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DENISE PARENTE VIEIRA PRINCIPAIS ASPECTOS DA LEI Nº 11.804, DE 2008 (LEI DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS)

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CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

DENISE PARENTE VIEIRA

PRINCIPAIS ASPECTOS DA LEI Nº 11.804, DE 2008 (LEI DE

ALIMENTOS GRAVÍDICOS)

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DENISE PARENTE VIEIRA

PRINCIPAIS ASPECTOS DA LEI Nº 11.804, DE 2008 (LEI DE

ALIMENTOS GRAVÍDICOS)

Trabalho de Conclusão de Curso

submetido à Faculdade de Direito da

Universidade Federal do Ceará, como

requisito parcial para obtenção do grau

de Bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Civil.

Orientador: Prof. Dr. Regnoberto

Marques de Melo Júnior.

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DENISE PARENTE VIEIRA

PRINCIPAIS ASPECTOS DA LEI Nº 11.804/08 (LEI DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS)

Trabalho de Conclusão de Curso submetido à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito em conformidade com os atos normativos do MEC e do Regulamento de Monografia Jurídica aprovado pelo Conselho Departamental da Faculdade de Direito da UFC. Área de concentração: Direito Civil.

Aprovada em: ____/____/______.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________ Prof. Dr. Regnoberto Marques de Melo Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará - UFC

_________________________________________________ Prof. Dr. Fernando Basto Ferraz

Universidade Federal do Ceará - UFC

_________________________________________________ Prof . Maria José Fontenele Barreira

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Aos meus pais, que sempre acreditaram que o melhor investimento é a

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha família e ao meu namorado Eugênio, que sempre me apoiaram e que agiram com paciência e respeito, mesmo nos meus momentos de ausência em virtude da realização deste trabalho.

Agradeço a Mayara, João Henrique e Fábio, amigos que me auxiliaram na obtenção do conhecimento necessário para o desenvolvimento do tema, através do empréstimo de livros.

Agradeço ao Professor Dr. Regnoberto Marques de Melo Júnior, que, com muita atenção, cortesia e disponibilidade, me incentivou e orientou na elaboração de cada um dos tópicos do presente trabalho.

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“A significação da vida do indivíduo consiste em tornar a existência de todos mais bela e mais digna. A vida é sagrada, representa o supremo valor a que se ligam todos os outros valores”.

(7)

RESUMO

A obrigação alimentar entre os indivíduos pertencentes a um mesmo vínculo familiar é prevista nos Artigos 1.694 a 1.710 do Código Civil de 2002, e tem como base o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à vida. No que concerne à obrigação do possível pai de conceder alimentos para o ser que ainda se encontra no ventre materno, no entanto, sempre existiram divergências, tanto na doutrina como na jurisprudência pátrias. Alguns autores, como é o caso de Caio Mário da Silva Pereira e Silmara J. A. Chinelato e Almeida, já defendiam a possibilidade de fixação de alimentos para o nascituro, tendo em vista a existência de preceitos, de ordem interna e internacional, que impõem a preservação de sua vida. A Lei nº 11.804, de cinco de novembro de 2008, adveio com o intento de pôr fim a essas divergências, concedendo à gestante o direito de requerer alimentos ao possível pai de seu filho. A Lei em comento inova ao admitir a possibilidade de fixação de alimentos com base na existência, tão somente, de indícios de paternidade, e tem importância na medida em que intenta assegurar a assistência da mulher durante o período de gravidez, bem como, conseqüentemente, garantir a formação e o desenvolvimento sadio do nascituro.

(8)

ABSTRACT

Alimony obligation among individuals from the same family tie is prescribed by the articles 1694 to 1710 of Brazilian Civil Code of 2002, and has as ground the principles of human dignity and right to life. Regarding the obligation of the probable father to provide alimony to the being that is still in the womb, although, there has been always disagreement, both in Doctrine and in Brazilian Jurisprudence. Some authors, such as Caio Mário da Silva Pereira and Silmara J. A. Chinelato e Almeida, have defended the possibility of granting alimony to the unborn one, in view of the existence of precepts, with internal and international root, that impose its life’s preservation. Law 11804, of November 5, 2008, has come with the intent to set an end on these disagreements, granting to the pregnant woman the right to require alimony from the probable father of her child. The law under discussion innovates in admitting the possibility to determine alimony with groundwork only in the existence of fatherhood evidences, and has significance in that it intends to ensure the assistance of the woman during the pregnancy time, as well as, thus ensuring healthy formation and development of the unborn.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 ALIMENTOS ... 11

2.1 Conceito e Fundamentos ... 11

2.2 Direito a alimentos como um direito social ... 14

2.3 Espécies ... 15

2.4 Requisitos ... 17

3 NASCITURO ... 19

3.1 Conceito ... 19

3.2 Teorias sobre o início da personalidade jurídica ... 20

3.3 Direito à vida ... 25

3.4 Direito aos alimentos ... 29

3.4.1 Capacidade processual do nascituro... ... 30

4 ALIMENTOS GRAVÍDICOS ... 34

4.1 Conceito e Peculiaridades ... 34

4.2 Legitimidade ... 36

4.3 Durabilidade e possibilidade de revisão ... 42

4.3.1 Ponderações acerca das ações propostas após o nascimento da criança ... 46

4.4 Citação, resposta, e termo inicial dos alimentos ... 48

4.5 Alimentos Provisórios ... 50

4.6 Competência ... 51

4.7 Provas ... 53

4.8 Repetição de indébito e reparação de danos morais e materiais ... 57

4.9 Hipóteses de não pagamento da prestação de alimentos gravídicos ... 60

4.10. Meios de execução da prestação não satisfeita ... 62

4.10.1 Desconto em folha ou renda ... 65

4.10.2 Prisão civil ... 66

4.10.3 Expropriação ... 69

CONCLUSÃO ... 73

BIBLIOGRAFIA ... 75

(10)

1 INTRODUÇÃO

Insta salientar que o Código Civil de 2002, em seus Artigos 1.694 a 1.710, institui a possibilidade de os indivíduos pertencentes ao mesmo vínculo familiar, sejam parentes, cônjuges ou companheiros, pedirem, uns aos outros, os recursos necessários para a sua subsistência, caso encontrem-se em situação de necessidade.

Essa possibilidade tem como fulcro, notadamente, o princípio da dignidade da pessoa humana, alçado a fundamento da República Federativa do Brasil pelo Artigo 1º da Constituição Federal de 1988, bem como o direito fundamental à vida, previsto no Artigo 5º da mesma Carta Magna.

Com relação à hipótese de a mulher grávida, que não disponha de condições financeiras para arcar com as despesas decorrentes deste estado de gravidez, e não possua vínculo de casamento ou companheirismo com o suposto pai de seu filho, pedir alimentos, sempre existiram algumas divergências na doutrina e na jurisprudência pátrias.

As divergências ocorriam, primordialmente, em virtude da multiplicidade de entendimentos distintos em relação à personalidade jurídica do nascituro, entendendo-se este como o ser em formação, ou seja, à sua aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações na seara jurídica.

É certo, não obstante, que se sobressaem preceitos, de ordem interna e internacional, que impõem a proteção da vida da criança, antes mesmo do seu nascimento, como é o caso da Declaração dos Direitos da Criança, de 20 de novembro de 1959, na Convenção sobre os Direitos da Criança, de 20 de novembro de 1989, do Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969, e do Estatuto da Criança e do Adolescente, previsto na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.

