experiências vividas, do Eu e Tu, onde o princípio ético, ao lado do princípio político, encontra o lugar de sua realização.

A pedagogia dialógica é problematizadora, e, sobretudo, para Freire (2009), investigativa, humana e democrática. Portanto, os dois filósofos, quando propõem a prática dialógica, pensam educação como atitude inovadora e criativa.

(39)

experiência histórica como sujeito e professor, a partir de sua própria forma de compreender e interpretar as situações transcenda para o mundo em que vive e atua.

Nesse contexto, cabe conhecer algumas ideias de Hans-Georg Gadamer sobre as relações hermenêuticas e a educação, onde a aprendizagem se dá por meio do diálogo, cuja força é transformadora, e, onde a autoridade do professor é genuína, quando mais que educador, age como orientador, pois é capaz, segundo Lawn (2010, p. 56) nessa perspectiva, “de levantar questões e fazer com que certos tópicos pareçam cruciais, [...] porque eles nos levam ao âmago daquilo que nós somos dentro dos nossos limitados horizontes culturais”.

Hans-Georg Gadamer (1900-2002), filósofo alemão de grande repercussão contemporânea, e forte influência socrática, afirma que “[...] um diálogo fecundo é um diálogo no qual dar e receber e vice-versa conduzem, por fim, a alguma coisa que é uma morada comum, com a qual se tem familiaridade e na qual é possível mover-se juntos”. (GADAMER, 2002a, p. 110). Preocupa-se que, na sociedade atual, com o modo de pensar técnico-científico, o diálogo seja escasso, demonstrado pela falta de disponibilidade de abrir-se ao outro ou ainda pela aproximação artificial, fenômeno preabrir-sente na era da informação capitaneada pelo aparato tecnológico. O que se vê, por um lado, é a globalização das economias e suas culturas, e, por outro, a falta de comunicação entre as partes que a formam. As inúmeras possibilidades e interconexões convivem com a ausência de uma linguagem comum.

Essa incapacidade para o diálogo, na forma subjetiva, solapa, segundo esse autor, a busca pela verdade, e, portanto, confere a monologização do comportamento humano, em seu individualismo exacerbado, como experiência única de mundo, de quem, para o filósofo (2002, p. 251) “[...] possui os ouvidos tão cheios de si mesmo, buscando seus interesses, que já não consegue ouvir os outros”. No campo educativo, o aprisionamento do professor como detentor da ciência, funda a dificuldade para o estabelecimento do diálogo vivido e a não atenção para o sentido das palavras e da pergunta, instala a obstaculização, contrária à participação dos sujeitos historicamente envolvidos.

(40)

social, pela não aceitação do outro ou isolamento pelo anonimato, por meio, (2002. p. 252), metaforicamente, do uso de “óculos que já não nos permitem ver além deles”.

Sócrates, considerado o pai da Filosofia, viveu no século IV a. C. Suas ideias perseveram ainda hoje como necessárias para o restabelecimento das relações humanas e para o desmantelamento de dogmas ou equívocos, como exercício reflexivo, à luz da maiêutica, isto é, à medida que faz chegar à verdade e às evidências, por meio do diálogo como ponto de partida para o entendimento.

Nascido em berço pobre, assim manteve-se ao longo de sua existência, mas viveu em um período conhecido como “século de ouro”, quando surgiram os grandes oradores da democracia ateniense. Nada escreveu, entretanto, suas ideias são conhecidas por meio de outros filósofos, como Aristófanes, que o retratou de forma semelhante aos que o condenaram à morte por envenenamento, e por alguns de seus discípulos, como Xenofonte, que ressaltou sua integridade moral, e, principalmente Platão, que considerou Sócrates como o homem mais justo que ele conhecera.

Sob o prisma do Sócrates platônico, marco referencial do pensamento humano e de toda história da Filosofia, buscou-se relacionar o diálogo como mediação para a prática docente, e nessa troca colaborativa ou produção compartilhada de significados, propiciar a emancipação intelectual dos protagonistas da educação, diante do contexto das mudanças rápidas em que se vive, para acompanhar o movimento natural da vida. A própria experiência de vida do filósofo reforça a ideia do inacabamento, pois o desenvolvimento de suas proposições, de modo contínuo, foram decisivos para a construção de suas ideias.

Como sua mãe, que era parteira, Sócrates descontruía conceitos para “parir o saber”, pois entendia, como pressuposto, que o conhecimento está latente no homem, portanto, só é necessário criar condições para que ele aflore, como reminiscência. Seu principal objetivo era ensinar o homem a cuidar de sua própria alma, e, a partir dessa busca do ser em si do homem, estabelecer relações dialógicas, através de perguntas e não de respostas, ao entender-se como parte do todo, e não a medida de todas as coisas.

