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A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NA CONFIGURAÇÃO DE NOVAS IDENTIDADES MASCULINAS

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Academic year: 2021

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A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NA CONFIGURAÇÃO DE NOVAS IDENTIDADES MASCULINAS

WILLIAN TITO MAIA SANTOS Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC)/Bahia ADRIANO DE LEON Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

Problemática

A partir do crescimento do feminismo no século XX (principalmente a partir da década de 1960), houve uma série de conquistas das mulheres no plano dos direitos, tal como a inserção cada vez maior da mulher no mercado de trabalho, nas organizações políticas, de classe, etc. Todavia, percebeu-se, dentro do próprio movimento feminista, a necessidade da integração dos homens como forma de expandir ainda mais os seus direitos. Assim, lutou-se e luta-se ainda por um maior engajamento do homem principalmente no que diz respeito a aspectos da vida privada, tais como a responsabilidade com a vida sexual e reprodutiva do casal, a criação dos filhos e a divisão das atividades domésticas.

No que diz respeito à masculinidade enquanto objeto de estudo e pesquisa, percebemos que esse interesse começou a partir da década de 60, motivado principalmente pelo movimento feminista. Esse movimento social de impacto mundial desencadeou uma análise intensa sobre as gritantes dissimetrias sociais associadas à diferenciação sexual. Por outro lado, já a partir daquela época os movimentos gay e lésbico, ao mesmo tempo em que lutavam por sua visibilidade e consolidação enquanto movimentos sociais legítimos começavam a refletir e a questionar os padrões vigentes e aceitos sobre identidades sexuais ditas “normais”.

A partir da luta nos espaços públicos e privados, e através de um ativismo e de uma militância que questionava as diferenças sexuais como fulcro de inserção nos espaços da política e da economia, por exemplo, esses movimentos lançaram as bases para mudanças de comportamento na sociedade, questionando principalmente um modelo de masculinidade hegemônica: branca, heterossexual e dominante.

A discussão sobre a masculinidade surge de uma série de deslocamentos e de uma ressignificação do lugar do homem e de seu papel na família e na sociedade (BADINTER, 1992; BORIS, 2002; CONNELL, 1995; NOLASCO, 2001; VALE DE ALMEIDA, 1995).

Esses deslocamentos são em grande parte decorrência das profundas transformações sociais, culturais e econômicas vivenciadas na sociedade ocidental principalmente a partir da década de 1960. Nesse momento em especial, o movimento feminista (mas também o movimento gay e lésbico) coloca em xeque as relações de trabalho, a configuração da família e a forma de se vivenciar a sexualidade em nossa sociedade. No decorrer deste processo, valores e crenças tradicionais, respaldados em grande parte por uma perspectiva patriarcal de distribuição de poder no mundo, foram e continuam sendo progressivamente confrontados e contestados.

Um pouco mais adiante no tempo, homens insatisfeitos com um modelo padrão

“sufocante” de se vivenciar a masculinidade se unem às mulheres, gays e lésbicas no sentido de discutir e tentar implantar na sociedade modelos mais igualitários no que diz respeito à convivência entre os gêneros. Surgem nesse momento grupos de homens, alguns deles declaradamente feministas, que visavam discutir novas e possíveis identidades de ser homem frente às novas configurações sociais que se apresentavam e se desenvolviam.

Esses desdobramentos encontraram respaldo em disciplinas tais como a Sociologia, a

Antropologia, a Psicologia e a História, que passaram a desenvolver uma série de estudos e

pesquisas que envolvem um olhar mais aguçado sobre o processo de transformação do

homem na sociedade, paralelamente à intensa transformação vivenciada pelas mulheres.

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Nesse ínterim, surgem novos olhares sobre a questão, permitindo a possibilidade da desconstrução do modelo patriarcal e hegemônico do homem como única forma de se vivenciar a masculinidade, além de permitir o reconhecimento da complexidade que envolve o masculino.