(11)

Alguns Tribunais pátrios, como é o caso do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o que será demonstrado adiante, nas últimas décadas, também começaram a admitir a possibilidade de o ser em formação, representado pela mãe, ingressar com ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos. Nesses casos, em sendo declarada a paternidade, era também determinada a obrigação alimentar do pai.

No entanto, esses entendimentos a favor da concessão de alimentos ao nascituro ainda eram escassos, de modo que se pode entender que faltava uma regulamentação específica, que não deixasse dúvidas quanto à possibilidade em comento.

Ressalte-se que a Lei nº 11.804, de cinco de novembro de 2008, que institui os alimentos gravídicos, adveio em momento oportuno, uma vez que outorgou categoricamente à mãe o direito de, substituindo o nascituro, buscar alimentos durante o período de gravidez.

A Lei aludida constitui uma inovação, uma vez que prevê uma hipótese excepcional, que não se apresentava no ordenamento jurídico pátrio, qual seja, a fixação dos alimentos gravídicos sem que exista comprovação inequívoca da paternidade, bastando a existência de indícios relevantes.

Assim, o presente trabalho tem como escopo delinear os principais aspectos da Lei nº 11.804, de cinco de novembro de 2008, de forma a demonstrar a sua importância para assegurar a assistência da mulher durante o período de gravidez, bem como para garantir a formação e o desenvolvimento sadio do nascituro.

(12)

2 ALIMENTOS

No presente capítulo, discorre-se acerca das principais características dos alimentos, analisando seu conceito, fundamentos, o seu status de direito social, suas espécies e seus requisitos.

2.1 Conceito e fundamentos

O termo alimentos, em linguagem comum, pode ser entendido como tudo o que o ser humano precisa, desde o nascimento até a sua morte, para a sua subsistência. Representa, assim, o estritamente necessário à sobrevivência do alimentando.

Na terminologia jurídica, tem sentido mais amplo do que o vigorante na linguagem comum, uma vez que abrange não somente o fornecimento do necessário ao sustento de uma pessoa, mas também de outras necessidades indispensáveis à vida em sociedade, como vestuário, habitação, tratamento médico, transporte e as verbas necessárias para instrução e educação.

Carvalho de Santos destaca com clareza a distinção entre estas duas concepções dos alimentos:

A palavra alimentos, no sentido geral, significa o que é necessário para a alimentação, mas, na linguagem do Direito, tem um significado técnico, devendo se entender por alimentos tudo o que é necessário para satisfazer as necessidades da vida e habitação, e, se o alimentário é menor, também para as despesas de criação e educação.1

Pode-se perceber a extensão da concepção de alimentos, no Código Civil de 10 de janeiro de 2002, a partir da leitura de seu Artigo 1.694, que dispõe que “podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de

1 SANTOS,

apud PEREIRA, Áurea Pimentel. Alimentos no Direito de Família e no Direito dos

(13)

modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”.

Insta salientar que todo indivíduo tem direito de prover a sua própria subsistência a partir de seu esforço, sendo o livre exercício de qualquer trabalho um direito fundamental previsto no Artigo 5º, XIII, da Constituição Federal de 1988, bem como um direito social previsto no Artigo 6º da mesma Carta Magna.

Muitas vezes, entretanto, seja por idade avançada, doença, falta de trabalho, ou qualquer outra incapacidade, pode acontecer de o indivíduo encontrar-se impossibilitado de obter pessoalmente os meios necessários à sua subsistência. Por conseguinte, destaca Caio Mario da Silva Pereira:

Quem não pode prover à sua subsistência, nem por isto é deixado à própria sorte. A sociedade há de propiciar-lhe sobrevivência, através de meios e órgãos estatais ou entidades particulares. Ao Poder Público compete desenvolver a assistência social, estimular o seguro, tomar medidas defensivas adequadas. E no mundo moderno tem-no feito com intensidade.2

Ressalte-se que, além da assistência do Poder Público, bem delineada pelo doutrinador acima referido, impõe-se que aquele que não pode prover o seu próprio sustento receba auxílio dos seus familiares, auxílio este que não se consubstancia em um favor ou uma generosidade, que no Direito Romano denominava-se officium pietatis, mas em uma obrigação judicialmente exigível, denominada obrigação alimentar.

Nesse sentido, importante trazer à lume o entendimento de Lafayette Rodrigues Pereira, em obra organizada pelo Conselho Editorial do Senado Federal:

Quando ao homem collocado em qualquer das circumstancias alludidas fallecem posses, quem deve vir-lhe em auxilio para não deixa-lo succumbir á míngua? - O Estado? Certo, ao Estado incumbe essa obrigação; mas antes do Estato que deve protecção á todos os infelizes, a voz da natureza chama os pais e os parentes mais próximos”.3

2 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. V.5. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.

495.

3 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direitos de Familia. Prefácio de Sálvio de Figueiredo. Coleção História do

(14)

Impende destacar que o Código Civil de 2002, em seus Artigos 1.694 a 1.710, dispõe sobre a obrigação alimentar do cônjuge ou cônjuge, companheiro ou ex-companheiro, ou dos parentes em propícia situação de fortuna.

Já a Lei nº 11.804, de cinco de novembro de 2008 (Lei de Alimentos Gravídicos), a qual constitui o objeto principal do presente trabalho e será delineada adiante, trata da obrigação do possível pai de prestar alimentos à mulher gestante.

Constitui fundamento da obrigação alimentar o princípio da dignidade da pessoa humana, o qual está inserido no Artigo 1º, III, da Constituição Federal de 1988, representando um dos alicerces do Estado Democrático de Direito.

Aponta Maria Helena Diniz que o princípio do respeito à dignidade pessoa humana “constitui base da comunidade familiar, garantindo o pleno desenvolvimento e a realização de todos os seus membros, principalmente da criança e do adolescente”.4

Insta pôr em relevo que o princípio da dignidade da pessoa humana irradia seus efeitos sobre todo o ordenamento jurídico, e baliza não somente os atos estatais, mas, outrossim, as relações privadas que se desenvolvem no seio da sociedade.

O princípio referente impõe que as pessoas sejam respeitadas, resguardadas e tuteladas em sua integridade física e moral, e norteia demais valores constitucionais, como é o caso do direito à vida, à educação, à saúde, dentre outros. Glauco Barreira Magalhães Filho destaca que “a dignidade da pessoa humana é a fonte ética dos direitos fundamentais, não sendo esses senão emanações do valor básico mencionado”.5

Dessa forma, pode-se entender que o direito fundamental à vida, presente no Artigo 5º da Constituição Federal de 1988, advém do princípio da dignidade da pessoa humana, além de constituir outro fundamento primordial da obrigação alimentar. É o que bem destaca Paulo Nader:

4 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 20.ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005, p.22.

5 MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira. Hermenêutica e unidade axiológica da Constituição. 2. ed. Belo

(15)

O direito a alimentos dimana do próprio direito à vida, que ao mesmo tempo é princípio de Direito Natural e de Direito Positivo. Para que o direito à vida se efetive, indispensável que a ordem jurídica ofereça aos indivíduos instrumentos eficazes de sua proteção. Um deles, iniludivelmente, é o direito de exigir, à pessoa da família, as condições básicas de subsistência.6

Também é fundamento da obrigação de prestar alimentos o princípio da solidariedade familiar, que estabelece um vínculo moral entre os membros de uma família, enfatizando a importância do respeito e consideração mútuos, bem como da criação de laços de fraternidade. Nesse sentido, destacam Washington de Barros Monteiro e Regina Beatriz Tavares da Silva que o instituto dos alimentos “repousa no dever que toca aos parentes, sobretudo aos mais próximos, de se ajudarem mutuamente, nos casos de necessidade”.7

O aludido princípio advém da solidariedade social, a qual constitui um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, segundo consta no Art. 3º, I, da Constituição Federal de 1988.