(41)

como ferramenta potencializadora da reflexão crítica para a constituição de condições propícias às mudanças necessárias, de ordem atitudinal, social, cultural e política.

Do ponto de vista etimológico, o termo “diálogo” resulta da fusão das palavras gregas dia e logos. Dia significa “por meio de”, ou aquilo que está entre duas coisas. Logos foi traduzida para o latim ratio (razão), mas tem vários outros significados, como sentido, palavra, expressão, fala. Segundo Abbagnano (2000), no seu Dicionário da Filosofia, trata-se de uma conversa, não discurso fechado, entre pessoas que se unem pelo interesse comum da busca, natural e verdadeira expressão humana.

Para o autor, a presença do diálogo, inspirado no modelo maiêutico socrático, fecunda a disponibilidade de ouvir o outro, de forma tolerante, em reconhecimento a toda experiência vivida. A legitimidade da experiência do outro funda-se no respeito às diferenças, e principalmente, na humildade ao reconhecer que não há verdade absoluta, portanto não há conhecimento último ou melhor.

Dialogar não é a busca pela uniformização do pensamento, mas o compartilhamento de ideias, portanto multilateral, não sem ausência de discordância, mas pautado em estruturas democráticas, para buscar significado por meio das experiências vividas. Nesse sentido, Dalbosco (2007) afirma que a filosofia gadameriana, transpõe, com mesmo grau de importância, a possibilidade do exercício dialógico para a pedagogia. A educação, enquanto experiência hermenêutica é um processo de criação de novas maneiras de compreender, de agir e de dialogar. A escola emerge nesse contexto como uma das instituições sociais que mais precisa vivenciar o diálogo, sobretudo, entre os atores envolvidos e no processo de ensino e aprendizagem.

No entanto, essa compreensão, para Lawn (2010), está sempre posta em jogo, diante da abertura a novas relações de sentido, entre presente e passado, que se estabelecem em constante tensão entre familiaridade e estranheza, mas, como ruptura com o habitual, para ouvir o passado e saber o que dele ecoa no presente, na construção do que Gadamer (2002b) chamou de consciência histórica efetiva.

(42)

e decisões comuns”. (2003, p. 98). Fica clara, portanto, a dimensão ética da práxis hermenêutica e da intencionalidade da educação pela busca do bem.

Na perspectiva freireana, a relação dialógica promove experiências de reflexão conjunta, na geração de ideias, na construção do saber compartilhado, a partir da apreensão crítica da realidade, o que não implica concordância ou ausência de conflitos, mas busca a problematização do real, em oposição à concepção de educação bancária ou pedagogia antidialógica.

No cotidiano escolar, se pode entender que aquilo que está em jogo não é um conceito em substituição a outros, mas, como afirma Freire (2009), supõe a disponibilidade à revisão dos acontecimentos, e, a partir dela, de forma autônoma e radicalmente coerente, assumir os riscos das incertezas, em oposição aos perigos da cátedra determinista e dogmática, transgressão ao impulso natural da incompletude. Para Dalbosco (2007), a ocorrência dessa situação última torna o agir pedagógico mero fazer pedagógico, mecânico, absorto pela causalidade espaçotemporal, desconhecendo por completo, a realidade que extrapola a sala de aula, ambiente de ensino e aprendizagem recíprocos.

Ainda em Freire (2009, p. 113-119), “[...] o educador que escuta aprende a difícil lição de transformar o seu discurso, às vezes necessário, ao aluno, em uma fala com ele”, ou em outras palavras, do próprio autor “[...] escutar significa a disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura à fala do outro, ao gesto do outro, às diferenças do outro”.

Referências

Documentos relacionados

A partir da investigação dos modelos teóricos acerca da abordagem da competência, das diretrizes dadas pelo Conselho Nacional de Justiça e do estudo do caso do

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

No entanto ela é necessária visto que, neste processo selectivo, há uma parte de informação nova que fica retida nos esquemas periféricos e que, inicialmente, ancora o real

Segundo o grupo europeu de interesse em hipersensibili- dade a drogas (European Network for Drug Allergy – ENDA) da Academia Europeia de Alergia e Imunologia Clínica, são quatro

In this sense, the challenges towards promoting sustainable livestock in Brazil, which has the recovery of degraded pas- tures, comprising intensification and the increase

Para que a organização do acervo funcione, a mãe responsável pela biblioteca, ao final de cada encontro, deverá conferir e guardar todo o material em seus

Assim como para Oiticica o artista é um propositor, também no ensino de Arte, mais especificamente, na formação dos professores de arte, espera-se que estes sejam

Hydrothermal Unit-commitment Problem. Kenny Vinente Santos and Erlon Finardi. Network-constrained Hydrothermal Unit Commitment in Centralized Cost-based Dispatch Models with.