Fala-se na literatura sobre a temática que a conseqüência desse processo é o aparecimento de uma suposta “crise” do masculino na contemporaneidade, onde o homem assume sua confusão sobre o que é ser homem de fato. As formas como se expressariam os aspectos dessa “crise” são abundantemente explorados pela grande mídia, o que pode ser comprovado a partir de uma série de novos programas, veículos de comunicação de massa e de produtos os mais diversos, direcionados especificamente para os homens. Entre os discursos veiculados por esses canais midiáticos está o fato de que o homem está em busca de sua auto-estima perdida, desenvolvendo sua sensibilidade, se interessando mais pela paternidade, assumindo suas emoções, preocupando-se com seu corpo e com a estética de uma forma geral, entre outros aspectos. Junto a esses discursos percebe-se também uma angústia, muitas vezes não falada e admitida, na medida em que muitos homens não conseguem mais se enquadrar no modo tradicional de se exercer a masculinidade: aquele homem frio, seguro, bem-sucedido, provedor de sua família e portador de uma sexualidade irrefreável.

Na nossa pesquisa em especial, buscamos entender se e de que forma a masculinidade se encontra sendo reconfigurada, ou seja, se ela se encontra e de que forma ocorreria essa transformação, levando em consideração um modelo de homem tradicional e machista.

Vamos discorrer sobre nossas considerações principalmente a partir da análise de alguns meios de comunicação voltados para o público masculino, veículos esses que atuam difundindo e dispersando discursos sobre o “homem moderno”.

Nosso objetivo é investigar de que maneira alguns canais midiáticos voltados para o público masculino veiculam concepções sobre o que é ser homem na contemporaneidade.

Além disso, objetivamos traçar um perfil dos principais termos/conceitos atribuídos aos homens na contemporaneidade e quais seus significados e analisar, através do discurso expresso nos textos e nas imagens de homens veiculados nesses canais midiáticos, quais novas configurações se expressam em relação às formas de expressão da masculinidade.

Método

Para se entender a realidade contemporânea, na maneira que é vivenciada pelos indivíduos, entendemos que é necessário levar em consideração as diversas atribuições de significados e interpretações que os indivíduos fazem da mesma. Nesse sentido, entendemos como profícua a investigação dos fundamentos do conhecimento da vida cotidiana realizada por meio da linguagem e do discurso, que reconstrói os significados no mundo intersubjetivo individual e coletivo.

Em nossa pesquisa em específico, estamos realizando

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uma ANÁLISE DO DISCURSO (AD) no sentido de captar, a partir da análise dos discursos e das imagens (fala pictórica) expressos em alguns canais da comunicação de massa, os sentidos expressos sobre as várias expressões atuais sobre o que é ser homem e como os homens podem vivenciar e expressar sua masculinidade. A AD, nesse sentido, nos permite a tradução das experiências que pertencem à vida cotidiana e suas diversas relações sociais ordenadas e organizadas, dentro de um campo de apropriações de significados em que tem, no nosso caso em especial, na linguagem escrita e imagética seu principal foco de análise.

Segundo Orlandi (2005) a AD concebe a linguagem como mediação necessária entre o

homem e a realidade natural e social. O discurso, dessa maneira, torna possível tanto a

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permanência quanto o deslocamento e a transformação do homem e da realidade em que ele vive. O trabalho simbólico do discurso está na base mesmo da produção da existência humana. A apreensão do simbólico relaciona-se principalmente com textos e formas de expressão produzidas por instituições, história dos povos, sociedades, indivíduos, etc.

(IÑIGUEZ, 2004)

Enquanto arranjo metodológico, a constituição do corpus da análise e a própria análise estão intimamente ligados. O investigador no seu percurso analítico não crê na objetividade pura e simples dos dados coletados, já que se trata de um método qualitativo. A exaustão da análise dos dados da pesquisa não quer dizer a compreensão total do conteúdo destes textos, mas antes de tudo, a relação que há na produção de cada um dos conjuntos escolhidos para a análise.