Não é demais mencionar que a obrigação alimentar, por ter como substrato princípios de relevância constitucional, os quais foram acima delineados, é de ordem pública. Assim, Caio Mario da Silva Pereira aponta que “os alimentos constituem obrigação natural, e aquele que os cumpre obedece a uma norma de ordem pública”.8

2.2 Direito a alimentação como um direito social

Os direitos sociais estão previstos no Artigo 6º da Constituição Federal de 1988, e podem ser considerados como aqueles que constituem as liberdades positivas, uma vez que se concretizam por meio da atuação estatal.

Tais direitos visam a minimizar as desigualdades existentes na sociedade e, por conseguinte, melhorar as condições de vida daqueles que não possuem recursos econômicos suficientes para prover o seu sustento. É o que destacam Vicente de Paulo e Marcelo

6 NADER, Paulo. Curso de Direito Civil: Direito de Família. V. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 531. 7 MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito Civil. 39. ed.

Saraiva: 2009, p. 429.

(16)

Alexandrino, ao apontar que os direitos sociais têm como objetivo “a melhoria das condições de vida dos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social”.9

Nessa esteira, é importante destacar que a Emenda Constitucional nº 64, publicada no Diário Oficial da União de quatro de fevereiro de 2010 inseriu, no rol dos direitos sociais previstos no Artigo 6º da Constituição Federal de 1988, o direito a alimentação, conforme demonstra o seu Artigo 1º, in verbis:

Art. 1º O art. 6º da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição." (grifos nossos)

A Emenda Constitucional em epígrafe, ao erigir a alimentação a direito social, evidencia a essencialidade do direito aos alimentos, tendo em vista, conforme foi mencionado anteriormente, que o mesmo tem como substrato o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à vida.

Sendo assim, o dispositivo aludido tem relevância na medida em que impõe não somente às autoridades estatais, mas a toda a sociedade, a adoção de medidas no sentido de assegurar a efetividade do direito referente, de forma a propiciar condições de vida salutares para todos os cidadãos.

2.3 Espécies

A doutrina aponta diversas espécies de alimentos, os quais são classificados segundo os seguintes critérios: natureza, causa jurídica, finalidade e momento em que são reclamados.

9 PAULO, Vicente de; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado.

(17)

Quanto à natureza, os alimentos podem ser naturais ou civis. Os alimentos naturais, segundo Carlos Roberto Gonçalves, limitam-se ao necessarium vitae, ou seja, ao que é indispensável à satisfação das necessidades primárias de vida, tais como alimentação, vestuário e habitação.10

Já os alimentos civis referem-se ao necessarium personae, destinam-se à manutenção da condição social, do status da família, abrangendo outras necessidades, tais como as intelectuais e as morais, e variam conforme a posição social da pessoa necessitada.

Quanto à causa jurídica, os alimentos dividem-se em legais ou legítimos, voluntários e indenizatórios. Os legais ou legítimos são aqueles devidos por força de lei. Sendo assim, são legítimos os alimentos previstos no Código Civil de 2002, em seus Artigos 1.694 a 1.710, bem como os alimentos gravídicos, previstos na Lei nº 11.804, de cinco de novembro de 2008, e objeto do presente estudo.

Os alimentos voluntários, por sua vez, emanam de uma declaração de vontade

inter vivos, como na obrigação alimentar assumida contratualmente, ou causa mortis, como é

o caso da manifestação através de testamento, em geral sob a forma de legado de alimentos. Os primeiros pertencem ao direito das obrigações, disposto no Livro I do Código Civil de 2002, Artigos 233 a 965, e os segundos pertencem ao direito das sucessões, disposto no Livro V do mesmo Código, nos Artigos 1.784 a 2.027.

Finalmente, os alimentos indenizatórios pertencem ao direito das obrigações, e destinam-se a indenizar as vítimas de atos ilícitos, estando previstos nos Artigos 948, II, e 950 do Código Civil de 2002.

Quanto à finalidade, os alimentos classificam-se em definitivos, provisórios e provisionais. Os alimentos definitivos são estabelecidos pelo juiz na sentença ou no acordo das partes devidamente homologado, e podem ser revistos a qualquer momento.

Já os alimentos provisórios têm natureza de antecipação de tutela, sendo fixados liminarmente no despacho inicial proferido na ação de alimentos, segundo o Artigo 4º da Lei nº 5.478, de 1968, que dispõe que “ao despachar o pedido, o juiz fixará desde logo alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita”.

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No que concerne aos alimentos provisionais, os mesmos são determinados em medida cautelar preparatória ou incidental de ação de separação judicial, de divórcio, de nulidade ou anulação de casamento ou de alimentos. Estão previstos no Artigo 852 do Código de Processo Civil de 1973, e destinam-se a propiciar meios para que a ação referente seja proposta, através do pagamento das despesas judiciais, bem como a prover a mantença da suplicante e de sua prole durante o curso do processo.

Por fim, quanto ao momento em que são reclamados, os alimentos classificam-se em pretéritos, atuais e futuros. São pretéritos quando o pedido retroage a período anterior ao ajuizamento da ação; atuais, os postulados a partir do ajuizamento; e futuros, os alimentos devidos somente a partir da sentença.

O direito brasileiro somente admite os alimentos atuais e futuros. Os pretéritos, alusivos a período anterior ao ajuizamento da ação, não são devidos, uma vez que, conforme aponta Silvo de Salvo Venosa, “se o alimentando conseguiu sobreviver sem o auxílio do alimentante, não pode o mesmo pretender o pagamento de alimentos relativos ao passado.” 11

2.4 Requisitos

O direito a alimentos obedece a alguns requisitos ou pressupostos, quais sejam: a necessidade, a possibilidade e a proporcionalidade.

Primeiramente, ressalte-se que é requisito primordial a necessidade do alimentando. Sendo assim, só pode reclamar alimentos o indivíduo que não tem bens suficientes para prover o seu sustento e está impossibilitado de obtê-los por meio de trabalho. Nesse caso, não importa a causa pela qual o demandante foi reduzido à condição de necessitado.

Assim, não tem relevância a razão da ausência de trabalho, segundo bem destaca Caio Mário da Silva Pereira, “seja ela social (desemprego), seja física (enfermidade, velhice, invalidez), seja moral (ausência de ocupação na categoria do necessitado) ou outra qualquer,

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desde que efetivamente coloque o indivíduo em situação de não prover à própria subsistência”.12

O fornecimento de alimentos também tem como pressuposto a possibilidade do alimentante. Desse modo, é preciso verificar se o alimentante possui recursos suficientes para prestar alimentos, sem que fique desprovido do necessário para o seu próprio sustento.

Dessa forma, exime-se de prestar alimentos aquele que poderá sacrificar ou mesmo pôr em risco de sacrificar a sua própria subsistência. Washington de Barros Monteiro bem destaca:

Se o alimentante possui tão-somente o indispensável à própria mantença, não é justo seja ele compelido a desviar parte de sua renda a fim de socorrer o parente necessitado. A lei não quer o perecimento do alimentado, mas também não deseja o sacrifício do alimentante. Não há direito alimentar contra quem possui o estritamente necessário à própria subsistência.13

Outrossim, é imprescindível o requisito da proporcionalidade, que nada mais é do que os dois requisitos anteriormente mencionados, considerados conjuntamente. Desse modo, na fixação dos alimentos, deverão sempre ser levadas em consideração as necessidades do alimentando e os recursos do alimentante.

Nesse sentido, aponta Carlos Roberto Gonçalves, in verbis:

Não deve o juiz, pois, fixar pensões de valor exagerado, nem por demais reduzido, devendo estimá-lo com prudente arbítrio, sopesando os dois vetores a serem analisados, necessidade e possibilidade, na busca do equilíbrio entre eles.14

12 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. V.5. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004,

p.497-498.

13 MONTEIRO

apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. V.6. São Paulo: Saraiva, p. 512.

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3 NASCITURO

Após analisar os principais aspectos dos alimentos, é importante delinear o conceito de nascituro, bem como expor as principais concepções acerca de sua personalidade jurídica, de seu direito à vida, de seu direito aos alimentos, e de sua capacidade processual.

3.1 Conceito

Nascituro é uma palavra derivada do latim nasciturus, e indica o ser que foi concebido, mas que ainda se encontra em desenvolvimento no ventre materno. Nesse sentido, “é o que irá nascer; em outras palavras, o feto durante a gestação; não é ele ser humano – não preenche ainda o primeiro dos requisitos necessários à existência do homem, isto é, o nascimento”.15

Para Paulo Dourado Gusmão, o nascituro é o ser “concebido com vida intra-uterina, cujos interesses a lei protege, se nascer com vida, no caso de falecimento do pai”.16

No entendimento do Vocabulário Jurídico de De Plácido e Silva, nascituro significa, in verbis:

NASCITURO. Derivado do latim nasciturus, particípio passado de nasci, que

precisamente indicar aquele que há de nascer. Designa, assim, o ente que está gerado ou concebido, tem existência no ventre materno: está em vida intra-uterina. Mas,

não nasceu ainda, não ocorreu o nascimento dele, pelo que não iniciou sua vida como pessoa.17

O Professor Paulo Carneiro Maia, por sua vez, conceitua nascituro:

15 ALVES, apud CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 345.

16 GUSMÃO, Paulo Dourado. Dicionário de Direito de Família. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 357.

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Ou em outro enunciado sintético: o que há de vir ao mundo: está concebido (conceptus), mas cujo nascimento ainda não se consumou continuando ‘pars ventris’

ou das entranhas maternais: aquele que deverá nascer, ‘nascere’, de étimo latino. Quer designar, com expressividade, o embrião (‘ venter’, ‘embrio’, ‘foetus’) que vem sendo gerado ou concebido, não tendo surgido ainda à luz como ente apto (‘ vitalis’), na ordem fisiológica. Sua existência é intra-uterina (‘pars viscerum matris’), no ventre materno (‘no uterus’), adstrita a esta contingência até que dele se separe, sendo irrelevante se por parto natural ou artificial, concretizando-se o nascimento com vida, existência independente e ‘extra uterina’ para aquisição do atributo jurídico de pessoa.18

3.2 Teorias sobre o início da personalidade jurídica

Ressalte-se que a personalidade está relacionada com a idéia de pessoa, que, no sentido jurídico, consubstancia-se na aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações. Segundo o Artigo 1º do Código Civil de 2002, a personalidade jurídica, que também pode ser denominada personalidade civil, é universal, uma vez que todo e qualquer ser humano, sem qualquer distinção, é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

Nesse sentido, Carlos Roberto Gonçalves menciona que “a personalidade é uma qualidade ou atributo do ser humano. Pode ser definida como aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações ou deveres na ordem civil”.19

A personalidade jurídica também possui ligação com a idéia de capacidade de direito, que se consubstancia na aptidão que qualquer pessoa possui de ser titular de direitos. Em virtude da proximidade entre os dois termos, Pontes de Miranda aponta que “capacidade de direito e personalidade são o mesmo”.20

Entendendo-se a personalidade civil como sendo a possibilidade de atuação da pessoa na ordem jurídica, é imprescindível averiguar quando ocorre o início da mesma. Nesse sentido, existem três teorias principais sobre o início da personalidade jurídica: a teoria da personalidade condicional, a teoria natalista e a teoria verdadeiramente concepcionista.

Não é demais salientar que existe uma multiplicidade de entendimentos doutrinários divergentes no que concerne ao começo da personalidade jurídica. Por

18 MAIA, apud ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato e. Tutela Civil do Nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000, p.

6.

19 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. V.1. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 70.

(22)

conseguinte, torna-se difícil dividir tais entendimentos em correntes doutrinárias. As teorias que serão expostas a seguir, portanto, advêm de divisões realizadas no seio da doutrina, mas que muitas vezes possuem relação entre si, não se consubstanciando em teorias estanques.

A teoria da personalidade condicional foi defendida por Clóvis Beviláqua no Projeto de Código Civil Brasileiro de 1899, o qual mencionava que a personalidade jurídica inicia-se com a concepção, sob a condição do nascimento com vida. Para tal teoria, portanto, o nascituro seria detentor de personalidade jurídica, desde que houvesse o posterior nascimento com vida. 21

Tal entendimento não prevaleceu no Código Civil de 1º de janeiro de 1916, que adotou a teoria natalista, ao prescrever, em seu Artigo 4º, que “a personalidade civil do homem começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro”.

A teoria adotada pelo Código Civil de 1916 foi bastante criticada por Clóvis Beviláqua, que destacou que, em diversos momentos, no mesmo Código, o nascituro era tratado como sujeito de direitos, podendo-se mencionar, como exemplo: o seu Artigo 462, que estabelecia a curatela do nascituro, no caso do falecimento do pai, não tendo a mãe grávida o pátrio poder; bem como o parágrafo único do seu Artigo 357, que admitia o reconhecimento da paternidade antes do nascimento do filho.

Nesse sentido, segundo o aludido doutrinador, uma vez que o CC/1916, nos dispositivos supra mencionados, protegia os direitos do nascituro, não se poderia admitir que o mesmo não possuísse personalidade jurídica.

A teoria da personalidade condicional também é defendida por Arnoldo Wald, que entende que o nascituro possui uma personalidade condicionada ao nascimento com vida, ao dispor que “a proteção do nascituro explica-se, pois há nele uma personalidade condicional que surge na sua plenitude com o nascimento com vida e se extingue no caso de não chegar o feto a viver”.22

21 BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria Geral do Direito Civil. 2.ed. rev. e atual. pelo Prof. Caio Mario da Silva

Pereira. Rio de Janeiro: Editora S.A., 1976, p. 75.