Nossa intenção, assim, é analisar de que forma os discursos, da forma que se expressam em uma série de veículos midiáticos, principalmente revistas voltadas para o público masculino e discursos circulantes na internet, veiculam novos significados, imagens e modelos sobre a forma de se vivenciar a masculinidade na contemporaneidade. Analisamos, dessa forma, principalmente as formulações discursivas que irão estruturar subjetividades de homens. Nossa análise se foca na análise dos discursos expressados em revistas tais como a Men’s Health, UM (Universo Masculino), Vip, entre outras revistas de inserção nacional e internacional, além da análise dos discursos presentes na internet. Não procuramos esgotar as possibilidades de análise dando conclusões definitivas sobre a temática, mas encontrar alguns elementos com os quais possamos vislumbrar aspectos sobre as novas formas de expressão do homem na atualidade.

Resultados

A partir de uma análise parcial das revistas masculinas ora estudadas, podemos dizer, em consonância com Ramos (2000), que existiria uma crise da identidade masculina que visa atingir uma nova identidade, um novo modelo de ser homem. Mas não podemos falar em unicidade, no único modelo, mas em modelos, havendo mesmo uma crise no próprio sistema classificatório, onde os termos e os conceitos sobre o “novo” homem ainda estão em pleno processo de formação.

È no meio da crise de identidade e na inexistência de parâmetros classificatórios que vão surgindo novos sujeitos masculinos. Os traços dessa mudança são ainda difíceis de vislumbrar de acordo com Goldenberg (2000). As margens de flexibilidade do gênero são bem mais amplas do que no passado e há múltiplas formas de os homens se apropriarem de uma masculinidade em processo de hibridação constante.

Vários rótulos já foram criados nos últimos anos para explicar os novos modelos ou as novas formas dos homens se expressarem: metrossexual, überssexual, retrossexual, ogrossexual, entre outros. O termo que ficou mais famoso nos últimos anos foi o metrossexual, onde a ênfase do homem se dá na busca da valorização do próprio corpo e do investimento maciço na sua estética.

Muitas vezes os rótulos criados para definir o homem atual em nossa sociedade são criados por publicitários que investem rios de dinheiro no sentido de identificar e direcionar seus produtos para um público-alvo específico. Mas não só isso. Esses marketeiros acabam criando identidades, não só identificando as demandas, mas também as criando, no sentido de encontrar novos nichos de venda de novos produtos que surgem a todo o tempo.

Na análise dos discursos veiculados pelas revistas masculinas pesquisadas,

encontramos alguns aspectos que chamam a atenção. Na revista Men’s Health em especial,

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encontramos o destaque na valorização do corpo do homem. Diferentemente das revistas masculinas tradicionais, tais como a playboy e a sexy, ou mesmo novas revistas tais como Homem Vogue ou UM, onde a ênfase é na exploração e valorização do corpo feminino (que se expressa na capa das mesmas), nesta revista em específico é exposto na capa o corpo do homem geralmente sem camisa, onde aparecem homens musculosos, brancos e bonitos. O foco aqui então é na exposição da beleza masculina, que parece ser valorizada e tem a necessidade de ser mostrada. Cria-se um novo padrão de beleza, onde os músculos são definidos, mas o homem não é musculoso em demasia: é sarado. Ele é alto, branco e longilíneo.

No decorrer da revista, o aspecto que mais chama a atenção é no sentido de um alcance e de uma manutenção dessa beleza: formas de dieta, exercícios para eliminar os pneus indesejados, esportes os mais variados para delinear o corpo. A “saúde” (health) que o próprio título da revista mostra não é tanto uma saúde corporal, uma qualidade de vida, um bem viver.

O foco aqui é no corpo adestrado, malhado, exposto, desejado. O corpo do homem deve, dessa maneira, ser desejado e se esculpir a partir desse desejo. O padrão deverá ser alcançado por todos. Um novo padrão se estabelece. Podemos mesmo dizer que se estrutura aqui aos poucos uma ditadura do corpo para os homens.