22 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil: Introdução e Parte Geral. 5.ed. rev. e atual. São Paulo: Revista

(23)

Também defendem a personalidade condicional do nascituro Washington de Barros Monteiro e Ana Cristina de Barros Monteiro França, ao mencionarem que “o nascituro é pessoa condicional; a aquisição da personalidade acha-se sob a dependência de condição suspensiva, o nascimento com vida”.23

É certo, reitere-se, que prevaleceu no CC/1916 a teoria natalista, defendida por doutrinadores como Pontes de Miranda, o qual entende que o nascituro, não sendo uma pessoa, não é sujeito de direitos e, portanto, não possui personalidade jurídica:

No útero, a criança não é pessoa. Se não nasce viva, nunca adquiriu direitos, nunca foi sujeito de direito, nem pôde ter sido sujeito (=nunca foi pessoa). Todavia, entre a concepção e o nascimento, o ser vivo pode achar-se em situação tal que se tenha de esperar o nascimento para se saber se algum direito, pretensão, ação, ou exceção lhe deveria ter ido. Não é preciso que haja cortado o cordão umbilical; basta que a criança haja terminado de nascer.24

O doutrinador em comento contrapõe-se ao entendimento da teoria da personalidade condicional, ao apontar que “é de repelir-se qualquer noção de condição. Não há condição nas situações jurídicas do nascituro”.25

A teoria natalista foi novamente adotada pelo Código Civil de 10 de janeiro 2002, até então em vigor, uma vez que foram reiteradas, em seu Artigo 2º, as disposições constantes no Artigo 4º do Código Civil de 1916.

Desse modo, segundo o Artigo 2º do CC/2002, existem dois pressupostos para a existência da personalidade jurídica: o nascimento e a vida.

Considera-se o nascimento no momento em que o feto é separado do ventre materno, seja naturalmente ou artificialmente, através de recursos obstétricos. Basta que haja o rompimento da unidade biológica que existia entre a mãe e o feto, não sendo relevante averiguar o tempo de gestação.

23 MONTEIRO, Washington de Barros; PINTO, Ana Cristina de Barros Monteiro França. Curso de Direito

Civil. V.1. 42. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 68.

(24)

Roberto de Ruggiero aponta que “antes do nascimento o produto do corpo humano não é ainda pessoa, mas uma parte das vísceras maternas”.26

Adicione-se que há a vida quando há respiração, ou seja, quando ocorre a primeira troca de oxigênio e gás carbônico entre a criança e o meio ambiente. Nesse sentido, se houver respiração, admite-se que houve vida, e que, por conseguinte, a criança adquiriu personalidade jurídica, ainda que venha a perder a mesma em seguida, por ocasião de morte.

Dentre as técnicas utilizadas na constatação da respiração do nascituro e, conseqüentemente, do nascimento com vida, sobressai-se de um exame denominado docimasia hidrostática de Galeno.

Saliente-se, não obstante, que os doutrinadores que defendem a teoria natalista, ao afirmarem que a personalidade jurídica inicia-se com a concepção, não sustentam que o nascituro não possui direitos.

Sendo assim, Silvio Rodrigues pondera que a lei não concede personalidade jurídica ao nascituro, a qual somente lhe será concedida se nascer com vida, “mas, como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico desde logo preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os direitos que, com muita probabilidade, em breve serão seus”.27

Por conseguinte, apesar de adotar a teoria natalista, somente admitindo o início da personalidade a partir do nascimento com vida, o CC/2002, assim como o CC/1916, em alguns dispositivos, trata o nascituro como sendo sujeito de direitos: é o caso do parágrafo único de seu Artigo 1.609, que dispõe sobre o reconhecimento da paternidade antes do nascimento; de seu Artigo 1.779, que trata da curatela do nascituro, bem como de seu Artigo 1.799, inciso I, que permite a capacidade testamentária passiva do nascituro.

Para Caio Mário da Silva Pereira, não se pode deduzir, a partir do fato de que os dispositivos em comento protegerem os direitos do nascituro, que o CC/2002 adotou a teoria verdadeiramente concepcionista. Segundo o doutrinador aludido, o nascituro, nesses casos,

(25)

possui, tão-somente, um direito potencial, “para cuja constituição dever-se-á aguardar o fato do nascimento e a aquisição da personalidade”.28

Sílvio de Salvo Venosa também defende que o nascituro possui direitos em situação de potencialidade, adicionando que tais direitos são eventuais, uma vez que ficam sob condição suspensiva, condição esta que se mantém até que haja o nascimento com vida.29

Já a teoria verdadeiramente concepcionista defende que a personalidade jurídica inicia-se na concepção, sem qualquer condição. Para a teoria em comento, é uma contradição admitir que o nascituro possui certos direitos e, ao mesmo tempo, considerar que o mesmo não possui personalidade jurídica.

Também aduz a teoria em comento que a personalidade jurídica do nascituro não é condicional, apenas os efeitos de certos direitos, notadamente, os direitos patrimoniais, é que dependem do nascimento com vida. Nesse sentido, dispõe Silmara J. A. Chinelato e Almeida:

Estabelece-se, destarte, que certos direitos e determinados estados, atributos da personalidade, independem do nascimento com vida, o que refuta a tese de que

aquela deste depende sempre. Mesmo que o nascituro fosse reconhecido apenas um

status ou um direito, ainda assim seria forçoso reconhecer-lhe a personalidade,

porque não há direito ou status sem sujeito, nem há sujeito de direito que tenha

completa e integral capacidade jurídica (de direito ou de fato), que se refere sempre a certos e determinados direitos particularmente considerados.”30

É certo, conforme salientado anteriormente, que o Código Civil de 2002, em seu Artigo 2º, adotou a teoria natalista, ao dispor que a personalidade jurídica inicia-se com o nascimento com vida. Não obstante, é bastante plausível a teoria verdadeiramente concepcionista, acima explicitada, visto que o nosso ordenamento jurídico, inegavelmente, protege os direitos do nascituro, sendo relevantes, no presente trabalho, destacar os direitos à vida e aos alimentos.

28 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. V.1. 20.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.

221.

29 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. V.1. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 153.

(26)

Conforme bem destaca Silmara J. A. Chinelato e Almeida, se o ordenamento jurídico concede determinados direitos ao ser em formação, evidentemente, o mesmo possui personalidade jurídica.

Ainda que certos defensores da teoria natalista, como é o caso de Caio Mário da Silva Pereira e Silvio de Salvo Venosa, aduzam que os direitos atribuídos ao nascituro encontram-se em condição de potencialidade, e, portanto, só sejam efetivamente adquiridos pela criança após o nascimento com vida, existem diversos preceitos, de ordem interna e internacional, que concedem os referidos direitos ao ser em formação, sem impor aos mesmos qualquer condição, de modo que se pode deduzir que esses direitos não são eventuais.

Desse modo, será demonstrado a seguir de que forma o ordenamento jurídico pátrio tem proporcionado, cada vez mais, meios para assegurar uma proteção efetiva aos direitos do nascituro, sendo relevantes para o presente trabalho, reitere-se, o direito à vida e o direito aos alimentos.

3.3 Direito à vida

Existem relevantes preceitos, de ordem interna e internacional, que impõem a necessidade de proporcionar condições para o desenvolvimento sadio e, conseqüentemente, para a preservação da vida da criança.

Ressalte-se que, na medida em que os dispositivos aludidos determinam a proteção à vida da criança, estão também impondo o amparo ao nascituro. Evidentemente, se não forem proporcionados meios para o desenvolvimento saudável do nascituro, não se estará protegendo a vida da criança que irá nascer.

(27)

imaturidade física e mental, precisa de proteção e cuidados especiais, inclusive proteção legal apropriada, antes e depois do nascimento”.

Acrescente-se que, em 20 de novembro de 1989, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas adotou a Convenção dos Direitos da Criança, que entrou em vigor em 2 de setembro de 1990, tendo sido o tratado de direitos humanos mais amplamente ratificado da história, e o que dispôs de forma mais abrangente sobre a proteção dos direitos da criança.

A Convenção em comento foi aprovada pelo Congresso Nacional brasileiro em 14 de setembro de 1990, através do Decreto Legislativo 28, sendo ratificada pelo Presidente da República em 21 de novembro de 1990, através do Decreto 99.710.

A Convenção dos Direitos da Criança reafirmou os preceitos estampados na Declaração anteriormente mencionada, destacando a necessidade de proteção à vida da criança, ao dispor, em seu Artigo 6, que “os Estados partes reconhecem que toda criança tem o direito inerente à vida”, bem como que “os Estados partes assegurarão ao máximo a sobrevivência e o desenvolvimento da criança”.

Outrossim, ressalte-se que a Convenção Interamericana dos Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica, promulgada em 22 de novembro de 1969, e ratificada pelo

Brasil em 25 de setembro de 1992, em seu Artigo 4º, menciona que “toda pessoa tem o direito

de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”.

Após a ratificação pelo Brasil, tanto a Convenção dos Direitos da Criança como a Convenção Interamericana dos Direitos Humanos, passaram a vigorar como legislação interna.

É importante também salientar que os referidos preceitos internacionais exerceram notável influência na legislação interna nacional. Antônio Fernando do Amaral e Silva e Munir Cury mencionam que “o espírito e a letra desses documentos internacionais constituem importante fonte de interpretação de que o exegeta do novo Direito não pode prescindir”.31

31 SILVA, Antônio Fernando do Amaral e; CURY, Munir. In: CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e

(28)

Nesse sentido, necessário salientar que o Artigo 5º da Constituição Federal de 1988 assegura a inviolabilidade do direito à vida, na qual, segundo destaca Washington de Barros Monteiro e Regina Beatriz Tavares da Silva, se inclui a vida intra-uterina.32

Silmara J. A. Chinelato e Almeida também destaca que o nascituro, sendo pessoa desde a concepção, tem direito de viver.33

Outrossim, impende pôr em relevo que a CF/88 abordou, pela primeira vez no ordenamento jurídico pátrio, a questão da criança como prioridade absoluta, conforme dispõe o seu Artigo 227, in verbis:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (grifos nossos)

O Estatuto da Criança e do Adolescente, disposto na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, por sua vez, segundo dispõe o seu Artigo 1º, adotou a doutrina da proteção integral da criança, cujas bases estão na Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959, acima mencionada, reconhecendo a criança e o adolescente como cidadãos e sujeitos de direito.

Assim, ressalte-se que, segundo o ECA (Lei nº 8.069, de 1990), a criança e o adolescente, em virtude de suas condições peculiares de pessoas em desenvolvimento, necessitam de direitos especiais e específicos, que sejam capazes de assegurar o seu pleno aprimoramento físico e moral.

Ângela Pinheiro dispõe que “entende-se por proteção integral um conjunto de cuidados voltados para a proteção e assistência à criança, de forma que possa ela assumir plenamente suas responsabilidades na comunidade”.34

32 MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito Civil. V. 2. 3.ed.

São Paulo: Saraiva, p. 440.

33 ALMEIDA, op. cit., p. 296.

34 PINHEIRO, Ângela. Criança e Adolescente no Brasil: porque o abismo entre a lei e a realidade.

(29)

Ressalte-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 1990) incluiu, no rol dos destinatários da proteção integral, além da criança e do adolescente, o nascituro, o qual possui os seus direitos resguardados desde a concepção. Tanto que, em seu Artigo 7º, o Estatuto em epígrafe dispõe sobre a efetivação de políticas públicas que assegurem o nascimento sadio da criança:

Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.

Evidentemente que, se a lei almeja garantir a proteção à vida da criança, deve proporcionar ao nascituro os recursos indispensáveis para o seu desenvolvimento saudável, conforme aponta Victor Santos de Queiroz:

Inequívoco, portanto, que o Estatuto da Criança e do Adolescente, interpretado sistematicamente em meio ao ordenamento jurídico, ao tratar da proteção integral à criança, também incluiu os nascituros no rol dos destinatários de suas normas protetivas.

Tal conclusão se confirma a partir da leitura, por meros exemplos, de alguns dispositivos específicos da Lei 8.069/90.

O artigo 7º da lei sob comento estabelece que a criança tem direito à proteção de sua vida e saúde, cumprindo às políticas sociais públicas garantir-lhe o nascimento sadio. Ora, se a lei quer garantir o nascimento sadio da criança, evidentemente deve proporcionar-lhe condições adequadas que sejam anteriores ao fato do nascimento.35

Por tal razão, brilhantemente, Maria Berenice Dias aponta que “a doutrina da proteção integral abraça a criança desde a concepção”.36

Do mesmo modo, em seu Artigo 8º, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 1990) dispõe sobre o acompanhamento da mulher grávida durante o período de gestação, com o intento de proteger o nascituro. Assim, prescreve que “é assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal”.

35 QUEIROZ, Victor Santos. A personalidade do nascituro à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 61, jan. 2003. Disponível em:

http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3603. Acesso em: 22 abr. 2010. (grifos nossos)

36 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5.ed.rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p.

(30)

Ao comentar o Artigo em comento, Evelyn Eisenstein destaca:

O processo crítico e dinâmico do crescimento e desenvolvimento de qualquer criança, até a fase final da maturação de sua personalidade, durante a adolescência, começa bem antes do seu nascimento, isto é, na interação com o meio onde vive, desde a vida intra-uterina.37

3.4 Direito aos alimentos

Antes do advento da Lei nº 11.804, de 05 de novembro de 2008, que dispõe sobre alimentos gravídicos, e será delineada adiante, parte da doutrina já defendia que o ser em formação, desde a sua concepção, tem direito a alimentos, tendo em vista a existência dos referidos preceitos, de ordem interna e internacional, que impõem a necessidade de preservação da vida da criança, antes mesmo de seu nascimento.

Com base no referido Artigo 2º do Código Civil de 2002, que adotou a teoria natalista da personalidade jurídica do nascituro, conforme explicitado anteriormente, Caio Mário da Silva Pereira já defendia a possibilidade de concessão de alimentos ao nascituro:

Se a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a concepção, é de considerar que o seu principal direito consiste no “direito à própria vida” e esta estaria comprometida se à mãe necessitada fossem recusados os recursos primários à sobrevivência do ente em formação em seu ventre.38

Reitere-se que todas as prescrições acima mencionadas, as quais impõem a proteção à vida, inclusive a intra-uterina, já serviam de fundamento para que os doutrinadores defendessem a concessão de alimentos ao nascituro. De forma sintética, ao comentar sobre a Lei nº 11.804, de 2008, dispõem Washington de Barros Monteiro e Regina Beatriz Tavares da Silva:

37 EISENSTEIN, Evelyn. In: CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 6.ed.

São Paulo: Malheiros, 2003, p. 58.

38 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. V.5. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.