Não que não haja corpos de mulheres expostos de forma sensual no decorrer da revista. Mas o foco não é no corpo da mulher. A mulher exposta é a mulher que deverá ser conquistada. E a conquista só se dará se o próprio homem conseguir alcançar o novo padrão de estética corporal: um corpo esculpido com labor, trabalhado, valorizado.

Mas ponto importante em nossa análise é que vemos também, operando como incentivadora dessa nova subjetivação do homem, uma ampla indústria que nos últimos anos investe maciçamente neste público: produtos estéticos, corporais, uma rede de serviços (depilação, cirurgias plásticas), entre outros. Essa indústria sabe que esse público tem um poder aquisitivo elevado - homens em sua grande maioria brancos da classe média alta – e que vai consumir seus produtos. Então novos produtos são lançados principalmente via mídias específicas como essa, de forma a mostrar e ao mesmo tempo incentivar o consumo mercadológico, mas também identitário, do homem que se forma.

Conclusões

Até alguns anos atrás os homens heterossexuais não se julgavam discutíveis. Não apenas o fato de serem heterossexuais, mas o fato de terem um padrão de comportamento previamente determinado pela cultura machista-patriarcal. Mas com os desdobramentos decorrentes da ampla discussão social sobre o papel da mulher na sociedade gerou um debate, posterior, do papel e da identidade do homem. Hoje se fala do surgimento de um “novo”

homem. Muitos de seus traços foram descritos abundantemente na literatura sobre a masculinidade. Segundo Goldenberg (2000) é difícil dar definições a essa novidade, porém, as margens da flexibilidade de gênero são mais amplas do que eram no passado e há múltiplas formas de os homens se apropriarem sua masculinidade, numa expressão híbrida que muda a todo instante.

Os deslocamentos observados nas últimas décadas, os mais múltiplos possíveis, geram

sujeitos com, diríamos, múltiplas possibilidades de se vivenciar o masculino. A difusão de

estilos de comportamento ditos modernos ou pós-modernos (dependendo da orientação

teórica que vislumbremos) não se dá de forma homogênea na sociedade. Ela acontece de

forma heterogênea, já que as dimensões de classe social, etnia, geração, contexto social e

gênero se entrecruzam, influenciam e dão um caráter plural à transformação dos valores

sociais acerca da masculinidade e da feminilidade. A pós-modernidade não pode ser encarada

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como um padrão unitário que perpassa a totalidade dos países e das classes sociais. Podemos falar, isso sim, em micromodernidades fragmentadas em várias comunidades, bairros, famílias e grupos sociais, elaborando cada qual da sua forma e com sua intensidade as novas configurações dos papéis sociais entre os gêneros, onde permanências e mudanças em relação à forma patriarcal e hegemônica de se vivenciar a masculinidade convivem de forma muitas vezes caótica e competitiva.

Referências

BADINTER, E. XY: sobre a identidade masculina. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

BORIS, G.D.J.B. Falas de homens: a construção da subjetividade masculina. São Paulo:

Annablume; Fortaleza: Secult, 2002.

CONNELL, R. Masculinities. Berkeley: University of California Press, 1995.

GOLDENBERG, M. (org.) Os novos desejos: das academias de musculação às agências de encontro. Rio de Janeiro: Record, 2000.

IÑIGUEZ, L. (org.) Manual de análise do discurso em ciências sociais. Petrópolis: Vozes, 2004.

NOLASCO, S. De Tarzan a Homer Simpson: banalização e violência masculina em sociedades contemporâneas ocidentais. Rio de Janeiro: Rocco, 2001.

ORLANDI, E. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Pontes: Campinas, 2005.

VALE DE ALMEIDA, M. Senhores de si: uma interpretação antropológica da masculinidade. Lisboa: Fim de Século, 1995.

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Essa pesquisa encontra-se ainda em desenvolvimento.

Referências

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