(31)

Antes dessa Lei, o nascituro já tinha direito a alimentos para preservação de sua vida, inobstante a personalidade jurídica tenha início no nascimento com vida, já que o art. 2º do Código Civil põe a salvo os direitos do nascituro desde a sua concepção, o art. 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe sobre as políticas sociais públicas que devem permitir o nascimento com vida e as condições dignas de sua existência e o art. 5º, caput, da Constituição Federal estabelece a inviolabilidade do direito à vida, a qual se inclui a vida intra-uterina.39

Também Stolze Gagliano e Pamplona Filho já defendiam que o nascituro possui direito alimentos, “por não ser justo que a genitora suporte todos os encargos da gestação sem a colaboração econômica do seu companheiro reconhecido”.40

Silmara J. A. Chinelato e Almeida argumentava que “em nosso modo de ver, ao nascituro – inclusive ao adotado – são devidos, como direito próprio, alimentos em sentido lato – alimentos civis – para que possa nutrir-se e desenvolver-se com normalidade, objetivando o nascimento com vida”.41

No mesmo sentido, Paulo Nader já salientava que “embora a Lei Civil não declare, diretamente, que o nascituro pode figurar como beneficiário em ação de alimentos, esta condição se acha implícita na ordem jurídica”.42

Assim como a doutrina, parcela da jurisprudência pátria, ainda que timidamente, já vinha progredindo no sentindo de amplificar a proteção aos direitos do nascituro, defendendo a sua capacidade processual para propor ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos, conforme será delineado a seguir.

3.4.1. Capacidade processual do nascituro

39 BARROS; SILVA, op. cit., p. 440.

40 GAGLIANO; PAMPLONA FILHO apud VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. V.1. 5.ed. São Paulo:

Atlas, 2005, p. 154.

41 ALMEIDA, Slimara J. A. Chinelato e. Tutela Civil do Nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 243. (grifos do

autor)

(32)

Conforme disposto anteriormente, a capacidade de direito está intimamente ligada à personalidade jurídica, consubstanciando-se na capacidade para ser titular de direitos e obrigações na ordem civil.

Já a capacidade processual pode ser divida em capacidade de ser parte, capacidade para estar em juízo e capacidade postulatória.

Saliente-se que a capacidade de ser parte é um reflexo da capacidade de direito, acima mencionada, e, por conseguinte, segundo Moacyr Amaral Santos, “toda pessoa é capaz de direitos e deveres processuais, isto é, de ser sujeito da relação processual, e, pois, tem

capacidade de ser parte”.43

Para Fredie Didier Jr., a capacidade de ser parte “é a personalidade judiciária: aptidão para, em tese, ser sujeito da relação jurídica processual (processo) ou assumir uma situação jurídica processual (autor, réu, assistente, excipiente, excepto etc.)”44

A capacidade para estar em juízo, por sua vez, tem ligação com a ideia de capacidade de fato ou de exercício, que, segundo Silvio Rodrigues, é a capacidade de “pessoalmente atuar na órbita do direito”.45

Desse modo, sendo um reflexo da capacidade de fato ou de exercício, a capacidade para estar em juízo “é a capacidade de exercer os direitos e deveres processuais; é a capacidade de praticar validamente os atos processuais; diz respeito àqueles que têm capacidade para agir”.46

Por fim, a capacidade postulatória “pode ser definida como a aptidão para dirigir petições ao Estado-juiz. Trata-se de aptidão que, em linha de princípio, é privativa do advogado”.47

No que se refere à capacidade processual do nascituro, ressalte-se que parte da jurisprudência pátria, antes do advento da Lei nº 11.804, de 05 de novembro de 2008, já

43 SANTOS, Moacyr Amaral. Direito Processual Civil: Processo de Conhecimento. 25. ed. São Paulo:

Saraiva, 2008, p. 362. (grifos do autor)

44 DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. V.1. Bahia: Podivm, 2007, p. 199. 45 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Parte Geral. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 39. 46 SANTOS; op. cit., p. 363.

47 CÂMARA, Alexandre Freitas. 16. ed. Lições de Direito Processual Civil. V. 1. Rio de Janeiro: Lúmen Juris,

(33)

entendia que o mesmo possui capacidade de ser parte, mas que, no entanto, não possui capacidade para estar em juízo, uma vez que, para praticar atos processuais, deveria ser representado pela mãe.

Parte dos nossos Tribunais já vinham admitindo que o nascituro possui capacidade de ser parte em ação de investigação de paternidade com pedido de alimentos, conforme bem destaca Caio Mário da Silva Pereira, ao indicar decisões pioneiras do Tribunal de Justiça de São Paulo e do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Têm os nossos Tribunais reconhecido a legitimidade processual do nascituro, representado pela mãe, tendo decisão pioneira da Primeira Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, datada de 14.09.1993 (Ap. Cível nº 193648-1), atribuído a legitimidade ad causam ao nascituro, representado pela mãe gestante, para propor

ação de investigação de paternidade com pedido de alimentos. Concluiu o Relator – Des. Renan Lotufo – reportando-se à decisão pioneira no mesmo sentido do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (RJTJRS 104/418) que “ao nascituro assiste, no plano do Direito processual, capacidade para ser parte como autor e como Réu. Representando o nascituro, pode a mãe propor ação investigatória e o nascimento com vida investe o infante na titularidade da pretensão de direito material, até então uma expectativa resguardada.48

Adicione-se ementa da decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, de 17 de novembro de 1999, que teve como relatora a Desembargadora Maria Berenice Dias, a qual reconheceu a legitimidade do nascituro para, representado pela mãe, propor ação de investigação de paternidade:

NASCITURO. INVESTIGACAO DE PATERNIDADE. A GENITORA, COMO REPRESENTANTE DO NASCITURO, TEM LEGITIMIDADE PARA PROPOR

ACAO INVESTIGATORIA DE PATERNIDADE. APELO PROVIDO.49

Pode-se mencionar também a ementa da decisão, de 10 de março de 2005, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, admite a legitimidade ativa do nascituro para propor ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos:

48 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. V. 5. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.

519.

49 TJRS, Apelação Cível nº 70000134635, Rel. Des. Maria Berenice Dias, 7ª Câmara Cível, julgado em

17.11.1999, revista de Jurisprudência: segredo de justiça. Disponível em: <

(34)

FAMÍLIA. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E ALIMENTOS. NATUREZA PERSONALÍSSIMA DA AÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. DIREITO DO NASCITURO. São legitimados ativamente para a ação de investigação de paternidade e alimentos o investigante, o Ministério Público, e também o nascituro, representado pela mãe gestante.50

Nesse diapasão, pode-se verificar que a jurisprudência vinha, ainda que timidamente, avançando no sentido de garantir a assistência alimentar ao nascituro, evitando que a gestante ficasse desamparada durante o período de gravidez.

No entanto, é certo que faltava uma regulamentação legal específica no que tange à concessão de alimentos ao ser em formação, a qual pusesse fim a qualquer divergência jurisprudencial que constituísse um óbice à proteção de sua vida

Por conseguinte, em momento oportuno entrou em vigor a Lei nº 11.804, de cinco de novembro de 2008, que dispõe sobre alimentos gravídicos, outorgando categoricamente à mãe o direito de, substituindo o nascituro, buscar alimentos durante o período de gravidez. É o que bem destaca Maria Berenice Dias:

Ainda que inquestionável a responsabilidade parental desde a concepção, o silêncio do legislador sempre gerou dificuldade para a concessão de alimentos ao nascituro. Assim, em muito boa hora é preenchida injustificável lacuna.

Trata-se de um avanço que a jurisprudência já vinha assegurando. A obrigação alimentar desde a concepção estava mais do que implícita no ordenamento jurídico, mas nada como a lei para vencer a injustificável resistência de alguns juízes em deferir direitos não claramente expressos.51

Não é demais salientar que a Lei nº 11.804, de 2008, inovou ao admitir a fixação de alimentos a partir da existência, tão somente, de indícios de paternidade, o que será delineado a seguir.

50 TJMG, Apelação Cível nº 1.0024.04.377309-2/001, Rel. Des. Duarte de Paula, 8ª Câmara Cível, julgado em

10.03.2005, DJU de 10.06.2005.

51 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,

(35)

4 ALIMENTOS GRAVÍDICOS

Conforme apontado alhures, a Lei nº 11. 804, sancionada em cinco de novembro de 2008, em vigor desde a sua publicação, em seis de novembro de 2008, pôs fim a todas as divergências jurisprudenciais e doutrinárias no que se refere à concessão de alimentos ao nascituro, regulando os alimentos gravídicos.

Ressalte-se que o Projeto de Lei nº 7.376, de 2006, que deu origem à Lei em epígrafe, teve seis de seus dispositivos vetados pelo Presidente da República, pelos mais diversos motivos, quais sejam: os Artigos 3º, 4º, 5º, 8º, 9º e 10. Todos os dispositivos em comento serão devidamente explicitados no decorrer do presente trabalho.

Dessa forma, a Lei dos Alimentos Gravídicos é bastante concisa, resultando, tão-somente, em seis dispositivos. Em virtude de sua brevidade, o seu Artigo 11 permite que se utilize supletivamente das disposições da Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, que dispõe sobre ação de alimentos e dá outras providências, bem como da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, que institui o Código de Processo Civil.

Feita essa rápida exposição, mister é delinear os aspectos primordiais da referida Lei.

4.1 Conceito e Peculiaridades

O Artigo 2º, bem como seu parágrafo único, da Lei nº 11.804, de 2008, estabelecem o conceito de alimentos gravídicos:

(36)

Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.

A partir da análise do dispositivo em epígrafe, pode-se perceber, primeiramente, que os alimentos gravídicos compreendem aqueles necessários à gestação. Desse modo, quanto à natureza, enquadram-se no conceito de alimentos naturais, uma vez que se restringem necessarium vitae, ou seja, aos recursos indispensáveis para o desenvolvimento sadio e conseqüente nascimento com vida do nascituro.

Nesse sentido, não devem os alimentos gravídicos abranger outras despesas que não sejam imprescindíveis para a manutenção de uma gestação saudável. Por conseguinte, pode-se mencionar que:

Não estão englobados na definição de alimentos gravídicos, por exemplo, exames de ultra-som, destinados somente à vaidade da mãe em ver o filho intra-uterino, já que hoje existem exames (ultra-sonografia 3D/4D), capazes de definir com precisão a aparência do feto. 52

Acrescente-se que as despesas apontadas no referido Artigo aludido constituem um rol exemplificativo, numerus apertus, podendo o juiz conceder os alimentos em comento levando em consideração o que for pertinente.

É importante também pôr em relevo que o parágrafo único estabelece que os alimentos gravídicos precisam estar em consonância com o binômio necessidade-possibilidade, ou seja, com o requisito da proporcionalidade, uma vez que devem levar em consideração as condições pessoais e sociais da mulher grávida e do suposto pai.

Sendo assim, somente pode requerer tais alimentos a gestante que não possua recursos próprios para arcar com as despesas da gravidez, bem como somente deve ser imposta tal obrigação ao suposto pai que possua bens suficientes para prestar tais alimentos,

52 ASSIS, Cícero Goulart de. Questões polêmicas dos alimentos gravídicos. Disponível em: <

(37)

sem prejudicar o seu próprio sustento, uma vez que “o instituto dos alimentos foi criado para socorrer necessitados, não para fomentar a ociosidade ou favorecer o parasitismo”.53

4.2 Legitimidade

A legitimidade ativa para propor ação que tenha em vista a concessão de alimentos gravídicos é da mulher gestante. Nesse caso, a legitimidade é extraordinária, e haverá substituição processual, uma vez que a mãe irá, em nome próprio, pleitear direitos do nascituro.

Conforme mencionado anteriormente, parte da jurisprudência pátria, antes da Lei dos Alimentos Gravídicos, já vinha admitindo que o nascituro possui capacidade para ser parte, podendo o mesmo, representado pela mãe, propor ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos.

Nesse caso, configurava-se um caso de representação processual, uma vez que a mãe agia em nome do nascituro, o qual era considerado o legitimado ativo da ação de alimentos.

Vicente de Paulo e Marcelo Alexandrino bem destacam esta distinção entre substituição processual e representação processual:

Usualmente, a pessoa que pode ajuizar a ação, isto é, aquele que tem legitimidade ativa, é o próprio titular do direito. O titular do direito pode ele próprio buscar a tutela do direito ou pode conferir a alguém a atribuição de representá-lo. Se o titular do direito for representado, o representante, ao ajuizar a ação, estará atuando em nome do representado, e na defesa de alegado direito do representado (portanto, em nome alheio e na defesa de interesse alheio). É necessário que o representado expressamente autorize o representante a ajuizar a ação.

Em alguns casos, diferentemente, o ordenamento jurídico atribui a determinadas pessoas a denominada legitimação ativa extraordinária, configurando a denominada substituição processual. Nessas situações, o substituto ajuíza a ação em seu próprio nome, mas na defesa de alegado direito alheio (direito do substituído). Quando isso

53 CLÓVIS

apud MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito

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ocorre, não é necessário que o substituído autorize expressamente o substituto a ajuizar a ação. 54

Moacyr Amaral dos Santos também elucida essa diferença, ao dispor:

O substituto processual é parte, no sentido processual. Quer na posição de autor, quer na de réu, o substituto processual é sujeito da relação processual, da qual participa em nome próprio, não em nome do substituído. Nisso difere a substituição

processual da figura da representação, em que o representante não é parte, mas

apenas representante da parte, que é o representado. Enquanto na substituição

processual o substituto age em nome próprio, na representação o representante age em nome do representado. 55

Desse modo, configurando-se representação processual, a legitimidade ativa seria do nascituro, o qual seria o titular do direito, cabendo à mãe representá-lo. Já em se tratando de substituição processual, a legitimidade ativa é da própria mãe, que ajuíza a ação em seu nome, mas defendendo direito do nascituro.

É certo que a hipótese de representação processual do nascituro, embora aceita por parte da jurisprudência pátria, conforme demonstrado anteriormente, ainda era bastante divergente, encontrando algumas oposições dos Tribunais mais conservadores. Nesse sentido, bem destacam Washington de Barros Monteiro e Regina Beatriz Tavares da Silva:

No entanto, debatia-se sobre a legitimidade do nascituro para a propositura de ação de investigação de paternidade cumulada com ação de alimentos, já que a sua personalidade está condicionada ao nascimento com vida. 56

Nesse diapasão, a lei em comento acabou com qualquer problemática que pudesse existir no tocante à legitimidade processual do nascituro para pleitear alimentos, uma vez que

54 PAULO, Vicente de; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 2.ed. Rio de

Janeiro: Impetus, 2008, p.130.

55 SANTOS, Moacyr Amaral. Direito Processual Civil: Processo de Conhecimento. 25. ed. São Paulo:

Saraiva, 2008, p. 359. (grifos do autor)

56 MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito Civil. V.2. 39. ed.

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